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Considerações sobre Hitler e sua ascensão
Em 1933, o Partido Nazista se tornou o maior partido do Reichstag, sendo liderado por Adolf Hitler que assumiu como chanceler da Alemanha em 30 de janeiro. Foi só quando Hitler, com o apoio do Parlamento, aprovou a Lei Habilitante que a Alemanha começou a sua transição para o nazismo. Sim, a população que o elegeu não sabia exatamente que Hitler submeteria a República de Weimar a um governo autoritário e autocrático.
Também não pensavam a respeito nem se preocupavam com a possibilidade porque a prioridade-mor era a recuperação econômica, independente de qual seria o custo. Sendo assim, se aparecesse um “salvador da pátria”, mesmo que com discurso populista, porém temerário, naturalmente ignorariam e considerariam os louros do possível progresso. E foi o que aconteceu.
Hitler, como líder do maior partido do Parlamento, conquistou bastante influência até 1932, mas não o suficiente para ganhar a simpatia do presidente Paul von Hildenburg, que comandou o Exército Imperial Alemão, e considerava Hitler um “militar medíocre e boêmio”. Hildenburg evitou o máximo que pôde a transmissão da chancelaria para Hitler, mas por pressões externas e políticas acabou cedendo e vindo a falecer pouco tempo depois, em 1934, no mesmo ano em que Hitler instaurou efetivamente o Terceiro Reich.
A principal arma de Hitler para ganhar a confiança da população foi a propaganda nazista que se apresentava como uma terceira via e fez uma grande parcela dos alemães considerarem os judeus como inimigos, mas não a princípio com a tentativa de relegá-los como inferiores (ou com qualquer relação com a questão ariana ou a eugenia), como faria mais tarde, mas sim como representantes de algo que, segundo Hitler, estava destruindo o país – os comunistas e os capitalistas. Isso mesmo, embora uma antítese, Hitler enxergava esses dois espectros econômicos diametrais como inimigos dos alemães, e vendia essa ideia. Essa crença também permitiu que sua popularidade aumentasse muito, já que Hitler era rejeitado pelos muitos simpatizantes de Hildenburg, que o viam como um ameaça ao Estado Alemão.
Mas com a criação de um inimigo visível, e próximo de todos os alemães, a população germânica, imersa no sonho da recuperação econômica, comprou massivamente a propaganda hitlerista como símbolo da idealização de um Estado rico que pudesse não apenas salvar os alemães, mas se sobressair a todos os outros, e a partir daí então se perpetuaria, de fato, a crença na eugenia, e em uma suprassoberania. Em síntese, o nazismo conquistou a simpatia da população não pelo autoritarismo embutido ideologicamente, mas pelos supostos benefícios econômicos que na mente de uma massa incauta faria qualquer mal valer a pena.
Como os matadouros influenciaram Hitler na idealização dos campos de concentração
Em 2002, o escritor Charles H. Patterson publicou o livro “Eternal Treblinka: Our Treatment of Animals and the Holocaust”, em que aborda como os matadouros serviram como referência para a construção dos campos de concentração durante o regime nazista. Tudo começou quando o empreendedor Henry Ford decidiu visitar um matadouro em Chicago. “Os animais abatidos, suspensos de cabeça para baixo em uma corrente móvel ou transportador, passam de trabalhador para trabalhador, e cada um deles executa algum passo particular no processo”, registrou Ford em sua autobiografia “My Life and Work”, de 1922.
Patterson afirmou que essa experiência de Ford, que serviria de exemplo para ele implementar nas suas linhas de montagem um sistema bastante avançado à época, influenciaria Adolf Hitler a seguir o mesmo caminho. A diferença é que em vez do ditador nazista aplicá-lo em fábricas e indústrias, ele faria isso em campos de concentração. “Hitler baseou todo o tratamento dado aos judeus nas linhas de produção dos matadouros dos Estados Unidos. Ele idolatrava Henry Ford, cuja inspiração para o sistema revolucionário da linha de montagem surgiu depois que ele visitou matadouros em Chicago na sua juventude. Essencialmente, Hitler construiu os seus próprios matadouros substituindo animais por seres humanos”, escreveu Charles Patterson na página 72 de “Eternal Treblinka”.
Para o autor isso significa que a objetificação animal durante e após a Revolução Industrial acabou facilitando também a objetificação humana, já que uma acabou por servir de exemplo a outra. Embora ainda hoje muita gente atribua a Ford o pioneirismo na criação das linhas de montagem que simbolizam a organização racionalizada do trabalho, a verdade é que todo o trabalho desenvolvido por ele teve como pioneiros os empresários Gustavus Swift e Philip Armour, da indústria da carne. “Henry Ford ficou tão impressionado com a maneira eficiente com que os operários abatiam e desmembravam animais em Chicago, que ele decidiu contribuir com o abate de pessoas na Europa, desenvolvendo um método que seria usado pelos alemães para matar judeus”, declarou Patterson.
No livro “Harvest for Hope: A Guide to Mindful Eating”, publicado em 2006, a escritora, primatóloga, etóloga e antropóloga britânica Jane Goodall explicou que os animais suspensos, com as pernas agrilhoadas, suas cabeças para baixo, e se movimentando de um lado para o outro, era o modelo perfeito de uma linha de produção aos olhos de Henry Ford, que buscava uma solução para a criação da ideal linha de montagem automobilística. Mais do que eficiente, a linha de produção na indústria da carne ofereceu aos trabalhadores a oportunidade de serem vistos de outra forma:
“Os animais foram reduzidos a produtos industrializados e os operários tornados insensibilizados poderiam se ver como trabalhadores de linha de produção em vez de assassinos de animais. Mais tarde, os nazistas usaram o mesmo modelo de matadouro para o assassinato em massa em campos de concentração. A linha de montagem tornou-se um meio para que os soldados nazistas se desconectassem da matança – vendo as vítimas como ‘animais’, e eles próprios como trabalhadores”, enfatizou Goodall.
Segundo a antropóloga britânica, Henry Ford era um antissemita fervoroso que desenvolveu uma linha de montagem que serviria de base para os campos de extermínio. O empresário admirava abertamente a eficiência nazista. Hitler retribuiu a admiração. O líder alemão considerava ‘Heinrich Ford’, um irmão de armas e manteve um retrato em tamanho real do magnata da indústria automobilística em seu escritório na sede do Partido Nazista.
De acordo com Charles H. Patterson, Henry Ford lançou uma campanha antissemita que ajudou a tornar o Holocausto uma realidade. Para fundamentar essa afirmação, ele cita o jornal Dearborn Independent, lançado por Ford no início da década de 1920. No periódico, ele publicou uma série de artigos baseados nos textos dos “Protocolos dos Sábios de Sião”, um tratado antissemita que começou a circular pela Europa após a Revolução Russa de 1917.
