David Arioch – Jornalismo Cultural

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Archive for the ‘Espanha’ tag

Quando Antonio Molina invadiu o congresso espanhol armado

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Foto que venceu o Prêmio World Press Photo em 1981 (Foto: Manuel Pérez Barrio)

Foto que venceu o Prêmio World Press Photo em Amsterdã (Foto: Manuel Pérez Barrio)

23 de fevereiro de 1981 – Quando Antonio Tejero Molina, o 23-F, ex-tenente-coronel da Guarda Civil, invadiu o Congresso dos Deputados na Espanha. O fotógrafo Manuel Pérez Barrio registrou o momento de tensão quando os políticos foram obrigados a se calarem para ouvirem a contragosto o discurso de Molina. A foto rendeu a Barrio o prêmio World Press Photo, em Amsterdã, na Holanda.

Written by David Arioch

February 4th, 2016 at 9:57 pm

O santo egoísmo

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Viridiana e a personificação da crítica de Buñuel ao catolicismo

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Dom Jaime tenta ter uma relação incestuosa com a sobrinha noviça (Foto: Reprodução)

Lançado em 1961, Viridiana, do cineasta espanhol Luis Buñuel, é um filme de crítica social e religiosa que revela o egoísmo de uma noviça que, na esperança de alcançar a redenção, oferece abrigo e fartura a um grupo de mendigos.

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Cena dos mendigos em paródia de “A Última Ceia” (Foto: Reprodução)

A personagem Viridiana (Silvia Pinal) que empresta nome ao filme é a personificação da crítica de Buñuel ao catolicismo. Na obra, Dom Jaime (Fernando Rey) tenta ter uma relação incestuosa com a sobrinha noviça. Em uma noite, ciente de que a moça não o aceitaria, pede ajuda a empregada Ramona (Margarita Lozano) para colocar sonífero na bebida da sobrinha. Consumado o plano, Dom Jaime pensa em estuprá-la, mas desiste da ideia.

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No filme, os andarilhos não se reconhecem como semelhantes (Foto: Reprodução)

No dia seguinte, diz para Viridiana que ela não pode voltar ao convento porque ele tirou-lhe a virgindade. Por meio da perversão, a cena evoca uma crítica sagaz ao comportamento da burguesia espanhola. Perturbada, a noviça decide partir, então Dom Jaime conta a verdade. Ainda assim, a moça se recusa a continuar na residência. Retorna somente quando está prestes a deixar a cidade e recebe a notícia de que o tio cometeu suicídio por enforcamento.

Em ato de expiação, Viridiana se muda para a mansão, onde busca a redenção oferecendo abrigo e fartura a um grupo de mendigos. Luis Buñuel mostra uma contraditória faceta do catolicismo ao apresentar a conduta de Viridiana como uma falsa abnegação. Certo dia, quando a moça sai e deixa a propriedade sob os cuidados dos andarilhos, eles invadem a casa principal e preparam um banquete. A memorável cena dos mendigos em torno da mesa é uma corrosiva paródia da pintura “A Última Ceia”, de Leonardo da Vinci.

O clímax da violência estética do clássico de Buñuel surge no momento em que um mendigo tenta estuprar Viridiana. Impossibilitado de ajudá-la, o primo Jorge (Francisco Rabal) evita o pior oferecendo dinheiro a outro andarilho. Este mata o companheiro, e assim o cineasta corrobora a ideia de que abaixo da linha de pobreza a força do capitalismo também se sobrepõe de forma virulenta ao humanismo e à religiosidade.

Na história, os andarilhos, entregues a uma condição de vida primitiva, são incapazes de agregar valor a qualquer coisa imaterial; não se reconhecem como semelhantes e vivem em um universo onde a hierarquia pode ser interpretada como a de uma cadeia predatória.

O trauma espanhol

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Soldados de Salamina explora o obscurantismo da Guerra Civil Espanhola

Lola busca informações sobre o paradeiro do poeta Rafael Sánchez Mazas (Foto: Reprodução)

 O filme Soldados de Salamina, idealizado pelo cineasta espanhol David Trueba e lançado em 2003, explora o obscurantismo da Guerra Civil Espanhola partindo da suposta execução do escritor e falangista Rafael Sánchez Mazas.

