David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

Archive for the ‘Governo’ tag

Um candidato que desconsidera valores humanos e sociais

without comments

Bolsonaro, um candidato que desconsidera valores humanos e sociais, que faz piadas sobre tortura, negros, gays e quilombolas; que acha normal desrespeitar mulheres; que não vê palestinos como cidadãos; que diz que “índio” não tem que viver no mato, mas sim aprender a se virar na cidade (não respeitando valores culturais); que fala em destruir o meio ambiente com a maior naturalidade possível, alegando que temos “áreas de proteção ambiental demais”; que chama caça de “esporte saudável”; que é o primeiro candidato à presidência do Brasil recente a ter apoio massivo das bancadas mais perigosas do congresso (BBB), que sempre colocaram os interesses pessoais e econômicos muito acima dos interesses humanos. Como isso pode ser aceitável?

Nada disso é ser sincero, verdadeiro ou do tipo que “fala o que tem pra falar”, mas sim apenas uma figura arbitrária que ao longo de sua vida não aprendeu a lidar com a pluralidade; alguém que não tem um arcabouço cultural sobre a premência de valores sociais porque esteve sempre imerso em vaidades, veleidades e em uma realidade unilateral. Estou falando de um candidato que foi despejado pelo Exército, que se exalta e fica nervoso diante de contrariedades, que em sua ficha militar consta: “Tinha permanentemente a intenção de liderar os oficiais subalternos, no que foi sempre repelido, tanto em razão do tratamento agressivo dispensado a seus camaradas, como pela falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de seus argumentos.”

Basicamente, uma pessoa que não tem perfil para ser o presidente do quinto maior país do mundo. Como um sujeito que desconsidera valores básicos como o respeito, as diferenças, tem condições de melhorar a realidade de um país? Se você não respeita as diferenças e as margens sociais de uma nação você está fadado a continuar sacrificando pessoas em benefício de interesses que você, na sua ignorância ou indiferença, considera mais urgentes.

Nas sociedades contemporâneas mais evoluídas, o tratamento dispensado às chamadas minorias é sempre um indicativo dos níveis de progresso de uma nação. Porque há um entendimento de que se você respeita “um diferente” você naturalmente respeita “um igual”. Não existe boa economia que beneficie toda uma população quando valores sociais são desconsiderados. Não existe boa economia se isso ofusca ou suprime outros valores. O Brasil precisa é de políticas econômicas que se voltem para modelos de referência como aqueles defendidos pelo sueco Olof Palme, modelos econômicos que consideram os valores humanos e sociais na formulação de um plano econômico, valores que combinam economia justa com bem-estar social.

O que vejo nos discursos e nas propostas do candidato, que me parecem vagas ou confusas, é apenas interesse em sacrificar todos ou quaisquer valores visando elevar a economia sem considerar de que forma isso pode efetivamente beneficiar quem mais precisa, não somente uma pequena parcela da população. Vamos considerar que o candidato consiga elevar a geração de renda. Se a apropriação dessa renda continuar, por exemplo, nas mãos dos 10% mais ricos, não há como alcançar mudanças substanciais, e pelo discurso de desconsiderações de outros valores, não tenho dúvida de que é isso que vai acontecer. O Brasil é um país que só vai ser capaz de melhorar quando a social-democracia for levada a sério.

Written by David Arioch

October 13th, 2018 at 6:49 pm

Governo dos Estados Unidos permite que carne orgânica seja produzida a partir de animais confinados em gaiolas

without comments

Aves criadas para consumo estão entre os animais mais prejudicados pela ausência de políticas de bem-estar animal (Foto: Jo-Anne McArthur)

Esta semana, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos revogou as Práticas Orgânicas de Pecuária e Avicultura, uma regra que regula os padrões de “bem-estar dos animais de criação” cuja carne pode ser vendida como orgânica. A regra foi criada no Governo Obama depois de muita pressão de organizações ligadas ao bem-estar animal, visando implementar “melhores padrões de vida” para esses animais. Essas práticas exigiam que frangos e galinhas não fossem confinados em gaiolas e que também tivessem acesso ao ambiente exterior às áreas de confinamento.

