Archive for the ‘Otávio Marques de Siqueira’ tag
“Meu objetivo era fazer com que as famílias se fixassem aqui”
Otávio Marques de Siqueira veio a Paranavaí por recomendação do major Fernando Flores
O médico gaúcho Otávio Marques de Siqueira, responsável pela construção do Hospital Professor João Cândido Ferreira, onde é hoje a Praça da Xícara, se mudou para Paranavaí em 1949, a pedido do major Fernando Flores. Além de se responsabilizar pela saúde da população, Siqueira foi incumbido de convencer os migrantes a fixarem residência em Paranavaí e não em Alto Paraná.
Otávio Marques de Siqueira veio a Paranavaí pela primeira vez no tempo da Fazenda Brasileira, em 1941, após participar da inauguração da primeira balsa do Porto São José, um recurso que intensificaria as relações entre Paraná e Mato Grosso. Em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás, Siqueira relatou que naquele ano quando chegou à Brasileira se deparou com um imenso vazio. “Não havia nada por aqui, só quiçaça e capoeira”, afirmou o pioneiro gaúcho que chegou ao povoado por meio da única estrada que existia à época, reaberta pelo Capitão Telmo Ribeiro em 1939.
Siqueira conheceu em Londrina o diretor da 4ª Inspetoria de Terras do Estado, Francisco de Almeida Faria, que lhe mostrou um mapa retangular de Paranavaí. “Ele olhou com o jeitão dele e falou: ‘Isto está muito monótono’, então traçou duas diagonais no mapa e saiu duas avenidas, uma era a Paraná”, enfatizou o médico que teve os primeiros contatos com o cotidiano da colônia em 1945, mas se mudou para Paranavaí em 1949, a convite do major Fernando Flores que em Londrina lhe falou sobre a necessidade de se construir um hospital em Paranavaí.
“Antes de vir pra cá, eu exercia o cargo de diretor da Santa Casa de Londrina”, destacou Siqueira que coordenou a construção do extinto Hospital Professor João Cândido Ferreira, o Hospital do Estado, em área onde está atualmente a Praça Dr. Sinval Reis, conhecida como Praça da Xícara. Após a inauguração, o pioneiro assumiu o cargo de diretor do hospital. “O Dr. Siqueira era um médico muito bom”, comentou o pioneiro gaúcho Severino Colombelli, acrescentando que Otávio Marques salvou muitas vidas.
Siqueira não veio a Paranavaí apenas para atuar como médico. “Meu objetivo era fazer com que as famílias se fixassem aqui e não em Alto Paraná”, revelou. Pioneiros lembram que esse tipo de missão era muito comum, pois todos aqueles que vinham ao povoado para assumir alguma liderança também tinham o papel de atrair novos moradores. A publicidade mais apregoada em Paranavaí era a de que cada propriedade valeria até cem vezes mais no futuro. Porém, muitos diziam que isso não passava de utopia.
A colônia era um local tranquilo em 1949, quando os principais pontos comerciais pertenciam a Carlos Faber, Severino Colombelli, Luiz Ambrósio e José Francisco, irmão de Natal Francisco, segundo o médico que nunca se esqueceu da vez em que pioneiros pegaram uma jaguatirica nas imediações do antigo Cine Ouro Branco.
Em 1950, o desenvolvimento local chamou a atenção do governador Moisés Lupion que enviou a Paranavaí um funcionário encarregado de vender imóveis. “Deu liberdade para que ele fizesse o que bem entendesse, desde que atraísse pessoas com muito dinheiro”, pontuou Siqueira. Logo surgiu uma onda de assassinatos motivados pela posse de terras. De acordo com o médico, as propriedades eram tomadas na marra. “Eu não me preocupei, nem me meti nisso”, declarou.
Saiba Mais
Otávio Marques de Siqueira nasceu em 18 de julho de 1914 em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.
