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14 anos sem Vittorio Gassman
Faz 14 anos que o ator italiano Vittorio Gassman se foi. O grande Il Mattatore que atuou em mais de 120 filmes, entre os quais C’eravamo Tanto Amati, Profumo di Donna, L’Armata Brancaleone, I Mostri, La Grande Guerra e Il Sorpasso.
Fez ótimas parcerias com o mestre do neorrealismo italiano Luchino Visconti e alguns dos maiores expoentes da Commedia all’italiana: Mario Monicelli, Dino Risi e Ettore Scola. Gassman está entre os melhores atores italianos de todos os tempos.
“Em cada real ator há uma necessidade de se sentir como o centro do mundo durante algumas horas. Egocentrismo, é o que dizemos em italiano.”
Vittorio Gassman.
Um exército de perdedores
L’armata Brancaleone, uma crítica bem humorada de valores como honra e bravura na Idade Média
Lançado no Brasil como O Incrível Exército de Brancaleone, L’armata Brancaleone é uma obra-prima de Mario Monicelli, expoente da commedia all’italiana. O filme se passa na Baixa Idade Média, durante a crise do feudalismo, e faz uma crítica bem-humorada de valores como honra e bravura.
Em 1966, L’armata Brancaleone entrou para a história do cinema mundial como a primeira película a satirizar o que está registrado em livros e filmes sobre a Idade Média. A obra, uma paródia de Dom Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes, apresenta um grupo de maltrapilhos que mata um cavaleiro para roubar o documento que lhe garante a posse de um feudo em Aurocastro.
Como nenhum dos bandidos tem o perfil adequado para substituir o herdeiro da propriedade, convidam o devoluto cavaleiro Brancaleone da Norcia (Vittorio Gassman) para se juntar a eles. De uma estupidez surreal, mas ambicioso, o homem em nada personifica um guerreiro polivalente, muito pelo contrário. Brancaleone é um anti-herói falacioso que golpeia árvores e gosta de se impor mantendo-se ereto sobre um pangaré ocioso e arredio chamado Aquilante.
O personagem não defende nenhum ideal, mas sonha em adquirir fortuna, nem que seja de forma ilícita, para custear excessos com bebidas e mulheres. É dotado de um niilismo de ocasião e um pragmatismo que oscila conforme o seu humor e boa vontade. Brancaleone não se importa em desafiar os fracos e fugir dos fortes. É o real “cavaleiro” que ganhou qualidades ficcionais na história oficial e teve as verdadeiras características ocultadas.
Além disso, os companheiros do protagonista são muito atrapalhados. Juntos, formam um exército de rejeitados, composto por um obeso, um lunático, uma criança, um velho judeu e um falso líder. Em situações críticas, Brancaleone deixa as decisões a critério do personagem menos lúcido. A desordem é acumulativa e passa por uma gradação enquanto o grupo percorre a Europa em um dos momentos mais obscuros da História.
A antiepopeia, pautada no período em que o trinômio guerra, peste e fome se torna o estopim da decadência do feudalismo e emergência do capitalismo, enaltece o feio a partir da estrutura cenográfica, fisionomia e traje dos personagens. O valor caricato da tragédia se estende à crença no messianismo. Exemplo é a clássica cena em que um padre, comandando peregrinos em viagem à Terra Santa, cai de uma ponte e morre.
Os fiéis se dispersam, dando a impressão de que com a morte da autoridade religiosa se esvai a fé. Monicelli ainda apresenta interpretações particulares da queda do Império Bizantino e invasão muçulmana na Europa. Também é inesquecível a música de abertura do filme, do compositor Carlo Rustichelli que ao longo da vida compôs para mais de 250 filmes, tornando-se um dos nomes mais célebres da Itália quando o assunto é trilha sonora.