Mas uma das maiores contribuições de Henry Ford ao regime nazista foi a publicação dos artigos que dariam origem ao livro “The International Jew”, lançado em 1920, uma obra assumidamente antissemita que teve papel fundamental na formação da ideologia nazista. Patterson revelou que Theodor Fritsch, um dos primeiros apoiadores de Hitler, foi um dos principais divulgadores do livro de Ford:
“Graças a uma campanha publicitária bem financiada e ao prestígio do nome Ford, ‘The International Jew’, foi extremamente bem-sucedido. […] Encontrou sua audiência mais receptiva na Alemanha, onde ficou conhecido como ‘The Eternal Jew’. Ford era extremamente popular na Alemanha. Quando sua autobiografia foi comercializada lá, virou imediatamente o best-seller número um do país. No início da década de 1920, o livro se tornou a bíblia do antissemitismo alemão, com a editora de Fitsch editando seis edições entre os anos de 1920 e 1922.”
No livro “Biopolitical Media: Catastrophe, Immunity and Bare Life”, lançado em 2015, Allen Meek frisou que o processo industrializado de abate de animais criados para consumo se tornou um modelo para os nazistas como “solução final”. Ou seja, a forma mais eficaz de se livrar de judeus: “O encobrimento gradual do abate de animais a partir da visão pública; o processo industrializado de matar um número cada vez maior de criaturas (hoje chegando a bilhões) foi o que provocou inevitável comparação com o genocídio nazista. A brutalidade dos assassinatos exige que aqueles que trabalham na indústria da carne se dessensibilizem em relação ao sofrimento animal, enquanto o consumidor de carne é estimulado a jamais pensar sobre o processo de matança, que é mantido fora de vista.”
Meek aponta que a dissociação entre morte e vida incentivada pela indústria fez e faz com que muitas pessoas desconsiderem o sofrimento animal no contexto da cultura de consumo, até pelo fato de haver um proposital distanciamento. Esse mesmo distanciamento fez com que grande parte dos apoiadores do Holocausto não racionalizassem o seu apoio. Ou seja, o sofrimento e as mortes eram desconsideradas porque os apoiadores do genocídio não precisavam testemunhar as medidas de extermínio.
Referências
Patterson, Charles H. Eternal Treblinka: Our Treatment of Animals and the Holocaust. Lantern Books. First Edition (2002).
Ford, Henry. My Life and Work (1922). CruGuru (2008).
Goodall, Jane. Harvest for Hope: A Guide to Mindful Eating. Grand Central Publishing. Reprint Edition (2006).
Meek, Allen. Biopolitical Media: Catastrophe, Immunity and Bare Life. Routledge. First Edition (2015).
“Henry Ford, que ficou impressionado com a eficiência dos matadouros de Chicago, deu a sua contribuição para a matança de pessoas na Europa”
Henry Ford, que ficou impressionado com a eficiência dos matadouros de Chicago, deu a sua contribuição especial para a matança de pessoas na Europa. Não só desenvolvendo o método de linha fabril que os alemães usaram para matar judeus, mas também lançando uma campanha antissemita que favorecia o holocausto.
O propósito da matança alemã centrava-se no extermínio de seres humanos. Operavam no largo contexto de sociedade de exploração e matança de animais, que eles imitaram. Os alemães não deixaram de matar animais quando começaram a exterminar pessoas.
Auschwitz, sob o comando de Rudolf Hess, era conhecido como o maior matadouro de pessoas que a história já viu; tinha o seu próprio matadouro. Os campos de morte mantinham o seu pessoal [nazistas] bem alimentado com carne.
Sobibor tinha currais de vacas, porcos, etc, que eram ao lado da entrada que levava os judeus à câmara de gás. Em Treblinka, tinham estábulo, e a pocilga junta ao campo das barracas dos auxiliares ucranianos.
Excertos de “Eternal Treblinka”, de Charles Patterson, publicado em 2002 pela Lantern Books.
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Kupfer-Koberwitz: “Acredito que enquanto o homem torturar e matar animais, ele vai torturar e matar seres humanos também”
Me recuso a comer animais porque não posso me nutrir a partir do sofrimento e da morte de outras criaturas
Em 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, o pacifista alemão Edgar Kupfer-Koberwitz foi classificado como um inimigo da Alemanha e enviado para um campo de concentração em Dachau, ao norte de Munique. Mesmo vivendo em situação degradante, ele se manteve fiel a sua filosofia de vida como vegetariano.
Quando recebia uma porção de carne, Kupfer dava aos seus companheiros prisioneiros, de acordo com informações do “Guide to the Edgar Kupfer-Koberwitz Dachau Diaries 1942-1945”, da Universidade de Chicago. Durante os anos em que esteve em Dachau, ele escreveu diariamente sobre a sua vida e suas impressões da realidade. Para Kupfer, o fato do ser humano negar humanidade a seus semelhantes e, assim agir de forma cruel, sempre foi determinante na legitimação da brutalidade contra os animais.
“Acredito que enquanto o homem torturar e matar animais, ele vai torturar e matar seres humanos também – e guerras serão travadas – pois o assassinato deve ser praticado e aprendido em uma pequena escala. Devemos tentar superar nossa própria pequena crueldade irrefletida, evitá-la e aboli-la”, escreveu em seu diário que deu origem ao livro “Dachauer Tagebücher Die Aufzeichnungen des Häftlings 2481”, publicado em Munique em 1997, baseado em suas memórias e reflexões.
Segundo informações da Biblioteca da Universidade de Chicago, depois de conseguir um trabalho como balconista em uma loja do campo de concentração, Edgar Kupfer-Koberwitz começou o seu próprio diário em pequenos pedaços de papel. A princípio, ele relatava principalmente os incidentes da vida em Dachau.
Para não ser flagrado e punido, ele escondia suas folhas entre outros papéis. Até que mais tarde, preocupado em perder tudo que tinha escrito, tomou a decisão de enterrar seus diários. Ainda assim, foi impossível preservar todas as folhas porque algumas foram danificadas pelo contato com a água.
“Me recuso a comer animais porque não posso me nutrir a partir do sofrimento e da morte de outras criaturas. Me recuso a fazê-lo, porque sofri tão dolorosamente que posso sentir as dores dos outros, lembrando meus próprios sofrimentos”, declarou em carta que faz parte do ensaio “Animais, Meus Irmãos”, que integra seus diários preservados pela Universidade de Chicago.
A passagem foi escrita quando, após contrair tifo, o pacifista alemão estava em um barracão que funcionava como hospital. Mesmo doente e receando a própria morte, ele conseguiu sobreviver, ao contrário de outros 12 mil prisioneiros que sucumbiram em decorrência de doenças ao longo de quatro meses e meio.
“Me sinto feliz, ninguém me persegue; por que devo perseguir outros seres ou fazer com que sejam perseguidos? Não sou prisioneiro, sou livre; por que eu faria com que outras criaturas fossem feitas prisioneiras e jogadas na prisão? Ninguém me prejudica; por que eu deveria prejudicar outras criaturas e fazê-las sofrer?”, ponderou Kupfer.
Edgar Kupfer-Koberwitz foi libertado pelas Forças Armadas dos Estados Unidos em 29 de abril de 1945, assim como outros mais de 67 mil prisioneiros. Quando se deu conta de que estava realmente livre para continuar a sua vida, ele declarou: “O dia acabou, celebrarei este 29 de abril de 1945 pelo resto da minha vida como o meu segundo aniversário, como o dia que me deu novamente a vida.”
