David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

Archive for the ‘Bezerro’ tag

Mike Lanigan, o pecuarista canadense que transformou a própria fazenda em um santuário

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“Quando chegar à minha velhice, quero que seja com uma consciência limpa e agradável”

“Pensei em como eu era hipócrita em dar tanto amor e no final agir de forma tão diferente desse amor” (Acervo: Farmhouse Garden Animal Home)

Em 2016, o pecuarista canadense Mike Lanigan, de Uxbridge, Ontário, estava ajudando um bezerro prematuro a mamar pela primeira vez quando se questionou sobre a sua fonte de renda, que se baseava em criar animais para mais tarde enviá-los ao matadouro: “Eu estava fazendo isso com tanto amor, e conversando com ele, limpando a sua face e tentando fazê-lo mamar em sua mãe.”

Lanigan ponderou sobre a contradição de dar a um animal todo esse cuidado simplesmente para depois enviá-lo ao abate. “Nunca gostei dessa parte, mas como fazendeiro você pode simplesmente desligá-la. Então pensei em como eu era hipócrita em dar tanto amor e no final agir de forma tão diferente desse amor”, diz Lanigan em um vídeo publicado por sua funcionária, Edith Barabash, na página do santuário Farmhouse Garden Animal Home.

Da terceira geração de uma família de criadores de gado, Mike Lanigan era uma criança quando se mudou nos anos 1950 para a fazenda onde vive até hoje. Mais tarde, foi para a faculdade e depois retornou. Mas somente a experiência de amamentar um bezerro prematuro fez com que mudasse o rumo de sua vida em 2016.

Com um choque de consciência, Lanigan decidiu que não exploraria nem mataria mais nenhum animal. Na realidade, fez mais do que isso. Transformou a tradicional fazenda de gado em um santuário para bovinos, aves, equinos e animais de outras espécies – um lugar onde podem viver até os seus últimos dias em paz. Porém, Lanigan sabia que seguir por esse caminho não seria fácil, porque uma das partes mais difíceis é conseguir recursos para alimentar todos os animais.

Além disso, passou a ser visto com outros olhos pelos vizinhos e se tornou alvo da piadas. Os fazendeiros da região pararam de acenar e de cumprimentá-lo quando passavam por sua propriedade. Ele não reagiu mal à reação. Apenas entendeu que os fazendeiros se sentiam ameaçados por sua atitude inimaginável. “Há um forte ativismo animal acontecendo. E não percebi todas essas nuances quando decidi fundar um santuário”, enfatiza. Até mesmo seus filhos ficaram com raiva no primeiro mês, porque estavam planejando assumir a fazenda de gado nos próximos anos. Com o tempo, entenderam e respeitaram a sua decisão.

Lanigan passou a ser visto como um sobrevivente em seu meio, porque vários de seus vizinhos, que também eram fazendeiros independentes e investiam no gado de corte e no gado leiteiro, não resistiram às pressões do mercado e acabaram vendendo suas fazendas para corporações e grandes produtores de gado. Apesar das dificuldades, Mike Lanigan está feliz com a sua decisão. Para angariar recursos para sustentar todos os moradores da fazenda, ele decidiu investir na produção de vegetais orgânicos e de xarope de bordo.

Em 2017 a fazenda foi transformada na Farmhouse Garden Animal Home, um abrigo para animais sem fins lucrativos que é mantido com os recursos da produção de vegetais orgânicos e por meio de doações. “Quando chegar à minha velhice, quero que seja com uma consciência limpa e agradável”, revela Mike Lanigan.

Referências

Farmhouse Garden – Animal Home. Our Story (2017).

Vegan Food and Living. Canadian cattle rancher turns his farm into sanctuary (16 de setembro de 2016).

CBC Radio. Meet the cattle rancher who stopped killing his cows ‒ to the annoyance of his neighbours (26 de novembro de 2017).

 





Será que vale a pena consumir leite e derivados?