Os pianos de cauda da Vila Montoya
Como os instrumentos chegaram a Paranavaí numa época em que não existia estrada?
Um dos fatos mais curiosos sobre a colonização de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, é que na década de 1920, antes do surgimento da Vila Montoya, o povoado contava com diversos pianos de cauda dispersos por residências próximas da Fazenda Experimental do Estado. Como isso era possível se cada um dos instrumentos tinha de 250 a 300 quilos e à época não havia nenhuma estrada que permitia o ingresso de grandes veículos na colônia?
Dos anos 1930 a 1945, vários pioneiros que chegaram a Paranavaí, então Fazenda Brasileira, se depararam com mais de 40 casas de madeira de louro-pardo, uma matéria-prima nobre. As residências, algumas tinham características da arquitetura francesa, passavam despercebidas pelos mais desatentos, pois a mata primitiva já tomava conta da vegetação cortada, além dos antigos cafezais que ao longe se ofuscavam diante do profundo abandono. “Nas casas ocupadas pela diretoria da Brasileira, encontrei diversos pianos de cauda em 1941”, afirmou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira em entrevista à Prefeitura de Paranavaí há algumas décadas, acrescentando que a maior parte estava em boas condições de uso.
De acordo com o pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles, que se mudou para a Vila Montoya em 1929, quando chegou ao povoado os instrumentos já estavam instalados nas residências da diretoria da Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco), responsável pela administração local. Na atualidade, cada um daqueles pianos de cauda importados custaria pelo menos R$ 40 mil, possivelmente mais valiosos que as casas que abrigavam os colonizadores. “O mais estranho é que ainda não tinha estrada até aqui. Os caminhões que vinham pra cá naquele tempo paravam a quilômetros de distância da colônia porque havia uma mata primitiva muito densa”, relata o pioneiro cearense João Mariano.
Salles também deixou claro em vida que só pouco tempo depois de formada Vila Montoya é que surgiu a primeira estrada. A futura Paranavaí era um povoado recôndito na selva, quase alheio à civilização. A única explicação palpável sobre a chegada dos pianos é que a diretoria da Braviaco incumbiu dezenas de empregados a percorrerem quilômetros a pé, em meio mata virgem, para transportarem cada instrumento que pesava mais de 200 quilos.
Há pioneiros que afirmam que alguns do pianos podem ter chegado ao povoado muito antes do que se imagina, na década de 1910, quando a Companhia Brasileira de Viação e Comércio começou a desbravar o Noroeste do Paraná, dando a Paranavaí e região o nome de Pirapó. Segundo Frutuoso Joaquim, os instrumentos musicais eram a única diversão de muitas famílias em 1929.
Enquanto os encarregados comandavam o trabalho de centenas de migrantes, quase todos analfabetos, trazidos ao Distrito de Montoya para plantar e colher café no seio da mata primitiva noroestina, as mulheres dos funcionários da Braviaco passavam a maior parte do tempo dentro de casa cuidando dos filhos, dos afazeres domésticos ou tocando excertos de canções de compositores alemães como Johannes Brahms, Richard Wagner e outros expoentes do romantismo clássico em sofisticados pianos Steinway. Vez ou outra, quando alguns peões retornavam da mata, ouviam ao longe vozes femininas cantarolando. Achavam bonito, mesmo que a completa ignorância os impedisse de decifrar o código musical. Tempos depois, a partir de registros pessoais, descobriu-se que eram trechos de óperas dos compositores italianos Giuseppe Verdi e Arturo Toscanini.
É possível crer que dois “mundos” se chocavam na Vila Montoya: a cultura intelectual – ostensiva e abstrata da burguesia, sob a imponente figura da Braviaco, e a cultura inculta – ingênua, frágil e estritamente rural do pobre migrante afiançado ao colonato. Desde o começo, Paranavaí já representava muitas realidades, mas o que mais chama atenção é que antigamente existia uma harmonia surreal nisso tudo.
