David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

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Sobre pessoas que debocham do veganismo

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Não há respeito na exploração e no consumo de animais

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Foto: Jo-Anne McArthur/We Animals

Se pesquisar sobre a palavra respeito, você vai perceber facilmente que o seu conceito costuma ser associado à consideração, estima, reverência, aceitação – e, naturalmente, ao entendimento de que não há respeito na arbitrariedade, porque esta é abusiva em essência. Então como alguém pode falar em respeito pelos animais quando toma parte em sua exploração ou morte? Seja por meio do consumo ou do lucro.

Já testemunhei pessoas alegando que matam ou se alimentam de animais, mas os respeitam. Não, isso definitivamente não é respeito. Porém, muitas vezes, ludibriado pela própria consciência o ser humano recria significações para as suas inconsistências. A palavra respeito, por exemplo, tem origem latina – respicere, que significa “olhar outra vez”. Como falar em olhar outra vez quando muitos se negam até mesmo a olhar uma primeira vez?

O respeito não é voltívolo como nossas conveniências. O respeito existe ou não existe em acordo ou desacordo com as nossas atitudes – sem meio termo, concessões ou interpretações que atribuímos para legitimar nossos interesses ou displicências. Se mato um animal ou me alimento dele porque qualifico isso como uma opção que me foi dada, de fato ignoro os interesses daquele animal. Sendo assim, uma violação motivada por uma das facetas mais viscerosas e usuais do desrespeito legitimado.





 

Breve reflexão sobre pessoas que debocham do veganismo

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O sofrimento animal como tema de uma discussão é algo que demanda respeito em qualquer circunstância (Foto: We Animals/Jo-Anne McArthur)

Tenho dificuldade em entender por que pessoas com pouca ou grande visibilidade se expõem tanto para falar sobre veganismo de forma pejorativa, debochada e desrespeitosa. É até difícil enumerar o tanto de pessoas, inclusive com prestígio em suas áreas, que agem dessa forma, sem medo de revelar arrogância ou presunção. O veganismo está vinculado aos direitos animais, e, para além de fatores óbvios, como o sofrimento animal, tem toda uma literatura de longa data que o fundamenta.

Há uma infinidade de obras que servem de referência sobre o assunto, e que começaram a ser publicadas ostensivamente a partir do século 19. Então sempre fico surpreso quando as críticas ou comentários mais inestéticos sobre o assunto normalmente não trazem nenhuma sólida referência ou argumento, mas somente um discurso fragilizado que encontra plateia entre aqueles que também não sabem de fato o que é a defesa dos direitos animais, o veganismo, e o que representam.

Eu jamais seria capaz de me expor para desmerecer algo sobre o qual tenho irrisório ou nenhum conhecimento. Quero dizer, qual é o sentido de falar mal de algo sem ter base para argumentar com a devida coerência? Como posso confrontar qualquer ideia com a qual não concordo se não dediquei tempo estudando sobre o assunto? O desrespeito subsiste exatamente nisso, na negação do conhecimento que podemos adquirir para fortalecer nossas contrariedades ou reavaliá-las.





Written by David Arioch

December 10th, 2017 at 8:59 pm

O dono da rua

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Rua onde tive que esperar a boa vontade do motorista da caminhonete (Foto: David Arioch)

Em Paranavaí, voltando para casa, passei por uma rua estreita onde os motoristas insistem em estacionar seus veículos dos dois lados, inviabilizando o tráfego. Até aí, tudo bem, nada de anormal. Passo por lá todos os dias e, sempre que vejo um carro vindo na mão oposta, costumo encostar o meu rente ao meio-fio e aguardo ele passar para seguir meu caminho.

Mas tem hora que é difícil não se surpreender com a falta de cortesia das pessoas. Exatamente em frente ao Salão do Reino das Testemunhas de Jeová, que fica no meio do quarteirão, um homem parou sua caminhonete importada e ficou lá bloqueando a passagem, pouco se importando se eu queria trafegar pela mesma rua.