A protagonista da obra é a escritora em crise Lola Cercas (Ariadna Gil) que decide se aprofundar em uma pesquisa in loco sobre a Guerra Civil Espanhola. O ponto de partida é a ordem de execução do poeta Rafael Sánchez Mazas, um dos fundadores da Falange Espanhola, grupo paramilitar que se aliou ao ditador Francisco Franco em 1936. Decidida a descobrir como Mazas sobreviveu, Lola viaja em busca de personagens que participaram do evento.

Cena antológica do soldado dançando com um rifle ao som de Suspiros de España (Foto: Reprodução)

Enquanto Lola é uma personagem alheia a própria história, inclusive se entrega a pesquisa como razão existencial, o seu estado de vulnerabilidade é uma simbologia da Espanha da época; confusa e controversa, principalmente com relação aos elementos históricos da Guerra Civil Espanhola ocultados por conveniência política. No decorrer do filme, Lola constrói uma outra identidade de si mesma conforme encontra novas informações sobre o episódio da execução de Rafael Sánchez.

O cineasta David Trueba deixa evidente na trama a importância da memória histórica para a preservação da identidade de um país, tanto que a personagem principal só consegue reconstituir importantes fatos da Guerra Civil Espanhola a partir da oralidade, pois não havia muitas provas materiais do que aconteceu com Mazas. O filme oferece poucas respostas, mas faz muitas perguntas e termina de uma maneira que impele o espectador a refletir sobre o assunto enquanto a folclórica canção “Suspiros de España”, de Antonio Álvarez Alonso, ainda ecoa.

Sobre a estética cinematográfica, os destaques são a quebra de linearidade, estruturada a partir de flashbacks, e a fotografia sobre a qual incide pouca luminosidade dando a ideia do quão a Guerra Civil Espanhola é um trauma histórico obscuro; um acontecimento com riqueza de detalhes desconhecidos pela população.

украинцев: uma neve vermelha no deserto siberiano

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Grupo de ucranianos viveu um episódio de terror no deserto siberiano (Foto: Reprodução)

Em 1941, os ucranianos Mikhail e Karen Kudha Ludovitch, à época com 89 anos, estavam dormindo em uma casa de repouso em Leningrado, no noroeste russo, quando foram acordados durante a madrugada por cinco soldados soviéticos. O casal foi colocado junto de mais 49 pessoas dentro de um velho caminhão usado no transporte de animais. O destino era a Sibéria. Morreram por inanição e hipotermia depois de serem abandonados a centenas de quilômetros de Omsk, no deserto siberiano.

Dos passageiros, apenas cinco foram encontrados vivos, segundo Mykola Dramenko, um sobrevivente ucraniano de ascendência cossaca que fugiu para a Espanha. O ato foi “justificado” como represália às manifestações separatistas. O neto de Mikhail e Karen, Nikolai Ludovitch, após saber do incidente por intermédio de uma rádio clandestina, localizou Dramenko. O sobrevivente revelou que só não morreu porque decidiram praticar antropofagia. A preferência era por cadáveres que exalavam odor mais tênue. Muitas milícias ligadas ao governo soviético eram contratadas para promover limpeza étnica, incluindo desde crianças a idosos, de acordo com Mykola.

Pioneiro forneceu eletricidade a Paranavaí

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Thomaz Estrada iluminou as ruas da colônia e forneceu energia elétrica para muitos profissionais

Thomaz Estrada abriu o primeiro posto de combustível da cidade (Foto: Reprodução)

Nos anos 1940, o imigrante espanhol Thomaz Estrada forneceu energia elétrica para a população de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. À época, as ruas da cidade foram iluminadas graças ao gerador do pioneiro.

No tempo em que Paranavaí ainda não contava com o fornecimento de energia elétrica, o espanhol Thomaz Estrada decidiu intervir. O pioneiro tinha um posto de combustível entre a Rua Getúlio Vargas e a Avenida Paraná, sentido ao antigo Terminal Rodoviário. Lá, Estrada mantinha um gerador de energia que poderia ter se limitado a abastecer o empreendimento. Mas o espanhol foi além, estendeu ao máximo a área de fornecimento, beneficiando muitos profissionais que dependiam de energia elétrica para trabalhar.

