David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

A Batalha de Acosta Ñu e o Dia das Crianças

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No paraguai, são prestadas homenagens aos mortos no Día del Niño

Brasil matou mais de cinco mil crianças na Batalha de Acosta Ñu (Foto: Reprodução)

Há alguns anos, tive a oportunidade de estudar a perspectiva paraguaia sobre a Guerra do Paraguai graças aos jornalistas e escritores Hugo Montero e Jaime Galeano, da revista argentina Sudestada. A partir disso, em 2007, escrevi uma história de ficção chamada “Rio de Águas Vermelhas” que foi publicada na época e retrata a história de uma família que foi fazer um piquenique às margens do Rio Nhu-Guaçu, onde todos foram assassinados brutalmente pelo Exército Brasileiro.

Me inspirei em alguns fatos que incluem a Batalha de Acosta Ñu em 1869, episódio jamais esquecido pelos paraguaios. Faço questão de destacar que enquanto no Brasil o Dia das Crianças, celebrado no dia 12 de outubro, se resume a fazer algo de bom pelos pequenos, como dar presentes ou levá-los para se divertir em algum lugar, no Paraguai a realidade é bem diferente. O Día del Niño, em 16 de agosto, é marcado por muitas homenagens aos que foram mortos na Batalha de Acosta Ñu,  em Eusebio Ayala, no Departamento de Cordillera, onde a maior parte da força paraguaia era formada por garotinhos segurando varas de madeira que simulavam rifles.

Em suma, foi um conflito desigual, pois Uruguai, Argentina e Brasil não contavam apenas com número superior de soldados, mas também mercenários que faziam as rajadas de fogo cortarem o vento. Aos poucos, pilhas de corpos se espalharam pela pradaria conforme a bandeira da Tríplice Aliança assegurava um morticínio sem precedentes numa guerra sul-americana liderada por ingleses.

Na Batalha de Acosta Ñu havia mais de cinco mil crianças entre 9 e 15 anos. Ainda assim, o Conde D’Eu ordenou que os soldados não deixassem vestígios do abate para não precisarem carregar inimigos feridos. No Paraguai, é de conhecimento popular que a verdadeira história da guerra com o Brasil, Uruguai e Argentina foi omitida pelos países da Tríplice Aliança.

Entre 1865 e 1870, a Aliança matou mais de 90% da população masculina paraguaia. Durante a guerra, estima-se que a cada 100 mil homens paraguaios sobreviviam apenas quatro. O episódio representou a perda de quase 61 mil quilômetros quadrados de extensão territorial. Com o fim das beligerâncias, o Paraguai contraiu uma enorme dívida com o banco inglês Baring Brothers, o mesmo que financiou a participação dos países da Tríplice Aliança.

Descendentes de sobreviventes da guerra contam que quando as crianças caíam mortas sobre o solo paraguaio, as mães se juntavam ao grupo com as armas dos filhos falecidos. A realidade era tão caótica que o Marquês de Caxias renunciou ao posto e enviou uma carta para Dom Pedro II. De acordo com o marquês, a megalomania da Tríplice Aliança chegou a um ponto em que a guerra só terminaria quando toda a população do Paraguai fosse transformada em fumaça, quando matassem o último feto no ventre da mulher paraguaia.

Antes de deixar a Batalha de Acosta Ñu, o Conde D’Eu, um dos maiores criminosos de guerra do Brasil e substituto do Marechal Caxias, mandou atear fogo nos últimos feridos e prisioneiros. Eliminaram todos os inimigos que encontraram e levaram consigo apenas os aliados ainda saudáveis.

21 Responses to 'A Batalha de Acosta Ñu e o Dia das Crianças'

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  1. que triste la historia del dia de los niños en paraguay….aqui en Brasil se sabe poco de esta historia…entre algunos brasileros que pesquisaron encontré esto….faltan muchas cosas contar aqui

    sara

    16 Aug 13 at 1:47 pm

  2. Com certeza, Sara. Obrigado pela visita.

    David Arioch

    16 Aug 13 at 2:45 pm

  3. Sem querer justificar o massacre, gostaria de lembrar que um maluco paraguaio, foi quem colocou as crianças naquela situação. Como disse, não quero tapar o sol com uma peneira, mas gostaria que me justificassem a atitude burra e estúpida dos militares paraguaios!

    GEOVAH ANDRADE

    18 Nov 13 at 3:03 pm

  4. Parabéns, David. Eu conhecia a história da batalha da Acosta Ñu pela leitura de Genocídio Americano, livro de Júlio José Chiavenato, ed. Brasiliense. Brilhante o seu texto.