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Vaca e bezerro antes de serem separados definitivamente (Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals)

Imagine carregar um bebê no ventre por nove meses, sentindo que existe outra vida dentro de você, e assim que ele nascer, ser retirado do seu convívio. Esse tipo de privação é a realidade comum da indústria de laticínios. Reflita sobre o nível de estresse da vaca e do bezerro nessa situação. No sistema industrial não é incomum os bezerros mamarem somente uma vez (ou nem isso) se não forem considerados “interessantes” como matéria-prima.

Caso haja o interesse de comercializar carne de vitela, eles normalmente passam dois dias com a mãe para serem amamentados com o colostro, o que previne doenças e evita que a carne do bezerro seja desqualificada comercialmente. Depois são separados definitivamente e confinados em gaiolas, baias ou qualquer outro espaço reduzido – onde são alimentados com um leite artificial pobre em ferro e outros nutrientes que ajudam a tornar a carne “mais clara, tenra e macia”.

A carne classificada como ideal é obtida após a morte de um bezerro com idade entre três e seis meses. Para produtores que não têm interesse nesse tipo de mercado, o que é muito comum no setor nacional de laticínios, a morte do bezerro pode ser decretada logo após o nascimento; já que ele é considerado descartável – ou simplesmente um efeito colateral de um processo. De fato, suas necessidades como ser senciente não são ponderadas, e a sua curta existência é apenas uma forma de assegurar a manutenção da produção leiteira.

Afinal, uma vaca precisa gerar vidas para entrar no período de lactação – seja de curta, média ou longa duração. Sendo assim, isso nos leva a uma óbvia conclusão. Se uma vaca produz leite, mesmo que geneticamente modificada e condicionada a produzir volumes incomuns, ela não o faz para alimentar seres humanos, mas sim por um dom natural que é alimentar seus filhos, assim como faziam seus ancestrais antes da intervenção humana.





Como a realidade do “gado leiteiro” pode ser pior do que a realidade do “gado de corte”?

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Há ainda a inevitável morte do bezerro – que pode ou não ser reduzido a pedaços de carne (Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals)

Na produção de carne, você engorda um animal e o mata precocemente. De fato, sua expectativa de vida não é considerada porque isso significa custos e desvalorização de matéria-prima. Sim, isso é muito ruim. Por outro lado, na produção de leite, há o custo da exploração da vaca até a exaustão, ou seja, até o momento em que ela deixa de atingir níveis aceitáveis de volume leiteiro.

Assim, claro, em decorrência disso, e sob a perspectiva de mercado, ela passa a ser considerada inútil e descartável. Consequentemente, seu destino comum é o matadouro e mais tarde o setor de frios dos mercados – onde não raramente pode ser encontrada em forma de pedaços de hambúrguer. E para além disso, há ainda a inevitável morte do bezerro – que pode ou não ser reduzido a pedaços de carne, dependendo do contexto e do país.

 





Não está tudo bem em consumir leite

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Há muitas pessoas que nem imaginam que pode haver até mais sangue na produção de um copo de leite do que de um pedaço de carne (Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals)

Quem acha que está tudo bem em consumir leite porque ele é apenas extraído dos úberes da vaca realmente não tem a mínima ideia de como funciona esse sistema. Como diz o Gary Francione, há muitas pessoas que nem imaginam que pode haver até mais sangue na produção de um copo de leite do que de um pedaço de carne.





Como os humanos, a vaca e o bezerro compartilham um vínculo especial

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As vacas são profundamente afetadas pela dor emocional de serem separadas dos bezerros (Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals)

Como os seres humanos, uma vaca e seu bezerro compartilham um vínculo forte e especial – um que se forma poucos minutos após o nascimento. Quando as vacas e seus bezerros podem levar uma vida natural, o bezerro chega a mamar por até um ano. Porém, isso é o que menos acontece. Uma pesquisa da Animal Australia mostrou que as vacas são profundamente afetadas pela dor emocional de serem separadas dos bezerros, uma prática padrão da indústria de laticínios. Será que vale a pena consumir leite e derivados?





