Archive for the ‘Séries’ Category
Mindhunter, uma boa opção para quem se interessa por séries sobre serial killers
Para quem se interessa pelo tema serial killers, recomendo a série Mindhunter, da Netflix. Creio que o diferencial maior é que o drama policial de David Fincher (diretor de filmes como Clube da Luta, Zodíaco e O Curioso Caso de Benjamin Button) é de fato baseada na realidade, inclusive com caracterizações fidedignas e diálogos reais ou parcialmente reais envolvendo alguns controversos psicopatas do século 20, como Ed Kemper III, Dennis Rader, Jerry Brudos, Monte Ralph Rissell, Richard Speck e Darrell Gene Devier. O livro que inspirou a série foi escrito pelo analista do FBI John E. Douglas.
O drama policial também discorre sobre a origem dos termos serial killer, mass murderer, M.O. e signature. Em síntese, Mindhunter mostra como a partir do momento que surgiu o interesse não apenas por traçar o perfil psicológico de assassinos em série, mas também o desenvolvimento de metodologias que permitissem aprender algo sobre suas mentes, houve uma evolução na identificação desses criminosos. Os dez episódios da primeira temporada foram ao ar no dia 13 de outubro e já foi confirmada renovação para a segunda temporada.
Sobre a série “O Atirador”
Comecei a assistir a série “O Atirador”, da Netflix, e pensei em parar quando vi o cara mirando a arma para um lobo, antevendo a morte do animal – clichê comum em séries e filmes. De repente, ele atira só para assustá-lo e usa outra arma para disparar um tranquilizante. Ele faz isso para livrar o lobo de uma armadilha colocada por caçadores. Depois, dois caçadores se aproximam, o ameaçam, fazem uma piada sobre caça e ele atira tranquilizantes nos dois. Ganhou meu respeito até o momento.
Claro que o uso de animais em obras audiovisuais sempre levanta questões envolvendo maus tratos, já que os animais não estão lá por espontânea vontade, mas creio que em meio a tantos filmes e séries que naturalizam a caça, é interessante ver uma abordagem que vá na contramão disso.
Narcos X Escobar, El Patrón Del Mal
Gostei da série Narcos, mas devo dizer que Escobar, El Patrón Del Mal me surpreendeu. A qualidade técnica e de elenco de Narcos é bem evidente, no entanto, a série colombiana se destaca pela fidedignidade à história de Pablo Escobar. Existe algumas falhas no elenco de Escobar, principalmente quanto à qualidade das interpretações, mas o trabalho de pesquisa dos colombianos é surpreendente.
O que também faz valer a pena assistir as duas séries são as contraposições de versões sobre um mesmo fato, além da dissonância no comportamento de inúmeros personagens. Só para citar um exemplo, a série colombiana, mais fiel à história real, mostra outra versão do relacionamento de Pablo Escobar com os guerrilheiros.
Penso que o que acaba atraindo menos atenção para El Patrón Del Mal é que a série tem estrutura de novela, logo é mais longa e muitos episódios acabam tendo um ritmo muito lento, inclusive decaindo para o melodrama. Se bem que isso não é de se estranhar, já que é uma característica da cultura televisiva latina. No mais, creio que uma série acaba por complementar a outra, embora Narcos tenha um roteiro bem mais ficcional do que Escobar, El Patrón Del Mal.
Fargo, poesia audiovisual do absurdo
Uma série de TV sangrenta com requinte satírico de tragédia grega
Para quem gosta de séries de anti-heróis, e que misturam drama, suspense e humor mórbido, vale a pena conhecer a série Fargo, da FX, que estreou em 2014. Melhor ainda para quem já assistiu ao filme homônimo dos Irmãos Coen, lançado nos Estados Unidos em 1996. Vale a pena investir algumas horas na série e no filme, já que como a storyline é diferente, assim como atores e personagens, um se soma ao outro nas suas mais diversas perspectivas.
Intrigante e envolvente, a primeira temporada da série tem como ponto alto um elenco composto por atores de séries como Sherlock, Breaking Bad e Dexter, além do tarimbado Billy Bob Thornton no papel de um mercenário enigmático, metódico, idealista e desdenhoso. Quem assiste ao primeiro episódio já fica na ânsia de acompanhar os demais.