O Departamento de Agricultura atrasou a votação sobre a implementação das Práticas Orgânicas de Pecuária e Avicultura três vezes e finalmente as derrubou, mesmo depois de receber 47 mil comentários em apoio à proteção aos “animais de criação”.

De acordo com Lindsay Wolf, vice-presidente de investigações da Mercy For Animals, os funcionários do governo responsáveis pela regulamentação do setor agrícola se curvaram para proteger os lucros corporativos do agronegócio em detrimento dos animais, da segurança alimentar e dos direitos dos trabalhadores.

“Como resultado, milhões de animais de criação estão sendo privados do benefício de leis e regulamentos modestos projetados para proteger seu bem-estar e promover o interesse público”, justificou Lindsay. Com essa decisão, a chamada carne orgânica comercializada nos Estados Unidos pode ser inclusive proveniente de lugares não muito diferentes das chamadas fazendas industriais.

Referência

VegNews

 

 





 

A má-fé da imprensa no caso do navio com mais de 25 mil bois

without comments

Foto: TV Tribuna

Há poucas horas, o G1 publicou uma matéria com o seguinte título: “Impasse de navio com 25 mil bois no Porto de Santos gera ‘mais prejuízos’ aos animais”. No texto, há uma declaração de que “a demora para o prosseguimento da viagem e desembarque dos animais no destino, causa muito mais prejuízos do ponto de vista do bem-estar animal do que o que é atribuído pelas ONGs, e que gerou o impasse”.

Essa afirmação não condiz com a realidade, mas apenas com a intenção da Minerva Foods e do Ministério dos Transportes – ambos considerando apenas os lucros de transação. E lamentavelmente, isso mostra como o Estado atua indiscriminadamente em favor da indústria em detrimento de vidas. Fazem uso das manobras mais diversas para atraírem a atenção do público para o seu lado, nem que para isso seja necessário vilanizar ativistas, pessoas que voluntariamente lutam pelo verdadeiro bem-estar animal. Até porque não é difícil, valendo-me da realidade comum, concluir que quem investe na exploração de animais sempre terá como prioridade o lucro, e isso consequentemente eleva o retorno financeiro a uma posição de protagonismo que desconsidera sempre as especificidades e o real valor da vida animal.

Viagens de carreta já são desgastantes, ainda mais depois de um percurso de 500 quilômetros. Agora imagine ser enviado como “carga” em uma viagem de navio que pode durar até 20 dias. Além disso, é importante ponderar que eles sempre serão acondicionados extremamente próximos uns dos outros, e partilhando de um espaço bem reduzido e do mesmo sentimento de estranhamento. Imagine esses animais extremamente pesados, desembarcando na Turquia depois de tanto tempo sem espaço para se locomover adequadamente.

Isso é saudável? Qualquer animal condicionado, logo forçado a passar dias sem se movimentar, está sendo privado de sua natureza, já que corpos foram feitos para o movimento. Após mais de 17 anos, estamos vivendo um retrocesso. Este é o segundo embarque de cargas vivas com mais de 25 mil animais em um intervalo de menos de dois meses.

E quando falamos em bovinos não podemos esquecer que são animais precocemente afastados do convívio com os seus. Isso é justo? Viver para ser reduzido a pedaços de carne? Infelizmente é isso que financiamos quando nos alimentamos de animais. Outro ponto que parece ter sido ignorado é que esses bezerros estão sendo enviados para um país onde o abate predominante é o halal.

Nesse tipo de abate, o animal é degolado com um golpe em forma de meia lua, que consiste em cortar os três principais vasos – jugular, traqueia e esôfago. Há quem diga que um “bom golpe” pode não gerar “sofrimento ao animal”, o enquadrando inclusive como “abate humanitário”, embora registros de ações em matadouros mostrem exatamente o oposto.

