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O poder de identificação de Louie
Série de Louie C.K. surpreende ao mostrar um comediante como uma pessoa comum
Há três anos, eu estava procurando uma nova série de comédia e me surpreendi com o que encontrei. Quando li a sinopse pela primeira vez, admito que hesitei, até porque hoje em dia é difícil pensar logo de cara em originalidade ou criatividade quando falamos sobre sitcoms protagonizadas por comediantes de stand up. Ainda mais se você passou a adolescência assistindo séries como Seinfeld, The Cosby Show, The Bob Newhart Show, Home Improvement, Roseanne e só pra citar um exemplo até recente – Everybody Loves Raymond. São programas feitos por artistas que marcaram a história da TV norte-americana ao migrarem das casas de shows para as comédias de situação.
Fizeram a diferença, incrementaram e foram copiados até mesmo por comediantes brasileiros que só não admitem isso porque sabem que a maior parte da população brasileira desconhece esses programas. Mas voltando ao principal, a série que me chamou a atenção é Louie, sobre o estilo de vida e o cotidiano de um comediante de quem eu jamais tinha ouvido falar até 2011. Acho que passei cerca de três meses adiando até o dia de assistir ao primeiro episódio.
Me arrependi de não ter assistido antes. A abreviação do nome do comediante, Louis C.K., é uma brincadeira com o sobrenome húngaro Székely que em português significa guarda da fronteira. É uma palavra até curiosa se levar em conta que Louie, como é mais conhecido, é um estadunidense de origem mexicana com um sobrenome magyar. Além de protagonizar a série lançada em 2010, C.K. é o criador, roteirista e diretor desse programa que se tornou uma das melhores aquisições do canal FX dos últimos anos.
Quando comecei a assistir a primeira temporada da série em 2011, um ano após o lançamento, o primeiro elemento que me chamou a atenção foi a estrutura de obra audiovisual independente e intimista. É interessante ver uma abertura de série em que o protagonista passa despercebido pelas ruas de Nova York, a meca do stand up comedy, em direção a uma pequena casa de shows, um ambiente que moldou e transformou Louie em quem ele é hoje.
O programa foge da glamourização e realça fatos pouco conhecidos sobre o vasto universo do stand up comedy nos Estados Unidos. Usa a ironia para instigar risos e reflexões sobre uma parcela da realidade do universo do entretenimento norte-americano. Na série, Louie não é celebrado como um comediante de sucesso. Muito pelo contrário. Também é um sujeito reservado e bem solitário quando não está acompanhado das duas filhas.
Há situações em que nem mesmo é respeitado. Por um lado, é uma forma de entrar em concordância com uma proposta peculiar de humor negro e satirização. Por outro, evidencia com certa pessoalidade as dificuldades vividas por centenas de comediantes que apenas lutam para se manter na ativa, sobreviver e garantir o sustento familiar.
S.K. é alvo das suas próprias piadas e das casualidades do cotidiano. Exemplos são os momentos em que é sacaneado por adolescentes e até por prestadores de serviços do prédio onde mora. Quem assiste Louie, percebe que o humor e o riso estão acima de tudo; são prioritários. Se necessário, o autor é capaz de desconstruir a própria imagem para surpreender o público, até porque o ser humano, independente de qualquer coisa, é suscetível à metamorfose. No programa, Louie C.K. se coloca numa posição de homem comum que simplesmente tem como diferencial o fato de ter escolhido trabalhar com a comédia. Tanto que assim como em qualquer profissão vive situações em que é enganado e passado para trás pelas pessoas com quem se relaciona, inclusive colegas de trabalho.
Logo na primeira temporada, Louie brinca que trilhou esse caminho porque provavelmente não saberia fazer outra coisa da vida. A hipocrisia é um tema recorrente nas piadas do comediante e agrada porque não recai na obviedade. Quando decide ser mais crítico e ácido, se volta para as consequências do capitalismo, hipermodernidade, excessos de urbanização, fobias sociais, paroxismos, estereótipos, falhas do american way of life, xenofobia e preconceito contra imigrantes e minorias étnicas. Aborda com criatividade singular a indiferença, apatia, ausência de sensibilidade e de solidariedade.