Mãe e Filho (Ou a Vaca e o Vitelo) – Uma reflexão sobre a realidade da vaca e do bezerro

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“Lembro como se fosse hoje quando levaram meu filho”

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Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals

— Lembro como se fosse hoje quando levaram meu filho.
— E como a senhora se sentiu?
— Péssima, nunca senti tanta dor.
— Deixaram a senhora se despedir?
— Assim que ele nasceu, nem tive tempo de tocá-lo. Alguém veio e o levou todo lambuzado, fragilizado e confuso para longe de mim.
— A senhora reagiu?
— Claro que sim! Mas eu estava tão fraca…
— Você lembra da aparência do seu bebê?
— Não muito bem. Foi tudo muito rápido. Corri por alguns metros e caí no chão, sentindo gosto de terra na boca. Sinto vergonha por não ter feito mais.
— E como está se sentindo agora?
— É terrível! Nem sei o que estou fazendo aqui.
— Isso já tem quanto tempo?
— Duas semanas.
— Tentou buscar ajuda?
— Quem poderia me ajudar?
— Foi o primeiro?
— Não, o terceiro.
— Está com alguma dor?
— Sim, na minha situação qualquer uma sentiria. Não tenho vontade de viver. Isso não é vida. Existir para servir aos outros, sem ter qualquer tipo de liberdade de escolha. Nascemos condenadas, vituperadas pela ignorância humana.
— Por que diz isso?
— Porque existo apenas para que me suguem o leite; o leite que existe para os filhos que já não tenho, que são mortos e descartados em um lugar que nunca saberei qual é ou onde é. Imagine a dor de jamais reencontrar um filho? Não saber se ele já morreu? Não poder confortá-lo diante da morte? Um bebê, uma pequena criança. Por que meus filhos não valem nada? Só por que são de outra espécie? O que tem de errado em não ser humano?
— Acredito que nada de errado.
— Não parece. Isso não é vida. Viver para ser ordenhada, para que tirem de você um alimento sagrado que depende da gestação de uma criança. Se eu tivesse nascido para alimentar seres humanos, eu teria parido alguns, não concorda? O que me resta? Uma vida dedicada a saciar o desnecessário? A gula humana? Isso, se empanturrem de leite e derivados lácteos. Suguem de mim o máximo possível, até que eu adoeça ou seja considerada inútil quando a produção de leite cair. Logo serei eleita a vaca do ano, premiada com uma viagem só de ida para o matadouro. Não se preocupem, mais tarde vocês poderão me encontrar. Sim, fatiada em forma de hambúrgueres distribuídos nas seções de frios de diversos mercados.





 

Jill Phipps, a ativista que morreu durante um protesto contra a exportação de bezerros

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Jill foi atropelada por um caminhão quando tentava atrasar o embarque dos bezerros

Jill: “Se ele não estivesse exportando animais vivos, este avião não estaria em Coventry. As únicas pessoas pelas quais sinto muito são as famílias cujos parentes morreram” (Arte: Evolve)

Na próxima segunda-feira, a ativista pelos direitos animais britânica Jill Phipps completaria 54 anos. Jill faleceu aos 31 anos quando foi atropelada por um caminhão em um protesto contra a exportação de bezerros vivos em 1º de fevereiro de 1995. Os animais enviados para os Países Baixos seriam reduzidos à carne de vitela e comercializados em toda a Europa.

Na matéria “For what cause did Jill Phipps die?”, publicada no jornal britânico The Independent em 3 de fevereiro de 1995, Bob Phipps, pai da ativista contou que na infância Jill já demonstrava um grande amor pelos animais, adquirindo o hábito de resgatar cães abandonados ou levar para casa hamsters ou testudinatas.