O chamado “abate humanitário” é hoje a bandeira da indústria de carne visando persuadir os consumidores a acreditarem que estão se alimentando de uma carne “sem dor”, o que é uma ilusão, já que qualquer tipo de privação precedente a morte já é uma forma de violência que gera sofrimento em diversos níveis. Alguma dúvida? Veja o desespero de um animal quando ele reconhece que está em um ambiente de onde não sairá com vida.
 





 

“Na ditadura militar brasileira, eles [os críticos do Estado] eram chamados de antibrasileiros”

without comments

Documentário aborda os princípios da concentração de riqueza e poder sob a ótica de Chomsky

Essa noção antiamericana é bem interessante. É uma noção totalitária. Não é usada em sociedades livres. Então se alguém na Itália critica o Berlusconi ou a corrupção do governo italiano, ele não é chamado de anti-italiano. Se o chamassem de anti-italiano, as pessoas iriam cair na risada nas ruas de Roma e Milão.

Em Estados totalitários essa noção é usada. Na antiga União Soviética, os dissidentes eram chamados de antissoviéticos. Era a pior condenação. Na ditadura militar brasileira, eles eram chamados de antibrasileiros. É verdade que em quase toda sociedade, os críticos são difamados ou maltratados de várias formas, dependendo da natureza da sociedade. Como na União Soviética, Vaclava Havel seria preso.

Em um Estado parte dos EUA como El Salvador, na mesma época, seus homólogos teriam seus miolos estourados por forças terroristas comandadas pelos Estados Unidos. Em outras sociedades, eles são condenados ou difamados, daí por diante. Nos Estados Unidos, um dos termos de abuso é antiamericano. Há alguns outros, como marxista.

Há uma série de termos de abuso. Mas nos Estados Unidos, você tem um alto grau de liberdade, então, se for difamado por alguns comissários, quem liga? Você continua, faz seu trabalho. Esses conceitos só surgem em uma cultura em que, se você criticar o poder estatal, e por estatal quero dizer em geral, não só o governo, mas também o poder empresarial, se criticar o poder concentrado, você é contra a sociedade, é contra o povo.

Noam Chomsky em “Requiem for the American Dream”, de 2015.

Contribuição

Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:





Written by David Arioch

August 6th, 2017 at 10:28 pm

A política no Brasil é tratada como uma prostituta

without comments

23473225680_4a3f3f3d11

Mesmo com a saída de Dilma, Ricardo Barros foi convidado a assumir o Ministério da Saúde (Foto: Reprodução)

A política no Brasil é tratada como uma prostituta. E uso um exemplo simples para ilustrar isso. O atual ministro da saúde, Ricardo Barros, foi da base governista da Dilma até pouco tempo atrás, quando era deputado federal. Já sua esposa, Cida Borghetti, se lançou como vice-governadora do Paraná ao lado de Beto Richa, do PSDB, em 2014. Ou seja, supostamente lados opostos. Curioso, não? Ainda mais levando em conta que os dois sempre tiveram inclinações políticas convergentes. Esse é o clássico exemplo de win-win situation.

No dia 7 de abril de 2016, há pouco mais de um mês, a Gazeta do Povo publicou uma reportagem destacando que Barros era o mais cotado para assumir o Ministério da Saúde, caso Dilma conseguisse se manter no cargo. Mas o mais intrigante é que foi justamente com a queda dela que Ricardo Barros assumiu a pasta. Na minha opinião isso deixa bem claro que a maior parte dos políticos não têm ideologia alguma, caso tivessem, provavelmente a conduta seria bem diferente.

Enquanto muitas brigas são travadas entre quem é de situação e quem é de oposição, os políticos simplesmente fazem seus acordos e seguem suas vidas como se nada mais importasse ou tivesse valor. Partidos e suas políticas hoje em dia pouco significam em meio a tantas negociatas. A verdade é que leva a melhor quem tem mais a oferecer.

