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A importância do avião nos anos 1950

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Precariedade das vias popularizou o avião em Paranavaí

Viagens terrestres eram muito desgastantes nos anos 1950 (Foto: Reprodução)

No início dos anos 1950, o avião se transformou em um dos principais meios de transporte de Paranavaí, no Noroeste Paranaense, por causa da precariedade das vias. À época, toda semana, muitos voos partiam do antigo Aeroporto Edu Chaves, atual Colégio Estadual de Paranavaí (CEP), para os mais diversos destinos.

Hoje não há registros que informem com exatidão quantos voos eram realizados por semana em Paranavaí nos anos 1950. No entanto, estima-se que as viagens aéreas ocorriam diariamente no antigo Aeroporto Edu Chaves. “Por volta de 1953, isso já acontecia bastante. Não era assim o ano todo, mas tinha época que os aviões partiam de Paranavaí todos os dias. Era gente indo pra Londrina, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, pra todo lugar”, afirmou o pioneiro cearense João Mariano, acrescentando que os aviões eram modestos, monomotores e até bimotores, mas cumpriam muito bem o trajeto.

Por causa da precariedade das estradas que faziam o carro balançar durante todo o trajeto, levando passageiros a sentirem-se mal,  muitos optavam por viajar de avião. “Naquele tempo, o avião era muito popular, então uma viagem não era nada cara, era relativamente barata”, disse Mariano.

O padre alemão Henrique Wunderlich escreveu em uma carta à revista alemã Karmelstimmen, de Bamberg, no Estado da Baviera, publicada em 20 de maio de 1953, que se surpreendeu com a facilidade em encontrar campos de aviação na região de Paranavaí. “Normalmente o aeroporto se resumia a uma pista para pouso e outra para decolagem e tinha pouco mais de um quilômetro de comprimento”, relatou, acrescentando que onde ainda não havia um campo de aviação, logo trataram de construir.

Henrique Wunderlich teve a ideia de criar um avião

Os aeroportos se resumiam a grandes campos com gramados ou apenas barro, sempre ladeados por terrenos ondulados. Segundo Wunderlich, muita gente dependia dos aviões, inclusive os padres da Paróquia São Sebastião. “O avião era uma necessidade primária para quem precisava viajar muito”, comentou João Mariano.

Na carta à revista alemã, Frei Henrique frisou que as viagens de carro eram muito desgastantes e os longos caminhos a serem percorridos em estradas ruins eram por vezes desanimadores. “Além disso, o vento e os violentos aguaceiros já tinham dado início ao processo de erosão do solo”, revelou. Por esses motivos, e como a Paróquia São Sebastião não tinha dinheiro para investir sequer na compra de um monomotor, o padre teve a ideia de criar um avião.

Wunderlich, que também era paraquedista e piloto, frequentou a Escola de Aviação Alemã durante a Segunda Guerra Mundial e trouxe a Paranavaí um projeto de um avião. “Também quis realizar este sonho para entusiasmar o povo da cidade”, admitiu o padre que pretendia dispor o veículo à população. Infelizmente, por causa de outros compromissos, Henrique Wunderlich não teve tempo de criar o avião porque precisou retornar à Alemanha em 1957.

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Um padre de muitos talentos

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Henrique Wunderlich: padre, pintor, escultor, marceneiro e carpinteiro

Frei Henrique criou dezenas de esculturas em Paranavaí (Acervo: Ordem do Carmo)

O frei alemão Henrique Wunderlich viveu em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, apenas cinco anos, mas foi tempo o suficiente para deixar marcas indeléveis na cultura e história local, a partir de seus trabalhos com pinturas, esculturas, marcenaria e carpintaria.

Hartwig Wunderlich, conhecido como Frei Henrique, chegou a Paranavaí em setembro de 1952 para prestar assistência ao padre alemão Ulrico Goevert, responsável pela paróquia local, que em maio do mesmo ano recebeu autorização do bispo para fundar a igreja matriz.  “Frei Henrique não era somente um padre, mas também excelente escultor, marceneiro e carpinteiro”, afirmou Goevert em publicação à revista alemã Karmelstimmen na década de 1950.

