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O grito dos animais por trás do grito de Edvard Munch
“Creio que quando [Edvard Munch] criou esse nome [em alemão], ele o relacionou com o grito dos animais”
O pintor norueguês Edvard Munch, precursor do expressionismo alemão, conquistou fama mundial com a sua obra-prima Skrik (O Grito), de 1893, considerada uma das mais importantes pinturas da história do expressionismo. Embora muita gente associe a obra à angústia e decepção em sua vida pessoal, a verdade é que existe muito mais por trás dessa pintura que se tornou o símbolo internacional da ansiedade.
Em “O Grito”, que mais tarde recebeu versões de Andy Warhol e Gary Larson, um corpo contorcido, um rosto esticado e uma boca oblonga e aberta tem ao fundo duas pessoas conversando, possíveis amigos de Munch. Acredita-se que as cores mais vívidas tenham sido inspiradas pelos matizes impetuosos do céu europeu durante a erupção do vulcão Krakatoa em 1883.
Há quem diga que a pintura é uma manifestação das insatisfações de Munch no amor e na amizade. Porém, declarações de artistas conceituados e pesquisas mais aprofundadas trazem informações reveladoras. Um exemplo é o livro “Edvard Munch: Behind the Scream”, da inglesa Sue Prideaux, publicado pela Yale University Press em 2005.
A escritora e pesquisadora da obra e vida do pintor norueguês confirma que a cena de “O Grito” foi baseada em um lugar na Colina de Ekeberg, um bairro de Oslo, na Noruega. A inspiração veio de uma memória de quando ele caminhava ao pôr-do-sol em companhia de dois amigos.
Segundo informações que Sue transcreveu do próprio diário de Edvard Munch, o pintor sentiu-se exaurido e parou para descansar, encostando na grade retratada na pintura. Também sofrendo de ansiedade, problema crônico que sempre o acompanhara, ouviu sons que pareciam vir diretamente da natureza. Eram gritos de animais sendo mortos em um matadouro perto de um hospício. Os sons perturbadores se misturaram ao choro dos pacientes internados em um manicômio onde sua irmã era uma das internas.
Na pintura, ao fundo, a paisagem esmaecida da Colina de Ekeberg, que proporciona uma túrbida perspectiva, deu a tônica do estado emocional de Munch transformado em protagonista. A inquietação do personagem combinou a agitação interna e externa de tudo que o pintor vivenciou na caminhada em companhia dos dois amigos. Ele também chamava sua pintura de Der Schrei der Natur (O Grito da Natureza), nome alemão que deu à obra.
“A experiência foi muito perturbadora para ele quando atravessou aquela ponte. Creio que quando [Edvard Munch] criou esse nome [em alemão], ele o relacionou com o grito dos animais. Acho que se abrirmos nossos corações para esse grito, os animais estão falando através de si mesmos”, interpreta a artista britânica Sue Coe, deixando subentendido que Munch provavelmente tinha grande aptidão para se sensibilizar tanto com a dor humana quanto com a dor dos animais.
Saiba Mais
Edvard Munch nasceu em Løten em 12 de dezembro de 1893 e faleceu em Ekely em 23 de janeiro de 1944.
Uma das cinco versões de “O Grito” foi vendida em um leilão por 120 milhões de dólares para um colecionador privado. As outras estão em exibição em museus ao redor do mundo.
Referências
Prideaux, Sue. Edvard Munch: Behind the Scream. Yale University Press (2005).
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Aluga-se ideologia cinematográfica
Ex-bancário mantém em Paranavaí uma videolocadora com grande acervo de filmes alternativos
Em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, a videolocadora de José de Arimateia Tavares se destaca, mesmo com a ascensão dos filmes online e de plataformas como Netflix. José de Arimateia não se limita a oferecer ao público somente filmes comerciais. Vai muito além, disponibilizando cultura e educação em DVD e Blu-ray. Em um passeio pelos expositores, geometricamente alinhados, é fácil encontrar as mais importantes correntes artísticas do cinema mundial.
Enamorado pelo cinema alternativo ou cult desde a juventude, na década de 1990 o ex-bancário conhecido como Teia decidiu abrir uma videolocadora idealizada muitos anos antes. Sua missão extracomercial e até pessoal era reunir um acervo com títulos que tanto vislumbrou assistir.
“Tentei comprar esses filmes apenas para apreciação pessoal, mas as produtoras não negociavam com quem não fosse do ramo. Então esse foi o estímulo final para que eu abrisse a locadora”, justifica José de Arimateia.
A partir de 1996, com o novo empreendimento, Teia parou de viajar até Curitiba e Londrina para alimentar o amor pela sétima arte. “Fiz isso durante 12 anos. Ia até a capital nos finais de semana e assistia pelo menos sete filmes”, conta.
