David Arioch – Jornalismo Cultural

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Palestra sobre o papel do negro no cinema

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Fui convidado pelo Sesc para dar uma palestra para professores hoje à tarde no Seminário Multidisciplinar – Diversidade Étnico Racial, Indígena e Cigana no Núcleo Regional de Educação de Paranavaí. Fazia mais de dois anos que eu não dava uma palestra sobre cinema, e hoje fui até lá para falar sobre o papel do negro no cinema brasileiro ao longo da história. Foi uma experiência muito rica e interessante. Me trouxe muitas lembranças dos cinco anos em que ajudei a coordenar o Projeto Mais Cinema. Uma vez por semana, após a exibição dos filmes, eu fazia uma análise e discutia a obra com o público.

Written by David Arioch

December 6th, 2016 at 12:53 am

A história do Preto Velho

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Em Cafundó, João de Camargo representa o Brasil miscigenado e heterogêneo

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Lázaro Ramos interpreta o preto velho João de Camargo (Foto: Reprodução)

Lançado em 2005, Cafundó, dos cineastas Paulo Betti e Clovis Bueno, é um filme recheado de simbologias que narra a trajetória de João de Camargo (Lázaro Ramos), o mais emblemático preto velho brasileiro. Na obra que teve como cenário várias cidades do Paraná, como Ponta Grossa, Paranaguá e Antonina, João de Camargo representa um símbolo de fé e a figuração de um Brasil marcado pela miscigenação, heterogeneidade e fusão de valores.

Exemplo de toda essa mistura é a ideia do protagonista em criar a Igreja de Bom Jesus do Bonfim que une elementos de umbanda e cristianismo; um revolucionário artifício que pode não ter sido determinante na aceitação dos símbolos religiosos africanos, mas contribuiu para mostrar uma nova realidade que se distanciava daquele contexto europeizado.

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Personagem rompe sua relação com o passado na busca pela redenção (Foto: Reprodução)

A iniciativa de construir uma igreja diferente só surge quando o protagonista decide, após uma vida errante de muito sofrimento, viver para a fé. João de Camargo rompe sua relação com o passado na busca pela redenção. A entrega às crenças religiosas também se relaciona ao fato do personagem assumir o dom para a mediunidade, não ignorando mais as vozes que o acompanhavam, e sim as usando para curar enfermidades.

Cafundó

Muitas cenas do filme foram gravadas no Paraná (Foto: Reprodução)

O Preto Velho era um homem muito à frente de seu tempo, tanto que os primeiros indícios de seu perfil como líder aparecem em 1866, quando o personagem começa a aceitar a vida e o próprio talento para lidar com as multidões e o preconceito racial. Camargo não só estimulava a fé das pessoas em uma divindade, mas também as fazia acreditar no valor da vida e na importância de cada ser humano, independente de credo ou origem.

Embora tenham se passado quase 150 anos, até hoje as influências do Preto Velho na cultura brasileira se estendem por diversas esferas artísticas e religiosas. Mesmo que desde 1988 o Cafundó, remanescente do quilombo situado na região de Sorocaba, em São Paulo, tenha deixado de ser um folclórico espaço físico de casinhas de barro e pau trançado, o lugar ainda é grande como um ambiente imaterial que se multiplica no ideário de quem se preocupa em preservar uma cultura pouco valorizada.

Além da interpretação inesquecível de Lázaro Ramos, é preciso destacar os papéis de Leona Cavalli, Leandro Firmino, Alexandre Rodrigues, Ernani Moraes, Luís Melo, Renato Consorte, Francisco Cuoco e Abrahão Farc. Outro grande atrativo de Cafundó é a trilha sonora de André Abujamra que a cada cena se mostra um exímio manipulador de emoções, introduzindo o espectador por viagens transcendentais. A rabeca entra na história como um recurso estilístico que pauta o tempo e os rompantes do acaso.