Conforme o “Guide to the Edgar Kupfer-Koberwitz Dachau Diaries 1942-1945”, durante a Segunda Guerra Mundial, Adolf Hitler proibiu que todas as organizações vegetarianas continuassem ativas em territórios ocupados pela Alemanha. Também ordenou a prisão de seus líderes. Tal iniciativa foi colocada em prática porque o vegetarianismo organizado era visto como uma ameaça, por se aproximar dos mesmos ideais das organizações pacifistas que o Führer desprezava.
“Ninguém me mata. Por que devo ferir ou matar outras criaturas, ou fazer com que sejam feridas ou mortas para o meu prazer e conveniência? Não é natural que eu não cause dor em outras criaturas que, eu espero e temo, nunca causarão em mim? Não seria injusto fazer tais coisas sem outra finalidade senão gozar deste insignificante prazer físico à custa do sofrimento dos outros, da morte de outros?”, interpelou o pacifista alemão em seu diário.
A vida de um pacifista alemão
Edgar Kupfer-Koberwitz nasceu na cidade de Koberwitz, na Alemanha, em 24 de abril de 1906 e estudou em Bonn, Regensburg e Stuttgart. Após o divórcio de seus pais, ele deixou a escola para ajudar sua mãe e sua irmã. Trabalhou em fábricas, lojas e bancos. Como consequência de uma desilusão amorosa, foi para a Itália em 1925.
Entre idas e vindas até 1940, trabalhou em jornais, agências de viagens e também como modelo para um escultor. Após a sua libertação, ele viveu nos Estados Unidos até o início dos anos 1950. E depois, se mudou para a Sardenha. Decidiu viver definitivamente na Alemanha a partir de 1984. Ele faleceu em Stuttgart, na Alemanha, em 7 de julho de 1991.
A autenticidade de seus diários foi confirmada pelos agentes do Corpo de Contra-Inteligência (CIC), e também por testemunhas. Ele criou e distribuiu um questionário entre ex-prisioneiros, assim reunindo declarações sobre seu comportamento no acampamento e sobre sua confiabilidade. Os relatos nos diários de Edgar Kupfer, doados à Universidade de Chicago em 1º de abril de 1954, foram publicados de forma fragmentada pela primeira vez no semanário do parlamento alemão “Aus Politik und Zeitgeschichte”, sob o título “Als Häftling in Dachau”.
Saiba Mais
“Die Tierbrüder − eine Betrachtung zum ethischen Leben“, ou “Os Irmãos Animais – Uma Consideração da Vida Ética”, ensaio que ele escreveu sobre vegetarianismo, foi publicado na íntegra no livro “Radical Vegetarianism”, de Mark Mathew Braunstein, em 1981.
Referências
https://www.lib.uchicago.edu/e/scrc/findingaids/view.php?eadid=ICU.SPCL.KOBERWITZ
http://neveragain.org.il/articles/animals-my-brethren-edgar-kupfer-koberwitz/
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Frei Jerônimo e a dura realidade do pós-guerra
“Eu era criança e vivíamos em um campo de refugiados na Tchecoslováquia. Lá, tinha uma floresta, e um dia a mãe foi junto conosco procurar frutas para comer. Tinha uma mina de água, colhemos folhas de agrião, escondemos nos bolsos e levamos para o campo. De manhã, quando ganhamos uma fatia de pão seco, colocamos o agrião e comemos. E o gosto era muito bom, porque o agrião já vem temperado da natureza.
Lá, eles amarraram minha mãe mal vestida em cima de um jipe com cordas e passaram pela cidade. Quebraram todos os dentes do meu pai com cassetete. As crianças tinham que sair com faixa amarela para pedir comida, e sabe que comida eles ofereciam pra nós? A borra de café. E eles davam risada quando nossa boca ficava suja, e faziam isso de brincadeira, para nos chatear.
Quando voltei em 2003, um dia saí do meu quarto para andar pela floresta, e aí aconteceu uma coisa bonita, veio um são-bernardo, um cachorrão que sobe montanhas para ajudar a procurar pessoas perdidas na neve. Quando ele estava perto de mim, coloquei as mãos nas costas, abaixei a cabeça e conversei com o cachorro. E depois veio o tutor, correndo e ofegando, falando que o cachorro era bravo. E eu disse que não, que ele não era bravo. Falei para o cachorro que eu não iria bater nele e ele não poderia me morder. O homem ficou me olhando e dizendo: ‘Como? Como pode falar?’ Falei que sim, converso com ele. Me entendo com cachorro.
Essa cachorrinha que está aqui com a gente aqui agora, nós nos entendemos. Eu não gosto de gente que bate em cachorro. Não gosto de gente que não aceita cachorro. Dá pra desconfiar. O cachorro quer sair, então por causa do cachorro eu vou todos os dias ao bosque. Se não fosse por ele, eu ficaria no meu quarto. O cachorro me chama. Tinha um gato aqui também. O gato e o cachorro se davam muito bem, mas um funcionário do convento matou ele. Falei pra ele que eu sei o que ele fez. Escutei dois cliques do gato. E naquele dia éramos os únicos em casa.”
Excertos de uma entrevista que fiz com o alemão George Karl Brodka (Frei Jerônimo). Conversamos principalmente sobre o que ele e sua família viveram após o fim da Segunda Guerra Mundial, quando foram enviados para um campo de refugiados na então Tchecoslováquia.
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Uma manhã com Frei Jerônimo
Fiquei muito feliz de conhecer o alemão George Karl Brodka (Frei Jerônimo), que sobreviveu à Segunda Guerra Mundial e à dominação soviética. A conversa rendeu algumas horas e agora já penso em transformar isso não apenas em uma reportagem, mas algo muito maior. Inclusive me comprometi em retornar mais vezes. Logo abaixo, segue uma prévia do bate-papo com Frei Jerônimo que vive no Seminário Imaculada Conceição desde o início da década de 1960. (Na foto, ele está segurando o primeiro dicionário de alemão/português que comprou antes de se mudar para o Brasil)
Suas impressões da Segunda Guerra Mundial são narradas sob a ótica de uma criança, já que na época ele não tinha mais que dez anos. Brodka se emociona ao contar que seu pai, assim como muitos outros alemães, entraram para o exército porque suas famílias estavam passando fome, e era o único tipo de trabalho disponível na Alemanha nazista. “Participei de um encontro de oficiais da Alemanha na década de 1950, e meu pai chorou ao dizer que nunca matou ninguém e jamais deu alguma ordem de assassinato.”
Brodka diz se envergonhar e não entender como na infância ele e muitas outras crianças tiveram coragem de andar sobre os cadáveres dos soldados mortos, retirando distintivos para compor suas coleções. Crente de que o filho de 14 anos não teria futuro na Alemanha Oriental, o pai de George Karl forjou documentos para que ele pudesse atravessar a fronteira. “Tive que percorrer uma grande selva, e depois acabei preso. Fui preso duas vezes na minha vida”, narra.
Outro relato surpreendente é o do dia em que os tchecos amarraram sua mãe com uma corda no capô de um jipe e percorreram toda a cidade fazendo piadas e a exibindo como um troféu. “Eles também nos obrigavam a comer borra de café e depois faziam piadas dos nossos dentes pretos. Eles odiavam os alemães”, declara. Seu tio, um pregador, foi capturado pelos poloneses e enforcado em uma árvore diante de uma plateia porque transportava uma bíblia. “Em algumas regiões a circulação da bíblia era proibida”, enfatiza.