Os pianos de cauda de Montoya foram abandonados em 1930, quando o Governo Vargas revogou a concessão da Companhia Brasileira de Viação e Comércio. Os funcionários da Braviaco e seus familiares partiram, deixando para trás todos os instrumentos musicais. Os pianos resistiram ao tempo, sobreviveram, mas desapareceram quando a colônia se transformou em Paranavaí. “Ninguém sabe ao certo o que houve depois com os instrumentos”, comenta João Mariano em tom de dúvida e mistério.
Curiosidade
Os pianos Steinway, criados por Heinrich Steinweg, surgiram em 1853 nos Estados Unidos, mas também foram fabricados na Alemanha a partir de 1880.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
As ruas de cascas de peroba
As primeiras vias de Paranavaí foram pavimentadas com restos de madeira
Na década de 1940, quando as vias de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, eram compostas por faixas de areia, os pioneiros usaram cascas de peroba como alternativa de pavimentação para o tráfego de veículos.
O marceneiro José Ebiner é o pioneiro da pavimentação em Paranavaí. Na época em que a colônia era chamada de Fazenda Brasileira, teve a ideia de cobrir as vias, que se resumiam a faixas de solo arenoso batido, com cascas de peroba. “A Velha Brasileira era puro areião. Então o Zé Ebiner inventou o calçamento. Isso não começou com os nossos prefeitos não. Foi com a gente usando cascas de madeira”, afirmou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O marceneiro tomou a iniciativa de cobrir o solo arenoso da Avenida Paraná e da Rua Getúlio Vargas com os muitos restos de madeira que sobravam na serraria. “O Zé Ebiner foi um dos primeiros pioneiros. Quando cheguei aqui a primeira coisa que fiz foi comprar madeira dele”, relatou Palhacinho. O pioneiro paraibano Cincinato Cassiano Silva faz coro às palavras de José Ferreira. “A primeira serraria privada de Paranavaí foi do Ebiner”, comentou.
Pioneiros lembram que a comunidade se uniu para transportar as cascas de peroba e esparramá-las pelas vias da Brasileira. “Era só jogar nas ruas que já dava um pavimento bom pra passar um pé-de-bode”, declarou José Ferreira. Os restos de madeira proporcionavam mais firmeza as vias e também beneficiavam os pedestres.
Em dias de Sol, os transeuntes podiam caminhar sobre as cascas para evitar sujar os calçados. Já quando chovia, o pavimento improvisado permitia que escapassem da lama. “A ideia do Ebiner ajudou muito a gente”, enfatizou Araújo, acrescentando que é impossível falar de madeira nos tempos da colonização sem citar o marceneiro.
O pioneiro paulista Valdomiro Carvalho prestou muitos serviços a José Ebiner. Carregou um grande número de toras de árvores que serviram para a construção de residências, casas comerciais e pavimentação. “Eu puxava tudo com um carretão de bois. Ia lá pra mata bruta derrubar figueiras, perobas, paus d’alho e palmitos. Quase todos os tipos de madeira”, complementou Carvalho.
Ebiner ajudou a construir o estádio e o Grupo Escolar
De acordo com o pioneiro paulista Natal Francisco, Ebiner contribuiu na criação do primeiro estádio de Paranavaí, onde é atualmente a Praça dos Pioneiros. “Ele me ajudou muito. Cobrou pouco pela mão-de-obra e pela madeira”, destacou. O marceneiro também teve participação importante na viabilização do primeiro hospital local.
“O Zé Ebiner deu madeira para construir o Hospital do Estado e também o Grupo Escolar [primeira escola de Paranavaí, onde se situa hoje o Colégio Estadual Marins Alves de Camargo]”, revelou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira. Parte da madeira aproveitada pelo marceneiro, que também forneceu matéria-prima para a construção da primeira igreja, pertenceu a Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco) nos tempos em que Paranavaí era conhecida como Distrito de Montoya.
