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Me parece que virou moda demonizar as redes sociais hoje em dia
Me parece que virou moda demonizar as redes sociais hoje em dia. Acredito que o problema não está em usar as redes sociais, mas sim em saber aproveitar o que elas têm de bom a oferecer. Ultimamente, tenho encontrado muitas pessoas falando de mídias sociais como se fossem o próprio demônio. Acho isso exagerado, até porque é uma importante ferramenta de divulgação do meu trabalho, e não tenho como não considerar isso positivo. Sejamos ponderados que tudo transcorre bem.
Uma coisa que nunca vou entender
Pessoas que adicionam outras pessoas em mídias sociais, não curtem nada, não comentam nada de positivo, mas em algum momento aparecem na sua página fazendo comentários negativos ou que manifestam algum tipo de contrariedade. Nunca tive interesse em direcionar minha energia para algo assim. Acredito na importância da alteridade e da empatia.
Sempre que posso, e evito ir na contramão disso, prefiro motivar as pessoas e agradecê-las. Ser educado, tolerante, ponderado e atencioso não diminui ninguém. Não é nenhum tipo de vulnerabilidade. Muito pelo contrário. É um exercício de força e resistência em um mundo que caminha cada vez mais para o individualismo, para a exaltação do “eu” e da forma falsamente deleitosa de como posso afetar ou desconsiderar os outros.
Parece que há pessoas que são impulsionadas pela ideia de atingir os outros e não percebem que dessa forma também estão atingindo a si mesmas. Às vezes, percebe-se isso somente depois de muito tempo, ou nem mesmo se percebe, não posso afirmar. Em síntese, não sei como ser amargo ou frio pode despertar algo de positivo em alguém.
Do anonimato à superexposição na internet
Éramos anônimos e o anonimato era praticamente uma bandeira para nós
Sou de uma geração de anônimos na internet. E o que quero dizer com isso? Bom, quando comecei a usar a internet por volta de 1996, eu, assim como a maioria dos usuários, era um anônimo. Não tínhamos nome, sobrenome, origem, cidade, estado nem mesmo um país real quando usávamos proxy internacional. O mais importante não era aparecer, mas sim conhecer e trocar informações, ideias e alguns poucos arquivos.
Cheguei a ter contato com pessoas por anos sem jamais saber quem eram de verdade; como eram fisicamente, quantos anos possuíam, o que faziam para sobreviver, entre outras coisas, até porque, dependendo, isso pouco importava. Éramos anônimos e o anonimato era praticamente uma bandeira para nós. Fotos dos usuários eram raras. E isso não fazia muita diferença.
Em alguns aspectos, acho que existíamos mais para o conhecimento, o conteúdo, do que para as relações interpessoais. Palace, ICQ, mIRC, fóruns, usávamos o que existia na época. Acredito que éramos feitos de linhas, estilos, linguagens, narrativas e trocas de arquivos. Em salas, tópicos e janelas privadas, poderíamos conversar hoje e então nunca mais. O vínculo era possível, mas não essencial. Desrespeito, intolerância e balbúrdia eram coibidos com o mais icônico BAN.
Não havia tanta exposição. Ninguém precisava aparecer se não quisesse, nem por isso seria tachado de coisa alguma. Muito pelo contrário, era a mais comum das práticas daqueles tempos. Aos poucos esse mundo foi desaparecendo, pelo menos diante de um novo onde os usuários de internet se tornaram mais transparentes, mais vaidosos, alcançáveis e até mesmo presas de um universo ruidosamente curioso.
Houve uma metamorfose e hoje vivemos a contramão do anonimato. Há uma superexposição como jamais imaginada nas décadas anteriores. E isso é encarado como algo natural. Muita gente parece não se importar em ter o cotidiano integralmente registrado na internet. O que faz em horários bem específicos, onde come, o que compra, o que ama, o que odeia, quando sai, com quem sai, quais ambientes frequenta.
É possível criar uma agenda de rotinas a partir das informações que as pessoas disponibilizam nas mídias sociais. Acredito que aí subsiste o perigo da superexposição, já que não conhecemos todas as pessoas que recebem essas tantas informações compartilhadas. Sim, você está sendo apenas você, porém e se ser você implica de algum modo em uma consequência negativa para si mesmo e para outros? Ainda valeria a pena?