Brodka conta que pelo fato de ter vivido muitos anos na Alemanha Oriental, quando ele decidiu se tornar carmelita sofreu muito preconceito. “Na Alemanha Ocidental, na própria Ordem do Carmo, não me chamavam pelo nome, mas apenas de comunista. Até mesmo quando cheguei em Paranavaí, e os outros padres ficavam sabendo que vivi na Alemanha Oriental, sempre se referiam a mim como ‘o comunista’. Era muito triste”, lamenta.
Algumas frases ditas por Frei Jerônimo e que ainda continuam ecoando na minha mente:
“Um dia, na Alemanha, um Bernardino, um cachorro que ajuda a encontrar pessoas perdidas nas montanhas, escapou do seu tutor e correu em minha direção. Quando ele se aproximou de mim, coloquei as mãos nas costas, abaixei a cabeça e conversei com ele. Depois veio o tutor dele correndo e disse que o cachorro era bravo. Eu falei que não, que ele não era bravo. Então olhei pro cachorro e expliquei: ‘Não vou bater em você e você não vai me morder.” O homem achou que eu estava louco: ‘Como?’ Expliquei que falei com o cachorro e ele entendeu. Sempre me entendi muito bem com cachorros.”
“Não gosto de gente que bate em cachorro. Não gosto de gente que não aceita cachorro. Dá pra desconfiar de gente assim…”
“Uma coisa que acho estranha em brasileiro é que brasileiro gosta de dizer que é descendente de italiano, alemão, português…que é descendente disso ou daquilo. Por que não apenas gostar de ser brasileiro?”
Frei Jerônimo é o fundador do Grupo Escoteiro Guy de Larigaudie, de Paranavaí, que este ano completou 50 anos.
O legado romanesco de Knut Hamsun
O virtuoso escritor norueguês que morreu na pobreza após declarar sua simpatia pelo nazismo
Knut Hamsun, um dos maiores escritores da Escandinávia, nasceu em 4 de agosto de 1859 em Gudbrandsdalen, na Noruega. Cresceu em meio à pobreza da pequena comuna de Hamarøy, em Nordland. Na infância e adolescência, trabalhou como aprendiz de sapateiro e pedreiro, até que mais tarde conseguiu se tornar professor. Insatisfeito com os rumos de sua vida, Hamsun passou alguns anos viajando pelos Estados Unidos, onde atuou como motorista de bonde e publicou as impressões satíricas daquele país sob o título Fra det Moderne Amerikas Aandsliv (A Vida Intelectual da América Moderna) em 1889.
Mas foram os romances Sult (Fome), de 1890, e Pan, de 1894, que chamaram a atenção para o trabalho do escritor, considerado até hoje o precursor da verdadeira literatura moderna norueguesa. O trabalho de Knut Hamsun, independente de época, é determinado por profunda aversão à civilização. Suas obras reafirmam sua crença de que a realização do homem só é possível por meio da sua basilar relação com a terra.
Sem dúvida, um primitivismo que lançou luz sobre sua desconfiança em relação a tudo que é moderno. A máxima expressão dessa filosofia pode ser percebida na obra Markens Grøde (Crescimento do Solo). Os primeiros trabalhos de Hamsun já traziam à tona características fundamentais que marcariam a sua trajetória como escritor. Exemplos são seus personagens baseados em párias. A figura do vagabundo na obra do norueguês é uma constante fundamental porque à época representava a mais agressiva das oposições à civilização.
Com o amadurecimento literário, o autor experimentou considerável gradação. Substituiu a hostilidade figurativa pela resignação melancólica em relação à perda da juventude. O envelhecimento então começou a ocupar lugar de destaque em peças como Livets Spil (Jogo da Vida), de 1896, e Aftenrøde (Sol), de 1898, assim como nos romances Under Høststjernen (Sob a Estrela do Outono), de 1906, Benoni, de 1908, e En Vandrer Spiller med Sordin (Um Andarilho Toca com Cordas Silenciosas). Antes, em 1904, ele publicou o livro de poemas Det Vilde Kor (O Coro Selvagem).
Na última fase da carreira como escritor, Knut Hamsun, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1920, já não se preocupava mais com a construção de figuras individuais. Sua atenção se voltou totalmente para os grandes ataques à civilização, um tema que se estende pelos livros Børn av Tiden (A Criança da Era), de 1913; Segelfoss By, de 1915; Landstrykere (Vagabundos), de 1927; August (Agosto), de 1930; Men Livet Lever (A Estrada Leva), de 1933; e Ringen sluttet (O Anel está Fechado), de 1936.
Desde sempre um admirador da Alemanha, principalmente da cultura germânica, quando os nazistas invadiram a Noruega em 1940, Hamsun declarou publicamente sua simpatia por Adolf Hitler, o que surpreendeu muito os noruegueses. Com isso, logo após a guerra, o escritor perdeu a propriedade onde vivia e foi colocado sob observação psiquiátrica. Pouco conhecido no Brasil, mas muito respeitado na Europa e nos Estados Unidos, Knut Hamsun passou os últimos anos de vida na pobreza.
Em 1945, aos 86 anos, escreveu o obituário de Adolf Hitler no jornal norueguês Aftenposten. A publicação em que ele homenageia o líder nazista se tornou a mais infame de suas obras, inclusive ofuscando o seu respeitado trabalho literário. Em um dos trechos, o escritor afirma que Hitler foi um guerreiro da humanidade, um pregador do evangelho da justiça que serviu de exemplo para todas as nações. “Nós, seus seguidores mais próximos, devemos inclinar nossas cabeças em respeito à sua morte”, escreveu.
Knut Hamsun faleceu em 19 de fevereiro de 1952, aos 92 anos. Em 1954, seus trabalhos voltaram a ser reeditados e publicados. No mesmo ano, uma edição de 15 volumes resgatou toda a trajetória literária do autor.
Referências
Nobel Lectures, Literature 1901-1967, Editor Horst Frenz, Elsevier Publishing Company, Amsterdam, 1969.
Reputação Póstuma de Knut Hamsun
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Porianna, nascimento e morte de um jovem neonazista
Não o reconhecia. Defendia crimes contra migrantes, imigrantes e falava em limpeza étnica
Conheci Piero pessoalmente quando tínhamos 17 anos. Ele era um adolescente comum. Estatura mediana, magro, cabelos e olhos castanhos e uma exímia vontade de existir e ser notado para além dos cravos e das espinhas que o exasperavam. No final dos anos 1990, nos tornamos amigos por meio da música. Eu já gostava muito de heavy metal e ele também. Então começamos a fazer trade em Maringá, onde ele visitava familiares. Eu saía de Paranavaí e ele de São Paulo. Nos encontrávamos na Musical Box, na Avenida Brasil, onde trocávamos CDs e cópias de fitas de shows em VHS.