Na segunda temporada, de 2015, Fargo recomeçou com um novo elenco e sem qualquer associação com o desenvolvimento da primeira temporada. Após um acidente fatal provocado pela esposa Peggy Blumquist (Kirsten Dunst), o incauto assistente de açougueiro Ed Blumquist (Jesse Plemons), o Todd de Breaking Bad, se vê às voltas com a máfia. Sem se dar conta das próprias ações, causa uma guerra entre mafiosos. A situação só não se torna pior do que já é porque tem como atenuante o policial Lou Solverson (Patrick Wilson) e o xerife Hank Larsson (Ted Danson).
Embora as histórias das duas temporadas sejam completamente distintas, alguns padrões são mantidos. Por exemplo, sempre há a moral, o imoral e o amoral, além de personagens que banalizam a vida e se colocam acima da lei para alcançar qualquer objetivo. Outras similaridades entre os personagens incluem prevaricação, comportamento sociopata e negação dos fatos e da realidade, além de anseios eversivos e autodestrutivos.
E o mais curioso é que tudo isso se mistura também à ingenuidade, irreflexão e descomedimento. Excessos de confiança e de profissionalismo também são apresentados como nocivos. São características que cegam os personagens para as falhas e vulnerabilidades percebidas apenas por quem não compõe aquele cenário ou contexto belicoso.
Um exemplo é a cena em que Hanzee Dent (Zahn McClarnon) planeja executar o casal Blumquist, crente de que, por serem pessoas comuns, eles não mostrariam nenhum tipo de resistência. É cômico reconhecer que a experiência também pode levar à tolice e à subestimação, e o que deveria ser uma vantagem se torna uma desvantagem.
Por pior que seja, a ideia da morte em Fargo não chega ao espectador de forma pesarosa, a não ser a de Betsy Solverson (Cristin Miloti), a esposa do oficial Solverson que sofre de câncer. No mais, o passamento parece inevitável e até incentivado como um recurso maior. Ele reforça os desdobramentos meândricos e tresloucados de uma obra cruenta com requinte satírico de tragédia grega.
A desgraça é apresentada em Fargo como uma poesia do absurdo, do tout est possible, mergulhada numa estética carmesim. E nela quase tudo de significante ou insignificante soa mais valoroso que a própria vida – quase relegada a recurso de figuração em meio a um caos de degenerescências.
Wardruna na série Vikings
Heimta Thurs, do projeto norueguês Wardruna, é uma das melhores músicas da trilha sonora da série de TV Vikings. Casou perfeitamente com a cena do ritual de execução (Blood Eagle) do viking Jarl Borg, líder de Götaland, morto no sétimo episódio da segunda temporada. Interessante ver como o History Channel abriu espaço para um projeto musical espiritualista como o Wardruna que se dedica a valorizar e divulgar o alfabeto rúnico proto-nórdico.
Jamais imaginaria ouvir a voz do taciturno norueguês Gaahl, mais conhecido por bandas de black metal como Gorgoroth e Trelldom, servindo de background a uma das cenas mais importantes de uma grande série dramática. Por esse tipo de abertura, isenção e comprometimento, tanto com a qualidade histórica quanto ficcional, posso dizer que considero o History Channel um canal de TV exemplar. O vocalista e multi-instrumentista Einar Kvitrafn Selvik é o principal compositor do Wardruna que também traz na formação a cantora Lindy Fay Hella. O trio tem outras composições que integram a trilha sonora da série, principalmente em cenas de batalhas.
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As duas realidades de Mark Britten
Em 2012, a série dramática Awake – Two Dreams, One Reality estreou nos Estados Unidos como uma grande promessa da rede NBC. Infelizmente foi mais um programa que não ultrapassou a primeira temporada, inclusive com cancelamento conturbado e final inconclusivo. Apesar disso, é uma série que vale a pena ser conhecida.
Ao longo de 13 episódios, o espectador é convidado a se aprofundar na história e no cotidiano do detetive Mark Britten (Jason Isaacs). Depois de sofrer um acidente, Britten acorda e acredita que está vivendo em duas realidades distintas. A verdade é que ele não é capaz de identificar quando está acordado ou sonhando devido ao trauma. Em uma das supostas realidades, a tragédia custou a vida de seu filho Rex. Na outra, quem está morta é sua esposa Hannah, o que o deixa mais confuso, o levando ao cume da culpabilidade e da crise existencial.