    José Cauneto

    16 Aug 13 at 5:28 pm

  5. Muito obrigado, Cauneto! Abraço!

    David Arioch

    16 Aug 13 at 6:20 pm

  6. As guerras são contadas pelos vencedores, e ai falam o que interessa para a história deles. A segunda guerra mundial, que nem é tão distante assim, existem distorções da história e fatos omitidos pelos aliados. Massacres como esse relatado pelo David. Dizem que nas guerras, a maior vítima é a verdade.

    Abdallah

    17 Aug 13 at 1:45 am

  7. Muitos dados são conflitantes nesse relato. Li muito a respeito de guerras, principalmente nas de âmbito sul-americano (Guerra do Paraguai, Guerra do Pacífico, Guerra do Cacho etc).
    A megalomania não era da Tríplice Aliança, mas sim de Solaño Lopez que não mediu esforços pra prender e torturar os próprios paraguaios, incluindo mãe e irmãs. Na verdade o próprio Conde D’Eu só foi aceito no ingresso da guerra por conta da desistência de Caxias, que não achava justificável continuar uma guerra apenas pra pegar um único homem (Solaño Lopez).
    Em relação ao Conde D’Eu, mais uma injustiça. De fato existem versões que alegam que o mesmo ateou fogo no capim seco justamente pra carbonizar feridos que ali se encontravam, porém outras versões dizem que o incêndio se deu por conta de fagulhas do tiroteio. Na verdade o Conde prendeu muitos oficiais que saqueavam e escravizavam os paraguaios no decorrer da guerra.
    E se quiser rotular um único vilão no massacre de crianças da Guerra do Paraguai, credite ao gordinho paraguaio que tomou a iniciativa e não aos soldados brasileiros.
    Deve-se tomar cuidado ao contar a história, expondo SEMPRE todos os espectros possíveis para não formarmos opiniões da maneira incorreta.

    André Filipe

    11 Sep 13 at 6:56 pm

  8. Pois é, guerras sempre culminam nas mais distintas perspectivas – e cada um daqueles que escrevem sobre o assunto tem a sua. No fim das contas, é impossível saber com exatidão o que aconteceu, já que sempre há ocultação de informações. Normalmente, deixamos um algo ou vários para trás não por malícia ou para assumir uma postura específica – é apenas a forma como a história chega até nós, mesmo que em menor ou maior proporção exista um interesse incessante em buscar sempre mais. André Filipe, obrigado pela contribuição.

    David Arioch

    11 Sep 13 at 7:11 pm

  9. como faço pra entrar em contato contigo? abs

    iur gomez

    18 Nov 13 at 2:07 pm

  10. Boa tarde, Iur. Pode ser pelo e-mail davidarioch@gmail.com.

    David Arioch

    18 Nov 13 at 3:04 pm

  11. Se o Paraguay não tivesse invadido terras da triplice aliança, não teria existido a guerra. Se o Paraguay tivesse se rendido quando viu que ia perder a guerra, não teria tantas baixas.

    otavio augusto viegas

    18 Nov 13 at 1:39 pm

  12. Ainda tem mais uma atrocidade: O exército brasileiro a mando do seu patrono, o Duque de Caxias, envenenou as águas dos rios do Paraguai; por isto não se pode consultar nenhum documento brasileiro sobre a Guerra do Paraguai ATÉ A DATA DE HOJE.

    Carlos de Freitas

    18 Nov 13 at 2:39 pm

  13. Acho o dado dos 4 sobreviventes para cada 100 mil homens muito alto. Qual era a população do Paraguai em 1864? Em 1960, 100 anos após o conflito, era de 1.900 milhões de pessoas. Na época deveria ser bem menos que isso, mesmo descontando o profundo corte demográfico causado pela Guerra, onde dados oficiais dão conta de 300 mil paraguaios mortos no conflito, o que já é um número enorme, ao falarmos de tal quantidade de gente morta na segunda metade da década de 1860.
    A Guerra do Paraguai foi um tremendo morticínio, onde não existem mocinhos nem bandidos, existem as vítimas e os interesses das elites e dos governos dos países envolvidos, tão somente, junto com a versão dos vencedores.
    O Paraguai possuía um exército forte, mas pagou um alto preço pela guerra, visto que a Triplice Aliança devastou o país. Assim como os nortistas fizeram aos sulistas nos EUA em 1964, até a rendição do General Lee. Solano Lopes não se rendeu, foi até o fim, até ser morto em março de 1870 em Cerro Corá, acompanhado de cerca de 200 homens. Essa obstinação, talvez, tenha custado caro a população paraguaia, assim como a de Sadam no Iraque (sem querer fazer comparações ideológicas ou julgamentos de valor). Talvez. Ou talvez não teria feito diferença nenhuma.
    Na Batalha de Campo Grande, há que se considerar, sim, que o governo Paraguaio alistou, até à força, velhos e crianças para a luta, conforme vários historiadores o indicam. Os próprios filhos de Solano Lopes, igualmente com idade entre 09 a 15 anos, participaram da Guerra. Claro, isso não diminui o impacto bárbaro do massacre de cerca de 4.000 paraguaios (ou 5.000, conforme o texto) por cerca de 20 mil soldados brasileiros. Mas ficam as perguntas: Porque os paraguaios montaram um batalhão assim? Porque enviaram para o front da guerra crianças e velhos? O então governo do pais tem, sim,,de ser historicamente avaliado pela sua parcela de responsabilidade pelo que aconteceu em Campo Grande.
    Entendo, de acordo com a opinião de alguns historiadores, que a Guerra do Paraguai foi um tremendo erro de cálculo de todos os governos envolvidos, pois durou (e custou) muito mais do que previam estes. Um erro de cálculo que custou muito caro a Solano Lopes, a seu povo e a seu país. Um tragédia impressionante.

