Um sonho de futebol
Natal Francisco, o pioneiro que sempre acreditou no futebol local

Fundado em 1946, o Atlético Clube Paranavaí não existiria sem o empenho de Natal Francisco (Foto: Reprodução)
Há poucos jovens em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, que já ouviram falar em Natal Francisco, o pioneiro a quem o Atlético Clube Paranavaí (ACP) deve muito. Francisco foi o responsável pela construção do primeiro estádio de futebol da cidade, uma conquista altruísta numa época de sonhos coletivos.
O pioneiro paulista Natal Francisco veio para a região Noroeste do Paraná pela primeira vez acompanhado do irmão José Francisco. Saíram de Presidente Prudente, interior de São Paulo, com a intenção de conhecer a tão falada Fazenda Brasileira, atual Paranavaí. Logo de cara, não acharam o lugar receptivo, então ficaram aqui oito dias e retornaram ao interior paulista. Em 1944, Natal Francisco voltou com a família e fixou residência em Paranavaí.
Apaixonado por futebol, a primeira iniciativa do pioneiro quando se mudou para cá foi conversar com o administrador geral da colônia, Hugo Doubek, sobre a possibilidade de conseguir um terreno para a criação de um campo de futebol. “O Hugo autorizou que eu abrisse uma picada até onde achasse melhor, a partir daí um engenheiro iria demarcar a área e entregar o terreno”, explicou o sapateiro Natal Francisco em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
Francisco escolheu um espaço onde é atualmente a Praça dos Pioneiros. Lá, mediu com os passos uma área de 280 por 200 metros quadrados. “Então fui pra Curitiba conversar com o governador Moisés Lupion. Fiz um requerimento em nome do Atlético Clube Paranavaí (ACP) e falei pra ele que queria o terreno. Mostrei o rascunho do engenheiro com detalhes do campo oficial para os jogos profissionais, um campinho para a rapaziada, uma piscina e a sede”, relatou.
Lupion então concedeu o terreno a Natal Francisco para a construção do primeiro estádio local. Empolgado, o pioneiro fez um acordo com o marceneiro José Ebiner que ajudou fornecendo madeiras a preço de custo. “Também contamos com a ajuda de alguns paraguaios. Eles quem transportavam e escolhiam as melhores peças para fazer as tábuas e as balaustres”, revelou Francisco.
Todo mundo ajudou na construção
Quando aparecia algum caminhão na colônia, o sapateiro pedia para ajudarem a transportar as toras até a serraria de Ebiner, acelerando o trabalho. “Em troca disso, a gente pagava as despesas do caminhão”, enfatizou o pioneiro, acrescentando que todo mundo participou da construção do estádio.
Sob comando do sapateiro, o campo, que anos mais tarde recebeu o nome de Estádio Municipal Natal Francisco, não demorou para ficar pronto. O próprio pioneiro cercou o campo com balaustres e construiu a sede quando não estava trabalhando na sapataria que tinha na esquina da Rua Getúlio Vargas com a Rua Minas Gerais.
Pela construção do estádio, o sapateiro apaixonado por futebol e por Paranavaí desde os tempos de Fazenda Brasileira nunca recebeu nada, a não ser a satisfação de admirar a sua criação e também ver a alegria de tantas pessoas que tinham como único lazer os jogos do Atlético Clube Paranavaí (ACP).
“Quantos não riram e choraram durante os jogos oficiais do ACP naquele estádio que ficava na Praça dos Pioneiros? A gente deve isso ao Natal Francisco, homem que criou um estádio com as próprias mãos, coisa que não existe hoje em dia”, comentou o pioneiro cearense João Mariano que atribui a existência e longevidade do Atlético Paranavaí ao sapateiro.
Muitos pioneiros destacam que o surgimento do primeiro campo oficial de futebol aproximou mais a população e também ajudou a superar os momentos de dificuldade. “Tinha gente que ficava a semana toda na expectativa de assistir a um jogo, isso animava mesmo as pessoas”, assegurou Mariano. Para o pioneiro mineiro José Antonio Gonçalves, Natal Francisco não teve o devido reconhecimento. “Ele foi um homem que deu tanto por Paranavaí. Hoje é praticamente esquecido”, reclamou Gonçalves.
Três mil réis em troca do terreno do estádio
Antes de construir o estádio de futebol na década de 1940, logo após a aquisição do terreno, o sapateiro Natal Francisco foi coagido por um morador local que tinha outros planos para o lugar. “O cara me ofereceu três mil réis em troca do terreno. Eu não aceitei porque já tinha feito a doação ao povo, era uma homenagem a eles. O indivíduo disse que nunca viu um sujeito bobo igual a mim que precisa de dinheiro e não aceita uma boa proposta”, declarou.
Em réplica ao homem, o sapateiro declarou que ganhava o suficiente para o sustento da família e ainda rebateu que a colônia cresceria muito. Irritado, o sujeito se comprometeu a ir até Curitiba fazer o possível para comprar pelo menos metade do terreno. À época, Natal Francisco ficou preocupado e decidiu ir até a capital com o seu Ford 29, movido a gasogênio.
“Meti uma muda de roupa dentro do carrinho e disse pra minha mulher que iria resolver a situação. Cheguei lá num dia pela manhã. Fui ao palácio do governo, mas o guarda não me deixou entrar”, confidenciou o pioneiro que gastou dinheiro do próprio bolso na viagem que durou dias por causa da precariedade das estradas.
Francisco insistiu para que o homem lhe fizesse um favor. “Pedi ao guarda para dizer ao governador que o Natal Francisco, de Paranavaí, precisava muito falar com ele”, lembrou. Dado o recado, sem demora, Moisés Lupion que estava dormindo se levantou e ainda de pijama foi atender o sapateiro. Lupion o convidou para entrar e tomar café. A obstinação do pioneiro chamou a atenção do governador que o qualificou como “um sujeito cem por cento”.
“Falou que se alguém tivesse a capacidade de ir a Curitiba para pegar um palmo daquela terra bastaria entregar a ele o nome da pessoa”, enfatizou. Ao final da conversa, Moisés Lupion afirmou que a terra já era do sapateiro e ainda garantiu a ele que dois dias após aquele encontro o título da terra estaria na colônia. Foi exatamente o que aconteceu.
Saiba Mais
Em 1961, o presidente do Atlético Clube Paranavaí (ACP), Waldemiro Wagner, construiu as arquibancadas do Estádio Natal Francisco e também o cercou com alambrado.
Na década de 1970, o Estádio Municipal Natal Francisco foi transferido para o Sumaré, distrito de Paranavaí.
Frase do pioneiro João da Silva Franco
“A única diversão daqui era o futebol. O campo de futebol foi feito pelo braço do povo”.
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31 Oct 10 at 5:52 pm