Em mídias sociais, todos os dias me deparo com conteúdo ofensivo ou formulado de forma bastante equivocada. Não consigo deixar de pensar em como isso pode ser perigoso. Nossa opinião pode reverberar coisas que nem imaginamos dependendo da forma como elaboramos um texto.
Acredite, muitas vezes a maneira como escrevemos pode gerar interpretações inimagináveis se não formos cuidadosos com as palavras. Não é à toa que pessoas são demitidas, amizades e casamentos são desfeitos, entre outras consequências. Afinal, somos responsáveis pelo que publicamos.
Há inclusive muitos casos de ameaças, brigas e assassinatos em decorrência de discursos, opiniões ou “críticas” e críticas publicadas na internet. Então por que não tentar ser mais comedido? Até porque quanto mais ódio disseminamos, mais ódio atraímos. Não é possível conquistar sorrisos sendo avesso à pluralidade.
Na minha opinião, a ponderação deve ser a base de toda produção textual divulgada em mídia social. E faço tal afirmação porque tenho certeza que a maioria não se sente bem gerando inimizades ou perdendo a admiração de pessoas que apenas têm alguns pontos divergentes dos seus.
Não se trata de ser imparcial, até porque a imparcialidade é um mito, mas sim de tentar ser justo e ter sempre em mente que o outro não merece ser ofendido por você apenas por pensar diferente. Há que se ter o entendimento também de que mesmo quando você publica um texto obtuso ou ofensivo e se arrepende e o deleta, isso não significa que ele deixou de existir.
Assim como sabemos que não existe fora no mundo, eu acredito que o mesmo acontece no ciberespaço. Na internet, deletar não significa fazer o conteúdo desaparecer completamente. E volto a endossar que a forma como escrevemos é a porta de entrada para o conteúdo que queremos transmitir. Ser arrogante, desrespeitoso, visceralmente satírico ou desdenhoso desqualifica até mesmo textos bem embasados, desestimulando a reflexão.
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A contradição de clamar por democracia sendo antidemocrático
Vejo muita passionalidade envolvida, e muitas vezes me parecem armadilhas do ego e da vaidade
Esses dias, testemunhei na internet um camarada sendo chamado de “comunista”, no sentido mais pejorativo do termo, aquele que hoje povoa o ideário comum, porque publicou um vídeo mostrando um general da época da ditadura militar impedindo um jornalista de exercer a própria função. Esse sujeito que o ofendeu com palavras baixas e declarou que o camarada deveria ser fuzilado por ser “comunista” é um exemplo de uma efervescência perigosa e sem precedentes que tenho visto na internet.
Primeiro porque o camarada não é “comunista”. Ainda assim, tentei entender o posicionamento do rapaz, mas foi impossível porque ele vive uma estoica contradição – uma pessoa que diz estar lutando pela democracia e ao mesmo tempo se coloca no direito de dizer que muitos brasileiros deveriam ser deportados ou fuzilados porque não pensam como ele. Me refiro a alguém que entra na internet para impor sua opinião de forma agressiva em páginas de pessoas com quem não partilha as mesmas ideias.
Penso que se não sou seu amigo e entro na sua página para comentar algo sem ser convidado, devo pelo menos ser educado e defender o meu posicionamento de forma ponderada e lúcida – o mínimo que se pode esperar de um ser humano que deveria respeitar o outro tanto quanto respeita a si mesmo. Não é correto invadir um perfil pessoal no Facebook para impor nada, até porque esse espaço pode, porém não precisa ser democrático. Ninguém tem o direito de fazer isso, independente de qualquer coisa.
Sinceramente, não há como negar que comportamentos como o do rapaz citado têm relação direta com a indigência cultural, já que generalizações e ofensas costumam ser usadas com mais frequência por pessoas que não são capazes de argumentar ou defender um ponto de vista sem apelar para clichês ou estereótipos. O sujeito que ofendeu esse meu camarada trabalha como instrutor em uma academia onde paro em frente quase todos os dias quando o sinal vermelho do semáforo está acionado.
Já o vi algumas vezes rindo e fazendo brincadeiras com alunos e colegas de trabalho, o que torna tudo mais chocante porque mostra como um ser humano aparentemente pacífico pode na realidade esconder uma faceta agressiva e tirânica, o que é interpretado por estudiosos do comportamento humano como sinais de sociopatia.
