Archive for the ‘1932’ tag
60 Anos de Paranavaí
Paranavaí, 14 de novembro de 2012.
São 60 anos de um município com uma história que ultrapassa os cem. Paranavaí não seria o que é hoje se não fosse por centenas de peões que criaram uma estrada com mais de 110 quilômetros de extensão ligando a velha Fazenda Ivaí ao Porto São José; se não fosse por pessoas que resistiram a 40 dias e 40 noites de chuvas dormindo em um barracão de bicho da seda. Além disso, reconstruíram uma ponte e atravessaram a nado o Rio Paraná para conseguirem chegar à Vila Montoya. Nem a Revolução de 1930, que culminou em desemprego para toda uma população que teve de caminhar mais de 220 quilômetros, impediu a colônia de renascer novamente sob o signo do café.
Nem mesmo uma série de incêndios criminosos que atingiu os cafezais e centenas de moradias em 1931 inviabilizou a sobrevivência do povoado. Paranavaí também não seria o que é hoje se não fosse a iniciativa do interventor federal Manoel Ribas para que o engenheiro Francisco Natel de Camargo diminuísse a influência paulista, abrindo novas estradas e ampliando a relação da Velha Brasileira com o restante do Paraná. Paranavaí tem uma extensa história de obstáculos, até mesmo por parte do poder público que só voltou a se preocupar com a localidade em 1935.
Infelizmente, muitos personagens importantes são praticamente desconhecidos da população. Falo do marceneiro Hugo Doubek, o curitibano que se tornou o primeiro administrador de Paranavaí. Doubek não apenas administrava a colônia, mas cuidava de toda a população. Quando houve um surto de leishmaniose em Paranavaí, passou dias na selva tentando encontrar ervas que pudessem lhe auxiliar na cura dos enfermos.
Não dormiu por semanas, prestando atendimento numa época em que a colônia não tinha médicos. Evitou a morte de muita gente, desde crianças a idosos. Fez muito mais; impediu assassinatos envolvendo brigas por terras. Como era um mestre marceneiro, até construiu casas para os moradores de Paranavaí. Em 1944, Hugo Doubek e Ulisses Faria Bandeira demarcaram toda a área da colônia a pé. Percorreram centenas de quilômetros até as fronteiras com São Paulo e Mato Grosso.
O ex-vereador Otacílio Egger é outra figura de destaque que todo paranavaiense deveria saber quem foi. O primeiro político eleito pela colônia, Egger fazia questão de participar de todas as sessões da Câmara Municipal de Mandaguari em 1948. À época, não se importava em sair de Paranavaí a pé num dia para estar em Mandaguari no outro para defender os interesses da população. Temos muitos personagens ainda anônimos, mas esses são alguns que faço questão de enaltecer neste dia em que comemoramos mais um aniversário.
Amo Paranavaí porque a conheço, e acho que não há nada mais incompleto que amar no desconhecimento.
Lindolfo Collor e a Revolução de 1930
O gaúcho Lindolfo Boeckel Collor, avô de Fernando Collor de Mello, foi um político de distinta envergadura moral, participante da Revolução de 1930, evento que teve consequências drásticas para Paranavaí, então Vila Montoya, no Noroeste do Paraná.
Em 1930, toda a população de Montoya teve de partir porque a concessão de terras da região concedida à Companhia Braviaco foi revogada. O empresário e jornalista baiano Geraldo Rocha, proprietário do Jornal A Noite, sediado no Rio de Janeiro, e seu amigo e sócio Landulpho Alves, um homem que mais tarde teria importância fundamental na criação da Petrobrás, apoiaram Júlio Prestes.
Então veio a represália, e a região pagou o preço graças ao Governo Provisório de Getúlio Vargas. Lindolfo Collor recebeu das mãos do presidente Vargas um documento que permitia a exploração de toda a nossa região um dia chamada de Fazenda Ivaí.
Boeckel Collor poderia ter lucrado muito explorando Paranavaí, assim como outros políticos fizeram, já que naquele tempo a ex-Vila Montoya somava uma área imensa, chegando a fronteira com Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, e São Paulo. Porém, idealista como era, teve um sério conflito com Getúlio Vargas e abriu mão do cargo no alto escalão do Governo Provisório.
Lutou pela deposição de Vargas, mas, assim como outros, foi enganado pelo próprio amigo e interventor gaúcho Flores da Cunha que se aliou ao Governo Getuliano. Em 1931, traído e vivendo na Riviera Argentina com alguns companheiros, Lindolfo Boeckel narrou toda a conspiração em uma publicação que em 15 de outubro de 1932 ganhou as ruas sob o título de “Manifesto ao Rio Grande do Sul, a São Paulo e à Nação”.