O pioneiro José Ferreira desabafou que nos anos 1940 a vida na colônia era muito difícil. O povoado era praticamente ignorado pelo Governo do Paraná. “A gente teve que fazer muitos sacrifícios como esse da pavimentação. Vivíamos no completo abandono, autoridades estaduais nunca vinham pra cá confortar o povo. Éramos obrigados a decidir tudo. O que valia era a palavra de cada um que vivia aqui”, reclamou.
Só a partir de 1946, a Colônia Paranavaí ganhou outras serrarias. Um homem conhecido como “Seu Pombalino” abriu uma na Avenida Distrito Federal, próxima ao Posto São José. Era pequena, mas também ajudou bastante. “Depois veio a marcenaria do Otto”, ressaltou Cincinato Cassiano.
Viagem ao Porto São José durava dias
O trecho da Estrada Boiadeira que ligava Paranavaí ao Porto São José foi aberto em 1939
Na época da colonização de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, para chegar ao Porto São José, por onde atravessava o gado que vinha do Mato Grosso, os pioneiros levavam pelo menos seis dias para percorrer um túnel no meio da mata.
O trecho da Estrada Boiadeira que ligava Paranavaí ao Porto São José foi aberto em 1939 pelo Capitão Telmo Ribeiro, homem designado pelo interventor Manoel Ribas para abrir vias em toda a região Noroeste do Paraná. No entanto, em 1941 a vegetação já havia coberto boa parte da estrada. Segundo pioneiros, qualquer via que não recebesse manutenção regular se tornava intransitável. No mesmo ano, Ribeiro exigiu que a estrada fosse recuperada.
Para facilitar as negociações de gado entre Mato Grosso e Paraná, o interventor Manoel Ribas tomou a decisão de inaugurar uma balsa no Porto São José. O evento também beneficiou muitos migrantes e viajantes que buscavam prosperidade no Noroeste do Paraná. “Vim pra Fazenda Velha Brasileira pela primeira vez logo que a balsa foi inaugurada em 1941”, relatou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira.
No trajeto até a Brasileira, Marques de Siqueira colocou dois sacos na frente do carro para impedir que sementes de guanxuma entupissem o radiador, o que dá uma ideia da diversidade da flora paranaense naquele tempo. Em 1947, parte dos pioneiros começou a percorrer o trajeto de caminhão e em grupo. Se surgisse algum imprevisto, haveria pessoas o suficiente para ajudar. “A viagem ao Porto São José era muito difícil. Quando eu ia pra lá, levava pelo menos 14 dias de ida e volta, incluindo os dois dias de estadia”, frisou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho.
Quem viajava ao porto com veículo de tração animal sofria para atravessá-los. Não havia pontes em alguns trechos. “O jeito era colocar os mantimentos nas costas e atravessar os bichos de pouco em pouco. A gente tinha que fazer várias viagens, até passar todo mundo”, afirmou José Ferreira, acrescentando que depois era preciso recarregar a carroça.
Segundo Araújo, era uma luta entre ir e vir porque a estrada para o Porto São José consistia em um “túnel dentro da mata”. “A gente sofria bastante, mas valeu a pena porque conheci tudo”, avalia. Nas viagens para o Porto São José, Palhacinho sempre viu veículos abandonados pela estrada, principalmente pés-de-bode. “Isso aconteceu muito, ainda mais depois que os Rocha abandonaram as fazendas da Colônia Paranavaí. Os baianos que trabalhavam pra eles ficaram espantados e fugiram com medo da polícia. Largaram todos os carros”, revelou.
Outro pioneiro que conheceu o Porto São José no início dos anos 1940 foi o paulista Salatiel Loureiro. “Lembro que não existia nada no porto, só o nome. O picadão foi feito para o trânsito do gado que era levado pra Apucarana, Londrina e Ponta Grossa. Eles passavam pela Estrada Boiadeira e saíam em Jaguapitã e Sertanópolis [no Norte Central Paranaense]”, assinala. Quem também viajou algumas vezes para o Porto São José foi o pioneiro paulista Valdomiro Carvalho.