Acho válido citar também pessoas mais próximas que conheço há muito tempo e que presenciei e ainda presencio defendendo discursos de ódio em mídias sociais. Posso dizer que não é fácil olhar para a pessoa e não associá-la ao que li na internet. A vida segue, mas um resquício de fel na boca persiste.
Vejo muita passionalidade envolvida, e muitas vezes me parece armadilha do ego e da vaidade, aliada a uma visão canhestra do mundo; até um anseio jactante e quase totalitarista de redefinir o que é certo e errado. É incrível como nos deparamos todos os dias com pessoas hostilizando alguém. Tudo isso porque não foram preparadas para lidar com as diferenças, e acho que esse é um problema que surge na infância e adolescência.
Diariamente encontramos pessoas querendo moldar o mundo e as pessoas à sua maneira, o que não significa que seja algo basicamente ruim, já que no fundo todos fazemos isso de algum modo. E claro, muitas coisas nesse sentido podem ser realmente positivas. No entanto, a preocupação surge quando as negativas se sobrepõem, porque aí o respeito é relegado à farelagem e o ser humano deixa de ser humano.
Mais reflexão e menos irritação
O que aconteceria se cada um se fechasse no seu mundo de preferências e desprezasse todo o resto?
Fiquei sabendo que um amigo foi ofendido com palavras de baixo calão no Facebook porque emitiu uma opinião respeitosa, embora contrária à da autora de uma enquete sobre política. Psicóloga, a senhora que fomentou o debate não poupou ofensas ao meu amigo apartidário que até então também era seu amigo. Sem dúvida, é uma situação que retrata um exemplo clássico da severa incapacidade em lidar com as diferenças, premissa básica do convívio social.
Tenho amigos que votam nos mais diferentes partidos políticos. Nem por isso me coloco no direito de ofender ou desrespeitar qualquer um deles. Discussões, críticas e piadas sempre surgem, mas sempre evitando extremismos ou apelações. O mesmo posso dizer sobre religião. Convivo com pessoas que amam atividades físicas e outros que simplesmente odeiam. Curto alimentação saudável, nem por isso perturbo quem não gosta, afinal, é uma questão de escolha. Não bebo, não fumo e tenho camaradas que bebem tanto quanto fumam, embora tenham pleno conhecimento das consequências desses hábitos. Poderia citar uma infinidade de outros exemplos, mas o meu objetivo é apenas respaldar uma ideia – a tolerância é o único caminho para assegurar a civilidade.
Diante de situações extremas de intolerância, sempre me pergunto: o que aconteceria com o mundo se cada um se fechasse no seu mundo de preferências e desprezasse todo o resto? Sem dúvida, nos tornaríamos bárbaros, e a julgar pelo avanço do mundo nessa fase definida como hipermodernidade, nos dividiríamos em hordas piores que aquelas que habitaram o mundo no século VI.
Digo pior porque hoje, mais do que nunca, temos recursos para ser cada vez melhores e não o contrário. Se me identifico com cinema “alternativo”, devo virar as costas para quem curte apenas cinema comercial? Se gosto de musculação, é justo me relacionar somente com quem pratica? Se aprecio heavy metal, preciso ignorar tudo que uma pessoa que não simpatiza com o gênero tem a oferecer? Não creio.
Em 2011, o estadunidense J.H. Kietzmann, um estudioso das redes sociais, publicou no jornal Business Horizons, da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, um trabalho bem interessante sobre o assunto. Em uma de suas citações, ele diz que mídias como o Facebook surgiram para permitir uma interação social baseada na criação colaborativa de informação. Veja bem, a afirmação foi baseada em um estudo ainda recente. Infelizmente, isso não resume o que vemos hoje nas redes sociais. O aspecto negativo cresce exponencialmente.
Na internet a intolerância tem motivado muita gente a odiar quem não conhece ou jamais viu. O desrespeito às diferenças tem desfeito amizades e também elevado o número de pessoas desprezando outras por um mero comentário em uma postagem de um amigo em comum. Muitos parecem encarar a falta de contato físico como um pretexto para ofender alguém, esquecendo que por trás da máquina há sempre um ser humano que também pensa e se emociona.