Em parceria com outros moradores, Estrada também criou alguns esquemas para a iluminação de ruas e avenidas. “O motor ficava dentro do posto e iluminava até o Banco Noroeste”, lembrou o espanhol em entrevista à Prefeitura de Paranavaí há algumas décadas. Para os pioneiros, Estrada fez muito mais que uma benfeitoria, dissipou a escuridão que impedia a colônia de existir no fim do dia. “Com o brilho daquela luz, Paranavaí ganhou nova dimensão, coisa que não se traduz, alegria arredia que destoa coração”, poetizou o pioneiro cearense João Mariano.

O abastecimento de energia deu novo sentido à vida em comunidade. Os moradores se beneficiavam da iluminação noturna realizando atividades que até então dependiam da luz solar. “As crianças aproveitavam a claridade pra brincar um pouco mais na rua”, relatou Mariano. Para o pioneiro mineiro José Alves de Oliveira, conhecido como Zé do Bar, a iniciativa do espanhol, que vivia numa residência ao lado de onde é hoje o Cartório Tomazoni, fez a diferença na colônia.

“Era tudo sertão e havia bicho pra todo lado”

O pioneiro Thomaz Estrada, que nasceu em 2 de julho de 1901, na Espanha, chegou à Fazenda Velha Brasileira, atual Paranavaí, em 1942, por sugestão de Francisco de Almeida Faria, inspetor de terras que conheceu em Londrina. “Me mudei pra cá em 1943. Aqui era tudo sertão e havia bicho pra todo lado. Veados andavam pelas ruas”, ressaltou Estrada.

Paranavaí quando construíram os primeiros postes para condução de energia elétrica (Foto: Reprodução)

O pioneiro admitiu que a fama da Fazenda Velha não era das melhores. “Um dia, ali em frente de onde eu morava, mataram dois”, confidenciou. A única estrada que existia naquele tempo era a que ligava a colônia ao Porto São José, o mesmo picadão para onde o capitão Telmo Ribeiro partia em direção ao Mato Grosso em busca de peões. “O Capitão Telmo tinha uma invernada onde é hoje o Jardim São Jorge”, disse o espanhol. De acordo com Estrada, no início, havia muita gente que não “prestava”. “Tinha muitos enguiços, mas decidi ficar. Coloquei um armazém pra sustentar a família”, pontuou e acrescentou que comprou uma fazenda na Brasileira e a vendeu em seguida.

O documento era a foice e o machado

Segundo o pioneiro espanhol Thomaz Estrada, o documento no período da Fazenda Velha Brasileira era a foice e o machado, ferramentas emblemáticas da colônia entre as décadas de 1930 e 1950. A verdade é que representavam mais do que instrumentos, um paradoxo semeado sob metáforas de luta, força, perseverança, injustiça, fragilidade humana e todas as agruras da colonização.

A Família Estrada viu exemplos disso tudo em Paranavaí. Enquanto o desenvolvimento trouxe mais qualidade de vida, em contrapartida, se intensificou a animosidade, até mesmo por banalidades. “Um dia na nossa loja, o Zé Capataz e o Zé Tabuinha começaram a beber. Eles puseram a faca e o revólver em cima da balança. Pedi pelo amor de Deus para que não brigassem. Daí pegaram eles e levaram pra fora. Outra vez foi o Joaquim das Éguas que tirou os briguentos daqui”, enfatizou Ana Maria Estrada.

Por muitas vezes, a pioneira passou medo no tempo da colonização. Quando o marido viajava, Ana Maria e o filho tinham de atender todos os fregueses. À época, muitas vacas dormiam em frente à casa comercial dos Estrada. “Também tinha muito mato em volta. Só foi mudando depois de 1950″, garantiu a pioneira.

Jesuítas salvaram mais de 12 mil índios caiuás

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Antonio Montoya comandou fuga que garantiu a sobrevivência dos índios do noroeste paranaense

Ruínas provam que pouco restou sobre as missões jesuíticas na região (Foto: Reprodução)

Das 13 missões espanholas fundadas pelos jesuítas na Província de Guaíra, somente as de Nossa Senhora de Loreto e de Santo Inácio Mini, nas regiões Noroeste e Oeste do Paraná, resistiram por muito tempo às investidas dos bandeirantes. Em episódio heroico, Antonio Montoya e outros missionários prepararam a fuga de mais de 12 mil índios caiuás.

Em 1628, os bandeirantes Antônio Raposo Tavares e Manuel Preto já tinham capturado milhares de índios nas imediações do Rio Tibagi, na bacia do Rio Paraná, no atual Norte do estado. No entanto, o que eles realmente queriam era um pretexto para invadir as reduções jesuíticas espanholas.