  14. Pois é, João. Como disse em um comentário anterior, sempre há conflitos de informações, até porque depende de quem conta e também de quais provas restaram para corroborar o que é dito. Por isso, fiz questão de deixar claro no texto que se trata de uma estimativa. Há muitas perguntas não respondidas. Há muito a ser descoberto. Obrigado pela contribuição.

    David Arioch

    23 Aug 14 at 1:09 pm

  15. Lamentável. Que sirva de lição para o futuro! David, agradeço a gentileza do compartilhamento de infomações.

    Antonio Neto

    21 Jan 15 at 12:30 pm

  16. Campo Grande, Mato Grosso do Sul, que fica a algumas centenas de quilômetros do Paraguai, nunca foi palco de batalha nesta guerra. Campo Grande a que se refere este artigo, hoje chama-se Eusébio Ayala e fica a 72 Km de Assunção.

    Washington Figueiredo

    23 Jul 15 at 4:54 pm

  17. Se você está numa guerra e estão atirando em você, nao importa se e um homem uma criança uma mulher ou um velho. A culpa é de quem colocou eles lá para lutarem. Recomendo o livro maldita guerra de francisco doratioto. Livro mais atual e com base em documentos historicos de todos os paises envolvidos que acaba com varios mitos tais como o do paraguai coitadinho q era desenvolvido e foi covardemente empurrado pra guerra por causa dos interesses ingleses. O paraguai invadiu o Brasil no mato grosso e no rio grande do sul, saqueou estuprou e matou a população e agora aparecem pessoas q colocam os brasileiros como vilão e o ditador louco co o um coitado. Nota 10 para o nosso exercito q foi lá e ganhou a guerra e eliminou o gordinho.

    Julio fariad

    26 Oct 15 at 1:23 am

  18. A Historia. dos grandes conflitos humanos sao sempre contados pelos vencedores!Devemos levar em conta que o Mariscal Solano Lopez foi um tirano completamente insano,que perseguiu,prendeu e mandou fuzilar membros de sua propria familia.O grande paradoxo e que,ainda hoje,e considerado Heroi no Paraguay.

  19. Mozart, obrigado pela contribuição!

    David Arioch

    25 Jan 16 at 12:02 am

  20. Uma coisa que me deixa puto da vida – quando falam da batalha da guerra do paraguai de Batalha de Acosta Ñu, aonde morreram 4 mil crianças sem o devido embasamento do geral e tentando crer em uma visão deturpada do que aconteceu fala simplesmente tendenciando o acontecido- a historia é dada assim:” morreram 4 mil crianças – ou o Brasil trucidou 4 mil crianças (alguns falam em 3 mil outros em 5 mil) mas nunca perguntam o que paraguaios fizeram em Uruguaiana ou Corumbá quando invadiras estas cidades – mas pera aí criança armada atirando em tropa é criança? segunda pergunta mães e crianças armadas atirando em soldados são mães e crianças? para mim parecem soldados – e se foram soldados inimigos é errado incendiar o mato e retirar a fogo os inimigos de lá?

    Eu acho engraçado tem uma postura de crime para este caso mas tem outra quando falo que a juventude hitlerista então deveria ser poupada, hipocrisia

    Doratioto, na introdução do livro, afirma que “entre 1740 e 1974, o planeta teve 13 bilhões de habitantes e assistiu a 366 guerras de grande dimensão, ao custo de 85 milhões de mortos. O resultado dessas guerras parece ter sido um prêmio à agressão, pois em dois terços delas o agressor saiu-se vencedor. […]A Guerra do Paraguai faz parte, portanto, da minoria, pois o agressor, o lado paraguaio, foi derrotado”.