Todo mundo deve conhecer casos de pessoas que deixaram até mesmo de se cumprimentar na rua ou de se falar por uma divergência de opinião em uma publicação em mídias sociais. A impressão que fica é que há bastante gente despreparada em aceitar a preferência alheia. Isso deveria acontecer? Acho que não, a não ser que você tenha uma cabana no seio de uma área de mata nativa e opte por passar o resto de sua vida em ostracismo ou na plena misantropia.
No Facebook, qualquer pessoa com uma lista de contatos está sujeita a receber uma infinidade de informações ao longo do dia, então por que se incomodar com um camarada que se sente bem postando algo sobre um assunto que o agrada? Pode não ser do meu gosto, mas também não me faz mal. Por que não permitir uma opinião contrária a sua? Isso pode enriquecer o diálogo ou pelo menos estimular uma reflexão ou consideração.
Claro, desde que não seja um comentário arbitrário ou agressivo. A rede social também tem o poder de avaliar a nossa paciência, equilíbrio e capacidade em aprender até mesmo sobre coisas com as quais até então não nos importávamos. Não nego que estamos todos sujeitos a condenar determinadas atitudes e cometer excessos nas redes sociais. Porém, isso não significa inaptidão em aperfeiçoar as nossas habilidades de ponderação.
Projeto de inclusão digital muda a vida dos moradores de Graciosa
Armando Lehmkuhl: “Estou aqui há três meses e antes eu só sabia apertar o botão de ligar”
São quase 19h, e na esquina da Avenida Osvaldo Cruz, em Graciosa, distrito de Paranavaí, alguns moradores atravessam a via em frente à Igreja Nossa Senhora das Graças, onde fazem o sinal da cruz em respeito à padroeira da pacata comunidade de aproximadamente três mil habitantes.
Do outro lado, o professor de informática Jáder Ragazzi abre uma porta de vidro e os recepciona na escola de inclusão digital mantida há dois anos pela cooperativa de crédito Sicredi com a parceria da Faculdade de Tecnologia e Ciências do Norte do Paraná (Fatecie). No local, o clima que envolve professor e alunos com idade de 33 a 58 anos é de muita camaradagem.
Entre brincadeiras e lições, os dez estudantes que até então desconheciam o mundo da internet e da informática se sentem como se estivessem renascendo para uma nova realidade, a virtual. “Estou aqui há três meses e antes eu só sabia apertar o botão de ligar. Hoje uso o programa Excel pra fazer tabelas de custo. Me ajuda muito. Só demorei pra entrar no curso porque tinha uma fila de espera enorme. A procura é muito grande”, conta rindo o agricultor Armando Lehmkuhl, de 43 anos, apontando para o monitor e mostrando que agora se soma a milhões de pessoas que usam mídias sociais como o Facebook.
A modesta e acolhedora escola funciona em uma sala de paredes brancas que abrigava a antiga unidade de atendimento do Sicredi, onde mesas, cadeiras e computadores que seriam descartados ajudam a transformar a vida de agricultores, pintores, motoristas, mecânicos, costureiras, aposentados, autônomos e donas de casa. À vontade, e perto de casa, os alunos não precisam se preocupar com formalidades. “Cada um vem do jeito que quiser. É como estar em casa”, diz o professor Jáder Ragazzi rodeado de estudantes que aproveitam o calor da primavera para assistir as aulas usando camiseta, bermuda e chinelos.
O projeto que se tornou um sucesso em Graciosa despertou receio e hesitação por parte da população no início. Muitos curiosos passavam perto da escola para observar a movimentação, ver à distância como eram as aulas. “Eu sabia que o banco estava ensinando informática, só que só tomei coragem de participar quando minha cunhada fez e falou que gostou. Aqui é assim. Um vai falando e chamando o outro”, explica sorrindo a costureira Rita de Cássia Schuelter Silva, de 47 anos, que vê na internet uma grande oportunidade de se manter informada e fazer amizades.
O curso com duração de quatro meses e realizado sempre na terça e na quinta-feira atende hoje três turmas que somam 30 alunos em três horários. A maioria dos adultos admite que dificilmente aprenderia a usar o computador se tivesse que se deslocar até Paranavaí, a 17 quilômetros de distância. Além das despesas, outra preocupação era a exposição diante de estranhos e jovens afeiçoados à informática. “Tudo começou quando pensamos em fazer um programa de inclusão social com a terceira idade e acabamos atendendo todas as faixas etárias. A Fatecie se dispôs a ajudar e nos forneceu o professor e o material didático”, garante a gerente da unidade do Sicredi de Graciosa, Andreia Rodrigues Mendonça Viana.