“Eu ia pro Mato Grosso buscar gado. A gente atravessava eles pelo porto, num vaporzinho”, pontua. Os personagens de destaque do Porto São José no período da Fazenda Brasileira e da Colônia Paranavaí eram o balseiro, de quem não se sabe o nome, e um homem conhecido apenas como “Seu Henrique” que desempenhava função semelhante a de um inspetor de terras.
Saiba mais
A Estrada Boiadeira era usada tanto por quem ia ao Porto São José quanto por quem ia a Londrina.
O saudoso Líder Bar
Muitos bailes foram realizados no bar nos anos 1940
Entre os bares mais antigos e já extintos de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, o destaque é o Líder Bar, um dos estabelecimentos mais frequentados pela população nas décadas de 1940, 1950 e 1960. O local foi até cenário de bailes e festas.
O Líder Bar, construído pelo pioneiro mineiro José Alves de Oliveira, conhecido como Zé do Bar, se situava na Avenida Paraná, perto da atual Cacau Brasil. Lá, os catarinenses começaram a comercializar broas de fubá feitas em Graciosa.
O alimento fez muito sucesso numa época em que não havia pão na colônia. “Naquele tempo, o Centro ia da esquina do Banespa [onde se situa a Cacau Brasil] até o Banco Bradesco”, contou o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira em entrevista publicada no livro “História de Paranavaí”, de Paulo Marcelo Soares da Silva, acrescentando que o Líder Bar ficava na área mais movimentada da cidade.
O estabelecimento era conhecido como ponto de reunião de moradores das mais diversas faixas etárias. No período da noite, era mais frequentado por homens, principalmente chefes de família que se reuniam para conversar sobre o cotidiano, futebol e política. Todos os ônibus paravam lá, até mesmo outros tipos de conduções. Os veículos de transporte coletivo ajudavam a levar mais fregueses ao bar. Muitos dos que desciam no ponto, dependendo do horário, já ficavam no bar ou pelo menos paravam para comprar algo.
A popularidade do Líder Bar era tão grande que muitas vezes o lugar foi cenário de bailes, principalmente em 1946, quando não havia quase entretenimento na colônia. As festas no bar sempre inspiravam confraternização, pois conseguia reunir boa parte da população, das mais diferentes etnias. Em vez das músicas que tocavam no rádio, os próprios moradores improvisavam. Quem tinha um instrumento musical e sabia como executá-lo sempre se juntava aos demais. “Isso só mudou depois, quando surgiram os clubes”, declarou o pioneiro José Ferreira de Araújo.
O Bar Líder era um dos poucos estabelecimentos de Paranavaí que tinha um gerador de energia. “Trabalhei com esse bar de 1945 a 1952. Daí vem o apelido Zé do Bar”, destacou o pioneiro José Alves de Oliveira que se mudou com a família para Paranavaí em abril de 1945. Foi incentivado pelo pai que disse que a colônia se tornaria uma cidade de grande futuro.
No local onde se situava o Líder Bar, antes havia uma casa de propriedade do pioneiro Dorvalino Moreira que pouco tempo depois a vendeu. “O lugar virou Bar do Abílio. Mas ele ficou com o bar apenas cinco meses. Aí então apareceu o José Alves de Oliveira que se hospedou na minha pensão e comprou o bar”, enfatizou José Ferreira. O local ficou conhecido como “Zé do Bar” até receber o nome de Líder Bar.