Piero era mais tímido do que eu. Falava pouco e não saía sozinho, pelo menos a maior parte do tempo. Me parecia sempre inseguro com seu olhar enviesado e vacilante que fortuitamente mirava o chão ou a parede mais distante. “Depois de mais de dois anos trocando ideias, é legal te conhecer, velho!”, eu disse apertando sua mão tão escanzelada que me dava a impressão de que eu estava segurando pés de galinha. Ele deu um sorriso fragilizado e acenou com a cabeça, em concordância, retomando uma postura que se esforçava para velar uma precoce hiperlordose.
Meu primeiro contato com Piero foi pela internet, em um canal de fãs de heavy metal da velha rede social Brasnet, acessada pelo programa mIRC, muito usado pela geração anos 1980. Tínhamos um grupo de dezenas de pessoas e passávamos pelo menos duas horas por dia tentando expandir nosso canal, fazendo brincadeiras e trocando informações sobre música. Era divertido. Eu era um dos operadores do canal, assim como Piero. Na internet ele se soltava mais. Se sentia mais livre e seguro para manifestar suas opiniões, anseios e inclinações. Nessas horas suas mãos não suavam ou tremulavam porque não havia contato físico. Pessoalmente, Piero só perdia a inibição em shows, quando o álcool e a música em volume extremamente alto o livravam das amarras da excessiva ponderação.
Ficava sorridente, falava com estranhos, perdia o medo de se aproximar de garotas e até trocava números de telefone. Sóbrio, continuava vivendo em um mundo que distante da realidade eletrônica parecia-lhe visceralmente acinzentado e taciturno. Mais tarde, descobri que Piero sofria de ansiedade e depressão. Nem mesmo seu pai sabia disso. A verdade é que se sentia feio, deslocado, magro demais e desprezado pelo mundo. Seu único orgulho eram os cabelos longos que movimentava com a destreza de um chicote amendoado nos shows que assistia motivado pela mais bucólica das empolgações. Sorria como criança vendo um pônei pela primeira vez.
A última vez que o encontrei pessoalmente foi em 2001, num festival de bandas de heavy metal no Tribo’s Bar, em Maringá. Ele tinha bebido bastante e estranhei quando percebi que sumiu em meio à multidão. Eram três horas da manhã e Piero estava lá fora, sentado sobre o meio-fio enquanto a aragem repentina fazia seus cabelos velarem seu rosto como uma máscara. Ele ajeitou os fios e vi seus olhos vermelhos e úmidos – vestígios de choro.
“Meu pai me expulsou de casa e agora estou sem rumo. E pra piorar, ele ainda fez eu perder meu emprego. Foi bêbado lá na loja de discos onde eu trabalhava e bateu no meu chefe, falando que ele estava usando a música pra me ensinar a venerar o diabo. Foi punk, mano! Minha sorte é que arrumei um quarto na casa da minha tia em Santo André”, desabafou.
A mãe de Piero faleceu em decorrência de câncer de mama quando ele tinha 13 anos. A convivência com o pai era muito conturbada. Ele não passava um dia sem ouvir críticas e ofensas à sua aparência e estilo de vida. Sempre que o pai bebia demais era obrigado a suportar as consequências. Muitas vezes teve de pular a janela e dormir em banco de praça para não ser espancado no próprio quarto. A hiperlordose de Piero também era resultado de chutes e socos desferidos pelo pai.
Quando se mudou para Santo André, Piero abandonou o nosso canal na Brasnet. O procurei por semanas até encontrá-lo em um canal secreto chamado Porianna. Consegui ingressar no grupo com um novo pseudônimo, me passando por outra pessoa. A liberação levou alguns dias. No grupo, Piero usava o nome de Globocnik, em homenagem ao austríaco Odilo Globocnik, general da SchutzStaffel (SS), a tropa de proteção do Partido Nazista.
Porianna era um grupo neonazista criado em 1999 e que contava com dezenas de participantes, talvez muito mais, principalmente das regiões Sul e Sudeste do Brasil. Alguns defendiam o racialismo pacífico enquanto outros pregavam o ódio contra raças não brancas, defendendo inclusive ações pontuais de violência que eram cuidadosamente articuladas. Muitas eram tão bem mascaradas que a polícia acreditava que eram casos isolados.
Acompanhando o grupo pelo canal da Brasnet, notei o embrutecimento e a transformação de Piero. Não o reconhecia. Defendia crimes contra migrantes e imigrantes. Falava em limpeza étnica e na aquisição coletiva de uma fazenda onde fundariam a sociedade Porianna, um novo país dentro do Brasil, onde pessoas armadas impediriam a entrada de pessoas não brancas.
“Estamos em todas as camadas da sociedade. Temos os boneheads na parte mais baixa da pirâmide, agindo junto ao proletariado, e juízes, advogados, médicos, engenheiros e jornalistas, todos bem preparados para influenciar a opinião pública. Não há como isso dar errado. Pode ser que não tão logo, mas um dia chegaremos lá”, declarou um homem, fundador do grupo que usava o pseudônimo de Plínio Salgado, em homenagem ao criador do movimento integralista ultranacionalista.
À época, registrei o discurso de uma mulher de 29 anos que se dizia juíza e era conhecida no Porianna como Vera Wohlauf por causa da sua simpatia pela esposa do oficial da SS Julius Wohlauf. O casal ficou famoso após passar a lua de mel assistindo e participando do massacre de judeus no gueto polonês de Miedzyrzec-Podlaski em 1942.
“A democracia não funciona, só que devemos fingir que sim. O que precisamos é encontrar, forjar ou criar um ponto de ruptura que faça a população, até mesmo inferiores como pretos, amarelos, pardos e outros mestiços, acreditar que o melhor caminho é uma política austera e ao mesmo tempo flexivelmente reacionária. As pessoas precisam achar que existe liberdade demais e que isso está associado à libertinagem. Façamos de conta que a nossa política há de ser maleável e quando ascendermos ao poder colocaremos em prática o nosso segundo plano que é a instauração de um governo verdadeiramente estoico, de extrema direita, mas muito superior ao molde hitlerista e franquista. Pinochet também descambou para o fracasso. O segredo é fingir que todos estão incluídos em nossas propostas. Nossa propaganda deve ser voltar para isso, uma ilusão factível”, dissertou Vera.
Aproximadamente um mês depois de ingressar no canal, conversei com Piero. Ele parecia mais seguro de si. No entanto, eu não tinha a mínima ideia de como isso poderia ser bom, levando em conta que ele se tornou uma pessoa completamente diferente. Estava morando sozinho e me contou que era bem pago para produzir, distribuir e despachar o material de divulgação do Porianna.
“A nossa sociedade foi construída sob os preceitos da cultura branca, totalmente ocidentalizada, então por que devemos absorver uma cultura que não corrobora esses valores? O resto é irrelevante, meu amigo, não tem o mesmo peso, a mesma significância. E quem não aceita isso merece ser expulso do Brasil, nem que seja à base de chutes e socos. Ter a pele clara também não diz nada. O que vale é a sua origem, sua identidade racial. Se você tem sangue não branco, você não é branco, mesmo que sua pele seja a mais clara do mundo. Cor de pele não prova que você seja caucasiano. Os traços também dizem mais do que a cor da pele”, defendeu Piero numa noite de conversa privada.
