David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

Archive for the ‘commedia all’italiana’ tag

14 anos sem Vittorio Gassman

without comments

Gassman em L'armata Brancaleone, de 1966 (Foto: Reprodução)

Gassman em L’armata Brancaleone, de 1966 (Foto: Reprodução)

Faz 14 anos que o ator italiano Vittorio Gassman se foi. O grande Il Mattatore que atuou em mais de 120 filmes, entre os quais C’eravamo Tanto Amati, Profumo di Donna, L’Armata Brancaleone, I Mostri, La Grande Guerra e Il Sorpasso.

Fez ótimas parcerias com o mestre do neorrealismo italiano Luchino Visconti e alguns dos maiores expoentes da Commedia all’italiana: Mario Monicelli, Dino Risi e Ettore Scola. Gassman está entre os melhores atores italianos de todos os tempos.

“Em cada real ator há uma necessidade de se sentir como o centro do mundo durante algumas horas. Egocentrismo, é o que dizemos em italiano.”

Vittorio Gassman.

Written by David Arioch

January 17th, 2015 at 3:53 pm

Um exército de perdedores

with 2 comments

L’armata Brancaleone, uma crítica bem humorada de valores como honra e bravura na Idade Média

armata_brancaleone_vittorio_gassman_mario_monicelli_013_jpg_qqja

Filme é uma paródia de Dom Quixote de La Mancha (Foto: Reprodução)

Lançado no Brasil como O Incrível Exército de Brancaleone, L’armata Brancaleone é uma obra-prima de Mario Monicelli, expoente da commedia all’italiana. O filme se passa na Baixa Idade Média, durante a crise do feudalismo, e faz uma crítica bem-humorada de valores como honra e bravura.

brancaleone

Brancaleone lidera um exército de marginalizados (Foto: Reprodução)

Em 1966, L’armata Brancaleone entrou para a história do cinema mundial como a primeira película a satirizar o que está registrado em livros e filmes sobre a Idade Média. A obra, uma paródia de Dom Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes, apresenta um grupo de maltrapilhos que mata um cavaleiro para roubar o documento que lhe garante a posse de um feudo em Aurocastro.

1480

Valor caricato da tragédia também se estende a crença no messianismo (Foto: Reprodução)

Como nenhum dos bandidos tem o perfil adequado para substituir o herdeiro da propriedade, convidam o devoluto cavaleiro Brancaleone da Norcia (Vittorio Gassman) para se juntar a eles. De uma estupidez surreal, mas ambicioso, o homem em nada personifica um guerreiro polivalente, muito pelo contrário. Brancaleone é um anti-herói falacioso que golpeia árvores e gosta de se impor mantendo-se ereto sobre um pangaré ocioso e arredio chamado Aquilante.

armatabrancaleone1966mk

Vittorio Gassman em uma de suas melhores interpretações (Foto: Reprodução)

O personagem não defende nenhum ideal, mas sonha em adquirir fortuna, nem que seja de forma ilícita, para custear excessos com bebidas e mulheres. É dotado de um niilismo de ocasião e um pragmatismo que oscila conforme o seu humor e boa vontade. Brancaleone não se importa em desafiar os fracos e fugir dos fortes. É o real “cavaleiro” que ganhou qualidades ficcionais na história oficial e teve as verdadeiras características ocultadas.

l

Obra mostra a decadência do feudalismo e emergência do capitalismo (Foto: Reprodução)

Além disso, os companheiros do protagonista são muito atrapalhados. Juntos, formam um exército de rejeitados, composto por um obeso, um lunático, uma criança, um velho judeu e um falso líder. Em situações críticas, Brancaleone deixa as decisões a critério do personagem menos lúcido. A desordem é acumulativa e passa por uma gradação enquanto o grupo percorre a Europa em um dos momentos mais obscuros da História.

A antiepopeia, pautada no período em que o trinômio guerra, peste e fome se torna o estopim da decadência do feudalismo e emergência do capitalismo, enaltece o feio a partir da estrutura cenográfica, fisionomia e traje dos personagens. O valor caricato da tragédia se estende à crença no messianismo. Exemplo é a clássica cena em que um padre, comandando peregrinos em viagem à Terra Santa, cai de uma ponte e morre.

Os fiéis se dispersam, dando a impressão de que com a morte da autoridade religiosa se esvai a fé. Monicelli ainda apresenta interpretações particulares da queda do Império Bizantino e invasão muçulmana na Europa. Também é inesquecível a música de abertura do filme, do compositor Carlo Rustichelli que ao longo da vida compôs para mais de 250 filmes, tornando-se um dos nomes mais célebres da Itália quando o assunto é trilha sonora.