Em menos de 23 minutos, e ao melhor estilo single-camera, Louie consegue fazer o espectador viajar por situações corriqueiras e insólitas que o fazem rir e refletir sobre as mais simples e imprevisíveis razões. Em uma das cenas de um episódio, o protagonista brinca com a inevitabilidade de envelhecer ao citar um aniversário em que confundiu a própria idade. Em outra, explora uma situação de intimidade com uma garota que tinha fetiche por homens velhos. Para o comediante, não há matéria-prima mais rica do que a própria condição existencial e as experiências do cotidiano.
Na série, o ato de fazer piada de si mesmo não tem uma conotação pejorativa, desrespeitosa ou apelativa. Na realidade, revela uma certa maturidade e até capacidade de aceitação. Quem o faz com sabedoria demonstra autoconhecimento e mais flexibilidade para encarar as dificuldades cotidianas, principalmente se tratando de relações sociais, sejam casuais ou não.
Até uma desconfortável dor nas costas entra para o script de uma cena em que a realidade flerta com o seu potencial inventivo. A situação faz rir porque explora uma perspectiva fantasiosa de um diálogo entre médico e paciente. Na ocasião, o comediante busca amenizar o seu problema. Em vez de apresentar uma solução plausível, o médico diz que o jeito é Louie começar a se locomover na horizontal, já que o homem não foi feito para andar em pé. Cenas como essa fazem parte de uma proposta de humor surreal, baseado na imprevisibilidade. A intenção é subverter as expectativas do público.
Outro exemplo pode ser visto nos minutos iniciais de Back, o primeiro episódio da quarta temporada, iniciada no dia 5 de maio, em que garis passam em frente ao prédio do comediante recolhendo o lixo. Louie não consegue dormir com o barulho. Para piorar, o nível de desconforto sofre uma gradação acelerada. Assim o autor e protagonista explora uma situação de identificação. Ou seja, qualquer espectador já deve ter vivido um momento em que queria dormir, mas o barulho nas imediações era tão incômodo que se tornava cada vez mais extenuante com o passar do tempo.
Louie usa o humor surreal como intensificador. Logo os lixeiros começam a arremessar as latas de lixo e também a batê-las no chão. Quando o espectador pensa que aquele é o ápice da cena, ele é surpreendido de novo. Dessa vez, com a imagem dos garis chutando a janela do comediante, que não fica nos andares mais baixos do edifício, recolhendo objetos do seu quarto, batendo lata e pulando em sua cama. A ideia é materializar a sensação de perturbação através do surrealismo. Afinal, quem nunca pensou em algo como: “Putz, que barulheira! Parece até que estão aqui no quarto comigo!”
A graça está no fato de que Louie C.K. não se coloca numa posição de comediante de aceitação universal, o que deixa tudo mais engraçado. No episódio Model, da quarta temporada, ele é convidado por Jerry Seinfeld, que também aparece na terceira temporada, para fazer uma breve apresentação em um evento beneficente. Em vez de tentar agradar a um público formado por multimilionários, ele faz piada deles, arrancando risos apenas de uma mulher da plateia. Surge uma situação tão desconfortável quanto cômica.
Louie é tão leve quanto denso, reflexo da sua formação heterogênea como um comediante que além de voyeurista por natureza não esconde suas influências que incluem George Carlin, Richard Pryor, Bill Cosby, Steve Martin, Robert Downey e Jerry Seinfeld. Como a maior riqueza do programa são os diálogos, fica impossível não notar as referências a Woody Allen, o que também se estende à qualidade estética minimalista e trilha sonora, já que tanto o cineasta quanto o comediante partilham do mesmo amor pelo jazz, um recurso que reforça o simbolismo nova-iorquino.
Lou Ferrigno, de vítima de bullying a campeão de fisiculturismo
Stand Tall, mais do que uma versão Pumping Iron do ítalo-americano
Embora muitos digam que o ex-fisiculturista e ator Lou Ferrigno foi ofuscado por muito tempo pelo também ator e ex-fisiculturista Arnold Schwarzenegger, a verdade é que o primeiro filme estrelado pela dupla, o documentário Pumping Iron, de 1977, de Robert Fiore e George Butler, serviu para alavancar ainda mais a carreira do ítalo-americano, mesmo que a película tenha se pautado mais na carreira e personalidade de Arnie.