Colonizadoras compravam terras a “preço de banana”

without comments

Era possível comprar centenas de alqueires pelo preço de um hectare

Entre os anos 1920 e 1950, inúmeras colonizadoras compraram milhares de alqueires de terras a “preço de banana” na região de Paranavaí. Naquele tempo, a prática já era considerada como “negociação de valor simbólico”.

Colonizadores ganharam “rios de dinheiro” na região (Acervo: Casa da Cultura de Paranavaí)

O dinheiro usado hoje na compra de um hectare de terra na região de Paranavaí, no Noroeste Paranaense, era o suficiente para a aquisição de uma área de centenas de alqueires de mata virgem nos tempos da colonização. “A única exigência do governo era que o colonizador se comprometesse em fundar uma colônia”, relatou o pioneiro e padre alemão Ulrico Goevert em texto publicado na revista alemã Karmelstimmen nos anos 1950.

O primeiro passo era enviar centenas de homens com traçadores e outras ferramentas para desmatarem a área tendo o suporte de caminhões e tratores. Segundo Goevert, a mata era derrubada e queimada, dando lugar a loteamentos e estradas. “A queimada era uma das piores partes, pois era demorada e atingia tudo em um raio de até quilômetros”, comentou o pioneiro cearense João Mariano.

Rancho construído em Paranavaí na época da colonização (Acervo: Casa da Cultura de Paranavaí)

As colonizadoras mal começavam a investir na divulgação da venda de terras e logo estavam lucrando. “Se ganhava rios de dinheiro assim”, afirmou o padre, acrescentando que as pessoas que mais compravam lotes eram comerciantes e outros trabalhadores urbanos. Porém, com o tempo, a comercialização de terrenos estagnava, então os investidores autorizavam a doação de até 500 lotes.

Quem ganhava um imóvel assinava um documento se comprometendo a construir uma residência em um prazo médio de três meses, do contrário, perdia o direito de posse. “Esse tipo de especulação atraía muita gente. Entretanto, com o tempo, mais de 30% das casas foram abandonadas”, revelou Ulrico Goevert. Isso acontecia quando muitos não acreditavam na evolução da colônia, principalmente em função da má qualidade de vida.  As primeiras residências criadas pelos colonizadores se resumiam a ranchos, eram cobertas com tabuinhas.

Na região, as colonizadoras enviavam primeiro uma família de bom nível cultural e bem comunicativa, como estratégia para atrair novos moradores. Era uma prática bastante eficaz na região de Paranavaí e que serviu para conquistar o interesse de milhares de pessoas. “Essa família também se responsabilizava pelo desbravamento e pelas queimadas”, disse o padre.

Com o tempo, mais de 30% das casas foram abandonadas (Acervo: Casa da Cultura de Paranavaí)

Quando a colônia já reunia centenas de famílias era deliberada a fixação de uma grande cruz em área que os moradores definiam como a ideal para a futura construção de uma igreja. Normalmente, a bênção da cruz e a celebração da primeira missa marcavam o início das atividades religiosas no povoado. “Tudo era feito com a presença do padre da paróquia ao qual o lugarejo pertencia. Era sob a sombra da grande cruz que a colônia se desenvolvia”, frisou Goevert. Segundo pioneiros, para a população, a cruz não era apenas um símbolo religioso, mas também de paz, confiança comunitária e cumplicidade.

As serrarias quase sempre surgiam após a fixação da cruz. Onde tal símbolo religioso se erguia havia uma legião de moradores crentes no desenvolvimento do povoado. De acordo com Ulrico Goevert, a serraria representava um marco para a colônia, pois logo desapareciam os primitivos ranchos que cediam espaço às belas casas de madeira. Semanas após a criação da marcenaria, o pároco retornava, reunia a comunidade e pedia para formarem uma comissão eclesial para a construção de uma capela ou igreja. “Era normal todos ajudarem nessa empreitada”, enfatizou o alemão.