Uma mulher e mais algumas pessoas desceram do veículo e o sujeito ainda continuou conversando. Depois de um tempinho, elas entraram no salão. Então o motorista passou por mim e seguiu seu caminho como se não houvesse mais ninguém naquela rua além dele e sua caminhonete. Talvez fosse doloroso demais pra ele ser gentil e fazer um aceno de mão em agradecimento.

A contradição de clamar por democracia sendo antidemocrático

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Vejo muita passionalidade envolvida, e muitas vezes me parecem armadilhas do ego e da vaidade

Discurso de Péricles em Atenas, um dos símbolos da democracia (Pintura: Philipp Foltz)

Discurso de Péricles em Atenas, um dos símbolos da democracia (Pintura: Philipp Foltz)

Esses dias, testemunhei na internet um camarada sendo chamado de “comunista”, no sentido mais pejorativo do termo, aquele que hoje povoa o ideário comum, porque publicou um vídeo mostrando um general da época da ditadura militar impedindo um jornalista de exercer a própria função. Esse sujeito que o ofendeu com palavras baixas e declarou que o camarada deveria ser fuzilado por ser “comunista” é um exemplo de uma efervescência perigosa e sem precedentes que tenho visto na internet.

Primeiro porque o camarada não é “comunista”. Ainda assim, tentei entender o posicionamento do rapaz, mas foi impossível porque ele vive uma estoica contradição – uma pessoa que diz estar lutando pela democracia e ao mesmo tempo se coloca no direito de dizer que muitos brasileiros deveriam ser deportados ou fuzilados porque não pensam como ele. Me refiro a alguém que entra na internet para impor sua opinião de forma agressiva em páginas de pessoas com quem não partilha as mesmas ideias.

Penso que se não sou seu amigo e entro na sua página para comentar algo sem ser convidado, devo pelo menos ser educado e defender o meu posicionamento de forma ponderada e lúcida – o mínimo que se pode esperar de um ser humano que deveria respeitar o outro tanto quanto respeita a si mesmo. Não é correto invadir um perfil pessoal no Facebook para impor nada, até porque esse espaço pode, porém não precisa ser democrático. Ninguém tem o direito de fazer isso, independente de qualquer coisa.

Sinceramente, não há como negar que comportamentos como o do rapaz citado têm relação direta com a indigência cultural, já que generalizações e ofensas costumam ser usadas com mais frequência por pessoas que não são capazes de argumentar ou defender um ponto de vista sem apelar para clichês ou estereótipos. O sujeito que ofendeu esse meu camarada trabalha como instrutor em uma academia onde paro em frente quase todos os dias quando o sinal vermelho do semáforo está acionado.

Já o vi algumas vezes rindo e fazendo brincadeiras com alunos e colegas de trabalho, o que torna tudo mais chocante porque mostra como um ser humano aparentemente pacífico pode na realidade esconder uma faceta agressiva e tirânica, o que é interpretado por estudiosos do comportamento humano como sinais de sociopatia.

Acho válido citar também pessoas mais próximas que conheço há muito tempo e que presenciei e ainda presencio defendendo discursos de ódio em mídias sociais. Posso dizer que não é fácil olhar para a pessoa e não associá-la ao que li na internet. A vida segue, mas um resquício de fel na boca persiste.

Vejo muita passionalidade envolvida, e muitas vezes me parece armadilha do ego e da vaidade, aliada a uma visão canhestra do mundo; até um anseio jactante e quase totalitarista de redefinir o que é certo e errado. É incrível como nos deparamos todos os dias com pessoas hostilizando alguém. Tudo isso porque não foram preparadas para lidar com as diferenças, e acho que esse é um problema que surge na infância e adolescência.

Diariamente encontramos pessoas querendo moldar o mundo e as pessoas à sua maneira, o que não significa que seja algo basicamente ruim, já que no fundo todos fazemos isso de algum modo. E claro, muitas coisas nesse sentido podem ser realmente positivas. No entanto, a preocupação surge quando as negativas se sobrepõem, porque aí o respeito é relegado à farelagem e o ser humano deixa de ser humano.