Exemplos não faltam. Após o lançamento de Pumping Iron, Lou Ferrigno estrelou o filme The Incredible Hulk, seguido pela série homônima de sucesso que foi ao ar pela CBS até 1982. Depois, Ferrigno foi protagonista de The Incredible Hulk Returns, de 1988; The Trial of the Incredible Hulk, de 1989; e The Death of the Incredible Hulk, de 1990. Ainda trabalhando com a sétima arte, interpretou o mitológico Hércules em 1983 e 1984, além de Sinbad of the Seven Seas em 1989.
Dos anos 1990 para cá, o fisiculturista aposentado teve poucas participações no cinema e na TV. Os trabalhos mais populares incluem a voz do Hulk nos remakes mais recentes e muitas dublagens para os desenhos animados da Marvel. No Brasil, o filme Stand Tall, de 1996, do cineasta Mark Nalley, é desconhecido da maior parte do público aficionado por musculação e fisiculturismo.
Curiosamente, é o único que mostra quem é e quem foi o maior adversário de Arnold Schwarzenegger no antológico Mr. Olympia de 1975. Ainda assim, é preciso ressaltar que talvez por ser um docudrama com caráter de tributo ou homenagem, Stand Tall omite informações sobre o final da carreira de Ferrigno como bodybuilder, quando amargou em 1992 e 1993 as posições de 12º e 10º colocado.
O filme de Mark Nalley tem boa estrutura, em acordo com uma proposição humanista que visa despertar a identificação do público com um dos maiores ícones da era de ouro do bodybuilding. Na obra, Louis Jude Ferrigno é uma criança do Brooklyn, em Nova York, que aos três anos é diagnosticada com surdez causada por uma infecção. Restando apenas 15% da audição, o jovem Ferrigno cresce retraído. As cenas sobre a infância difícil do atleta são apresentadas em forma de vídeos caseiros registrados no final dos anos 1950.
Vítima constante de bullying, apenas anos mais tarde consegue ouvir e falar com clareza. São emocionantes as cenas de Lou contando como foi ridicularizado na infância por ser um garoto magricela surdo-mudo. Mas tudo começa a mudar aos 13 anos, quando descobre o fisiculturismo como forma de superar a timidez e a baixa autoestima. O amor pela modalidade é quase instantâneo, tanto que Ferrigno trabalhava como engraxate para comprar revistas de musculação.
Um dos momentos mais inesquecíveis de Stand Tall surge quando o ex-fisiculturista lembra dos episódios em que disse aos seus clientes que se tornaria um campeão mundial de bodybuilding. A narrativa vigorosa e a construção clara e objetiva do filme conquistam a atenção do espectador. Mesmo quem não gosta de musculação ou fisiculturismo começa a entender e respeitar a complexidade e o rigor da construção corporal, seja em nível competitivo ou não.
O filme que conta a história de superação do ítalo-americano também tem algumas semelhanças com Pumping Iron. No clássico de 1977 o adversário que o protagonista Arnold Schwarzenegger precisa superar é Lou. Já em Stand Tall, Ferrigno, com mais de 40 anos, tem de vencer o veterano Boyer Coe. A obra que levou um ano e meio para ser produzida tem bom material de pesquisa e apresenta entrevistas com familiares e amigos de Lou, além de Arnold, o maior ídolo do fisiculturismo.
Nalley quase desistiu de ter Schwarzenegger no filme por causa das dificuldades em convencê-lo a participar. Para o bem do cineasta, as regulares insistências garantiram um final feliz. Em troca da participação, Arnie pediu apenas uma caixa de charutos. “Sabíamos como seria determinante para o filme ter alguém famoso como o Arnold”, diz o cineasta Mark Nalley que precisou se desdobrar com um orçamento modesto de 200 mil dólares, considerado minúsculo para os padrões estadunidenses. Uma das poucas queixas sobre o filme diz respeito a iluminação. Há algumas cenas escuras que denunciam uma certa falta de cuidado e de recursos da produção.
