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Le Salaire de La Peur e a poesia da degradação humana
Filme aborda a mercantilização da vida em uma missão suicida
Obra-prima do cineasta francês Henri-Georges Clouzot, Le Salaire de La Peur, que chegou ao Brasil tardiamente sob o título O Salário do Medo, conta a história de quatro imigrantes europeus contratados por uma companhia petrolífera dos EUA para transportar uma carga de nitroglicerina pelas estradas precárias de um país do Terceiro Mundo.
Quando Le Salaire de La Peur foi lançado em 1953, a França vivia o apogeu do existencialismo de autores como Jean-Paul Sartre, Albert Camus e Georges Arnaud, pensadores que influenciaram Henri-Georges Clouzot a criar um filme que mostra homens como indivíduos desorientados em um mundo cada vez mais caótico e aberrante, onde os valores são deglutidos pela esperança de sobrevivência.
Na história, Mario (Yves Montand), Bimba (Peter Van Eyck), Luigi (Folco Lulli) e Jo (Charles Vanel) são personagens desgastados pela miséria que vivem no vilarejo de Las Piedras, onde decidem mercantilizar a vida em uma missão suicida que pode render dois mil dólares a cada um. Os quatro são contratados por uma empresa estadunidense de petróleo para garantir que um carregamento de nitroglicerina chegue ao destino.
Embora a missão seja na Guatemala, o filme de Clouzot deixa claro que a história poderia se passar em qualquer país de Terceiro Mundo, onde a dominação econômica dos EUA é quase sempre proeminente, deixando graves consequências como a degradação social e o esgotamento dos recursos naturais.
Ironicamente, em um dos diálogos da obra, o personagem Mario parece visualizar tanto o presente quanto o futuro quando diz: “Onde tem petróleo, tem americanos.” Além de fazer severas críticas ao capitalismo, mostrando que ninguém sofre mais com as ações dos países ricos do que as nações subdesenvolvidas, o cineasta francês ainda consegue emocionar o espectador com uma estética baseada no realismo poético.
Logo na abertura, somos introduzidos por uma criança a um mundo de insetos mergulhados em uma poça de lama, metáfora que amarra toda a trama de Le Salaire de La Peur. Muitas cenas como a mencionada se repetem no decorrer do filme, transmitindo um sem-número de mensagens que flertam com o niilismo.
São imagens capazes de instigar reflexões e emoções conflitantes. Também é interessante a forma como Henri-Georges Clouzot aborda a perda da identidade dos personagens. Sem sobrenomes, se atêm a pequenos sonhos e devaneios de um dia se encontrarem novamente como parte de um algo concreto.
O brasileiro e o suposto atentado da Maratona de Boston
O brasileiro precisa refletir mais com urgência
Tenho acompanhado de acordo com minhas possibilidades o suposto atentado da Maratona de Boston e com base em tudo que li até hoje, até mesmo por parte de estadunidenses e outros estrangeiros, ouso dizer que o brasileiro mediano consegue ser extremamente medíocre quando se trata da falta de análise crítica e profunda dos fatos. Que falta de bom senso e mínima capacidade reflexiva é essa que faz as pessoas acreditarem em qualquer informação divulgada pelos meios de comunicação mainstream de países de “Primeiro Mundo”?
Nem mesmo quem mora nessas nações costuma simplesmente absorver essas informações como se fosse apenas uma mera esponja, um receptáculo de pseudo-elucubrações. E ainda com conteúdo reproduzido copiosamente e com uma conivência surreal dos veículos de imprensa do Brasil que tratam os EUA como se fossem um país exemplar, o que não é. Claro, muitas vezes, a grana que os sustenta costuma vir de lá, principalmente de conglomerados comandados por magnatas sionistas. Curioso que os acusados do atentado em Boston são muçulmanos tchetchenos, não? Para citar um exemplo, o que será que Rupert Murdoch pensa a respeito do assunto?
Afinal, todo estadunidense sabe que recentemente ele tentou assumir o controle de toda a grande mídia dos EUA, o que só não foi possível por causa das limitações legais do oligopólio midiático. Claro, e não posso deixar de mencionar que esse mesmo líder das comunicações é um dos maiores incentivadores do Estado de Israel, inclusive financiando ações do governo que partem de Tel Aviv e Jerusalém.
Por que quando um meio de comunicação de um país pobre, subdesenvolvido ou que vive um sério conflito civil divulga algo sempre há brasileiros colocando em xeque o conteúdo, mesmo sem entender do que se trata? E ainda em um tom de superioridade que demonstra uma severa incapacidade de autorreflexão, para não dizer uma inclinação mais do que obtusa e falseada do pensamento “americanizado”.
Eu não diria que o brasileiro desinformado costuma ser apolítico, ele consegue ser pior que isso. Não se importa em aceitar tudo que lê sem questionar – e quando o faz prefere ser jactante e frívolo. Assuntos complexos envolvem sim abstração de raciocínio e exigem boa bagagem cultural. Criticidade e bom senso parte do princípio de que tudo que você lê deve ser avaliado cuidadosamente como um cardápio de restaurante. Ou seja, é imprescindível descartar aquilo que não faz bem ao nosso organismo.
Sinto vergonha ao ver tantos brasileiros reverenciando os EUA por terem encontrado os supostos acusados do atentado de Boston no dito tempo recorde. Há “leitores” dizendo que isso deveria servir de exemplo ao Brasil. E pior, vejo brasileiros divagando na superficialidade, admirando as fardas dos estadunidenses responsáveis pelo assassinato do jovem Tamerlan Tsarnaev (quando ainda era um suspeito, não um criminoso). Dizem que é algo que impõe mais postura e respeito. Vestimenta agora é uma alusão ao senso de justiça?
Se eu não for preguiçoso e quiser saber sobre o que realmente está acontecendo nos EUA, prefiro buscar informações e discutir sobre o assunto com pessoas que acompanham a mídia considerada independente, seja nacional ou internacional – formadores de opinião que não sejam de extrema direita nem esquerdistas radicais. E claro, sempre partindo da base de que em menor ou maior proporção os livros continuam sendo a melhor fonte de informação para entender esse tipo de situação.
Ainda considero Noam Chomsky uma importante referência para compreender as problemáticas mais extenuantes da Terra do Tio Sam – seja com relação a conflitos internos e relações internacionais. Outros nomes interessantes que posso citar por ora e do próprio EUA são Benedict Anderson, Bruce Bueno de Mesquita, Norman Finkelstein e Harold Lasswell.
Não sou Anti-EUA, muito pelo contrário, admiro muito a arte produzida por eles, mas simpatizo pouco com o sistema político daquele país e principalmente com os meios de comunicação “mais populares” que estão sempre inclinados sobre si mesmos – como se o mundo se projetasse ao redor da “América”.