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O vegetarianismo na vida e na obra de Scott Adams, criador de Dilbert
“Você quer dizer, por que não pego animais mortos, e os cozinho até tornarem-se carcinógenos?”
O cartunista Scott Adams, criador de Dilbert, famoso personagem do mundo das tirinhas, tornou-se vegetariano na faixa dos 30 anos. O que o motivou a tomar tal decisão foi um prato ruim que ele consumiu com carne de frango.
“Decidi tentar ser vegetariano para ver como é e me senti muito melhor. Menos dores de estômago e mente mais clara; e sei que vou viver mais dessa forma”, afirmou em entrevista ao Famous Veggie. Embora tenha sido motivado por uma questão pessoal envolvendo saúde e hábitos alimentares, Adams deixou claro que hoje em dia a sua decisão de não comer animais está muito além disso.
“Em um mundo perfeito todos os animais seriam tratados com bondade. Mas em um mundo com seis bilhões de pessoas indelicadas, os resultados serão inferiores ao ideal. Não é uma luta que acho que possa ser vencida”, lamentou.
Adams sugeriu que pessoas que consideram a carne essencial e benéfica pesquisem um pouco mais sobre o assunto, porque provavelmente terão surpresas. Segundo o cartunista, a pergunta mais tola que ele já ouviu ao longo de décadas de vegetarianismo foi “’Como você consegue sua proteína?’” Então eu pergunto quantas pessoas eles conhecem que estão hospitalizadas por deficiência de proteína”, declarou.
Em inúmeras tirinhas publicadas desde os anos 1990, Scott Adams abordou o vegetarianismo e o veganismo. Em uma delas, Dilbert diz a Dogbert que não entende porque ele ou qualquer um se tornaria vegetariano. “Você quer dizer, por que não pego animais mortos, e os cozinho até tornarem-se carcinógenos, então os como em vez de alguma coisa nutritiva? É a sua pergunta?”, satiriza.
“Exatamente. Tem alguma razão? Você se juntou a um culto?”, continua Dilbert. Dogbert apenas responde: “Aparentemente.” O humor de Scott Adams em Dilbert sempre foi pautado no absurdo das coisas, principalmente sobre a realidade empresarial, já que ele, como economista, também é um crítico desse meio. E o vegetarianismo, na figura do cachorro Dogbert, acabou entrando também enquanto tema como uma forma de abordar a hipocrisia e o comodismo que envolve a indústria da exploração animal e o consumo, principal motivador desse sistema de produção.
Os três alimentos preferidos do autor de Dilbert são arroz, brócolis e macarrão. Mesmo com uma alimentação relativamente simples, o milionário destacou que há lugares para onde ele viaja nos Estados Unidos que é difícil encontrar pratos que agradem o paladar de um vegetariano acostumado à simplicidade. “É difícil viajar para alguns lugares dos Estados Unidos, por exemplo, fora da Califórnia. Em Iowa, eles colocam carne até na salada”, reclamou.
E foi pensando na questão da diversidade alimentar e da oferta de opções para vegetarianos e veganos que Scott Adams e seu sócio Jack Parker lançaram o Dilberito em 1999 pelo selo Scott Adams Foods. Embora o produto tenha saído de circulação em 2003, agradou muita gente. O alimento vegetariano que tinha forma de burrito trazia 100% dos valores diários de vitaminas e minerais. E era oferecido nos sabores comida mexicana e indiana, alho e ervas, e churrasco.
Saiba Mais
Scott Adams nasceu em Windham, Nova York, em 8 de junho de 1957.
Ele publicou as primeiras tirinhas de Dilbert em 16 de abril de 1989.
Referências
http://www.famousveggie.com/interviews/scott_adams.aspx
Adams, Scott. Dilbert: A Treasury of Sunday Strips (2000).
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Pawel Kuczynski, um cartunista que desperta reflexões sobre a exploração animal
“Nossa realidade é triste e, como consequência, meu senso de humor é mórbido”
O artista gráfico e cartunista Pawel Kuczynski vive em Police, uma cidade com pouco mais de 40 mil habitantes, situada na região da Pomerânia Ocidental, no Noroeste da Polônia. Lá, ele produz desenhos que despertam a atenção para temas como exploração animal, ecologia, política, pobreza, fome, ganância, novas tecnologias e vício em internet. Kuczynski une metáforas visuais, a estética do surrealismo, a sátira e o humor mórbido para fazer com o que o espectador reflita sobre questões bem atuais.
Muito popular em mídias sociais como Reddit, Pinterest, Instagram e Facebook, neste último ele tem mais de 528 mil seguidores, o artista polonês já produziu inúmeros desenhos em que propõe discussões sobre a forma como nos relacionamos com os animais. São trabalhos que permitem inúmeras releituras e colocam em evidência a hipocrisia humana no que diz respeito ao fato de considerar alguns animais como companheiros e outros simplesmente como comida. Exemplo disso é “Dinner”, uma de suas obras mais populares, em que um açougueiro acaricia a cabeça de um gato enquanto é assistido por animais não domésticos na entrada de um estábulo.
Alguns cartuns de Kuczynski, que trabalha com técnicas de lápis aquarelável, mostram como as pessoas fingem não ver que estão consumindo um ser que um dia teve vida, e talvez por tal motivo em alguns de seus trabalhos os animais estão vivos. Um exemplo é “Pig”, em que um porco aparece sorrindo inocentemente com uma toalha sobre o dorso, sem reconhecer que ele é a mesa e o prato principal de um banquete. Em “Coffin”, ele apresenta o funeral de um porquinho que tem como caixão um lanche, uma referência às tiras de bacon.
Em “Eggs”, há uma máquina que esmaga galinhas para a produção de ovos. Provavelmente, a intenção de Kuczynski é mostrar que ovos não são apenas ovos. Eles custam a vida das galinhas que são descartadas quando produzem pouco ou quando representam despesas. Outra de suas obras destaca um homem com aspecto morbígero, uma boca enorme e dentes pontiagudos, prestes a engolir a cabeça de um suíno, numa analogia à glutonaria humana.
Pawel Kuczynski também critica quem cria peixes em casa. Além desses animais viverem até sua morte em pequenos espaços para o deleite humano, as pessoas normalmente ignoram o quão paradoxal é criar um peixe ao mesmo tempo em que se come outro. Tal contradição é evocada no cartum em que aparece um peixe enlatado dentro de um pequeno aquário.
Em outro desenho, um boi tem um grande pasto como guardanapo amarrado ao pescoço, referência ao desmatamento e a superprodução de grãos para alimentar esses animais, o que vai muito além do que é investido na produção alimentícia voltada aos seres humanos.
Por esses e outros trabalhos, o polonês graduado na Academia de Belas Artes de Poznań, e com especialização em artes gráficas, já foi premiado nos Estados Unidos, Brasil, Bélgica, Itália, Espanha, Portugal, Rússia, Japão, China, Coréia do Sul, Colômbia, República Tcheca, Irã, Itália, Eslováquia, Turquia, Síria e Taiwan. Em 2005, ele recebeu o Eryk, prêmio da Associação Polonesa de Artistas, por ter conquistado um número recorde de premiações em competições internacionais. Só em 2010, Kuczynski ganhou 19 prêmios e distinções.
“Não sou o tipo de cartunista que trabalha com humor. Não é o tipo de sátira que as pessoas podem associar com piadas. São assuntos muito sérios. A realidade é tão louca e absurda que é difícil competir com isso. A realidade me inspira. Apenas tento ser honesto sobre as minhas observações em meus desenhos. Coloco uma informação em minha cabeça e espero pelos resultados. Se eu já tiver algo em minha mente, e for uma boa ideia, preciso de dois dias para fazer o desenho”, disse em entrevista à Fluster Magazine, da Itália, publicada em 10 de março de 2012.
Um observador do comportamento humano, Pawel Kuczynski considera surpreendente o fato de que vivemos há tanto tempo neste mundo e ainda assim seguimos cometendo os mesmos erros. ele cita como algumas das maiores incoerências humanas as guerras, a pobreza, a fome, a exploração animal e a destruição do meio ambiente. “Nossa realidade é triste e, como consequência, meu senso de humor é mórbido. Acho que talvez eu seja muito lírico e sentimental”, declarou.
O artista polonês sempre gostou de arte barroca, das obras de Caravaggio [Michelangelo Merisi]. Sua admiração o motivou desde cedo a usar a luz teatral como uma grande aliada, ou seja, aprendeu a manipular sabiamente o contraste entre o claro e o escuro. “É muito útil para organizar a composição narrativa em minhas obras”, justificou.
Membro da Associação Polonesa de Artistas, ele prefere não enaltecer a sua própria história. Quando questionado sobre o motivo de divulgar sempre uma curta biografia, Kuczynski costuma responder que o mais importante não é ele, mas sim o seu trabalho. Sobre sua rotina, ele começa o dia praticando atividades físicas. “É a melhor forma de refrescar meus pensamentos. Ou a melhor forma de não pensar em desenhos”, enfatizou em entrevista veiculada no portal iraniano Tabriz Cartoons em 11 de setembro de 2016.
O cartunista normalmente prepara o projeto um dia antes de executá-lo, e seu período de maior produção costuma ser à tarde. “Trabalho como freelancer. É o que mais me convém, mas posso trabalhar em qualquer lugar onde eu tenha um canto para desenhar e acesso à internet. Tudo que tenho em Police [sua cidade natal] é um ambiente tranquilo, amigos e família. Não preciso de nada mais além disso”, contou a Tabriz Cartoons.
Pawel Kuczynski transparece não ter grandes ambições e ressalta que o mais importante é ter ideias e força para trabalhar. Se suas obras seguirem conquistando as pessoas e permitirem que ele continue vivendo do seu trabalho, isso o deixará satisfeito. “É o suficiente para mim. Como qualquer jovem estudante, eu fazia retratos em festas, imagens para decorar interior de apartamentos. Sou duro comigo e prefiro não admirar meu trabalho. Sempre acho que o próximo será melhor e me forço a ir além. Claro, como qualquer autor, fico feliz quando meu trabalho é notado e recompensado em competições”, ponderou.
Há pessoas que criticam alguns trabalhos de Kuczynski por interpretá-los como críticas intransigentes ao uso de tecnologias. Porém, embora não use smartphones, ele deixa claro que sua intenção nunca foi essa: “Não sou um inimigo das inovações técnicas. Estou ativamente usando e usufruindo delas. Mas, por outro lado, é por isso que tenho o direito de alertar sobre as armadilhas que estão sempre à nossa espreita.” Para o polonês, a melhor forma de manter a qualidade do seu trabalho é jamais negligenciar o próprio cérebro que, por ser um músculo, precisa sempre de bons estímulos.
Saiba Mais
Pawel Kuczynski começou a trabalhar com desenhos satíricos em 2004.
Para comprar algum dos trabalhos do artista polonês, acesse:
http://www.pictorem.com/collectioncat.html?author=Pawel+Kuczynski
Referências
http://pawelkuczynski.com/
https://flustermagazine.wordpress.com/2012/03/10/showcase-pawel-kuczynski/
http://tabrizcartoons.com/en/news/tcan/6196-interview-with-pawel-kuczy%C5%84ski-poland,2016.html
Charlie Hebdo, Siné e liberdade de expressão
Dizem que o jornal francês Charlie Hebdo defende a liberdade de expressão acima de tudo. Tudo bem. Então por que demitiram o cartunista Siné em 2009? O demitiram porque ele fazia críticas ao semitismo. Ou seja, assim como muitos veículos de comunicação, o Charlie Hebdo também tem seus interesses bem definidos, e não se trata apenas de liberdade de imprensa.
É algo mais subjetivo, embora muita gente prefira encarar a situação sob uma perspectiva simplista e radicalmente maniqueísta. Há pessoas até divagando e comparando os cartunistas ao Carlos Martel, o tal herói que livrou a Europa da expansão islâmica na Idade Média. O que chama atenção também é que o jornal lançou três milhões de exemplares em 16 idiomas na edição seguinte ao atentado em Paris, no dia 7 de janeiro de 2015. Uma enorme discrepância com a edição anterior, limitada a 60 mil cópias.
Mesmo sediado em Paris, o Charlie Hebdo sempre foi considerado um veículo com um orçamento modesto, tanto que enfrentou inúmeras crises financeiras para não fechar as suas portas. Sendo assim, quem financiou isso tudo? E com qual interesse?
A mídia tradicional não funciona sem geração de lucros e muito menos com dívidas. Visibilidade e comunicação se constituem em formas de poder, logo é difícil crer que o foco do semanário satírico seja apenas a liberdade de expressão. Torço apenas para que a tragédia do ano passado não tenha sido usada para alimentar interesses escusos.