Felizmente, nada disso é o suficiente para ofuscar o brilho do documentário sobre um dos atletas mais importantes da história do fisiculturismo. Se tratando de estatura física, Ferrigno, que tinha 1,96m e 130 quilos, ultrapassou os padrões do bodybuilding profissional e conquistou dois títulos de Mr. Universo em 1973 e 1974, além de uma terceira colocação no Mr. Olympia de 1975. Em síntese, Stand Tall é um filme feito para todos os seres humanos, amantes ou não de atividade física resistida. “Ele tinha tudo. Boas costas, bons ombros e sabia como posar”, comenta um admirador do atleta no filme.
Fazendo a diferença em Ruanda
Violette Mutegwamaso, a mulher que superou uma guerra civil e o brutal assassinato do marido
Em 1994, milícias armadas entraram em conflito em Ruanda, na região dos Grandes Lagos da África. Pessoas de etnias hutu e tutsi tornaram-se inimigos mortais, se enfrentando pelas ruas à luz do dia. A motivação foi o desvio de recursos que deveriam ser utilizados para a reestruturação do país. Com a expansão do caos, iniciado na capital Kigali, 250 mil pessoas foram mortas. Ainda assim, muita gente acreditava que estava livre das zonas de guerra civil. Um exemplo era a dona de casa Violette Mutegwamaso que cuidava dos filhos enquanto o marido trabalhava na capital, a três horas de distância de Gahini, a pacata aldeia onde a família sempre viveu.
“Quando percebi que a guerra já estava ao lado, peguei meus dois filhos nos braços e fugi para a igreja mais próxima. Pensei que encontraria um santuário de paz. Na realidade, entrei em um pesadelo”, lembra. Atacados por uma milícia munida de facões e armas de fogo, muitos moradores de Gahini caíram mortos dentro da igreja. Para sobreviver, Violette deitou-se em um corredor e lambuzou os corpos dos filhos e o próprio com sangue para evitar que os agressores os matassem.
“Nos escondemos entre os cadáveres e nos fingimos de mortos. Ficamos naquela igreja por uma semana até que o exército ruandense apareceu para libertar a área”, conta. No episódio, sobreviveram apenas 20 pessoas dentre os mais de 700 escondidos no templo religioso. O marido de Violette não teve a mesma sorte. Foi brutalmente assassinado quando retornava para casa depois de mais um dia de trabalho.
A dona de casa se viu obrigada a assumir sozinha a criação do filho Eric, de cinco anos, e Angelique, de quatro anos. Demonstrando muita força, Violette ainda cuidou de um órfão que perdeu a família inteira na guerra. “Não tive quase apoio, mas tentei reconstruir a vida cultivando as terras de outras pessoas. O que ganhava não dava para alimentar a mim e meus filhos. Também não conseguia pagar a escola, comprar remédios e roupas. Foi muito difícil”, admite em tom emocionado.
Dez anos depois, Violette ouviu falar de um programa internacional de patrocínio para mulheres. Sem nada a perder, se matriculou e ganhou uma ajuda da estadunidense Liz Hammer, uma mãe de dois filhos comprometida em repassar 30 dólares por mês ao longo de um ano. A quantia que partia de Boston pode parecer ínfima para muita gente, mas Violette soube fazer a diferença com tão pouco.
Usou o dinheiro para investir em cerveja de sorgo. “Cheguei a produzir uma tonelada e meia do cereal. Ainda assim, a demanda era tão grande que tive de comprar sorgo de outros agricultores”, explica. De modo artesanal, Violette Mutegwamaso preparava de 150 a 180 litros de cerveja a cada três dias, lucrando cerca de 50 dólares por lote.
Com o dinheiro da bebida, investiu no plantio de feijão. Além de garantir alimento para a família, também conquistou uma nova fonte de renda. “Se o preço está alto, vendo o feijão para os vizinhos. Já quando cai, repasso no atacado para lojas e restaurantes”, revela. Enquanto a maior parte da população de Ruanda tinha uma renda mensal familiar de 260 dólares, segundo dados do Banco Mundial, Violette, superando todas as expectativas, já conseguia faturar 1,8 mil dólares com a safra de feijão.
