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Quase uma ode ao feio
Clássico de Scola se pauta na degradação humana
Lançado no Brasil como Feios, Sujos e Malvados, o filme Brutti, Sporti e Cattivi é uma anti-heroica e ácida comédia do cineasta italiano Ettore Scola sobre a degradação humana. No clássico de 1976, o protagonista é o caolho de meia-idade Giacinto (Nino Manfredi) que mora com a mulher, dez filhos e outros parentes em um cortiço romano.
A trama se desenrola a partir do momento que o homem recebe um milhão de liras em moedas; dinheiro de uma indenização conquistada após sofrer um acidente de trabalho. Interessados na grana de Giacinto, todos tentam encontrar os meios mais sórdidos para enganá-lo.
É difícil não se sentir desconfortável com a ausência de beleza combinada à amoralidade dos personagens e do cenário. Tudo é intencional e inspira a disformidade. Scola explora o feio como um parâmetro neorrealista que flerta com o surrealismo. Exemplo é a cena em que o protagonista, em um ato gentio embora sincero, leva uma amante horrorosa para viver com ele e a enorme família, já estigmatizada pela feiura, num minúsculo barraco. Na obra, o feio é recorrente e ganha status de natural.
Aparentemente, são todos feios, sujos e malvados, mas ao mesmo tempo não há um discurso, mesmo lacônico, sobre a culpa de serem assim. É um filme sobre miseráveis ociosos e materialistas às raias do primitivismo que não se importam em arremessar lixo aos familiares ou fazer sexo na frente de parentes, amigos e conhecidos. Para os personagens, tudo é válido quando não há referência cultural de distinção entre certo e errado.
Estão todos juntos em uma lama social que os aglutina a um cenário de desconhecimento moral e privação de dignidade. Ainda assim, surpreende ver que apesar de tudo não há ódio indiscriminado entre eles, apenas vontade de viver da única forma que aprenderam. Em 1976, Feios, Sujos e Malvados garantiu a Ettore Scola o prêmio de melhor diretor no 29º Festival de Cannes.
Curiosidade
O filme Brutti, Sporti e Cattivi inspirou dezenas de filmes, séries e programas sobre famílias desajustadas.
Elia Kazan, genialidade e macartismo
Elia Kazan, um genial e polêmico artista, sempre lembrado pelas suas obras, emblemas do realismo socialista norte-americano. Foi acusado de entregar colegas de trabalho no período negro do macartismo. Quando morreu, aos 94 anos, já não gozava do prestígio do auge da carreira eternizada por películas inesquecíveis como A Streetcar Named Desire (Uma Rua Chamada Pecado), joia de 1951.
Nos anos 1990, Kazan, um turco de origem grega que adotou os Estados Unidos como lar, foi alvo de críticas severas de atores conceituados como Sean Penn, Ed Harris, Richard Dreyfuss, Holly Hunter e Nick Nolte pelo que fez no passado. Até hoje há controvérsias sobre a contribuição de Kazan à lista negra do Comitê de Investigação de Atividades Anti-Americanas do Senado dos Estados Unidos. Partiu, mas deixou um legado que influenciou o cinema de Francis Ford Coppola, John Cassavetes e Martin Scorsese.
Para muitos, um ótimo cineasta, para outros, um traidor; pra mim, também um bom escritor, autor de “America, America”, um livro tornado filme que conheci acidentalmente em um sebo.