David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

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A caça

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Um homem encontrou um caçador acompanhado do filho na mata. Eles arrastavam com dificuldade o cadáver de uma onça-pintada.

— Querem ajuda?
— Sim, por gentileza.

Depois de percorrerem mais de um quilômetro, pararam ao lado de uma caminhonete. O caçador pediu que o homem fotografasse ele e o filho com a onça inanimada.

— Não posso fazer isso.
— Por quê?
— Pelo mesmo motivo que esse animal jamais exibiria o seu filho aos dele como se fosse um troféu.
— Você é louco? Isso é uma onça, não uma pessoa.
— O senhor tem razão. É justamente por não ser uma pessoa que ela não faria isso. Não goza dessa estranha capacidade. A propósito, por que mataram esse animal e o que farão com ele?
— Matamos porque é matreira. Já nos avisaram que ela tem invadido chácaras, sítios e fazendas da região.
— Quem disse ao senhor?
— Um sujeito que mora naquele sítio a leste.
— Isso é intrigante.
— Por quê?
— Porque é lá que eu moro. O que pretende fazer com a onça?
— Curtir o couro, fazer um tapete, um churrasco. Dizem que carne de onça tem gosto de lombo de porco. Vamos experimentar.
— O senhor tem comida em casa?
— Sim…
— Fartura?
— Sim…
— Então por que comer a carne desse animal? O senhor já viu outro ser vivo arrancar o couro de alguém para servir apenas para limpar-lhe os pés?
— Então farei um casaco.
— Imagino que o senhor tenha blusas e jaquetas em casa…
— Farei um cobertor.
— O senhor tem passado frio atualmente?
— Não…
— Imagino.
— Amigo, farei o que eu quiser. Não me interessa sua opinião. Só aceitei ajuda para carregá-la.
— Tudo bem. Mas o que o senhor ensina ao seu filho fazendo isso?
— Ensino que é importante estar preparado pra tudo.
— Humm…
— E o senhor pensa em viver em uma área de mata fechada?
— Não…
— Então em qual circunstância seu filho teria que matar um animal desses?
— Não interessa.
— O que você aprendeu com seu pai hoje?

O menino ficou em silêncio.

— Chega dessa conversa. Vá cuidar de sua vida.
— Tudo bem, senhor.

Entre as ramagens, um filhote de onça-pintada ameaçava se aproximar.

— O senhor tem uma dívida. Se um dia aquele filhote lhe cobrar, o senhor não poderá reclamar. 

O caçador riu, mas deixou a onça e partiu.





Written by David Arioch

October 19th, 2017 at 12:05 am

“Me senti como se eu tivesse cometido um assassinato”

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Walking the Line – Pheasant Hunting, de Michael Sieve

O britânico William Harris, um dos caçadores mais famosos de seu tempo, conta que durante os anos de 1836 e 1837 viajou para longe no coração da África com a mera intenção de perseguir animais, algo que ele definia como uma de suas paixões. Em uma passagem de sua biografia, publicada em Bombaim em 1838, ele descreve como atirou em seu primeiro elefante, uma fêmea.

Na manhã seguinte, indo procurar seu novo alvo, ele descobriu que todos os elefantes tinham fugido da localidade, exceto um jovem elefante que passou a noite toda ao lado de sua mãe morta. Vendo os caçadores, o animal não sentiu medo e, com os mais claros e vivos sinais de tristeza desconsolada, caminhou até eles. Então moveu seu minúsculo tronco como se suplicasse por ajuda. Sobre o episódio, registrou Harris em sua biografia: “Eu estava cheio do mais verdadeiro remorso pelo que tinha feito e me senti como se eu tivesse cometido um assassinato.”

 

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Written by David Arioch

January 25th, 2017 at 11:42 pm