David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

Quando alguém que você conhece comete suicídio

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(Imagem: The Daily Beast)

Poucas coisas, ou nenhuma, reafirmam mais nossa impotência do que quando você é informado que alguém que conhece cometeu suicídio. De repente, alguém que ontem sorriu com você, contou uma piada, disse que é preciso lutar, e hoje partiu. Não está mais lá. Lateja na mente a última conversa. “Será que algo poderia ter sido dito para evitar isso?”

Não se pode prever. Há sentimentos e estados, que dependendo da circunstância e intensidade, já não se transmutam com palavras, porque são acumulativos e podem pesar sobre a cabeça como um edifício de bigornas. Talvez haja também o peso da vergonha em partilhar um desinteresse pela vida que se intensifica. Medo de julgamentos, da condenação sem consideração. Medo da comparação, que não ameniza. Como se dores pudessem ser medidas.

Acredito que é por isso que muitas pessoas que sofrem de depressão morrem e até mesmo os mais próximos dizem que não tinham a mínima ideia de que tal ente “sofria de algo assim”. A educação, a cultura em que estamos inseridos, também moldam a forma como “nos transmitimos” emocionalmente, para os outros e para nós. A nossa percepção de mundo e dos outros – os limites da personalidade, e o que recebemos em troca.

Para muitos, há tantos bloqueios que a morte pode parecer menos dolorosa em um momento de desespero inenarrável – ainda que digam que é preciso ser forte. Exigir força dos outros também pode ser exaustivo para quem serve como objeto dessa intenção.

E dependendo da condição, vive-se em um estado intenso de transitoriedade – que vai rapidamente de um extremo ao outro. A depressão pode fazer isso. Acordar bem, mas horas depois não conseguir dormir porque sente-se numa autofagia crônica do existir. A mente e o arrebatamento das sensações incontroláveis não para e é como se afogasse a alma.

Apenas ser forte no mundo em que vivemos pode não ser suficiente, e dizer isso aos outros, dependendo do seu estado, talvez não ajude. A força só tem razão de existir quando há para onde direcioná-la. Quando os propósitos se diluem, a força é apenas uma palavra, já fragilizada, descaracterizada. Vontades, sonhos, intenções, creio que só existimos à medida que não os diluímos, ao menos por completo.

Alguns encontram forças para demonstrar o que sentem, ainda que em uma sessão de terapia, já outros não se veem como capazes ou simplesmente não creem. E se fecham, num constante drenar de energia, até o apagar da luz. Essas considerações podem ser tão reais quanto irreais, dependendo de quem seja. Para menos ou para mais.

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