Mais tarde, ampliou ainda mais os negócios e contratou trabalhadoras locais para atuar no campo e no gerenciamento das atividades. Preocupada com a comunidade, fez um empréstimo bancário para instalar uma tubulação de água na aldeia, evitando que as mulheres tivessem de andar por horas até achar uma torneira. “Vivemos em um país onde apenas 20% das pessoas tem acesso à água potável, então muitas mulheres são obrigadas a carregar jarros pesados por longas distâncias”, desabafa.
Hoje, Violette Mutegwamaso é presidente de uma cooperativa de artesanato. Dentre os produtos mais populares está a cesta de paz que faz parte da cultura ruandense e normalmente é comprada para presentear a noiva e o noivo no dia do casamento. “Também vendemos bastante cerâmica e artigos de crochê. Fico feliz por reunir na mesma cooperativa mulheres de origem hutu, tutsi e twa. Elas sentam lado a lado para tecer fibras de sisal com técnicas tradicionais de desenho”, afirma Violette.
A cooperativa tirou da miséria muitas vítimas do genocídio e até mesmo pessoas que assumiram a autoria dos mais chocantes homicídios cometidos durante a Guerra Civil de Ruanda. “Se perdoei o assassino do meu marido por que não aceitaria aqueles que cometeram outros crimes?”, questiona, incitando reflexão.
O brasileiro e o suposto atentado da Maratona de Boston
O brasileiro precisa refletir mais com urgência
Tenho acompanhado de acordo com minhas possibilidades o suposto atentado da Maratona de Boston e com base em tudo que li até hoje, até mesmo por parte de estadunidenses e outros estrangeiros, ouso dizer que o brasileiro mediano consegue ser extremamente medíocre quando se trata da falta de análise crítica e profunda dos fatos. Que falta de bom senso e mínima capacidade reflexiva é essa que faz as pessoas acreditarem em qualquer informação divulgada pelos meios de comunicação mainstream de países de “Primeiro Mundo”?
Nem mesmo quem mora nessas nações costuma simplesmente absorver essas informações como se fosse apenas uma mera esponja, um receptáculo de pseudo-elucubrações. E ainda com conteúdo reproduzido copiosamente e com uma conivência surreal dos veículos de imprensa do Brasil que tratam os EUA como se fossem um país exemplar, o que não é. Claro, muitas vezes, a grana que os sustenta costuma vir de lá, principalmente de conglomerados comandados por magnatas sionistas. Curioso que os acusados do atentado em Boston são muçulmanos tchetchenos, não? Para citar um exemplo, o que será que Rupert Murdoch pensa a respeito do assunto?
Afinal, todo estadunidense sabe que recentemente ele tentou assumir o controle de toda a grande mídia dos EUA, o que só não foi possível por causa das limitações legais do oligopólio midiático. Claro, e não posso deixar de mencionar que esse mesmo líder das comunicações é um dos maiores incentivadores do Estado de Israel, inclusive financiando ações do governo que partem de Tel Aviv e Jerusalém.
Por que quando um meio de comunicação de um país pobre, subdesenvolvido ou que vive um sério conflito civil divulga algo sempre há brasileiros colocando em xeque o conteúdo, mesmo sem entender do que se trata? E ainda em um tom de superioridade que demonstra uma severa incapacidade de autorreflexão, para não dizer uma inclinação mais do que obtusa e falseada do pensamento “americanizado”.
Eu não diria que o brasileiro desinformado costuma ser apolítico, ele consegue ser pior que isso. Não se importa em aceitar tudo que lê sem questionar – e quando o faz prefere ser jactante e frívolo. Assuntos complexos envolvem sim abstração de raciocínio e exigem boa bagagem cultural. Criticidade e bom senso parte do princípio de que tudo que você lê deve ser avaliado cuidadosamente como um cardápio de restaurante. Ou seja, é imprescindível descartar aquilo que não faz bem ao nosso organismo.
Sinto vergonha ao ver tantos brasileiros reverenciando os EUA por terem encontrado os supostos acusados do atentado de Boston no dito tempo recorde. Há “leitores” dizendo que isso deveria servir de exemplo ao Brasil. E pior, vejo brasileiros divagando na superficialidade, admirando as fardas dos estadunidenses responsáveis pelo assassinato do jovem Tamerlan Tsarnaev (quando ainda era um suspeito, não um criminoso). Dizem que é algo que impõe mais postura e respeito. Vestimenta agora é uma alusão ao senso de justiça?
Se eu não for preguiçoso e quiser saber sobre o que realmente está acontecendo nos EUA, prefiro buscar informações e discutir sobre o assunto com pessoas que acompanham a mídia considerada independente, seja nacional ou internacional – formadores de opinião que não sejam de extrema direita nem esquerdistas radicais. E claro, sempre partindo da base de que em menor ou maior proporção os livros continuam sendo a melhor fonte de informação para entender esse tipo de situação.
Ainda considero Noam Chomsky uma importante referência para compreender as problemáticas mais extenuantes da Terra do Tio Sam – seja com relação a conflitos internos e relações internacionais. Outros nomes interessantes que posso citar por ora e do próprio EUA são Benedict Anderson, Bruce Bueno de Mesquita, Norman Finkelstein e Harold Lasswell.
Não sou Anti-EUA, muito pelo contrário, admiro muito a arte produzida por eles, mas simpatizo pouco com o sistema político daquele país e principalmente com os meios de comunicação “mais populares” que estão sempre inclinados sobre si mesmos – como se o mundo se projetasse ao redor da “América”.
Era uma vez um sonho americano
Down By Law, confinados a uma realidade marginal
Lançado em 1986, Down By Law, do estadunidense Jim Jarmusch, consagrado nome do cinema independente, conta a história de três detentos alheios ao sonho americano. Mesmo sem perspectiva de futuro, eles conseguem fugir, mas fora da cadeia se dão conta de que continuam presos, confinados a uma realidade marginal.
Zack (Tom Waits) e Jack (John Lurie) são dois personagens condenados a prisão por crimes que não cometeram, embora ganhem a vida praticando atividades ilícitas. Enviados para a mesma cela, os dois se evitam como se fossem pessoas antagônicas. Mas a verdade é oposta. Não se gostam por serem semelhantes; um parece refletir a imagem do outro. A convivência é difícil, inclusive o diretor Jim Jarmusch explora a situação com tomadas longas e uma fotografia em preto e branco que privilegia tons mais escuros.
Aos poucos, a história toma outro rumo, até estético. Os diálogos se tornam mais densos e as cenas mais curtas com a chegada do detento Roberto (Roberto Benigni), um verborrágico imigrante italiano, mas bem humorado, que leva luz e vida ao mórbido e opaco ambiente. A princípio, Zack e Jack tentam evitá-lo. Entretanto, cedem quando Roberto afirma ter um plano para fugirem da prisão. Dos três, o único que realmente foi preso por um crime que cometeu é o italiano. Jarmusch destaca a subjetividade e o paradoxo ao mostrar um homicida ingênuo enquanto os outros dois condenados, mesmo inocentes, personificam o estereótipo de um criminoso.
O cineasta mostra a incomunicabilidade com uma peculiaridade assombrosa. Bob, que mal sabe falar inglês, é efusivo e raramente fica em silêncio. Já Zack e Jack, autênticos estadunidenses, têm dificuldades de se relacionarem. No decorrer da trama, o imigrante italiano, admirador da cultura norte-americana, consegue uma esposa. Jarmusch faz o espectador crer que o abestalhado Roberto encontrou um “lar” na América, quem sabe a concretização particular do american way of life. Em contraponto, os dois americanos da Louisiana continuam vivendo nos EUA como se fossem estrangeiros; vagam em rumo de um objetivo existencial.
Uma das cenas mais impactantes de Down By Law surge quando os três criminosos encontram uma casa durante a fuga. No interior, Jim Jarmusch recria o ambiente de uma cela, com beliches típicos de penitenciárias e colchões cobertos por lençóis iguais. O objetivo é transmitir a ideia de que mesmo livres ainda estão presos, não a um espaço material, mas a uma condição existencial que os acompanhou por toda a vida. É uma referência a responsável por privar-lhes de sentirem-se livres – a marginalidade.