No distrito, mais de 700 moradores são associados da cooperativa, o que significa que o benefício é estendido a praticamente todo mundo, até porque para ingressar na escola basta ter algum parentesco com um associado. “Muitos começaram do zero e veem também uma oportunidade de ter uma remuneração melhor”, comenta Jáder Ragazzi. O mecânico Devanir Perri aponta como uma das vantagens do curso o fato de conseguir emitir nota fiscal dos serviços prestados em sua oficina.
Omir de Oliveira, autônomo de 58 anos, segue na mesma esteira. “Consigo abrir firma pela internet e estou aprendendo a pesquisar tudo que quero”, destaca. Vilson Lourenço de Sousa, de 39 anos, que está se familiarizando com o programa PowerPoint e já faz compras online, justifica que com as novas tecnologias todo caminhoneiro precisa ter bons conhecimentos de informática. “Estou na mesma situação que eles. O meu trabalho de pintor exige que eu saiba pelo menos enviar e-mails e mexer com programas como o Word. Ainda bem que temos um professor calmo e que explica muito bem”, pondera Edilson Lino de Oliveira, de 33 anos, sem velar a satisfação.
A autônoma Janete Rodrigues de Almeida, de 46 anos, assim como a dona de casa Sandra Portela de Oliveira, de 53 anos, e a costureira Rita de Cássia Schuelter Silva, de 47 anos, quis aprender informática principalmente para usar mídias sociais e manter contato com amigos e familiares. “Minhas duas filhas moram fora e assim posso falar com elas com mais facilidade. Temos dificuldades de aprendizado, mas vamos indo. O curso é muito bom”, revela Sandra.
O que também ratifica o êxito do projeto é o baixo nível de desistência. A cada turma, no máximo um ou dois alunos deixam a escola. As causas normalmente são problemas sérios de saúde ou falta de tempo. “Fazemos o possível para evitar que desistam, tanto que oferecemos alternativas de horário”, confidencia Jáder Ragazzi.
Em Graciosa, onde a economia é essencialmente agrícola, a inclusão digital trouxe uma grande transformação social e cultural. Não é difícil ver homens e mulheres trocando a enxada no final da tarde pelo computador, o que é encarado com naturalidade, já que 50% dos participantes atendidos pelo projeto são trabalhadores do campo. “Também recebemos pessoas da área de comércio e indústria querendo aprender a entrar em contato com fornecedor pela internet”, assinala o professor.
Acostumado a trabalhar com pessoas experientes em informática, Jáder Ragazzi relata que se surpreendeu quando se dispôs a encarar o desafio de lecionar para adultos que nunca usaram um computador. “É um aprendizado bacana, tanto pra eles quanto pra mim. No geral, são curiosos e pacientes. É bonito ver o interesse de um em ajudar o outro. Aprendo inclusive valores com eles. Afinal, muitos são maduros, pessoas com mais experiência de vida do que eu”, avalia.
Quando não estão em sala de aula, os alunos se comunicam pelas redes sociais, onde trocam piadinhas e planejam reuniões esporádicas. “Sempre chamam para dar um pulo na casa deles ou no sítio. Então a gente vai lá e faz uma confraternização. É um pessoal muito bacana, com quem vale muito a pena trabalhar”, afirma Ragazzi.
Curso de informática tem lista de espera para 2016
Ao ingressarem no curso de informática oferecido pela cooperativa Sicredi em parceria com a Fatecie, os participantes passam por um processo de nivelamento para que o professor possa trabalhar adequadamente com todos os alunos ao mesmo tempo.
“Aqui eles aprendem a mexer com a internet e com o pacote Office, da Microsoft, que inclui Word, Excel e PowerPoint. Todo o material didático é entregue a eles em um pendrive. E nesse mesmo dispositivo eles armazenam as atividades”, detalha o professor Jáder Ragazzi, acrescentando que a apostila foi desenvolvida pelo professor André Dias Martins, coordenador do curso de sistemas para a internet da Fatecie.
