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Artistas se unem e lançam coleção de contos infantis veganos
São seis livros em que os protagonistas são animais regularmente explorados e mortos para fins humanos
Desde 2014, Marcya Harco, Paulo Roberto Drummond e Daniela Benite realizam ações de artivismo em defesa dos animais. E foi com essa motivação que recentemente publicaram a coleção de livros “PAZ – Pessoas e Animais, AmiZades Legais”, que apresenta às crianças alguns contos com histórias de animais comumente explorados. De acordo com o trio que compõe o projeto PAZ, sediado em São Paulo e que dá nome à coleção, eles tiveram a preocupação em apresentar cada história de maneira delicada e lúdica. Nos seis livros, intitulados “Vera”, George”, “Márcia”, “Gary”, “Jill” e “Ismael”, os protagonistas, que são animais, almejam sempre a liberdade e uma vida justa.
Um diferencial da coleção, e que ajuda a fortalecer a mensagem de que os leitores têm bons motivos para incluir também os animais explorados para consumo em seu círculo moral, é que em cada conto há um ser humano com um olhar sensível em relação aos animais lutando para salvá-los de qualquer exploração. Para entender melhor a proposta do projeto, entrevistei Marcya, Paulo e Daniela sobre a coleção e a sua receptividade, além da importância da literatura infantil e projetos futuros, dentre outros assuntos. Confira:
Sei que os livros da coleção “PAZ – Pessoas e Animais, AmiZades Legais” são voltados principalmente ao público infantil, mas há uma faixa etária específica a quem essas obras são direcionadas?
Todos os contos são ilustrados e sugeridos para crianças a partir dos 3 anos, com leitura compartilhada. Depois de alfabetizadas, são indicados para até 10 anos ou mais, dependendo de como tocam cada pessoa. No entanto, pessoas de todas as faixas etárias têm se interessado e adquirido os livros.
Como foi a ideia de dar nomes únicos de personagens a cada um dos livros?
Cada título leva nome de um animal que é personagem principal e tem a sua história de vida retratada. Sempre acreditamos que o animal incluído na comunidade moral teria o seu espaço como pessoa respeitado, com todos os direitos. Então é assim que o vemos. Nós já o incluímos e assim o tratamos. O nome corresponde à sua identidade como pessoa. Essa questão do nome é muito significativa. Conhecemos há muitos anos um fazendeiro que criava algumas vacas. Ele se afeiçoou mais a uma delas e deu-lhe um nome como pessoa. Depois ele teve muita dificuldade em permitir que ela fosse assassinada para consumo. Era visível a crise de consciência diante da possibilidade de morte da nova amiga.
Cada livro traz um conto diferente, o que significa uma história singular. Porém, há algo que une todas essas histórias como partes de uma mesma unidade?
Sim, os protagonistas de cada história são animais regularmente explorados e mortos para fins humanos: Jiil, uma vaca; Ismael, um porco; Gary, um peixe; Márcia, uma galinha; George, um peru; e Vera, uma coelha. Nesse primeiro momento foi primordial considerar os animais criados e abatidos em grande escala. Outra questão é que há, em todos os contos, um ser humano, criança ou adulto, envolvido na salvação de cada animal herói do conto.
Há um caráter de importância em ler todos os livros para entender melhor cada história?
O interessante em ler toda a coleção é possibilitar às crianças a construção de um olhar sensível para todos os animais. Ao leitor ou leitora com mais vivência, permite ampliar a percepção para a desconstrução de histórias de exploração animal consideradas “normais” em nossa sociedade. É importante esclarecer que a coleção PAZ tem um caráter lúdico e delicado, com uma linguagem extremamente acessível a todos e todas.
Como vocês veem a importância da literatura infantil contra a exploração animal?
As obras literárias, as quais afastam a visão antropocêntrica do mundo, podem colaborar para a construção de conhecimento da criança, no sentido de sua formação, como pessoas críticas diante da atual condição dos animais e de todo o habitat de vida na Terra. O estímulo à empatia, ao afeto, à compaixão, e principalmente ao respeito e à consideração ética em relação aos animais não humanos são parâmetros para que a literatura infantil se torne uma ferramenta pedagógica primordial para o processo educativo de todas as crianças. Uma sociedade que maltrata animais, considerando-os como mercadoria e propriedade será sempre opressora e violenta, em facetas diversas, tanto com os animais não humanos quanto conosco, humanos.
Quais são os predicados de um bom livro para sensibilizar crianças em relação aos direitos animais?
Primeiramente, afastar a perspectiva antropomórfica e zoomórfica sobre os animais não humanos. Os personagens animais não estão para falarem das qualidades e dos defeitos humanos, mas retratarem suas próprias histórias e desejos, como sujeitos morais. Estimular a empatia, o respeito, a afetividade e a consideração pelos sentimentos dos animais. De preferência, livros de fácil manuseio e ilustrados.
Entre a idealização e a conclusão do livro foi preciso bastante tempo?
A ideia surgiu em 2015. Em seguida, o Paulo Roberto Drummond iniciou a escrita dos contos, e em 2016 a Daniela Benite, começou o trabalho com as ilustrações. Em 2017, entramos com uma campanha de crowdfunding [financiamento coletivo] e ao final do ano enviamos o material para a gráfica.
Houve alguma dificuldade nesse processo?