Wunderlich começou a mostrar suas qualidades artísticas em Paranavaí ajudando na construção da primeira Igreja São Sebastião, principalmente o altar-mor. À época, os dois padres tiveram de se desdobrar em engenheiros porque em Paranavaí não havia profissionais da área. O que exigiu bastante cautela, pois naquele tempo muitas igrejas tinham desmoronado na primeira tempestade, após construídas nas proporções erradas.

Frei Ulrico lembrou que não demorou para a igreja ficar pronta, apesar do árduo trabalho. Pouco tempo depois, Frei Henrique começou a lapidar um enorme pedaço de árvore para dar-lhe formas inimagináveis. Wunderlich, conhecido na Alemanha como um prolífico artista, logo que terminou o altar teve a ideia de criar um grande quadro de madeira com o símbolo da eucaristia. “Ele fez o peixe e o pão, e no mesmo estilo um cálice com hóstia nas portas do tabernáculo, além de uma enorme cruz atrás do altar”, declarou Goevert que se surpreendeu com o talento do frei em trabalhar com pranchas grossas e duras de madeira de marfim.

O padre se mostrou tão criativo em Paranavaí que desenvolveu métodos particulares de aplicação de tintas. De acordo com Frei Ulrico, primeiro, Wunderlich preparou uma talhadeira tipo cinzel e então esculpiu figuras e linhas na madeira. Frei Henrique preencheu tudo com tinta importada do Japão. “As gravações impediram que as cores se misturassem e logo tudo ficou belo e liso”, comentou Goevert que admitiu ter ficado maravilhado com os quadros de Wunderlich que mais pareciam mosaicos em madeira, tamanha a perfeição.

A população local também ficou extasiada com as criações de Frei Henrique. Não imaginavam que em Paranavaí havia um padre que ao mesmo tempo era um artista de exímias habilidades. O mais incrível é que Wunderlich criava muitas obras em questão de semanas. Uma das esculturas do frei que até hoje chama bastante atenção é a de Jesus pregado na cruz com uma feição carregada de saudade. “Como ele sentia muita falta da Alemanha acabou transmitindo isso ao crucificado”, revelou Frei Ulrico, citando a obra criada em 1953 e que pode ser vista no altar-mor da Igreja São Sebastião.

Uma das esculturas mais famosas da Igreja São Sebastião foi feita por Henrique Wunderlich (Foto: Ordem do Carmo)

Uma das esculturas mais famosas da Igreja São Sebastião foi feita por Henrique Wunderlich (Foto: Ordem do Carmo)

Outra peça do padre alemão muito lembrada pelos pioneiros de Paranavaí é o escudo dos carmelitas feito em madeira e que traz o lema da Ordem: “Zelo Zelatus Sum Pro Domino Deo Exercituum” que significa “Consome-me o zelo pelo Senhor, Deus dos exércitos.” Também se destacam as pinturas da Santíssima Trindade e da Rosa Mística. “Esta foi pintada como um botão aberto de uma tenríssima rosa da qual nasce a divina criança”, disse Frei Ulrico, acrescentando que junto ao altar, em cima do livro com sete selos, Wunderlich lapidou a imagem de Jesus como o bom pelicano e também como o cordeiro de Deus.

Das peças que podem ser apreciadas ainda hoje, entre as dezenas de esculturas e pinturas que Henrique Wunderlich legou a Paranavaí, uma das que desperta mais curiosidade é a outra escultura de Jesus na cruz, situada na Paróquia São Sebastião. Quem o observa de frente não consegue ver seu rosto. O crucificado está cabisbaixo e com o cabelo tapando parcialmente o rosto em uma simbologia de tristeza e ao mesmo tempo compaixão pelo próximo.

Para conseguir enxergar Jesus com nitidez a pessoa precisa se ajoelhar. A intenção de Frei Henrique era transmitir a ideia de que diante de Jesus crucificado, o cristão deve se abaixar em ato de respeito e adoração. Wunderlich viveu em Paranavaí até 6 de dezembro de 1957, data em que foi enviado de volta à Alemanha para trabalhar nas paróquias de Fürth e Schlusselau, no Estado da Baviera. Ao se aposentar em 1993, Henrique Wunderlich retornou para a sua cidade natal, Kulmbach, também na Baviera, onde viveu até falecer em 18 de abril de 2000.

Curiosidade

Henrique Wunderlich foi soldado do Exército Alemão de 1939 a 1945.