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A obrigatoriedade e o prazer da leitura
Tive amigos e colegas na minha infância e adolescência na escola que não apenas desgostavam da leitura como a desprezavam. A ideia da obrigatoriedade como as principais experiências com a leitura os levou a isso. Eles não viam a leitura para além do condicionamento. Não encaravam a leitura como uma escolha, uma opção.
Não tive esse problema porque fui estimulado a ler dentro de casa, e de forma bem natural. Quero dizer, ouvindo histórias, encontrando livros espalhados pela casa, convivendo com leitores, ganhando livros, fazendo minhas próprias escolhas; inclusive quando ficava de castigo no quarto dos meus pais e tinha o direito de ler e escolher o que ler.
Então, na escola, a ideia da leitura não me incomodava porque eu já havia sido estimulado nos primeiros anos de vida. Porém, aquelas crianças que não passaram por isso, com raras exceções, tinham dificuldade de aceitar o fato de que eram obrigadas a lerem algo. Afinal, a experiência com a leitura era condicionada, atrelada às obrigações escolares e vista como chata ou enfadonha.
Realmente há muitas crianças e adolescentes que não são capazes de pensarem em leitura sem logo associarem a notas, provas, trabalhos, Enem, vestibular. Logo, para muitos, por mais estranho que isso possa parecer, a ideia de ficar longe de livros é vista como prazerosa. O que, de fato, não deveria acontecer ou ser visto com normalidade. Porém, é uma consequência natural da maneira como se cria vínculo com os livros.
E quando o desinteresse pela leitura é crônico, a ideia da leitura vem embutida de más experiências que poderiam ter sido boas, se bem semeadas. Sendo assim, qual seria um bom caminho para evitar isso? A princípio, acredito ainda que estimular a leitura dentro de casa, mas de forma natural.
Creio que a oralidade, a contação de histórias, é o primeiro ponto de partida antes e durante o processo de alfabetização, porque aguça a imaginação e a criatividade da criança, despertando a vontade de conhecer mais histórias; e esse interesse aproxima as crianças dos livros. Logo não é difícil estimular uma criança a gostar de ler a partir da narração de histórias. Naturalmente, funciona como uma ponte que pode construir um vínculo de fruição perene e genuína.
Claro, conheci também crianças, adolescentes e adultos que desenvolveram o gosto pela leitura fora de casa, de forma independente, mas por fatores não tão recorrentes. Então, realmente sou da opinião de que os níveis de interesse pela leitura seriam muito maiores se houvesse de fato um incentivo doméstico.
Neste caso, que tal começar contando histórias ou lendo para as crianças próximas de nós? Com tantos projetos de democratização da leitura hoje em dia não é difícil doar ou presentear crianças com livros. Há inclusive bibliotecas, ONGs, institutos e instituições de ensino que fazem doações de obras literárias; distribuição de kits e coleções.
Ok, mas e no caso de jovens que não desenvolveram o gosto pela leitura? Neste caso, creio que vale a sugestão de abrir uma porta para a leitura baseando-se em predileções. Até mesmo uma biografia de alguém que um adolescente admire, ou um livro que deu origem a um filme ou jogo de videogame pode ser um bom princípio. Quando o interesse pela leitura é nulo, querer que uma pessoa leia uma obra que não a interessa sob uma perspectiva individual pode ser realmente contraproducente. Então por que não identificar interesses e usar isso como ponto de partida? Afinal, a leitura nos humaniza.
Sebastião Castro, o artista inclusivo
A arte é um conhecimento que permite uma melhor compreensão do ser humano e do mundo”
O artista e professor Sebastião Soares Castro, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, chama atenção pela afinidade com as mais diversas formas de arte. O talento descoberto na infância permitiu que mais tarde se dedicasse à arte inclusiva, aquela que não apenas existe para a fruição, mas também para integrar e facilitar o aprendizado. “Ela muda as pessoas. É um conhecimento que penetra em outras áreas e permite uma melhor compreensão do ser humano e do mundo”, comenta o pintor, desenhista, romancista, poeta e ator Sebastião Castro.
Mesmo que a arte seja produzida de forma individualista, somente quando passa pelo crivo da coletividade que assume um caráter transformador. Tal raciocínio é dividido por Castro que descobriu o dom para as artes aos quatro anos, quando começou a usar pó de grafite colorido de lápis para pintar. “Em seguida, tinta acrílica e guache, basicamente aquarela. Mais tarde, antes de ingressar na escola, aprendi a ler com o meu irmão. Logo produzi peças baseadas no livro ‘Meu Pé de Laranja-Lima [de José Mauro de Vasconcelos]’”, conta e acrescenta que a leitura é essencial para quem produz qualquer tipo de arte.
Muito conhecido no Paraná como escultor, Sebastião Castro é o criador de uma alternativa ao papel machê, pois prioriza a dimensionalidade na criação de matéria-prima. “Percebi que o machê me limitava, então optei por um material de refugo diferenciado, baseado em água, cola e jornal velho”, explica. Provavelmente, uma das peças mais conhecidas do artista seja o presépio natalino que faz parte de um conceito de reconstrução de valores e identidade. Outra característica marcante do estilo de Castro é a paródia.
Exemplo é a escultura “A Pensadora” que imita a meditação de “Le Penseur”, de Auguste Rodin. Outras são mais fiéis ao original e evocam fragmentos literários, como a personagem mulata Rita Baiana, de “O Cortiço”, de Aluísio de Azevedo. “São figuras que materializo com técnica de condensação de jornal molhado, papel decomposto mesmo. Misturo com bastante cola para que a base fique o mais sólida possível”, revela o artista que inspirado em um haicai da poetisa paranaense Helena Kolody decidiu homenageá-la criando uma escultura. O maior desafio em cada obra é tentar captar a essência de quem o inspira.
Sebastião Soares, também autor de textos teatrais como “Tempo de Reformar a Casa”, já produziu tanto que considera impossível precisar o total de peças. Atualmente, se dedica mais a literatura, até por estar se preparando para concluir um trabalho de mestrado intitulado “A transformação da obra literária para deficientes visuais”. Ainda assim, o autor que tem formação em inglês, letras e literatura, e é professor do Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos (CEEBJA), não se distancia das artes plásticas por mais de alguns dias. “Estou prestes a finalizar o meu romance ‘A Morte da Primavera’, sobre uma personagem em conflito de identidade”, destaca e lembra que a recepção de toda obra artística oscila conforme o estado emocional e psicológico do receptor, além da capacidade de concepção.