Aos 11 anos, Jill foi encorajada pela mãe ativista pelos direitos animais a participar de campanhas contra o comércio de peles de animais. “Ela participou de uma manifestação comigo e continuou a partir daí”, relatou Nancy. Pouco tempo depois, Jill se tornou vegetariana e conseguiu convencer toda a família a adotar a mesma filosofia de vida. Também ingressou no grupo de ação direta Eastern Animal Liberation League, filiado à Animal Liberation Front (ALF).

Por meio de manifestações, Jill e sua mãe geraram comoção o suficiente para fecharem uma fazenda e uma loja onde extraíam e comercializavam peles de animais. Em 1986, elas invadiram a fábrica de sabão Port Sunlight, subsidiária da Unilever, em Merseyside, no Noroeste da Inglaterra, para protestar contra a realização de testes em animais.

Naquele dia, as ativistas quebraram inúmeros equipamentos de informática da fábrica. Presas em flagrante, sua mãe foi sentenciada a seis meses de prisão e sua irmã a 18 meses. Jill teve sua pena suspensa porque estava grávida. Após o nascimento de Luke, Jill se dedicou bastante ao filho. Divorciada, participava de manifestações ocasionais e encontros visando sabotar caçadas, principalmente durante as férias escolares de Luke.

Em dezembro de 1994, quando um dos aviões usados no transporte de bezerros caiu matando cinco pessoas, ela comentou: “Todo esse desastre é consequência da ganância de [Christopher] Barrett-Jolly. Se ele não estivesse exportando animais vivos, esse avião não estaria em Coventry. As únicas pessoas pelas quais sinto muito são as famílias cujos parentes morreram.”

A crescente exportação de carne de vitela motivou Jill a intensificar o seu ativismo. Ela começou a fazer vigílias diárias no Aeroporto de Baginton, em Warwickshire, no início de novembro de 1994. Seu filho de nove anos, sua mãe e sua irmã frequentemente a acompanhavam. Em janeiro de 1995, ela percorreu quase 160 quilômetros de Coventry até o Westminster, em Londres, para protestar no dia 15 de janeiro, data de seu aniversário, em frente à casa de Barret-Jolly, empresário responsável pela exportação de bezerros vivos.

Idealista, Jill Phipps sonhava com a libertação animal, e tornou-se bastante popular nos protestos contra a exploração animal na Inglaterra, um sonho interrompido em 1º de fevereiro de 1995. Naquela quarta-feira, Jill Phipps fazia parte de um grupo de 35 ativistas no Coventry Airport, em Baginton, protestando contra a exportação de bezerros vivos com destino a Amsterdã.

A intenção de Jill e dos outros ativistas era fazer com que os caminhões que transportavam os bezerros desacelerassem, na tentativa de impedir que os animais embarcassem para Amsterdã. Pam Brown, uma de suas amigas mais próximas, relatou em fevereiro de 1995 à Animal Liberation Front que elas falaram inclusive de irem logo depois para casa tomarem um pouco de chá e então retornarem ao aeroporto. No decorrer da ação, Pam foi apanhada por um policial e levada para longe do caminhão. Meia hora depois recebeu a notícia de que Jill estava morta.

Durante o protesto, dez manifestantes atravessaram a barreira policial e tentaram impedir o comboio de chegar ao seu destino – colocando-se na frente dos caminhões. Nesse ínterim, Jill que corria ao lado de um caminhão, foi atropelada e esmagada pelas rodas do veículo. Seus ferimentos fatais incluíram uma espinha quebrada. Ela faleceu a caminho do hospital.

Zab Phipps, irmão de Jill, declarou em 1995 que o motorista Stephen Yates não foi responsabilizado, nem mesmo pela condução sem o devido cuidado e atenção. O Ministério Público alegou que não havia provas consistentes contra o motorista. A família culpou a negligência policial pela morte de Jill, justificando que a polícia manteve o comboio em movimento o tempo todo.