Ele já não ouvia mais heavy metal, somente bandas nacionais e internacionais de hatecore e rock against communism (RAC), grupos que pregavam racialismo, racismo, xenofobia, separatismo, violência e intransigência política e social. “Pela primeira vez eu tenho família, cara! Sou amado de verdade. Sou Porianna até a morte!”, comentou em outra ocasião. Um dia, não resisti e falei a ele quem eu era de verdade.
O questionei sobre o seu sumiço e o novo rumo de sua vida. Deixei claro que era difícil crer que alguém pudesse mudar tanto e se tornar algo completamente avesso a tudo em que ele acreditava. “Você desprezava violência e preconceito, cara. Tudo aquilo que seu pai era te dava repulsa. O que houve nesse entrementes?”, disparei. Piero demorou a responder e fiquei em silêncio aventando o que me esperava. Talvez me denunciasse e neonazistas viessem atrás de mim. Quem sabe a poucos quilômetros de distância houvesse algum simpatizante do Porianna disposto a atear fogo em minha casa quando soubesse que eu não era um deles.
Mas isso não aconteceu, embora a probabilidade não pudesse ser desconsiderada. Isto porque na chamada mais baixa hierarquia, o grupo contava com pessoas sem perspectivas de futuro. Eram capazes de matar ou morrer por um propósito, mesmo que ruim. Confundiam a ficção com a realidade, crentes de que talvez fossem heróis, que a morte não era o fim e que talvez renascessem como um tipo mais contemporâneo de highlander.
“Você é um merda, David! Sempre com esse papo de tolerância e não percebe que a própria vida é uma guerra. Estamos aqui para mostrar que uns merecem mandar e outros nasceram para obedecer. Nem todo mundo deve ter direito à vida, e muito menos o direito de tomar decisões que exigem reflexão. O mundo deve ser comandado pelos fortes, pelos puros de sangue, que conhecem a sua própria história. Não quero um mundo que prega a mistura de raças, a extinção dos povos caucasianos. Brancos não devem ser influenciados por outras raças”, registrou sem velar a irritação.
Depois daquele dia, desapareci do canal e soube que eles migraram para a rede internacional Undernet, onde criaram um vínculo com neonazistas portugueses. Em 2004, Jonas, um amigo em comum com Piero, dos tempos de shows em Maringá, me informou que ele foi assassinado dentro de casa, em Santo André. Além de mim, havia outro jovem infiltrado no grupo e ele estava lá para preparar uma retaliação pela surra que um grupo de simpatizantes do Porianna deu em seu irmão, um sharp (skinhead contra o preconceito racial), perto da Praça da Sé, em São Paulo, o deixando paraplégico.
Piero, que desconhecia o episódio, ouviu alguém batendo palmas em frente à sua casa numa manhã ensolarada de verão. Assim que se aproximou do portão segurando um copo de café, um homem disparou um tiro certeiro contra seu peito. O copo se espatifou no chão e Piero caiu agonizando, ainda com vida. Porém não resistiu às coturnadas que recebeu na cabeça, causando afundamento craniano e morte cerebral. Sobre a estante na sala de Piero havia uma foto em que aparecia eu, ele e Jonas em frente ao Tribo’s Bar em 2001. Naquela madrugada, Piero imobilizou um ladrão, impedindo que um sharp que também estava no Tribo’s fosse assassinado a facadas por um ladrão no Terminal Rodoviário Urbano de Maringá.
Anjo da Morte pode ter morado em Graciosa em 1954
Pioneiros de distrito de Paranavaí suspeitam que médico nazista viveu no Seminário Imaculada Conceição
Em 1954, um grupo de criminosos armou uma emboscada para assassinar o comerciante Ludovico Selhorst na colônia germânica Graciosa, distrito de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Para não serem identificados, os homens usaram máscaras e se esconderam em uma roça de milho nas imediações do comércio de Selhorst.
À noite, assim que o comerciante ficou sozinho, aguardaram alguns minutos, atiraram nele e fugiram. Quando Ludovico caiu, quem estava próximo do local estranhou o barulho e correu até lá para saber o que aconteceu. “Ele foi atingido perto do braço e não teve tempo nem de ver de onde a bala saiu”, relata a pioneira Francisca Bruning Schiroff que à época tinha 19 anos. Os irmãos da vítima, inclusive Jacob Selhorst que era o delegado do distrito, foram os primeiros a socorrer Ludovico, assim como João Bruning, pai de Francisca, que pediu para alguém chamar um médico hospedado no Seminário Imaculada Conceição.
“Ficamos sabendo desse doutor. Só que ninguém sabia quem era”, conta a pioneira. Descrito como alto, forte e aparentando ter mais de 40 anos, o médico pouco comunicativo estancou o sangramento, aplicou um antibiótico injetável e o encaminhou para o Hospital Professor João Cândido Ferreira, conhecido como Hospital do Estado, em Paranavaí. Para transportá-lo, como não havia ambulância naquele tempo, o colocaram sobre um colchão em cima de um caminhão. A princípio, Ludovico reagiu bem, mas não resistiu e faleceu na manhã seguinte.
A suspeita é de que os envolvidos no assassinato trabalhavam explodindo pedreiras com dinamite. “Achamos que o crime foi cometido por homens contratados para retirarem pedras de um rio perto de Graciosa. Eles estavam atuando na construção do seminário e se desentenderam na hora do pagamento. Me parece que queriam receber mais, então é provável que tenha sido um ato de vingança”, declara Francisca.
A pioneira se recorda do dia em que o frei Bonaventura Einberger falou sobre a chegada de um médico alemão para ajudar os mais necessitados. “Explicou apenas que o médico, assim como ele, também participou da guerra. Como a gente era bem jovem, ninguém tinha coragem de perguntar demais. Além disso, o ‘frei Bona’ não gostava de comentar sobre a Alemanha do período nazista”, relata. Apesar do conhecimento básico de português, o médico não enfrentou nenhum problema no distrito, até porque nos anos 1950 muitos moradores de Graciosa se comunicavam mais em alemão do que em português.
“Ele se vestia com simplicidade, acho que até para não chamar a atenção. Só que era fácil perceber que não era um médico comum”, avalia Francisca que certo dia foi até o seminário acompanhada da mãe para se consultar com o alemão de quem ninguém sabia o nome.
O médico demonstrava muita experiência profissional, tanto que soube lidar com todos os problemas de saúde dos pacientes. “As consultas com ele eram rápidas e quem não sabia alemão ia acompanhado de um intérprete. Me recordo que a primeira pergunta dele para a minha mãe foi: ‘Como está se sentindo?’”, cita a pioneira.
Polido, parcimonioso e reservado, o médico atendeu praticamente todas as famílias que viviam em Graciosa em 1954. Ainda assim, um fato curioso chamou a atenção dos moradores. O misterioso alemão não registrava prescrições médicas em papel nem pedia que alguém o fizesse para que ele apenas assinasse. “Era tudo falado, de boca mesmo”, garante Francisca Bruning Schiroff.
No distrito, o médico auxiliava o frei Bonaventura na distribuição gratuita dos medicamentos enviados da Alemanha pela Caritas Internacional, entidade de promoção e atuação social que trabalha na defesa dos direitos humanos, da segurança alimentar e do desenvolvimento sustentável solidário. “Eles também levavam remédios para o frei alemão Ulrico Goevert em Paranavaí. Era uma assistência muito boa. Realmente fazia a diferença”, pondera a pioneira.
