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Por que não dar brinquedos “mais comuns” para as crianças?
Minha sobrinha fez três anos esses dias e desde que ela nasceu nunca dei nenhum brinquedo que tentasse moldar de forma limitante a personalidade dela. Sempre preferi dar algo educativo ou que a estimulasse a reconhecer a própria liberdade desde cedo. Ao longo desse período algumas pessoas vieram me perguntar porque eu não dava brinquedos “mais comuns”. A minha resposta foi a seguinte:
“Analisando hoje, como você se sentiria se ainda criança alguém te desse presentes que te condicionasse no futuro a fazer algo ou ser algo? Quando você dá um brinquedo, por exemplo, não é apenas um brinquedo. Para uma criança isso vem embutido de um sentido que nós que damos ao objeto e consequentemente ela vai absorver isso através da nossa influência. Pra mim é como se você afunilasse o mundo dela. O ser humano tem a possibilidade de uma consciência livre quando nasce, mas essa qualidade muitas vezes se perde com o tempo, quando mostramos através de pequenos atos ou condicionamentos que na realidade a liberdade dela vai só até onde queremos que ela vá, assim a impedindo de ser algo mais do que ela poderia ser.”
Esculpindo vidas
Jesus Soares descobriu a identidade artística na figura dos marginalizados
Em 1986, quem via o garotinho Jesus Soares esculpindo faces desconhecidas em barrancos, nem imaginava que ele se tornaria um dos grandes nomes das artes plásticas em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, com trabalhos expostos em diversos países da América Latina e Europa.
A relação de Jesus Soares com a arte começou por acaso, aos 11 anos, quando ele e os irmãos Paulo, Gílson e Adauto Soares se divertiam criando os próprios brinquedos e dando novas formas a alguns espaços. O que para a maioria era apenas um cenário ordinário e natural, na perspectiva de Jesus e seus irmãos era um universo de possibilidades de transformação.
“Uma vez vimos a capa de um livro e aquilo nos influenciou a criar algumas faces em barrancos”, conta o artista plástico Jesus Soares. O feito dos quatro irmãos pode ser interpretado como uma peculiar, mas ocasional concepção artística do Monte Rushmore, monumento rochoso situado nos EUA.
À época, ainda crianças, Jesus e os irmãos, que cultivavam uma profunda relação de amizade entre eles, produziam arte sem perceber, perdidos em uma realidade lúdica. “A gente fazia apenas porque gostava, era uma forma de divertimento”, afirma e acrescenta que encarou o próprio trabalho como arte somente a partir de 1998.
Naquele ano a artista Tânia Volpato foi até a residência do artista e se deparou com um presépio. “Quando disse a ela que fui eu quem fiz, a Tânia ficou surpresa, e eu mais ainda porque já tinha feito um monte de peças, mas nunca pensei que fossem arte”, admite Soares, que se destaca pelo talento em criar esculturas com as mais diversas matérias-primas, como arame, madeira, resina, gesso, sisal e fibra de média densidade (MDF).
Embora já tenha manipulado muitos materiais, Jesus é mais conhecido pelas esculturas em arame, sua marca registrada. “Nessa linha de trabalho, já atendi a Fundação Cultural, Rotary, Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí [Fafipa], Universidade Paranaense [Unipar], Secretaria Municipal de Esportes e Lazer e Associação Comercial e Empresarial de Paranavaí [Aciap], além de outros”, acrescenta.
Quem conhece o trabalho de Jesus Soares, logo identifica características do realismo surgido no século XIX. É algo que se deve não ao fato do artista seguir tal tendência, mas sim ter descoberto a identidade artística na figura dos marginalizados. Soares tem o dom de eternizar pessoas com quem se depara no cotidiano, aquelas que parecem inexistir socialmente.
“Pra mim a escolha de um personagem a ser transformado em escultura depende muito do contexto. Além disso, quando me pedem algum trabalho sob encomenda, já me foco no tema, daí faço um esboço levando em conta questões sociais, históricas e econômicas”, revela o artista que encontra na arte de esculpir um exercício de introspecção e reflexão sobre a vida e o mundo.
É impossível mensurar quantas obras Jesus Soares já produziu, mas muitas estão espalhadas pelo Brasil, além das enviadas para exposições na Áustria, Alemanha, República Dominicana e outros países. “Há poucos dias, recebi o convite para enviar peças ao Chile”, enfatiza o artista.
Material embutido de significados
A escolha do material para se trabalhar a confecção de cada peça carrega alguns significados. Um exemplo são três obras criadas pelo artista sob influência de Guernica, pintura de Pablo Picasso. “Foi uma encomenda que me fizeram em Amaporã. Selecionei três personagens do quadro e criei as peças”, conta.
Em uma das obras recheadas de crítica social, é possível ver uma criança no colo da mãe. O bebê em óbito foi idealizado a partir de uma minúscula colher. Levando em conta o contexto da guerra, principalmente os bombardeios alemães a pequena cidade espanhola de Guernica em 1937, Soares usou o talher para destacar uma metáfora; a infância perdida como sobremesa germânica.
O artista plástico, que também trabalha com cenografia em parceria com os irmãos Paulo e Adauto Soares, está sempre atendendo pedidos de novas encomendas. “Pra ter uma ideia, recentemente fiz cenários para a peça ‘As Aves’, do Grupo de Teatro da Unipar, também criei três obras em MDF e ainda preciso entregar mais de 300”, assinala o artista que cobra de R$ 35 a R$ 150 por peças de 35 a 50 centímetros.
Serviço
Para entrar em contato com o artista plástico Jesus Soares, basta ligar para (44) 8806-9585.