Vila Montoya estava abandonada em 1932
Em 1932, o tenente-coronel Palmiro, da Polícia Militar do Paraná, e o vice-diretor da Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco), o engenheiro agrônomo Landulpho Alves de Almeida, encontraram a Vila Montoya, hoje Paranavaí, no Noroeste do Paraná, destruída, com muitas casas queimadas.
De acordo com informações do livro “Pequena História de Paranavaí”, de autoria do juiz de direito Sinval Reis, Palmiro e Almeida se surpreenderam ao ver a colônia desabitada. Os dois se depararam com centenas de casas destruídas, completamente queimadas. Na fazenda que recebeu o nome de Vila Montoya restaram poucos moradores, dispersos por vários pontos. “Estavam aqui Frutuoso Joaquim de Salles, José Firmino da Silva, João Clariano, Velho Caboclo, Marins, Velho Roque e mais alguns”, afirmou o juiz.
Os remanescentes continuaram na fazenda porque não achavam que valeria a pena migrar novamente, reviver as mesmas dificuldades que tiveram quando chegaram à região. Além disso, ainda havia cafeeiros para serem explorados. Na fazenda, os poucos colonos deram continuidade a produção, levando-a para ser comercializada em Presidente Prudente, no Oeste Paulista, conforme já o fazia a Braviaco antes de ter a concessão de terras da colônia revogada.
Quem também veio à região em 1932 foi o arrendatário Mario Pereira que construiu em Montoya a residência mais luxuosa do Noroeste Paranaense, criada sob o padrão estético europeu. A mansão também foi consumida pelas chamas. Sobre tal fato, ao longo de décadas, os pioneiros de Paranavaí levantaram três possíveis suspeitas. A primeira atribui ao presidente Getúlio Vargas o fim de Montoya.
Especula-se que o Governo Vargas tenha enviado uma tropa do Exército Brasileiro à Vila Montoya para promover a destruição das residências, além da queima de milhares de pés de café. “O presidente Vargas anulou o contrato com a Braviaco e pegou todas as terras de volta porque a colonizadora apoiou um adversário político, o Júlio Prestes. Então mandar soldados para fazer esse tipo de serviço era uma forma de mostrar a companhia quem mandava aqui, caso alguém da Braviaco aparecesse de novo por essas bandas”, disse o pioneiro cearense João Mariano.
A segunda hipótese culpa a Companhia Brasileira de Viação e Comércio pelo que aconteceu. “A própria Braviaco poderia ter feito isso para se vingar do Governo Federal e também evitar que outros usufruíssem de suas benfeitorias. Muito dinheiro foi gasto. Você acha que eles deixariam outro se beneficiar disso? Acho que não!”, justificou o pioneiro gaúcho João Alegrino de Souza. Já a terceira suspeita diz respeito a grupos de criminosos que viajavam pelo Oeste Paulista e Norte do Paraná no princípio dos anos 1930, realizando atos de vandalismo, assaltos e saques. “Esses bandos visavam apenas colônias abandonadas e povoados que não contavam com força policial”, comentou o pioneiro catarinense José Matias Alencar.
Sobre a destruição de Montoya, há apenas inferências, pois os pioneiros que viveram esse período faleceram há muito tempo e nunca se dispuseram a falar abertamente sobre o assunto, nem mesmo o pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles, homem que participou de praticamente todos os acontecimentos mais importantes do princípio de Paranavaí.
O que aconteceu com a população de Montoya?
Como o direito de concessão de terras da Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco) foi revogado em 1931, os mais de seis mil colonos que viviam na Vila Montoya ficaram sem trabalho. Muitos eram analfabetos e jamais desempenharam qualquer atividade que não a de empregado em lavouras. Por isso, sem terem como se sustentar, foram obrigados a partir em busca de serviço em outras colônias e cidades.
Supostamente, em vez de assegurar o emprego dos milhares de trabalhadores de Montoya, assumindo a colonização da região ou repassando a concessão a uma nova colonizadora, o Governo Federal preferiu, por questões ideológicas políticas, ignorar toda a problemática socioeconômica que surgiu naquele momento. A área só voltou a ser colonizada em 1935.
Há quem acredite que foi uma tentativa de mais tarde negar a existência do lugarejo, a partir da anulação histórica, já que restariam poucas testemunhas para futuramente relatarem o que aconteceu. Tal iniciativa pode ter contado com a conivência dos primeiros pioneiros de Paranavaí que ao longo da vida sempre evitaram falar sobre o assunto.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar: