Archive for the ‘Comer Animais’ tag
“Não teremos paz enquanto derramarmos sangue de animais”
No livro “Food for the Spirit: Vegetarianism and the World Religions”, de Steven Rosen, lançado em 1987, o escritor judeu e vegetariano Isaac Bashevis Singer afirmou que não teremos paz enquanto derramarmos sangue de animais.
“Foi necessário um pequeno passo baseado na matança de animais para que fossem construídas as câmaras de gás de Hitler e os campos de concentração [gulags] de Stalin. Todas essas ações foram praticadas em nome da [suposta] justiça social. Não haverá justiça enquanto o homem empunhar uma faca ou outra arma para destruir seres mais fracos que ele”, queixou-se.
Tudo vinha de bicho
Deitado, via os bichos pulando e voando janela afora. Saltavam da geladeira, fogão, armários. Iam se arrastando, se juntando e ganhando a noite. Não fazia calor nem frio. Não sentia fome. Nem sentia nada.
Assistia a partida no remanso, esfregando mão vez ou outra sobre o topo da cabeça. “Tá tudo bem.” “Faz mais falta lá fora que aqui dentro. Deixe que vão.” O último mirou a íris por segundos, e correu sem jeito, reaprendendo a controlar movimentos.
Levantou, abriu geladeira, forno e armários. Só curiosidade. Não tinha sobrado nada pra comer. Tudo vinha de bicho. Pegou copo d’água, caminhou até o fundo e percebeu que os galhos da mangueira vizinha caíam sobre o quintal. Não se recordava do quintal. “Existia um quintal?”
Alguns passos e sentiu coceirinha na orelha; pé de mexerica deitava galhos. Já estava ali? Talvez, nunca tinha notado. No canto do muro, jabuticabas forravam o chão. Deitou sobre elas e assistiu a lua. Parecia massagem.
“Nunca tinha sentido este cheiro. Diferente.” Engoliu algumas e, vacilando olhos, tentou contar mangas e mexericas que cochilavam do lado de cá. “Todo mundo tem sono, de coisa que vem ou de coisa que vai. Às vezes, é consciência pregando peça pra gente não despertar. Ou desgarrar?” Dormiu sentindo cheiro do cheiro.
Uma mensagem de Natal
Sobre a exploração animal, consumo de carne e fome mundial
Natalie Portman: “Eu não como animais”
A atriz se tornou vegetariana aos nove anos e vegana há sete anos
Na semana passada, a atriz e produtora Natalie Portman, que recentemente lançou o documentário “Eating Animals”, inspirado no livro homônimo de Jonathan Safran Foer, participou do The Late Show with Stephen Colbert.
Depois de comentar que ela agora tem um documentário chamado “Eating Animals”, Colbert a questionou se ela não se alimenta de animais: “Eu não como animais”, respondeu Natalie Portman, acrescentando que se tornou vegetariana aos nove anos e vegana há sete anos.
Colbert admitiu que experimentou uma dieta completamente livre de alimentos de origem animal por sete meses. “Nada que tivesse olhos passou pelos meus lábios. Nada com casco, penas, escamas; sem leite, sem laticínios ou qualquer coisa parecida por sete meses” revelou. O apresentador, que acabou cedendo, relatou que está tentando ser vegano novamente.
Sobre “Eating Animals”, que no Brasil deve receber o título de “Comer Animais”, assim como o livro, Natalie explicou que o documentário todo é voltado para a discussão sobre a agropecuária industrial, que representa 99% de todos os animais criados para consumo nos Estados Unidos, incluindo carnes, ovos e laticínios.
“É a fonte número um de poluição, superando carros ou qualquer outra coisa”, afirmou. Quando começaram a falar sobre “carnes mais sustentáveis”, proveniente de pequenos criadores de animais, Natalie Portman argumentou que, embora pequenas propriedades sejam melhores para o meio ambiente, elas não têm condições de sustentar a demanda dos consumidores por produtos de origem animal – o que indica que a abstenção desse consumo é o melhor caminho.
Documentário “Comer Animais” é lançado hoje nos Estados Unidos
“De onde vêm os nossos ovos, laticínios e carnes?”
O terceiro livro de Jonathan Safran Foer, “Eating Animals”, de 2009, que foi lançado no Brasil com o título “Comer Animais”, foi transformado em um documentário e lançado hoje nos Estados Unidos. Com direção e roteiro de Christopher Dillon Quinn e narração da atriz Natalie Portman, o filme é definido pela equipe de produção como “a história do início do fim da produção industrial”, e começa com a seguinte pergunta: “De onde vêm os nossos ovos, laticínios e carnes?
O filme traz argumentos contra a pecuária industrial e mostra imagens em que os animais são criados em pequenas, médias e grandes propriedades. Embora seja aberto a diferentes pontos de vista, o documentário é apontado como complacente com pequenos criadores de animais, já que a crítica se volta mais para a realidade da criação de animais em regime industrial, o que pode soar um tanto quanto problemático se você defende o veganismo abolicionista, não o reducionismo ou utilitarismo.
Porém, “Comer Animais” também deixa claro que apenas 1% dos animais criados para consumo na atualidade, pelo menos nos Estados Unidos, representam uma realidade diferente, “violenta, mas não tanto quanto a industrial”. Porém, denuncia que os outros 99% estão inseridos em uma realidade de confinamento que pode ser descrita como o holocausto animal.
O jornalista Ben Kenigsberg, do New York Times, assistiu ao documentário antes do lançamento e relatou que passou as últimas 36 horas pós-filme com dificuldade para consumir carne. Porém, como “Comer Animais” não aborda os animais que vivem no oceano, ele conseguiu comer um pouco de salmão defumado.
Na perspectiva de Kenigsberg, o filme convence reunindo uma mixórdia de filosofia, principalmente epistemologia, e economia. “As fazendas industriais podem permitir que mais pessoas sejam alimentadas, mas seus efeitos ambientais invalidam a sua eficiência. O filme nem sequer defende o vegetarianismo, mas parece impossível sair disso sem querer saber mais de onde vem a sua carne”, avalia o jornalista.
Outros espectadores compararam o filme, inspirado no livro homônimo de Jonathan Safran Foer, com documentários como “Food Inc.” de Robert Kenner, e livros como “O Dilema do Onívoro”, de Michael Pollan. Alguns veganos que assistiram ao filme o classificaram como uma oportunidade perdida de abordar o assunto de forma mais abrangente, inclusive discutindo o veganismo na atualidade e suas possíveis contribuições futuras. Como disse Safran Foer, a interpretação é livre. Então assista e tire suas próprias conclusões.
Por que é mais ético não se alimentar de animais
Alguém diz: “Você não tem dó das plantas?”
Um sujeito alega que quem mais causa mal às plantas são vegetarianos e veganos e então lança a pergunta: “Você não tem dó das plantas?” Devo dizer que pensei que ele, como alguém que consome carne, comesse principalmente animais herbívoros há muito domesticados (que consomem de 10 a 40 quilos de vegetais por dia), como os bovinos, não carnívoros como tigres e leões.
Honestamente, sou incapaz de comer tantos vegetais assim em um dia. Não tenho condições de competir com um boi em uma dieta vegetariana. Afinal, falo de um animal adulto que pode chegar a 600 quilos. E, claro, para alguém afirmar que vegetarianos e veganos são os que mais causam mal às plantas é porque só pode estar se alimentando da carne de animais essencialmente carnívoros como tigres e leões.
Ademais, quando alguém se alimenta de animais, antes do pedaço de carne chegar ao seu prato, há toda uma cadeia produtiva que deveria ser considerada. Um animal objetificado não nasce pronto para ser consumido. Ele demanda uma série de recursos antes mesmo de existir. Há um planejamento de como será a sua vida visando atender um mercado que o tipifica como produto, não animal senciente e consciente que é.
Parece-me um tanto quanto paradoxal criarmos animais que deverão ser alimentados com toneladas de vegetais e então mortos violentamente para as pessoas se alimentarem de suas carnes. Quando penso nisso, associo à ideia de uma pessoa que pode atravessar uma ponte, mas prefere derrubá-la para fazer um trajeto mais longo para chegar até o outro lado de um rio.
Degradamos o meio ambiente para criar milhões, bilhões de animais que alimentamos com imensas quantidades vegetais e que serão mortos precocemente – animais que não desejam sofrer nem morrer. Então alguém aponta o dedo para o amigo vegetariano ou vegano o acusando de não ter dó das plantas porque esse amigo come pequenas porções de vegetais. Sim, o mundo é um lugar estranho.
Como o consumo de carne favorece a destruição da identidade dos animais
Howard Lyman, a transformação de um pecuarista multimilionário em um ativista vegano
“Se você realmente ama os animais, se você se importa com eles tanto quanto diz, por que os come?”
Howard Lyman talvez tenha uma das histórias mais famosas de transformação de um pecuarista multimilionário em um ativista vegano. Desde o início da década de 1990, ele tem promovido o veganismo nos Estados Unidos e publicado obras que revelam as mazelas da indústria agropecuária, e sob a perspectiva de quem fez parte desse meio por mais de 20 anos.
Da quarta geração de uma família de pecuaristas, Lyman frequentou a Universidade Estadual de Montana, onde se graduou em agricultura geral em 1961. Depois passou dois anos no Exército dos Estados Unidos antes de comprar a sua própria fazenda: “Eu acordava cedo, fazia a roçada, ouvia os pássaros cantando e me sentia como o guardião do Éden. Meu sonho era ser um fazendeiro. Então fui para a universidade. Comprei uma fazenda orgânica e com o passar dos anos, já possuía mais de 7 mil cabeças de gado e mais de 12 mil hectares.”
De 1963 a 1983, Lyman dedicou a maior parte do seu tempo à criação de animais e grãos, convertendo a sua fazenda orgânica em uma megaoperação de confinamento de animais visando a extração de leite e o abate. “Lembro como se fosse hoje quando trouxemos os animais e demos a eles entre 7 e 21 vacinas. Cortamos os chifres, castramos eles, injetamos hormônios e os alimentamos com resíduos e antibióticos. Na fazenda, eu via tantas moscas juntas que você podia pegá-las aos montes apenas abrindo e fechando as mãos”, narra.
Além de nove mil bovinos, incluindo bezerros enviados ao matadouro para atender ao mercado de carne de vitela, ele criava porcos e aves. Também produzia grãos, silagem e feno: “Levantávamos cedo, quando não havia nevoeiro, e pulverizávamos inseticidas por toda a propriedade. Havia sempre uma grande nuvem flutuando sobre o gado, sobre a água e sobre a comida, e o inseticida atingia tudo. Duas horas mais tarde, o gado se alimentava e bebia aquela água contaminada. Essas são as coisas que aprendi na Universidade Estadual de Montana.”
O ex-pecuarista admite que era preciso dissimular a realidade para seguir em frente. Sempre que via os pássaros mortos, as árvores morrendo, e o solo de sua fazenda mudando, ele se esforçava para não pensar em como estava gastando centenas de milhares de dólares em produtos químicos. “Eu era o responsável por tudo isso. Meu irmão faleceu aos 29 anos, e ainda hoje acho que ele morreu por causa desses produtos químicos que usamos na fazenda”, declara.
Em 1979, quando ainda criava animais para consumo, Lyman foi diagnosticado com um tumor na espinha. Diante da possibilidade de ficar paralítico, ele prometeu que se sobrevivesse ao câncer se afastaria dos meios de produção baseados em produtos químicos.
“Eu estava no auge da minha carreira quando fiquei paralisado da cintura para baixo. É preciso muita concentração para direcionar a sua atenção para outra coisa que não seja a sua situação. No hospital, os médicos disseram que eu tinha uma chance em um milhão de voltar a andar por causa de um tumor dentro da minha coluna vertebral. Fui levado para a sala de cirurgia e operado durante 12 horas. Eles removeram um tumor do tamanho do meu polegar. Saí do hospital depois de uma operação com uma chance de sucesso em um milhão. Me lembro de estar na fazenda após a operação.”