Uma testemunha disse à ALF que a polícia estava mais preocupada em proteger os negócios da empresa de exportação de animais vivos do que a segurança das pessoas. Segundo o The Independent, o inquérito diz que o motorista pode ter se distraído com outro manifestante que estava sendo forçado a se afastar do caminhão.

Um policial chegou a dizer que Jill se jogou debaixo do caminhão. A explicação foi refutada por toda a família e pelos ativistas, argumentando que Jill tinha um propósito na vida, reforçado principalmente após o nascimento do filho Luke. O que surpreende até hoje na história da morte de Jill Phipps é que havia quase 100 policiais trabalhando no local, e nenhum deles pensou na possibilidade de que uma tragédia poderia acontecer naquele dia.

As exportações de bezerros vivos pelo Coventry Airport só foram encerradas meses depois, quando Christopher Barrett-Jolly faliu após acusações de que ele estava transportando armas da Eslováquia para o Sudão, violando regras da União Europeia (UE). Em 2006, ele também foi acusado de contrabandear 271 quilos de cocaína da Jamaica.

Saiba Mais

Embora fosse boa aluna, Jill Phipps deixou a escola aos 16 anos para trabalhar no Royal Mail, os Correios da Inglaterra, seguindo os passos de seu pai Bob Phipps.

Em 2005, John Curtin lançou o documentário “Jill’s Film”, que conta a história de Jill Phipps. Com aproximadamente 40 minutos de duração, o filme inclui filmagens amadoras de Jill, a sua campanha no Coventry Airport, o seu funeral e entrevistas com familiares e amigos, além de informações sobre a cruel realidade da exploração animal.

Referências

For what cause did Jill Phipps die? – The Independent – 3 de fevereiro de 1995.

Jill Phipps – Animal Liberation Front





 

Práticas violentas contra os animais só existem porque sempre há plateia e consumidores

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Em uma sociedade civilizada, não deveria haver espaço para tais práticas

Não é tão raro encontrar pessoas falando mal de toureiros. Sem dúvida, concordo que não há nada de bom a se falar a respeito, até porque ninguém deveria se “profissionalizar” em fazer mal a um animal e chamar isso de arte.

Porém, a tauromaquia, assim como qualquer atividade considerada tradicional, e que cause mal a outros seres vivos sencientes, só existe porque há plateia e consumidores. Enfim, pessoas que não racionalizam a própria maldade, ou que não são capazes de externalizá-la, pagam para que os outros façam o que elas não conseguem. Assim, tornando-se voyeurs de anseios desasseados e perigosos.

Qualquer atividade que impinge dor a um animal, seja chamada de “espetáculo” ou “esporte”, não passa de truculência, de uma expressão equivocada da ignorância e da insensibilidade humana. Se alguém convida uma pessoa para participar de algo e essa pessoa recusa, como você chamaria o ato de obrigá-la a fazer parte de algo que não é de sua vontade?

Não tenho dúvida de que alguém testemunhando tal ato, se motivado por um princípio probo de justiça, há de intervir ou se manifestar de alguma forma, porque isso também é inerente à natureza humana. E por que quando se trata dos animais não humanos continuamos a legitimar e encarar a violência até mesmo com sorrisos? Porque pessoas gargalham ao ver um animal sendo ferido?

Você rir de um touro ferido na arena, de um boi caído durante a vaquejada, de um bezerro laçado e arremessado ao chão, de um animal golpeado na farra do boi, não é diferente de rir de um gato ou um cão espancado na rua e diante dos seus olhos. Violência é violência, não importando se concordamos ou não com isso. Afinal, a vítima traz consigo a expressão da própria realidade, da consequência de nossos atos, independente se você está imerso em ilusão, negação ou dissimulação.

Não deveríamos repensar nossas relações com os animais? Não seria isso no mínimo bizarro e incoerente de nossa parte? Afinal, animais não humanos também sentem dor, agonizam, sofrem à sua maneira. Somos tão ardilosos em alguns aspectos da vida em sociedade que usamos eufemismos capciosos tentando mimetizar o impacto de nossas ações, tentando maquiá-las com algo inexistente e deletério.