Outra surpresa é que em cada aparente realidade o detetive tem parceiros diferentes. Na história em que sua esposa faleceu, ele trabalha com o detetive Efrem Vega, um jovem com pouca experiência, mas muito sociável. Já no segmento marcado pela ausência de Rex, Mark Britten atua com Isaiah “Bird” Freeman, um detetive veterano – homem cínico e irônico. É interessante perceber logo no primeiro episódio como os mais diversos aspectos da série são permeados pela dualidade, uma constante que inunda o universo de Britten até o episódio final.
Alcatraz, uma série subestimada que acabou cancelada
Em 2012, acompanhei a série Alcatraz, exibida pela Fox e produzida por J.J. Abrams, o mesmo produtor de Lost. Infelizmente a série foi tão subestimada que acabou cancelada. Ainda assim, recomendo a qualquer um que goste de séries de drama e mistério que assistam a primeira e única temporada de Alcatraz. O enredo gira em torno dos 302 presos que desapareceram da Ilha de Alcatraz, a prisão de segurança máxima mais famosa dos Estados Unidos, sem deixar pistas numa noite de 1963.
O mais interessante é que a série se passa na atualidade e, aparentemente, cada um dos detentos retorna em um episódio. Reaparecem e cometem crimes a mando de quem os livrou da prisão à época. O mais intrigante é que os presos voltam com a mesma aparência, como se tivesse passado apenas mais um dia e não 48 anos.
A série tem um caráter crítico bem curioso, tanto é que Jack Sylvane, veterano da Segunda Guerra Mundial e o primeiro fugitivo a ressurgir na atualidade, foi confinado em Alcatraz porque roubou uma mercearia que vendia selos, ou seja, por ironia, um crime federal. No elenco, estão alguns nomes bem conhecidos como Sam Neill, Sarah Jones e Jorge Garcia.
Boardwalk Empire e a Crise de 1929
Embora tenha chegado ao fim em 26 de outubro de 2014, Boardwalk Empire é uma das melhores séries de TV dos últimos anos. Recomendo para quem gosta de programas que casam entretenimento com história. A série é ambientada no período da Grande Depressão, quando os Estados Unidos passaram por uma de suas maiores crises econômicas.
Um dos pontos mais interessantes de Boardwalk Empire é que a série mostra como os mafiosos italianos e irlandeses atuavam para explorar ao máximo as privações da Crise de 1929. Inclusive fica bem claro que esse período foi tão benéfico para criminosos quanto para políticos.
Há elementos históricos bem contundentes misturados com boa ficção. Outro atrativo são os muitos personagens enigmáticos, inspirados em figuras reais que comandaram o crime organizado nos EUA, principalmente nas décadas de 1920 e 1930.
O poder de identificação de Louie
Série de Louie C.K. surpreende ao mostrar um comediante como uma pessoa comum
Há três anos, eu estava procurando uma nova série de comédia e me surpreendi com o que encontrei. Quando li a sinopse pela primeira vez, admito que hesitei, até porque hoje em dia é difícil pensar logo de cara em originalidade ou criatividade quando falamos sobre sitcoms protagonizadas por comediantes de stand up. Ainda mais se você passou a adolescência assistindo séries como Seinfeld, The Cosby Show, The Bob Newhart Show, Home Improvement, Roseanne e só pra citar um exemplo até recente – Everybody Loves Raymond. São programas feitos por artistas que marcaram a história da TV norte-americana ao migrarem das casas de shows para as comédias de situação.
Fizeram a diferença, incrementaram e foram copiados até mesmo por comediantes brasileiros que só não admitem isso porque sabem que a maior parte da população brasileira desconhece esses programas. Mas voltando ao principal, a série que me chamou a atenção é Louie, sobre o estilo de vida e o cotidiano de um comediante de quem eu jamais tinha ouvido falar até 2011. Acho que passei cerca de três meses adiando até o dia de assistir ao primeiro episódio.
Me arrependi de não ter assistido antes. A abreviação do nome do comediante, Louis C.K., é uma brincadeira com o sobrenome húngaro Székely que em português significa guarda da fronteira. É uma palavra até curiosa se levar em conta que Louie, como é mais conhecido, é um estadunidense de origem mexicana com um sobrenome magyar. Além de protagonizar a série lançada em 2010, C.K. é o criador, roteirista e diretor desse programa que se tornou uma das melhores aquisições do canal FX dos últimos anos.
Quando comecei a assistir a primeira temporada da série em 2011, um ano após o lançamento, o primeiro elemento que me chamou a atenção foi a estrutura de obra audiovisual independente e intimista. É interessante ver uma abertura de série em que o protagonista passa despercebido pelas ruas de Nova York, a meca do stand up comedy, em direção a uma pequena casa de shows, um ambiente que moldou e transformou Louie em quem ele é hoje.