Em casa, o pecuarista viu o próprio reflexo no espelho e teve um momento de conflito existencial que, segundo ele, foi uma das primeiras situações em que foi honesto consigo mesmo. Lyman, que costumava dizer a si mesmo que amava os animais, se perguntou:
“Se você realmente ama os animais, se você se importa com eles tanto quanto diz, por que os come?” Foi tão traumático para mim que eu quase arranquei a pia da parede. Essa foi uma porta da minha alma que eu nunca tinha aberto antes. E uma vez que a abri, nunca mais consegui fechá-la porque eu sabia como esses animais pareciam quando eles caíam mortos no chão. Eu sabia o que havia em seus olhos, e eu era a pessoa que os colocava lá. Era como se tudo o que você acreditasse que é justo e sagrado de repente estivesse em risco.”
Naquele dia, Lyman se perguntou como falaria para a própria esposa que a sua operação multimilionária era um erro, e que ele percebeu que a sua fonte de renda foi construída “sobre a areia”; já que tudo em que Howard Lyman acreditava estava em risco porque, pela primeira vez se deu conta de que o seu lucro era baseado no assassinato de animais. “Como eu poderia dizer que talvez o que devêssemos fazer era sair desse negócio?”, lembra.
Lyman reconheceu que não poderia falar de seus conflitos com seus amigos, porque todos eles trabalhavam no mesmo ramo. Não teve nenhum apoio. Pensou também em falar com um padre, mas concluiu que provavelmente o próprio padre comia tanta carne quanto ele. “Foi o momento mais solitário e mais difícil da minha vida”, garante.
No entanto, a grande transformação de Howard Lyman só aconteceria alguns anos depois. Em 1990, quando atuava como lobista em Washington, ele estava muito acima do peso e enfrentando problemas de saúde como pressão alta e altos níveis de colesterol. Então decidiu definitivamente se tornar vegetariano. No ano seguinte, mais decidido e com uma opinião mais forte sobre os direitos animais, fez a transição para o veganismo e transformou a sua fazenda em um santuário para animais. Também começou a promover o veganismo em diversas regiões dos Estados Unidos, defendendo também a produção orgânica de vegetais:
“Nunca vi um animal pular e dizer que quer ser um hambúrguer. Estive em centenas de matadouros, vi milhares de animais morrerem, e sempre que eu os observava, eu notava que eles sabiam o que aconteceria com eles. Havia o cheiro de morte. Eu me questionava: ‘Existe alguma necessidade disso?’”
Em abril de 1996, o ex-pecuarista participou do programa The Oprah Winfrey Show, onde denunciou as mazelas da indústria de proteína animal. Suas revelações tiveram repercussão nacional e fizeram com que Oprah abdicasse do consumo de hambúrgueres. Lyman e a apresentadora tiveram de responder a dezenas de processos da Associação dos Produtores de Carne Bovina dos Estados Unidos, mas foram inocentados em 1998. “Tenho certeza de que se eu fosse novamente ao programa, hoje eu seria condenado, mesmo falando a verdade”, lamenta.
Também em 1998, Howard Lyman, que se tornou uma referência em veganismo para a atriz vegana Linda Blair, publicou o livro “Mad Cowboy: Plain Truth from the Cattle Rancher Who Won’t Eat Meat”, em que narra a sua trajetória pessoal e profissional de pecuarista à ativista vegano. Também traz importantes informações sobre as mazelas da indústria agropecuária, o que inclui investigações do uso de nocivos produtos químicos nesse meio. Em 2005, ele lançou o livro “No More Bull! The Mad Cowboy Targets America’s Worst Enemy: Our Diet”, que é uma continuação da obra de 1998. A sua história é narrada no documentário “Mad Cowboy” e em “Peaceable Kingdom” – este segundo com boa repercussão internacional.
Lyman também aparece no famoso documentário “Cowspiracy”, de Kip Andersen e Keegan Kuhn, em que afirma que não faz sentido um ambientalista consumir produtos de origem animal. “Engane-se se quiser. Aliás, se quiser alimentar o seu vício, faça-o, mas não chame a si mesmo de ambientalista ou protetor dos animais”, critica.
Saiba Mais
Entre os anos de 1996 e 1999, Howard Lyman foi presidente da União Vegetariana Internacional.
Referências
Lyman, Howard. Mad Cowboy: Plain Truth from the Cattle Rancher Who Won’t Eat Meat (1998).
Stein, Jenny. Peaceable Kingdom (2004).
Andersen, Kip; Kuhn, Keegan. Cowspiracy (2014).