Muita. Não tínhamos verba. Então foi uma luta insana, dia e noite, trabalhando na campanha de crowdfunding. A Marcya Harco teve um problema de saúde e precisou ser internada durante um mês, em razão de uma hérnia de disco extrusa. Nesse tempo, apesar da dificuldade em se locomover, ela levou o seu notebook e realizou a diagramação dos livros no hospital mesmo. Ao final, não arrecadamos o que pretendíamos, mas conseguimos produzir uma quantidade modesta da coleção.
Como tem sido a receptividade?
Incrível! Modéstia à parte, as pessoas que adquiriram os livros têm elogiado muito as histórias, as ilustrações e o projeto em si. Comentam sobre a boa receptividade e o encantamento das crianças pelos contos. Estamos muito felizes por isso.
Os livros já têm sido utilizados em escolas?
Tivemos uma reunião em São Paulo com os dirigentes da primeira escola vegana do Brasil, a Nativa Escola, localizada em João Pessoa [Paraíba]. A escola vai adotar a coleção PAZ como material pedagógico para crianças do ensino infantil e fundamental I. Algumas professoras da rede pública, que apoiam o veganismo, adquiriram os livros para leitura em sala de aula.
Vocês têm maior predileção por algum dos contos em específico?
Não temos um livro predileto. São histórias lúdicas, às vezes poéticas, de aventuras, de personagens, animais e pessoas [crianças e adultos], que lutam para um mundo ético, sem violência, sem escravidão, com paz, compaixão e libertação para todos. Cada livro tem um valor intrínseco.
Consideram difícil a publicação de livros com temática vegana no Brasil?
Olha, como fizemos um projeto autônomo, não pesquisamos muito essa questão. Mas imaginamos que não deva ser muito fácil ainda. A ideia da coleção surgiu dentro de um projeto que estávamos iniciando, que é o projeto PAZ – Pessoas e Animais, AmiZades Legais. Ela nasceu como primeira realização desse projeto, que tem o objetivo de fomentar e reverberar ações que difundam as inter-relações positivas, que já existem pelo mundo, entre pessoas humanas e pessoas animais. Isso no foco, principalmente, dos animais que são violentamente explorados. Queremos dizer: “Olha, você ainda come o porco, mas veja esse porco aqui. Ele tem um amigo humano que respeita a sua vida e o seu modo de ser.” Acreditamos que ações como essa também possam colaborar no convencimento, no esclarecimento, já que, se formos pensar em Kant, o veganismo não poderia ser uma espécie de adeus a menoridade do indivíduo?
Há previsão de novas parcerias e publicação de mais livros?
Estamos em busca de parceiros para uma nova edição da coleção atual. Também estamos planejando uma outra coleção de livros para mais adiante. Já nos sugeriram procurar editoras, mas aí a coleção, de cuja venda queremos gerar recurso para financiar outras atividades do projeto PAZ, deixará de oferecer essa oportunidade. Uma vez que só conseguiríamos receber 10% do que for arrecadado. Por isso, estamos pensando em uma forma de produzir, por exemplo, uma tiragem de mil exemplares da coleção. Dessas mil coleções, uma boa parte seria distribuída para as crianças, ONGs, instituições e escolas de baixa renda, e a outra parte fomentaria outras ações do PAZ.
Falem um pouco também do trabalho de vocês com a arte como instrumento de reflexão sobre o respeito à vida animal não humana. Sei que, para além da literatura, vocês também trabalham com teatro e intervenções artísticas voltadas para essa conscientização.
A arte é uma expressão sensível e habilidosa de uma experiência estética, que por via sensorial, altera a percepção ao nosso redor, provocando a desautomatização do cotidiano. O ato artístico não deve ser apenas uma informação. É necessário que se proponha uma experiência ou vivência. A obra artística deve tocar as pessoas no campo da sensibilidade, estimulando-as a se colocarem diante da sociedade de forma mais ativa, consciente e crítica. Mas, como podemos fazer uma arte em que o espectador passe do papel de contemplador passivo para ativo? É preciso que a arte proporcione uma experiência. Sem experiência, não há sensibilização nem reflexão e muito menos incitará uma transformação.
Por isso, desde 2014 realizamos ações de artivismo em defesa dos animais. Trabalhamos com teatro e frequentemente realizamos atividades artísticas dirigidas às crianças, por meio de apresentações teatrais e oficinas pedagógicas. Pensamos que uma educação consciente, a qual prioriza o respeito pela vida, seja a base para proporcionar um mundo de paz. Buscamos realizar ações de artivismo (arte + ativismo) por meio de linguagens diversas, como cenas teatrais, performances visuais, poesia, narração de histórias, literatura, entre outras. Nossas ações artísticas têm como objetivo propor experiências que possibilitem o despertar da empatia e da consciência afetiva das pessoas, com o intuito de impulsionar ações que modifiquem a atual realidade especista, violenta e absurdamente injusta, as quais os animais não humanos são subjugados e agredidos. Transformações no âmbito do veganismo, visto que este é o único caminho real em direção a libertação e reconhecimento dos animais não humanos como seres morais e de direitos. Para tanto, as experiências e fruições artísticas têm que ser significativas.
Os seis livros veganos que compõem a coleção estão à venda na lojinha do Projeto PAZ:
http://pazpessoaseanimais.com/#!lojinha
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