Para não ficar datado, o material digital é constantemente atualizado. Com o Word, os alunos aprendem a editar texto e melhorar a digitação. Já o PowerPoint é usado mais como recurso preparatório para a inserção de imagens em mídias sociais. “Daí quando chega na internet, eles estão tinindo”, comemora Ragazzi, lembrando que deu aulas em Graciosa até para alunos de 80 anos, com quem mantém contato quase diário pelo Facebook.
Após os quatro meses de curso, os participantes recebem os certificados. Para 2016, a procura pelo projeto de inclusão digital deve crescer ainda mais. A maior prova disso é o fato de que existe uma grande lista de espera.
Saiba Mais
Em julho, a diretoria da Sicredi União embarcou para os Estados Unidos. Em Denver, no Colorado, o projeto de inclusão digital concorreu ao prêmio do Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito (Woccu).
A cada quatro meses 30 novos alunos ingressam na Escola de Inclusão Digital do Sicredi União PR/SP
As aulas são realizadas às terças e quintas-feiras em três horários: 14h às 16h, 16h às 18h e 19h às 21.
Os participantes também podem participar de mais de 800 cursos online disponibilizados pelo Sicredi.
Contato
Para mais informações sobre o projeto, ligue para (44) 3428-1371
Desigualdade, empatia, descomedimento e humanidade
A Organização Não Governamental Oxfam International divulgou esta semana uma pesquisa revelando que há grande probabilidade de que até o ano que vem 1% da população mundial assuma o controle de 50% das riquezas do mundo.
Acredito que a ideia da Oxfam seja propor um debate sobre o assunto, claro que já deixando transparecer uma crítica prenunciando os desdobramentos mais severos do que chamam hoje em dia na Europa de bancarrota social, só para ser o mais objetivo possível na minha análise superficial. Daí em redes sociais surgem pessoas com comentários de campina envolvendo meritocracia ou indo um pouco mais além e declarando:
“É isso aí, também quero fazer parte desse 1%”, “Fala mal, mas queria estar no lugar deles” ou “Se não consegue se juntar a eles é porque não tem capacidade pra isso.” São comentários que poderiam simplesmente ser qualificados como individualistas, triunfalistas, egocêntricos, mas não é só isso. Está além disso.
É possível fazer uma observação usando a empatia como exemplo. Sim, ela parece cada vez mais fortuita como mostra a internet, principalmente em mídias sociais como Facebook. Chega a ser digna de abjeção em muitos casos. Diuturnamente, sofre por ser extirpada e privada da própria semântica.
Hoje em dia, na chamada hipermodernidade, é grande o número de pessoas que se colocam numa posição de figura proeminente do digitalismo. Há opinião para tudo e sobre tudo, mesmo sobre aquilo que sequer dedicou alguns minutos de pesquisa. É preciso cultivar um mínimo de senso laborial.
Mídia social se tornou território fértil dos tribunais online. Tudo há de ser julgado com embasamento em senso particularista, “moral” que se confunde muitas vezes com amoral e imoral, e principalmente empirismo inconsistente. Na ausência do confronto físico, é comum o pensamento de que não há motivo para ser educado ou respeitoso. Na realidade, o descomedimento é atroz, “natural” em conceito distorcido e pluralizado.
Quem age de maneira inquisitória ou negligente costuma não ter dúvidas porque nunca teve perguntas. Se contenta com meias certezas, meias verdades de um mundo talvez até plano, como defendia Ptolomeu nos tempos do Renascimento. É alguém que refuta a complexidade, se nega a aceitar o poder da subjetividade, as nuanças que podem travestir mentira de verdade e vice-versa. Esses mesmos indivíduos não acreditam na possibilidade das divergências complementares das forças que regem o pensamento humano.
O Facebook nos prova que há quem prefira o anacronismo de um mundo paralelo e falsamente simplificado. Muitos não permitem discussões construtivas nem críticas. Aprendi na adolescência que crítica se fundamenta em argumento, desde então tomo isso como um referencial do que fazer, mas principalmente do que não fazer.
Numa sociedade tão desnivelada, e ainda fortemente influenciada pelo fatalismo e determinismo, acredito que o ser humano há de continuar perseverando como grande exemplo e símbolo do que eu acho adequado chamar de paradoxo existencial. No entanto, o que mais preocupa é que hoje em dia muita gente ensaia a própria humanidade, pois optou por se despir dela. Sendo assim, cresce a incapacidade humana de verdadeiramente sentir-se humano.