Estamos tão imersos em nossos mundos particulares, em satisfazer nossos anseios obsoletos e desnecessários, travestidos de necessidades, que muitas vezes neutralizamos qualquer possibilidade natural de ver algo como ilegítimo, cruel e impraticável.

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Sobre queijos preparados com um complexo de enzimas extraídas do estômago de bezerros mortos

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Com o surgimento de técnicas mais modernas, o estômago do bezerro passou a ser congelado, moído e colocado em uma solução de extração de enzimas

Você já pensou na possibilidade de estar consumindo ou já ter consumido algum queijo preparado com um complexo de enzimas extraídas do estômago de um bezerro morto? Pois é, isso pode parecer absurdo, mas não é e vou explicar o motivo baseando-me em três livros de referência sobre a produção de queijo.

Rennet ou coalho de origem animal é um complexo de enzimas produzidas no estômago de mamíferos ruminantes. É ele que facilita o processo de digestão dos bezerros durante a fase de amamentação. Há queijos industrializados que possuem essa enzima extraída da mucosa interna da quarta câmara de estômago (abomaso) dos bezerros após o desmame.

Se ele for extraído de bezerros mais velhos, que normalmente são alimentados apenas com pasto e grãos, naturalmente o Rennet terá pouca ou nada de quimosina. O que significa níveis elevados de pepsina, assim sendo destinado somente ao preparo de queijos e leites especiais. De acordo com o livro “Traditional Cheesemaking Manual”, de Charles O’Connor, como cada ruminante produz um tipo especial de coalho para digerir o leite de sua própria espécie, isso significa que o rennet de cabra é introduzido no leite de cabra e o rennet de cordeiro no leite de ovelha.

E de que forma o coalho de origem animal é extraído? Bom, no método mais clássico, defendidos principalmente por produtores mais tradicionais de queijo, os estômagos limpos dos bezerros são cortados em pedaços pequenos e imersos em água salgada ou soro de leite, juntamente com uma porção de vinagre ou vinho para reduzir o pH da solução. Após a filtragem, o rennet é usado para coagular o leite. Cerca de um grama de coagulante extraído de um pedaço do estômago de um bezerro serve no método tradicional para coagular dois a quatro litros de leite.

Com o surgimento de técnicas mais modernas, o estômago do bezerro passou a ser congelado, moído e colocado em uma solução de extração de enzimas. É importante entender que as enzimas no estômago do bezerro são produzidas de forma inativa. Por isso, só são ativadas através da acidez estomacal. Quando o ácido é neutralizado, o extrato de coalho é filtrado em vários estágios até atingir uma potência específica. Neste caso, um grama de extrato de rennet pode coagular até 15 quilos de leite.

Hoje em dia, é difícil dizer qual queijo possui ou não coalho de origem animal porque a indústria de laticínios demanda muito mais coagulantes do que a indústria de vitela poderia fornecer. Sendo assim, criou-se alternativas a partir de fungos, micróbios e plantas – como folhas secas de alcaparra, cardo e cynara, usados principalmente em países mediterrâneos, segundo informações do livro “Technology of Cheesemaking”, de Barry Law.

Porém, como o uso de vegetais e micróbios com finalidades coagulantes não é uma unanimidade no mercado de laticínios, há fabricantes que ainda fazem uso de coagulantes de origem animal. Sendo assim, o uso de enzimas extraídas do estômago de bezerros não é uma prática obsoleta, segundo informações do livro “Cheese: Chemistry, Physics, and Microbiology, Volume 1”, de Patrick F. Fox, Paul L.H. McSweeney, Timothy M. Cogan e Timothy P. Guinee, lançado em 2004. De qualquer modo, saiba que rennet ou coalho de origem animal está disponível à venda em qualquer site que comercialize produtos para a fabricação de queijo, inclusive no Ebay e Mercado Livre.

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