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Um dia de “guerra civil” em Terra Rica
Quando católicos e umbandistas duelaram em frente à Igreja Santo Antônio de Pádua
Em 1960, Terra Rica, no Noroeste do Paraná, já era uma cidade habitada por pessoas das mais diversas crenças. No entanto, essa diversidade, que até então inspirava a tolerância e respeito em prol do desenvolvimento, foi ofuscada por um conflito que jamais seria esquecido pelos moradores do município. Em 2 de novembro do mesmo ano, Terra Rica viveu um episódio digno de uma guerra civil em frente à Igreja Matriz.
Era Dia de Finados, quando integrantes do Centro de Umbanda de Terra Rica decidiram realizar uma passeata até o Cemitério Municipal, na Avenida Rio de Janeiro. O trajeto incluía passar em frente à Igreja Santo Antônio de Pádua, o que foi interpretado como uma afronta pelos católicos. Ciente da movimentação, o padre Vicente Magalhães de Teixeira, o primeiro pároco da cidade, se dirigiu até o Centro de Umbanda para tentar impedir a realização da passeata, embora há quem diga que o padre tenha apenas pedido para mudarem o percurso.
A solicitação da autoridade religiosa foi ignorada, então membros dos grupos Congregados Marianos e Filhas de Maria pegaram facas e foices e montaram guarda na entrada da Igreja Matriz. “Me recordo que quando os umbandistas apareceram a situação saiu de controle e os católicos levaram o conflito até as últimas consequências”, relatou o pioneiro Joaquim Pereira Briso em entrevista concedida ao autor deste blog em 2006.
Muita gente se feriu, mas ninguém morreu. Não foram poucos que tiveram de ser levados em estado grave para o hospital. Há testemunhos de pessoas que perderam a visão durante a briga. De acordo com o pesquisador Edson Paulo Calírio, a luta começou “no braço”, só que os mais exaltados logo recorreram a foice, facão, balaústre, tijolo e pedra. Qualquer objeto próximo da mão era usado como arma. Alguns pioneiros afirmaram que o conflito teve início às 13h e se estendeu por toda a tarde.
Havia centenas de pessoas na entrada da Igreja Santo Antônio de Pádua no momento da confusão. Os umbandistas somavam cerca de 300 pessoas, um número considerado bem inferior a quantidade de católicos no local para impedir que os manifestantes continuassem a passeata até o cemitério. “No final da tarde, em uma ação extrema, os católicos foram até o centro de umbanda e atearam fogo em tudo. Não sobrou praticamente nada, só as vigas incineradas’”, lembrou Pereira Briso.
O padre Vicente e os grupos Congregação Mariana e Filhas de Maria justificaram o incêndio contra os umbandistas como consequência do desrespeito aos católicos e também de uma suposta ameaça ao pároco. Já os pioneiros que não pertenciam a nenhum grupo religioso pensavam e ainda pensam diferente. “A verdade é que o camarada que criou esse centro em Terra Rica começou a se sobressair demais, fazer uns milagres esquisitos, daí só precisaram de uma justificativa para tocar fogo no terreiro”, declarou Joaquim Pereira Briso. No mesmo dia da briga entre católicos e umbandistas, três crianças que caminhavam pela Avenida Rio de Janeiro, via de acesso ao Cemitério Municipal, foram atropeladas por um caminhão.