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De Bamberg a Paranavaí

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Enfermeiro da Segunda Guerra Mundial cumpriu missão e encontrou paz no Brasil

Padre era tímido e não gostava de ser fotografado sozinho (Foto: Acervo da Ordem do Carmo)

Padre era tímido e não gostava de ser fotografado sozinho (Foto: Acervo da Ordem do Carmo)

Depois de enfrentar as tragédias da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o padre e enfermeiro alemão Bonaventura Einberger veio a Paranavaí com a missão de construir um seminário em Graciosa, distrito de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Além de concluir o trabalho, adotou o Brasil como pátria e aqui viveu ao longo de 31 anos.

Em meados de 1953, o frei alemão Ulrico Göevert, que já vivia em Paranavaí, pediu para a Ordem dos Carmelitas na Alemanha enviar um padre apto a construir um seminário em Graciosa. “O frei Bonaventura mal chegou e já foi visitar propriedades nas imediações da igreja. Ali ele escolheu um sítio. No dia seguinte, começaram a derrubada da mata”, conta a pioneira Francisca Schiroff.

Entre o início da construção e a inauguração, passaram nove meses. A maior parte do investimento veio da Ordem dos Carmelitas da Alemanha. De acordo com Francisca, quase todos da comunidade ajudaram, mas o destaque maior foi o frei Bonaventura que viveu em função do Seminário Imaculada Conceição.

Antes de chegar a Graciosa, onde a quietude se contrastava apenas com o som preponderante da natureza, Einberger ainda mantinha fresca em suas lembranças os sons de bombas, metralhadoras e gritos exasperados, consequência de dores, na maioria das vezes, irremediáveis.

Tudo começou em meados da década de 1940, quando o frei Bonaventura foi convocado a compor um grupo de enfermeiros em um navio do Terceiro Reich. Segundo a pioneira, o padre cuidou de centenas de soldados alemães que se feriram na linha de frente.

A guerra fez com que Bonaventura Einberger perdesse o contato com os familiares, principalmente com os irmãos Otto Einberger, inspetor-chefe da SS (Schutzstaffel), unidade de elite da polícia nazista, e o caçula Heinrich Einberger, soldado do Exército alemão.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, Einberger desconhecia o paradeiro dos irmãos. “Otto, que tinha 38 anos, foi capturado pelo Exército soviético. Ele ficou oito meses em uma prisão russa próxima de Moscou, até que foi encontrado morto depois do fim da guerra”, revela Francisca, referindo-se ao fatídico dia 13 de outubro de 1945.

Bonaventura, inconformado com a morte do irmão, decidiu buscar o corpo para enterrá-lo em Bamberg, sua cidade natal. O corpo de Heinrich nunca foi encontrado e a única conjetura possível é a de que foi alvejado em um confronto terrestre com os soviéticos.

Em 1953, depois de perder os pais e os irmãos, surgiu uma oportunidade de deixar tudo para trás. Acompanhado pela cunhada e três sobrinhos, filhos do irmão Otto Einberger, o frei Bonaventura veio a Paranavaí. “Eles compraram um sítio de cinco alqueires aqui em Graciosa e fixaram residência, com exceção do frei que vivia no seminário”, garante Francisca.

Einberger era discreto e reservado

Quando chegou a Graciosa, o frei Bonaventura Einberger foi recebido por todos os moradores do distrito. “Ele falou muito obrigado em português”, relembra a pioneira Francisca Schiroff que durante décadas guardou um grande baú de madeira que pertenceu ao frei.

O objeto foi doado para a Fundação Cultural de Paranavaí e colocado em exposição no Museu Histórico de Paranavaí que funciona na Casa de Cultura Carlos Drummond de Andrade. “Ele trouxe grandes caixas de madeira. Veio com toda a mudança. A ideia dele já era se fixar aqui”, destaca Francisca.

Quando aprendeu a falar fluentemente em português, o frei Bonaventura visitou todas as capelas da região. “Ele ia a cavalo, não tinha pressa. Inclusive quando o animal ficava com fome e havia algo na beira da estrada, ele parava e deixava o cavalo comer. Tinha dó”, conta Francisca sorrindo. O equino foi o principal meio de transporte do frei durante sete anos, até que ganhou um jipe da Ordem dos Carmelitas.

Segundo a pioneira, Einberger era bastante amistoso e jamais teve qualquer tipo de inimizade. “Acho que todo mundo gostava dele justamente por não se envolver com política e assuntos familiares. Só ajudava quando lhe era solicitado, algo constante”, informa, referindo-se a uma época em que padre desempenhava papel de conselheiro.

No entanto, Bonaventura Einberger era bastante reservado e tímido. A pioneira conta que o padre era acanhado a ponto de evitar ser fotografado sozinho. “Me recordo também que festas para ele tinham de ser surpresa, do contrário, ele fugia”, enfatiza em tom de nostalgia.

Frei alemão adotou pátria brasileira

Quando, por curiosidade, questionavam o frei Bonaventura Einberger sobre as agruras vivenciadas durante a Segunda Guerra Mundial, a expressão do padre mudava na hora. Hesitante e apreensivo, se limitava a dizer que era algo horrível.

Einberger torcia para que qualquer guerra jamais chegasse ao Brasil, citando a experiência de ter visto tantas pessoas morrendo. “Falava também que viu muitas casas sendo bombardeadas, noite após noite”, reitera a pioneira Francisca Schiroff.

Quando o assunto era o Brasil ou nova pátria, como ele mesmo dizia, o frei Bonaventura, com um sorriso cândido e olhar profundo, afirmava que não errou em escolher um país que tem tudo para estar entre os melhores do mundo. “Dizia que aqui é muito bom para se viver. Era algo muito sincero, tanto que ele esteve com nós até o dia de sua morte”, lembra a pioneira Francisca Schiroff emocionada.

O frei Bonaventura Einberger faleceu em 14 de novembro de 1984, aos 80 anos, em decorrência de algumas complicações envolvendo rins, pulmão e coração. “Agradecemos por ele não ter ficado muito tempo acamado. Foi uma grande perda, ainda mais se tratando de uma pessoa que dedicou sua vida ao povo de Graciosa e de Paranavaí”, enfatiza Francisca.

Saiba Mais

O frei Bonaventura Einberger está enterrado na cripta da Igreja São Sebastião em Paranavaí.

Ele nasceu em Bamberg no dia 15 de fevereiro de 1904 e se tornou sacerdote em 29 de junho de 1929.

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