Após ajudar muita gente em situação de carência social, um dia o homem partiu. A notícia foi lamentada pelos moradores de Graciosa. “Ele ficou mais ou menos um ano aqui. Ninguém sabe exatamente quando chegou nem quando foi embora”, confidencia Francisca. No distrito, o médico morou em um pequeno quarto no Seminário Imaculada Conceição. Poucas vezes foi visto em outros locais.
Alguns meses depois, Lidia Selhorst, esposa de Ludovico Selhorst, e também falecida, foi surpreendida ouvindo rádio, quando o locutor noticiou que estavam procurando o médico nazista Josef Mengele, conhecido como Todesengel, Anjo da Morte. A descrição era a mesma do médico que morou em Graciosa. “Falaram que o Mengele tinha inclusive uma cicatriz perto do pescoço. Quando ele se abaixou para prestar atendimento ao Ludovico, a Lidia viu essa cicatriz”, enfatiza Francisca Schiroff.
Como o frei Bonaventura Einberger foi enfermeiro da Wehrmacht, Forças Armadas da Alemanha nazista, até o final da Segunda Guerra Mundial, pode ser que eles tenham se conhecido anos antes. “Não dá pra afirmar até que ponto o ‘frei Bona’ o conhecia, mas a partida do médico foi suspeita. Acho que o frei ficou com medo de alguma coisa e recomendou que o homem partisse para outro lugar”, supõe a pioneira.
“Ele preferia crianças, gêmeos e anões”
Nascido em 11 de março de 1911 em Günzburg, na Alemanha, Josef Mengele se tornou um dos personagens mais famigerados da Segunda Guerra Mundial. Discípulo do geneticista Otman von Verschuer, com quem trabalhou em Frankfurt, Mengele tinha um doutorado em antropologia e outro em medicina.
Em 1937, ingressou no Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) e se voluntariou para trabalhar na SS Medical Corps como pesquisador de genética no reassentamento da Província de Posen, na Polônia. O papel de Mengele consistia em preservar a pureza racial dos membros da Schutzstaffel (SS). Sendo assim, casamentos só eram aprovados após análises invasivas e estudos sobre a árvore genealógica da noiva.
Em 1942, enviaram Josef Mengele para atuar na Frente Leste como cirurgião da 5ª Divisão Panzer. Ferido em combate, teve de ser transferido para o Oeste. Na Alemanha, foi promovido a capitão e se juntou mais uma vez ao geneticista von Verschuer no Instituto Kaiser Wilhelm, onde se concentravam os maiores estudos de antropologia, hereditariedade e eugenia da Alemanha, temas com os quais Mengele se identificava muito.
No instituto, o médico seguiu uma hermética linha de pesquisa baseada na qualificação racial e limpeza étnica. O seu trabalho foi determinante na criação do Aktion T4, programa de eutanásia e esterilização voltado para a identificação de pessoas consideradas “inaptas a se reproduzir ou viver”.
Meses mais tarde, transferiram Mengele para a rede de campos de concentração de Auschiwtz-Birkenau, na Polônia. Com o apoio incondicional do governo alemão, realizou experiências com pessoas que ele mesmo escolhia e qualificava como fracas ou inúteis. Documentos do The National WWII Museum, de Nova Orleans, nos Estados Unidos, responsabilizam Josef Mengele pelo envio de 400 mil pessoas para as câmaras de gás dos campos de concentração. “Ele preferia crianças, gêmeos e anões, pessoas com quem ele fazia experiências sem qualquer tipo de remorso”, comenta o pesquisador e historiador estadunidense Tom Gibbs.
Von Verschuer e outros cientistas receberam de Mengele muitos cadáveres, órgãos, esqueletos e amostras de sangue de crianças judias e ciganas. “Ele gostava de ‘cortejar’ suas vítimas, tanto que oferecia melhores condições de moradia e alimentação. Também tinha o hábito de presentear crianças com leite e doces”, relata Gibbs.
Em janeiro de 1945, após a evacuação de Auschwitz-Birkenau, Mengele percorreu alguns campos menores até ser capturado. Ficou preso na Alemanha até junho do mesmo ano, quando conseguiu fugir para a Argentina com um nome falso. Mais tarde, partiu para o Paraguai e depois se mudou para o Brasil. Supostamente, Mengele morreu afogado em 7 de fevereiro de 1979 em Bertioga, no litoral paulista. No entanto, até hoje há pesquisadores que refutam o motivo e a data da morte.
Enterrado no Cemitério do Rosário, em Embu das Artes, na grande São Paulo, Josef Mengele teve os ossos exumados em 1985, quando uma equipe de especialistas do Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo e da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP) confirmou a sua identidade. Em 1992, foi feita uma ratificação por meio de análise em DNA.
Saiba Mais
Há inúmeros relatos de moradores de Graciosa e de Paranavaí que viram o médico caminhando sozinho pelo Bosque de Graciosa em 1954.
O que também despertou a suspeita dos moradores de Graciosa é que o misterioso alemão raramente circulava pela área central do distrito.
A 137 quilômetros de Paranavaí, pioneiros de Mamborê, no Centro Ocidental Paranaense, afirmam que Josef Mengele, usando o nome de Josef Kanat, trabalhou como médico no então distrito de Campo Mourão em 1956.
No mundo todo, o médico nazista inspirou livros, filmes, documentários, músicas e programas especiais para a TV. No Brasil, a obra mais conhecida é o filme “Meninos do Brasil”, de 1978. Em 2013, a cineasta argentina Lucía Puenzo lançou o filme “Wakolda”, também inspirado na vida do médico, principalmente em sua passagem pelo Sul da Argentina.
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Um filme sobre o fim da liberdade romani
A história de uma família roma que foi perseguida durante a Segunda Guerra Mundial
Lançado em 2009, Korkoro, palavra romani que significa sozinho, é um filme do cineasta franco-argelino Tony Gatlif que retrata a realidade de uma família roma que perdeu a liberdade enquanto viajava pelo interior da França em 1943, quando o país estava sob o domínio Vichy.
Logo no início, a música, a paisagem bucólica e o lirismo introduzem o espectador a uma cena em que as notas de um piano são representadas pela movimentação de arames farpados em paralelo. A princípio, a única perspectiva real que se tem é de um primeiro plano enuviado pelas incertezas de não sabermos o que há antes e depois daquela divisa. É um prólogo referencial do estilo de vida nômade.
Tony Gatlif apresenta uma família romani composta por pessoas de personalidades bem distintas, mas que carregam na essência algumas afinidades que envolvem companheirismo, abnegação, hospitalidade, amor à música, fé e desapego material. Não é uma obra que se limita a combater estereótipos ou simplesmente construir uma imagem bonita sobre a cultura cigana. É bem mais do que isso. Em alguns casos, Gatlif ironiza os clichês justamente para reforçar uma ideia ou parodiar um pensamento comum obtuso.
Em uma das viagens, o cigano Taloche (James Thiérrée) percebe que estão sendo seguidos por um garoto – Claude (Mathias Laliberté). Sem família, o menino se junta a eles. Durante o percurso, colocam saquinhos de estopa nas patas dos cavalos para não deixarem rastros. Quando chegam a um vilarejo, onde montam acampamento, são informados de que o nomadismo está proibido em todo o território francês, sob pena de prisão.