Naquele mesmo ano, um dos prisioneiros, o cacique caiuá Tataurana, capturado pelos bandeirantes Frederico de Melo, João Pedroso de Barros, Antônio Bicudo e Simão Álvares, conseguiu fugir para a Missão de Santo Antônio. Quando soube do acontecido, Raposo Tavares foi até a redução e exigiu que os missionários entregassem o índio.

Os jesuítas se recusaram, e assim os bandeirantes portugueses e paulistas decidiram invadir e destruir a redução, de acordo com o historiador Romário Martins. À época, Raposo Tavares e Manuel Preto contavam com uma guarnição de mais de três mil homens fortemente armados, o suficiente para promover a morte de mais de 15 mil índios caiuás no atual Noroeste do Paraná, antigo território espanhol.

Os indígenas capturados eram transformados em escravos. Muitos foram enviados a mando de Manuel Preto para o Sudeste e Nordeste do Brasil. A situação se tornou tão preocupante que em 1629 os missionários receberam ordens de Assunção, no Paraguai, e Madri, na Espanha, para abandonarem as reduções na Republica del Guayrá.

Os jesuítas italianos José Cataldino, Simón Mascetta e o peruano Antonio Ruiz de Montoya, que eram os responsáveis pela Missão de Nossa Senhora de Loreto e Santo Inácio Mini (atual Noroeste e Oeste do Paraná), acharam melhor acatar a ordem, já que dos mais de cem mil índios catequizados pouco mais de 12 mil escaparam do genocídio bandeirante.

Antonio Montoya foi quem idealizou a fuga dos índios Caiuás

Fuga contou com mais de 700 embarcações

À época, 11 das 13 missões jesuíticas fundadas pelos três padres foram destruídas pelos bandeirantes que invadiram a Província de Guaíra. Em suas cartas, Antonio Montoya escreveu que além de evangelizarem os índios, os padres explicavam sobre a importância da vida política, roupas, monogamia e tecnologia. Segundo Montoya, da Missão de Loreto prepararam uma fuga que contou com o empenho de sete padres, entre os quais Mascetta e Dias Tanhos.

Os índios de Loreto e Santo Inácio construíram mais de 700 embarcações, principalmente jangadas, que foram dispostas às margens do Rio Paranapanema em área que inclui os municípios de Jardim Olinda e Terra Rica. De lá, partiram antes da chegada dos bandeirantes.

Desceram do Paranapanema até o Rio Paraná, passando inclusive pelas Sete Quedas, onde perderam a maior parte das jangadas. Mesmo vítimas de inanição e de inúmeras doenças, os caiuás e os padres resistiram e chegaram a redução de Natividad del Acaray y Santa María del Iguazú, na Província de Alto Paraná, no Paraguai, onde hoje se situa Foz do Iguaçu, no Oeste do Paraná, e Ciudad Del Este, capital do Departamento de Alto Paraná.

Em março de 1632, chegaram às margens do Rio Yabebyry, atual território argentino, onde recriaram as missões de Loreto e Santo Inácio. O padre Montoya foi além e criou novas reduções desde o Rio Paraná até o Rio Uruguai, onde se situa atualmente o Rio Grande do Sul. Pouco tempo depois, o padre recebeu um convite para viajar a Madri, na Espanha, e testemunhar a favor dos índios caiuás em um tribunal que contou com a presença do Rei da Espanha, Filipe IV.

Ruínas da segunda Redução de Loreto construída às margens do Rio Yabebyry

As historiadoras paraguaias María Angélica Amable e Karina Dohmann relatam que por meio de decreto, o rei condenou os ataques dos bandeirantes e ordenou a libertação de todos os cativos. “Antes de morrer em 11 de abril de 1652, Montoya estava na Espanha e disse que não queria que seus ossos fossem enterrados entre os espanhóis, mas sim junto de seus filhos, os índios caiuás”, revelam María Angélica e Karina. O desejo de Montoya foi atendido e seus restos mortais depositados em um túmulo na segunda Missão de Nossa Senhora de Loreto, na Argentina.

Curiosidades

A segunda Missão de Nossa Senhora de Loreto, na Argentina, foi pioneira na arte de produzir e preparar a erva-mate.

Suspeita-se que lá tenha sido criada a primeira prensa literária da América Latina, de onde foram impressos um sem número de livros.