A trilha sonora do filme foi composta especialmente pelo ator, músico e artista plástico John Lurie que fez parte do grupo The Lounge Lizards, um clássico do jazz estadunidense. Outra curiosidade sobre Down By Law é que o filme venceu importantes festivais de cinema e disputou em 1986 o prêmio Palme d’Or, o mais importante do Festival de Cannes. Vale lembrar ainda que a influência da obra se estende ao cenário musical. O exemplo mais emblemático é a banda de punk-rock Down By Law, muito famosa nos EUA e que já se apresentou no Brasil algumas vezes.
Os zumbis de Romero
Night of the Living Dead, o primeiro filme de horror como crítica social
Lançado em 1968, Night of the Living Dead (A Noite dos Mortos-Vivos) é um filme cult de horror do cineasta estadunidense George Romero que apresenta uma crítica social a partir das deficiências de caráter do ser humano em situações de risco.
Em Night of the Living Dead, os mortos voltam à vida por causa da radiação de um meteorito do planeta Vênus. Cientes de que os zumbis se alimentam de carne humana, os vivos fogem em busca de abrigo. A antropofagia no filme é tão direta quanto simbólica; representa a autodestruição do homem e a anulação do que cada um representa na individualidade.
Na obra, alguns sobreviventes se refugiam em um casebre localizado na área rural de Pittsburgh, na Pensilvânia. A partir do confinamento, Romero apresenta a vileza humana através de ações de egoísmo e autopreservação. Em vez de se unirem para tentarem se livrar dos zumbis, os personagens brigam entre si, ampliando o caos em um universo racional, onde o intelecto deveria ser dominante.
O mais curioso é que paralelo a isso, os mortos-vivos que estão fora da residência, mesmo privados de suas funções cerebrais, representando de forma peculiar a essência primitiva e livre do homem aquém dos princípios sociais, agem coletivamente, como uma infantaria. Em Night of the Living Dead, Romero também confronta o preconceito racial ao destinar o papel mais importante do filme a Ben (Duane Jones), um jovem negro que ao contrário dos brancos da história é o personagem mais lúcido, coerente e perspicaz. Há ainda uma cena que faz referência ao ativista Martin Luther King Jr.
Outro destaque é a previsão quase profética do cineasta ao mostrar a submissão do homem diante da tecnologia. Um grande exemplo é a cena em que os abrigados parecem reféns de um televisor, aparelho usado para preservar algum tipo de relação com o mundo exterior. Aí subsiste uma ironia, pois a TV já era encarada como um instrumento de reafirmação coletiva, condicionamento e uniformidade reflexiva.
Um dos precursores da zombie culture, Night of the Living Dead influenciou centenas de filmes, além de séries televisivas. O clássico está entre os melhores de todos os tempos nas mais importantes listas de grandes obras de horror. É considerado o expoente do splatter film, subgênero que tem como principal característica a violência gráfica que por meio de efeitos especiais ressalta a vulnerabilidade do corpo humano e a teatralização da mutilação.
Embora não se enquadre tanto como splatter film quanto Dawn of the Dead, lançado por Romero em 1978, Night of the Living Dead é um marco e serviu de base para os subgêneros exploitation e slasher. O primeiro diz respeito aos filmes de apelo visual e baixo orçamento. O segundo se refere as obras ao melhor estilo “serial killer à solta”, como os sucessos Halloween, de John Carpenter; Friday The 13th, de Sean S. Cunningham; e Nightmare on Elm Street, de Wes Craven.
Até hoje, Night of the Living Dead surpreende pelo custo de produção de U$ 114 mil, o que garantiu um lucro de U$ 30 milhões em todo o mundo. Em seu livro, Planks of Reason – Essays on the Horror Film, de 2004, o pesquisador estadunidense Barry Keith Grant, define o clássico de Romero como um divisor que transformou o cinema independente norte-americano e apresentou uma fórmula de sucesso aos muitos cineastas que enveredaram pelo horror nos anos 1970 e 1980.
Fábula sobre um mundo iluminado
A história de um jovem que viaja em busca de memórias familiares
Em 2005, o filme Everything is Illuminated, que no Brasil foi lançado com o título Uma Vida Iluminada, marcou a estreia do ator estadunidense Liev Schreiber como cineasta. A obra é um road movie sobre um jovem que viaja para o Leste Europeu em busca da mulher que salvou seu avô na Segunda Guerra Mundial.