O programa foge da glamourização e realça fatos pouco conhecidos sobre o vasto universo do stand up comedy nos Estados Unidos. Usa a ironia para instigar risos e reflexões sobre uma parcela da realidade do universo do entretenimento norte-americano. Na série, Louie não é celebrado como um comediante de sucesso. Muito pelo contrário. Também é um sujeito reservado e bem solitário quando não está acompanhado das duas filhas.
Há situações em que nem mesmo é respeitado. Por um lado, é uma forma de entrar em concordância com uma proposta peculiar de humor negro e satirização. Por outro, evidencia com certa pessoalidade as dificuldades vividas por centenas de comediantes que apenas lutam para se manter na ativa, sobreviver e garantir o sustento familiar.
S.K. é alvo das suas próprias piadas e das casualidades do cotidiano. Exemplos são os momentos em que é sacaneado por adolescentes e até por prestadores de serviços do prédio onde mora. Quem assiste Louie, percebe que o humor e o riso estão acima de tudo; são prioritários. Se necessário, o autor é capaz de desconstruir a própria imagem para surpreender o público, até porque o ser humano, independente de qualquer coisa, é suscetível à metamorfose. No programa, Louie C.K. se coloca numa posição de homem comum que simplesmente tem como diferencial o fato de ter escolhido trabalhar com a comédia. Tanto que assim como em qualquer profissão vive situações em que é enganado e passado para trás pelas pessoas com quem se relaciona, inclusive colegas de trabalho.
Logo na primeira temporada, Louie brinca que trilhou esse caminho porque provavelmente não saberia fazer outra coisa da vida. A hipocrisia é um tema recorrente nas piadas do comediante e agrada porque não recai na obviedade. Quando decide ser mais crítico e ácido, se volta para as consequências do capitalismo, hipermodernidade, excessos de urbanização, fobias sociais, paroxismos, estereótipos, falhas do american way of life, xenofobia e preconceito contra imigrantes e minorias étnicas. Aborda com criatividade singular a indiferença, apatia, ausência de sensibilidade e de solidariedade.
Em menos de 23 minutos, e ao melhor estilo single-camera, Louie consegue fazer o espectador viajar por situações corriqueiras e insólitas que o fazem rir e refletir sobre as mais simples e imprevisíveis razões. Em uma das cenas de um episódio, o protagonista brinca com a inevitabilidade de envelhecer ao citar um aniversário em que confundiu a própria idade. Em outra, explora uma situação de intimidade com uma garota que tinha fetiche por homens velhos. Para o comediante, não há matéria-prima mais rica do que a própria condição existencial e as experiências do cotidiano.
Na série, o ato de fazer piada de si mesmo não tem uma conotação pejorativa, desrespeitosa ou apelativa. Na realidade, revela uma certa maturidade e até capacidade de aceitação. Quem o faz com sabedoria demonstra autoconhecimento e mais flexibilidade para encarar as dificuldades cotidianas, principalmente se tratando de relações sociais, sejam casuais ou não.
Até uma desconfortável dor nas costas entra para o script de uma cena em que a realidade flerta com o seu potencial inventivo. A situação faz rir porque explora uma perspectiva fantasiosa de um diálogo entre médico e paciente. Na ocasião, o comediante busca amenizar o seu problema. Em vez de apresentar uma solução plausível, o médico diz que o jeito é Louie começar a se locomover na horizontal, já que o homem não foi feito para andar em pé. Cenas como essa fazem parte de uma proposta de humor surreal, baseado na imprevisibilidade. A intenção é subverter as expectativas do público.
Outro exemplo pode ser visto nos minutos iniciais de Back, o primeiro episódio da quarta temporada, iniciada no dia 5 de maio, em que garis passam em frente ao prédio do comediante recolhendo o lixo. Louie não consegue dormir com o barulho. Para piorar, o nível de desconforto sofre uma gradação acelerada. Assim o autor e protagonista explora uma situação de identificação. Ou seja, qualquer espectador já deve ter vivido um momento em que queria dormir, mas o barulho nas imediações era tão incômodo que se tornava cada vez mais extenuante com o passar do tempo.