O empresário se emociona ao se recordar da década de 1970, quando o cinema político do cineasta russo Sergei Eisenstein parecia tão distante da realidade de quem vivia no interior do Paraná. “Pensei que nunca assistiria ‘A Greve’, ‘Outubro’ e ‘Encouraçado Potemkin’”, frisa, referindo-se ao cinema revolucionário que contribuiu para os rumos do socialismo na Rússia.
Dentre os preferidos, José de Arimateia cita também o cinema surrealista e neorrealista do italiano Federico Fellini e os franceses Jean Renoir, expoente do realismo poético, e o controverso Jean-Luc Godard, ícone da Nouvelle Vague. Segundo o empresário, o contato com filmes tão paradoxais, convergentes e divergentes proporciona uma grande coerência de apreciação. “Automaticamente, você começa a selecionar coisas diferentes”, enfatiza.
E o que não falta na videolocadora é variedade. São mais de 700 títulos de filmes que compõem um cosmopolitismo cinematográfico atraente aos olhos de quem busca não apenas entretenimento, mas uma significativa contribuição para a formação humana.
Cinema novo, surrealista, expressionista alemão, revolucionário soviético, nouvelle vague são algumas das correntes artísticas que fazem da locadora um subjetivo reduto de estudantes universitários, artistas e intelectuais.
Dos clássicos que não atendem diretamente aos anseios da indústria cultural, Teia adianta que os mais procurados são sempre os filmes de Stanley Kubrick, Steve McQueen, Quentin Tarantino e Alfred Hitchcock.
“O ano de produção assusta quem não gosta de arte”
Para quem está acostumado apenas com lançamentos e filmes comerciais, a área cult da locadora de José de Arimateia Tavares pode até despertar atenção em um primeiro momento, mas a curiosidade não ultrapassa os limites da sinopse no estojo do DVD ou Blu-ray. “O ano de produção normalmente assusta quem não gosta de arte”, diz Teia.
Os mais relegados ao ostracismo são os filmes do cinema expressionista alemão e revolucionário soviético. O Gabinete do Dr. Caligari, por exemplo, do realizador alemão Robert Wiene, foi lançado em 1920.
“É algo que não está no âmbito das informações que muitas pessoas têm. Por isso, o cliente apenas olha, mas sem maior profundidade”, pondera José de Arimateia. O empresário atribui a surpresa dos clientes ao fato de que a locadora é a única em Paranavaí que não oferece apenas filmes comerciais.
No entanto, há clientes que valorizam o acervo da videolocadora, normalmente são jovens com pouco mais de 20 anos. “Eles procuram idealizadores como Federico Fellini e Stanley Kubrick. Isso tem relação com a formação cultural adquirida nas universidades”, avalia o empresário.
“Qualquer filme não comercial é interessante”
Como o ser humano vive sob a égide de um plano cartesiano de informações, é impossível que uma pessoa esteja atenta a todos os gêneros cinematográficos, sejam artísticos ou não. O empresário José de Arimateia Tavares admite esse fato, mas ressalta que qualquer filme de gênero não comercial já se torna interessante apenas em existir.
“Não interessa quem seja o idealizador ou qual é a proposta dele com o filme, a verdade é que ali teremos alguma novidade, algo jamais oferecido por um filme convencional”, justifica.
Para Teia, é regozijante ter uma locadora, principalmente pela oportunidade de conhecer a fundo o trabalho de cineastas brasileiros que tardiamente são valorizados. “O Fernando Meirelles é um grande cineasta e o primeiro filme dele que adquiri foi ‘Domésticas’. É uma pena que a maioria só conheça o seu trabalho em ‘Cidade de Deus’”, destaca.
O empresário também reconhece qualidade nos títulos do Cinema Novo que tem Glauber Rocha como um de seus grandes representantes. “Não tenho tanta simpatia por essa corrente cinematográfica, mas alguns filmes realmente são clássicos e de extrema qualidade”, comenta.
O interesse de Teia por filmes não comerciais não significa que ele desmereça os demais. “Não sou preconceituoso com relação a filmes. Por pior que seja o filme, assisto de ponta a ponta para reconhecer alguma qualidade”, assegura.
Alguns realizadores do cinema não convencional que podem ser encontrados na locadora do Teia
Federico Fellini, Ingmar Bergman, Stanley Kubrick, Sergei Eisenstein, Glauber Rocha, Jean-Luc Godard, Jean Renoir, Fritz Lang, Robert Wiene, Luis Buñuel, Ed Wood, Michelangelo Antonioni, Ettore Scola, Friedrich Wilhelm Murnau, Akira Kurosawa, etc.