Então uma professora, Mademoiselle Lundi (Marie-Josée Croze) – partisan, integrante da resistência francesa, sugere que eles parem de viajar até o fim da guerra. Por ora, continuam no local, embora não tenham planos de fixar residência. Na escolinha, um dos estudantes comenta com Claude, a quem Taloche chama ironicamente de Chororo (garoto pobre), que os romani roubam crianças. Admirador dos ciganos, o ignora.
O filme é pautado por muita música do início ao fim, corroborando a ideia de que não há vida sem música no mundo roma. Bem comunicativos, os ciganos vão até o centro comercial do vilarejo vender produtos e oferecer serviços. Na tentativa de ganhar algum dinheiro consertando panelas, Taloche diz em tom bem humorado: “Todos têm utensílios com buracos em casa, o que acontece é que às vezes os buracos estão escondidos.”
Em uma cena, o médico veterinário e prefeito do vilarejo, Théodore Rosier (Marc Lavoine), socorre um dos cavalos do acampamento na ausência dos ciganos. Por azar, Rosier é mordido pelo animal e cai com o braço ensanguentado. Pouco tempo depois, chegam para socorrê-lo. Enquanto uns cuidam de seu ferimento, outros prestam atendimento ao equino. Movidos pela fé, tradição e superstição, tratam do braço do veterinário com uma pasta de estrume. Ao mesmo tempo, oram pelo cavalo caído que em um rompante se levanta como se jamais tivesse adoecido.
Mais tarde, Rosier, o prefeito que deu abrigo a petit Claude, evitando que os ciganos tivessem problemas por terem entre os seus um jovem de origem desconhecida, pede ao garoto para perguntar qual foi o remédio usado em seu tratamento. “Foi estrume de cavalo. Mas diga a ele que até uma vassoura pode lançar fogo se for o desejo de Deus”, enfatiza um dos roma.
É profunda a relação dos ciganos com outras formas de vida não humanas. Em outra situação, a família toca uma canção festiva para elevar o ânimo de dezenas de galinhas. No filme, a música ajuda a superar muitos problemas – um recurso que manifesta uma liberdade frugal.
Em contraste ao paisagismo rústico, Gatlif parte de uma condição coletiva para a individual quando aborda o lirismo de Taloche, personagem cuja inocência, aparente dislexia e hiperatividade, parece experimentar um incessante conflito existencial. Há uma exaltação da hipersensibilidade do cigano que destoa da idade e, por vezes, remete ao humor pastelão dos tempos do cinema mudo.
Mas não há nada mais bem representado em Korkoro do que a necessidade de liberdade, até nas cenas mais simples. Outro momento inesquecível surge quando Taloche vai até a casa de Rosier. No banheiro, ele se inebria com a água que sai da torneira. Enche a pia e a faz deslizar por todo o cômodo, como se a conduzisse à emancipação. Quando a água desce em abundância, Taloche se lança escada abaixo, sem o menor temor de se ferir.
O filme assume um caráter documental em algumas cenas-chave. Traídos pelo amigo Pierre Pentecôte (Carlo Brandt), um simpatizante dos nazistas, a família é levada para um campo de concentração, onde há centenas de romani. Lá, Darko (Arben Bajraktaraj) pergunta a Pentecôte por que estavam trancando eles como cachorros. O traidor então responde: “Para livrar a França de seus vermes.”
Ao saberem o que houve, Rosier e Mademoiselle Lundi decidem intervir. O prefeito transfere a escritura de uma propriedade familiar para o patriarca roma. Em seguida, os dois vão até o campo de concentração e apresentam o documento, obrigando que a família seja libertada. Quando retornam ao vilarejo, os ciganos se surpreendem com a nova morada. Alguns concordam em viver provisoriamente no local, já outros preferem partir. No fim, prevalece a decisão do patriarca que considera mais prudente continuar no povoado.
Taloche é o último a entrar na casa. Para ele, a ideia de viver entre paredes é uma forma de privação, embora não manifeste isso com palavras. Dias depois, Rosier os visita e encontra a propriedade abandonada. Novamente na estrada, rumam para a Bélgica, acompanhados mais uma vez por Claude. Não chegam tão longe. São surpreendidos pelos homens do Governo Vichy, a serviço dos nazistas.
Enquanto são obrigados a formarem uma fila e apresentarem registros de identificação, Taloche se esconde. O arrastam, mas ele estapeia o líder da operação – uma versão de Adolf Hitler, em uma cena caricata digna de Charlie Chaplin. Foge em direção à floresta e sobe em uma árvore enorme. É alvejado a tiros, até que numa queda poética e acrobática cai sobre um córrego. Deitado, mas ainda vivo, é vítima de um tiro certeiro na testa.
A morte de Taloche simboliza o fim da liberdade romani e a iminência do Porajmos, o genocídio cigano perpetrado na Segunda Guerra Mundial. O desespero da família é geral, mas, apesar dos prantos, nada pode ser feito diante de tantos homens armados. O corpo é abandonado, assim como os animais e os pertences. Dali, não levam nada. Um longo tempo passa em questão de segundos. Aquela família não retorna mais. Em uma cena estática, tudo se esvai: o som, o fogo, a fumaça, a luz e a vida.
É muito interessante o cuidado que Tony Gatlif teve aos detalhes das expressões e particularidades de alguns personagens, embora talvez fosse mais impactante tornar outros romani da obra igualmente menos anônimos. De qualquer modo, fica clara a intenção de não deixar o individual, por mais peculiar que seja, se sobressair ao coletivo. O cineasta não tem intenção de se aprofundar na guerra. O foco é outro. É um filme sobre pessoas tentando exercer o direito de existir, não apenas habitar o mundo. Há uma bela construção do espaço em profundidade.
Korkoro se divide em dois ritmos. Onde existe alegria, há movimento e velocidade. Onde há tristeza, prevalece a lentidão de retratos quase estáticos das agruras de um tempo nefasto. Outro diferencial é a trilha sonora sempre pontual, um belíssimo trabalho capitaneado por Gatlif e a compositora Delphine Mantoulet.
Tony Gatlif é um dos poucos cineastas que se dedica a produzir obras que evidenciam ou flertam com a cultura romani. Como autor de filmes de longa-metragem, o primeiro grande destaque surgiu com Latcho Drom, de 1993; seguido por Mondo (1995), Gadjo Dillo (1997), Je Suis Né D’une Cigogne (1998), Vengo (2000), Swing (2001), Exils (2004), Transylvania (2006), Korkoro (2009) e Indignados (2012). Vale a pena se aprofundar um pouco mais na filmografia desse autor de origem roma.
Saiba Mais
Não há dados precisos, mas acredita-se que de 250 a 500 mil ciganos foram assassinados pelos nazistas até o fim da Segunda Guerra Mundial.
Curiosidades
Korkoro é baseado em uma história real. A professora Lundi é inspirada na combatente da resistência Yvette Lundi.
James Thiérrée que interpreta Taloche é filho de Victoria Chaplin e neto de Charlie Chaplin.