Jonathan Safran Foer, interpretado pelo estadunidense Elijah Wood, conhecido por filmes como The Lord of the Rings, Hooligans e Sin City, é um emotivo colecionador de objetos comuns e incomuns como embalagens vazias, selos, xícaras de chá, fotos, cartões, dentaduras, terras, insetos e lembranças familiares. Logo que chega à Ucrânia, conhece o guia Alex Perchov, personagem do músico ucraniano Eugene Hütz, vocalista da banda icônica de gypsy punk Gogol Bordello que inclusive assina a trilha sonora do filme.
Perchov, que se veste como um rapper negro, personificando das mais diversas formas a globalização, se diz especialista na descoberta de heranças culturais e lidera uma equipe formada por ele, o avô mal-humorado (Boris Leskin) que se considera cego e o demente cão-guia Sammy Davis Jr. Isso mesmo, uma homenagem ao icônico cantor judeu.
A bordo de um carro soviético em frangalhos, o grupo vive inúmeras aventuras pelo interior da Ucrânia. Aos poucos, a história assume um caráter de fábula reforçada não apenas pela linguagem, costumes e estranheza dos personagens, mas também pela direção de imagem de Matthew Libatique. Rica em detalhes, a fotografia do filme transcende a narrativa e convida o tempo todo o espectador a um mergulho por um universo de cores tão vívidas que remetem ao hiper-realismo.
Em Everything is Illuminated, a leveza contrasta com a intensidade e o burlesco com a beleza em sua forma mais simplificada. E mais interessante ainda, o filme tenta se distanciar de clichês e estereótipos ao abordar o holocausto da forma menos apelativa possível, evitando se somar aos muitos filmes melodramáticos que discutem o tema. Em suma, uma obra de sensibilidade, diversão e reflexão.
Curiosidade
O filme é inspirado no livro homônimo do escritor estadunidense Jonathan Safran Foer, publicado em 2002.
Book of Beards
Uma das imagens do livro “Book of Beards”, do fotógrafo estadunidense Justin James Muir. A obra reúne fotos de 86 “barbudos profissionais”, ou seja, pessoas que realmente tratam a barba como uma extensão do próprio corpo. Todos os personagens do livro são moradores de West Chester, na Pensilvânia, onde o culto à barba tem relação com a identidade cultural do município e dos moradores. Não é à toa que a cidade abriga as maiores competições de barba dos EUA.
Harold Lloyd, uma carreira sem dublês
O estadunidense Harold Lloyd é, sem dúvida, um dos melhores atores da Era do Cinema Mudo. Quando criança tive a oportunidade de conhecer um de seus filmes mais conceituados: Safety Last!, de 1923. Mais tarde, fiquei sabendo que o cara dispensava dublês.
Uma de suas cenas mais antológicas é aquela em que Lloyd aparece pendurado no ponteiro de um relógio, dando a entender que ele está no topo do Bolton Building, em Los Angeles, onde foi usado um truque de perspectiva. Mesmo com status de celebridade, se submeteu a uma cena de explosão em um de seus filmes e acabou perdendo um dos dedos da mão. Ainda assim deu continuidade a carreira sem usar dublês.
Sobre H.P. Lovecraft
O escritor estadunidense H.P. Lovecraft é uma das minhas principais referências da literatura do horror, assim como Edgar Allan Poe. Sem dúvida, o gênero deve muito a ele. O próprio cinema de terror não seria o que é hoje se não fosse pela criatividade de Lovecraft, o Mestre Cthulhu reverenciado até mesmo por uma infinidade de bandas espalhadas pelo mundo.
H.P. é um autor que faz parte de todas as fases da minha vida: infância, pré-adolescência, adolescência e fase adulta. Sem Lovecraft, não teríamos uma infinidade de obras literárias, filmes e músicas que fazem referência ao intrigante Necronomicon, O Livro dos Mortos, além de outras criações fantásticas. O preciosismo e realismo de suas obras, embora fantasiosas, há quase 90 anos estimulam pessoas de todas as partes a procurarem o Necronomicon de Abdul Alhazred, escrito em 730 d.C, de acordo com o conto “The Hound”. É uma pena que H.P. Lovecraft tenha morrido com apenas 46 anos.