Louie usa o humor surreal como intensificador. Logo os lixeiros começam a arremessar as latas de lixo e também a batê-las no chão. Quando o espectador pensa que aquele é o ápice da cena, ele é surpreendido de novo. Dessa vez, com a imagem dos garis chutando a janela do comediante, que não fica nos andares mais baixos do edifício, recolhendo objetos do seu quarto, batendo lata e pulando em sua cama. A ideia é materializar a sensação de perturbação através do surrealismo. Afinal, quem nunca pensou em algo como: “Putz, que barulheira! Parece até que estão aqui no quarto comigo!”
A graça está no fato de que Louie C.K. não se coloca numa posição de comediante de aceitação universal, o que deixa tudo mais engraçado. No episódio Model, da quarta temporada, ele é convidado por Jerry Seinfeld, que também aparece na terceira temporada, para fazer uma breve apresentação em um evento beneficente. Em vez de tentar agradar a um público formado por multimilionários, ele faz piada deles, arrancando risos apenas de uma mulher da plateia. Surge uma situação tão desconfortável quanto cômica.
Louie é tão leve quanto denso, reflexo da sua formação heterogênea como um comediante que além de voyeurista por natureza não esconde suas influências que incluem George Carlin, Richard Pryor, Bill Cosby, Steve Martin, Robert Downey e Jerry Seinfeld. Como a maior riqueza do programa são os diálogos, fica impossível não notar as referências a Woody Allen, o que também se estende à qualidade estética minimalista e trilha sonora, já que tanto o cineasta quanto o comediante partilham do mesmo amor pelo jazz, um recurso que reforça o simbolismo nova-iorquino.
Grimm cria em Portland um universo moderno de seres fantásticos
Cada episódio da série é uma versão livre de uma história dos Irmãos Grimm
Desde a primeira temporada, acompanho a série Grimm, da NBC, e ouso dizer que é uma das produções televisivas mais intrigantes da atualidade; um mix de fantasia, mistério e crimes. Recomendo principalmente para quem na infância, adolescência ou qualquer outra fase da vida tenha lido as fábulas dos Irmãos Grimm, famosos por contos como “Chapeuzinho Vermelho”, “O Flautista de Hamelin” e “O Príncipe Sapo”, entre outros.
Na série que gira em torno do detetive Nick Burkhardt, um descendente dos Grimm, interpretado por David Giuntoli, cada episódio é uma versão livre de uma história dos alemães. A criatividade aliada a uma estética fria recria na moderna Portland, Oregon, um universo místico, onde personagens como Blutbad (Homem-Lobo Mau), Hexenbiest (Mulher-Bruxa), Jagerbar (Homem-Urso), Mellifer (Homem-Abelha), Ziegevolk (Homem-Bode), Reinigens (Homem-Rato) e Bauerschwein (Homem-Porco) assumem características tão peculiares quanto assustadoras.
Há tanta profundidade na construção do perfil físico e psicológico de cada personagem sobrenatural que nos leva até mesmo a questionar se os contos de Jacob e Wilhelm realmente eram apenas mágicas histórias infantis. Em um dos episódios, aqui cito o sexto da primeira temporada – “The Three Bad Wolves”, me surpreendi logo no início quando percebi que se tratava de uma livre releitura contemporânea do conto “Os Três Porquinhos”.
Dois Bauerschweins (Homem-Porco) são assassinados um ano antes por uma Blutbad (Mulher-Lobo Mau) e mais tarde surge a retaliação, pois o terceiro decide se vingar pela morte dos irmãos. A trama se desenrola a partir de uma inversão de papéis, destrói e reconstrói metáforas, anula estereótipos e se apoia na obliteração da figura do Lobo Mau diante do Porquinho.
É possível até enxergar pequenas referências aos pensadores Niccolò Machiavelli e Jean-Paul Sartre em algumas passagens. A vendetta do Bauerschwein diante do Blutbad é emblemática. Na série, o Lobo-Mau não sopra casas. Além disso, é suplantado pelo Porquinho que faz uma residência ir pelos ares sabotando o sistema de distribuição de gás. Noutra oportunidade, aniquila o inimigo com quatro tiros disparados de uma arma automática e silenciosa.
E o mais interessante de tudo é que aparentemente todos os seres da série são humanos, pois apenas os sobrenaturais se reconhecem como tais em momentos de grande carga emocional. Outros dois personagens de destaque da série são: o detetive Hank Griffin, interpretado por Russell Hornsby, parceiro de Burkhardt; e o blutbad Monroe, papel de Silas Weir Mitchell, amigo de Nick. Em suma, Grimm permite novas reflexões sobre as fábulas infantis.