A segunda Redução de Loreto recebeu da Unesco o título de Patrimônio Mundial em 1984.

Frase do historiador Romário Martins

“Antonio Montoya, Simón Mascetta e Dias Tanhos eram figuras formidáveis que a história do cristianismo projetou, como um clarão, nos sertões meridionais do Novo Mundo, que o destino escolhera para salvar 12 mil criaturas perseguidas por toda a espécie de perigos, através da imensidão das distâncias, da inclemência dos inimigos, das precárias condições de êxodo.”

Esculpindo vidas

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Jesus Soares descobriu a identidade artística na figura dos marginalizados

Soares eterniza pessoas com quem se depara no cotidiano (Foto: David Arioch)

Em 1986, quem via o garotinho Jesus Soares esculpindo faces desconhecidas em barrancos, nem imaginava que ele se tornaria um dos grandes nomes das artes plásticas em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, com trabalhos expostos em diversos países da América Latina e Europa.

A relação de Jesus Soares com a arte começou por acaso, aos 11 anos, quando ele e os irmãos Paulo, Gílson e Adauto Soares se divertiam criando os próprios brinquedos e dando novas formas a alguns espaços. O que para a maioria era apenas um cenário ordinário e natural, na perspectiva de Jesus e seus irmãos era um universo de possibilidades de transformação.

“Uma vez vimos a capa de um livro e aquilo nos influenciou a criar algumas faces em barrancos”, conta o artista plástico Jesus Soares. O feito dos quatro irmãos pode ser interpretado como uma peculiar, mas ocasional concepção artística do Monte Rushmore, monumento rochoso situado nos EUA.

À época, ainda crianças, Jesus e os irmãos, que cultivavam uma profunda relação de amizade entre eles, produziam arte sem perceber, perdidos em uma realidade lúdica. “A gente fazia apenas porque gostava, era uma forma de divertimento”, afirma e acrescenta que encarou o próprio trabalho como arte somente a partir de 1998.

Naquele ano a artista Tânia Volpato foi até a residência do artista e se deparou com um presépio. “Quando disse a ela que fui eu quem fiz, a Tânia ficou surpresa, e eu mais ainda porque já tinha feito um monte de peças, mas nunca pensei que fossem arte”,  admite Soares, que se destaca pelo talento em criar esculturas com as mais diversas matérias-primas, como arame, madeira, resina, gesso, sisal e fibra de média densidade (MDF).

Embora já tenha manipulado muitos materiais, Jesus é mais conhecido pelas esculturas em arame, sua marca registrada. “Nessa linha de trabalho, já atendi a Fundação Cultural, Rotary, Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí [Fafipa], Universidade Paranaense [Unipar], Secretaria Municipal de Esportes e Lazer e Associação Comercial e Empresarial de Paranavaí [Aciap], além de outros”, acrescenta.

Quem conhece o trabalho de Jesus Soares, logo identifica características do realismo surgido no século XIX. É algo que se deve não ao fato do artista seguir tal tendência, mas sim ter descoberto a identidade artística na figura dos marginalizados. Soares tem o dom de eternizar pessoas com quem se depara no cotidiano, aquelas que parecem inexistir socialmente.

Algumas das obras do artista estão em exposição no corredor do Teatro Municipal (Foto: David Arioch)

Algumas das obras do artista estão em exposição no corredor do Teatro Municipal (Foto: David Arioch)

“Pra mim a escolha de um personagem a ser transformado em escultura depende muito do contexto. Além disso, quando me pedem algum trabalho sob encomenda, já me foco no tema, daí faço um esboço levando em conta questões sociais, históricas e econômicas”, revela o artista que encontra na arte de esculpir um exercício de introspecção e reflexão sobre a vida e o mundo.

É impossível mensurar quantas obras Jesus Soares já produziu, mas muitas estão espalhadas pelo Brasil, além das enviadas para exposições na Áustria, Alemanha, República Dominicana e outros países. “Há poucos dias, recebi o convite para enviar peças ao Chile”, enfatiza o artista.

Material embutido de significados

A escolha do material para se trabalhar a confecção de cada peça carrega alguns significados. Um exemplo são três obras criadas pelo artista sob influência de Guernica, pintura de Pablo Picasso. “Foi uma encomenda que me fizeram em Amaporã. Selecionei três personagens do quadro e criei as peças”, conta.