    A guerra perdurou de dezembro de 1864 a março de 1870, e milhares de paraguaios, argentinos, brasileiros e uruguaios morreram, a maioria de fome, doença e exaustão física.

    O autor também informa que no dia 16 de agosto de 1869 travou-se a “batalha de Campo Grande, conhecida como Acosta Ñu no Paraguai, e dela participou um grande número de jovens paraguaios, que contavam entre 14 e 15 anos de idade. […]Do lado paraguaio, misturados aos soldados, encontravam-se crianças com barbas postiças para parecerem adultas”.

    Outras informações dão conta que algumas crianças pintavam o rosto com carvão para parecerem mais velhas. Essas crianças não colocavam a barba postiça e pintavam o rosto por vontade e iniciativa própria, mas sim por ordem do comando superior, em cujo ápice estava Solano López.

    Desde o início da guerra, crianças paraguaias foram obrigadas pelo ditador López a lutar. No “Maldita guerra”, Doratioto cita Taunay:

    “Oh! A guerra, sobre tudo a guerra do Paraguai! Quanta criança de dez anos, e menos ainda, morta quer de bala, quer lanceada junto à trincheira que percorri a cavalo, contendo a custo as lágrimas!” (pág. 409).

    Solano López, por ocasião da batalha de Acosta-Ñu, em 1869, já havia praticamente perdido a guerra. Portanto, já não havia “justificativa para Solano López colocar crianças a lutar contra soldados profissionais” (Doratioto).

    “Nessa circunstância, a persistência em jogar contra os aliados tropas improvisadas, composta em grande parte de velhos e crianças, somente pode ser classificada de indefensável. Alguns trabalhos populistas, cultuadores, implícita ou explicitamente, da tirania, se limitam a destacar a coragem de crianças e velhos e a buscar levantar no leitor a indignação de, afinal, os aliados terem lutado e matado um inimigo mais fraco. Esses trabalhos induzem o leitor a admirar a Solano López, em lugar de responsabilizar o ditador pela morte de crianças e velhos, ao levá-los a lutar numa guerra já perdida. Por essa lógica míope, dever-se-ia admirar Hitler por resistir o avanço aliado, sem render-se, ao preço da destruição final da Alemanha e, mais, em outra identidade entre os ditadores, também utilizar-se de adolescentes e velhos para enfrentar o avanço soviético sobre Berlim” (Doratioto, Maldita Guerra, pág. 409).

    Não sei quantos paraguaios e brasileiros conhecem a história verdadeira desta maldita guerra, iniciada pelo ditador Solano López. Sabemos que a maior vítima foi o povo, principalmente as crianças, velhos e mulheres do Paraguai.

    Na atual conjuntura, no Brasil, há quem, por desinformação, má-fé, ignorância ou oportunismo, trace paralelos indevidos ao afirmar que a suspensão do Paraguai do Mercosul seria mais uma agressão dos países que no passado constituíram a Tríplice Aliança, tentam sempre colocar o Paraguai como um coitadinho, mas naqueles idos tempos o pais era governado por um insano que foi educado na europa e se achava o napoleão das americas e achava que poderia conquistar- eu disse conquistar a força a bacia cisplatina.

    E hoje passados 150 anos tenho de conviver com historietas sem o menor embasamento de relato historico culpando os brasileiro em especial o nosso exercito e seus Heróis naquele momento historico tão decisivo ao nosso pais e sua integridade

    No massacre da Acosta Ñu, há responsáveis dos dois lados, mas um principal culpado – o ditador Solano López.

    João Gilberto Araújo Pontes

    11 Jan 17 at 6:56 pm

  21. Você tem o direito à sua opinião, e eu de produzir meus textos. Só não tem o direito de vir na minha página me ofender. Se limite a discutir o assunto, não a direcionar intolerância às pessoas. Sou jornalista profissional desde 2005 e trabalho com jornalismo cultural desde então. Aprenda a debater educadamente. Ademais, você não conhece meu trabalho nem sabe quem sou. Se você é do tipo “ultranacionalista”, é algo que compete tão e somente a você. Não tenho nada a ver com isso. Estou contando a história em torno do “Día Del Niño” e citei minhas fontes, assim como você citou as suas. Posso dar espaço para você se manifestar, mas não sou obrigado a concordar com você ou tomar suas “verdades” como as minhas. Nunca vou concordar com morte de crianças em guerra, independente de qual seja. Sou humano antes de qualquer coisa, e independente de condição geográfica.

    David Arioch

    12 Jan 17 at 12:53 am

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