Em uma das obras recheadas de crítica social, é possível ver uma criança no colo da mãe. O bebê em óbito foi idealizado a partir de uma minúscula colher. Levando em conta o contexto da guerra, principalmente os bombardeios alemães a pequena cidade espanhola de Guernica em 1937, Soares usou o talher para destacar uma metáfora; a infância perdida como sobremesa germânica.

O artista plástico, que também trabalha com cenografia em parceria com os irmãos Paulo e Adauto Soares, está sempre atendendo pedidos de novas encomendas. “Pra ter uma ideia, recentemente fiz cenários para a peça ‘As Aves’, do Grupo de Teatro da Unipar, também criei três obras em MDF e ainda preciso entregar mais de 300”, assinala o artista que cobra de R$ 35 a R$ 150 por peças de 35 a 50 centímetros.

Serviço

Para entrar em contato com o artista plástico Jesus Soares, basta ligar para (44) 8806-9585.

O dom de talhar a madeira

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Olegário aperfeiçoou as habilidades como carpinteiro e se tornou um mestre em talhar madeira

Artesão é especialista em esculturas de madeira (Foto: David Arioch)

Artesão é especialista em esculturas de madeira (Foto: David Arioch)

Há 28 anos, Olegário José dos Santos, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, aproveitou as habilidades como carpinteiro para reproduzir uma obra de arte. O resultado foi tão positivo que desde então se dedica a criar placas, quadros e esculturas, peças que já foram comercializadas em muitos estados do Brasil e em outros países.

Tudo começou em 1981, quando “Seu Olegário” trabalhava como mestre de obras e marceneiro. À época, a habilidade em talhar madeira despertou no artista o desejo de fazer algo mais do que criar apenas produtos funcionais. “Vi um trabalho e decidi produzir também. Comecei a fazer esculturas e não parei mais. Tem peças minhas nos Estados Unidos, Japão, França, Espanha, Argentina, Costa Rica e Portugal”, diz o artesão em tom de orgulho.

Houve um período em que Santos participava de feiras agropecuárias com o intuito de divulgar e também comercializar as peças que produzia. “Em exposições no Paraná e São Paulo, eu vendia pelo menos 10 placas para fazenda e ainda levava trabalho pra casa. A procura era grande”, explica o artista plástico que já participou de exposições agropecuárias em Paranavaí, Maringá, Umuarama, Londrina, Foz do Iguaçu, Santo Antônio da Platina, Wenceslau Braz, Maringá, Ourinhos, Votuporanga, Presidente Prudente e Assis. Santos também vendeu muitas peças no litoral de Santa Catarina, principalmente pequenos artigos.

Independente do tamanho da obra, seja um chaveirinho feito na hora e vendido por R$ 4 ou um altar de R$ 7 mil que levou 90 dias para ser produzido, a verdade é que depois do trabalho concluído sempre surge o momento de fruição. “Sinto prazer em criar qualquer coisa”, enfatiza Seu Olegário que preza pela riqueza de detalhes. O perfeccionismo está embutido em cada uma de suas esculturas; nas formas e nas curvas que tiram do anonimato pedaços de cedro e cerejeira que provavelmente seriam transformados em produtos em série, como móveis.

Olegário dos Santos: “Sinto prazer em criar qualquer coisa” (Foto: David Arioch)

Olegário dos Santos: “Sinto prazer em criar qualquer coisa” (Foto: David Arioch)

“São ótimas madeiras para o trabalho que desenvolvo. Só uso outros tipos para fazer placas de fazenda”, informa e acrescenta que a cerejeira é trazida de Rondônia. Uma das especialidades de Seu Olegário é a criação de esculturas de imagens de santos, talento que combina com o sobrenome do artista. “Tenho algumas obras disponíveis para venda. São réplicas de São Expedito, São José, São Paulo e Nossa Senhora Aparecida”, destaca o escultor que está sempre aberto a encomendas e comercializa esculturas pelos mais diversos preços. Quem quiser conhecer de perto o trabalho do artista, pode vistar o seu atelier na Avenida Heitor Alencar Furtado, em frente ao trevo de acesso à Vila Operária.

Saiba mais

Cada escultura leva em média 30 dias para ficar pronta e um quadro é concluído em quatro dias.

O artista plástico Olegário José dos Santos também pode ser encontrado na Rua Augusto Fabretti, 877 –  Jardim Alvorada do Sul, Paranavaí. Ou pelo telefone: (44) 3423-4633