Saiba Mais
O primeiro bar de Paranavaí era de propriedade de Zeca Machado e se situava onde é hoje o Banco do Brasil.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Aventuras para chegar a Paranavaí
Migrantes enfrentaram adversidades para chegar ao povoado entre os anos 1920 e 1940
A travessia do Rio Paranapanema a nado
Uma das histórias mais surpreendentes de chegada de migrantes a Paranavaí, no Noroeste do Paraná, é a do pernambucano Frutuoso Joaquim Salles. Considerado o primeiro cidadão local, o homem foi um dos poucos remanescentes da Vila Montoya a viver aqui até os seus últimos dias. Aos 19 anos, Salles recebeu uma proposta de trabalho no Paraná e aceitou na hora. Era a chance de fugir da miséria que assolava o sertão pernambucano na década de 1920.
Deixou a terra natal, Sítio do Moreira, no primeiro semestre de 1929. A vontade de fugir da pobreza era tão grande que foi embora do povoado a pé. Salles caminhou até a cidade de Salgueiro, onde conseguiu carona em um barco a vapor até Juazeiro, na Bahia.
“Peguei outro barco até Pirapora, em Minas Gerais”, relatou o pioneiro em entrevista ao jornalista Saul Bogoni décadas atrás, acrescentando que foi de trem até São Paulo. Na capital paulista, o pernambucano teve que se submeter a um procedimento típico aplicado aos migrantes nordestinos. “Fui vacinado como se vacina égua”, frisou. Por toda a vida, carregou no braço a marca daquele dia: uma cicatriz bem visível.
De São Paulo, Joaquim Salles viajou para Presidente Prudente, no Oeste Paulista, acompanhado de quase 300 pessoas com menos de 30 anos. De lá, seguiram para o Porto Ceará, na divisa com o Paraná. Como a balsa não comportava tanta gente, os centenas de migrantes tiveram de atravessar o Rio Paranapanema nadando. Do outro lado da margem, percorreram mais de cem quilômetros a pé até chegarem à Vila Montoya no dia 24 de julho. A sede administrativa da colônia ficava onde é atualmente o Distrito de Piracema.
Nove dias esperando uma carona
Aventuras também foram vividas mais tarde pelos paulistas João Silva Franco e Salatiel Loureiro. Os dois pioneiros pegaram um trem em Ourinhos, no interior paulista, e viajaram até Apucarana, no Norte Central Paranaense.
“Apucarana era do tamanho do Distrito Deputado José Alfonso [Quatro Marcos], tinha pouca gente e algumas casinhas. Ficamos ali nove dias esperando uma carona pra trazer a família pra cá”, ressaltou Franco, lembrando que passaram por Lovat, atual Mandaguari, antes de virem para a Fazenda Brasileira, atual Paranavaí.
De acordo com a pioneira catarinense Francisca Schueroff, nas viagens de caminhão, os passageiros que iam na carroceria tinham de se abaixar muitas vezes para evitar que fossem atingidos pelos galhos das árvores. Outro fato interessante é que na época da Brasileira não se via quase veículos motorizados. Era um bem acessível a poucos, tanto que muitos migrantes chegaram ao povoado inclusive de carona ou a pé. “O movimento mesmo era de carroças e cavaleiros”, enfatizou João Franco, se referindo ao tempo em que o pioneiro paulista Valdomiro Carvalho e muitos outros migrantes ganhavam a vida realizando fretes com carretão de bois.
Caminhões patinavam na estrada
Automóveis começaram a fazer parte da rotina dos paranavaienses somente no início dos anos 1950. Segundo o pioneiro mineiro José Alves Oliveira, conhecido como Zé do Bar, Paranavaí se situava no meio do nada e o picadão para chegar ao povoado era tão precário e arenoso que os caminhões até patinavam, quase indo ao encontro da mata virgem.
“Cheguei aqui com um caminhão que quebrou no caminho, lá perto da Capelinha [atual Nova Esperança]. Acontecia muito isso”, revelou Zé do Bar. Imprevistos custavam dias de atraso. O pioneiro catarinense Carlos Faber sabia o que isso significava. Nunca se esqueceu das viagens para visitar os parentes em Rolândia, no Norte Central Paranaense.
Naquele tempo, entre os veículos motorizados, o mais popular na região da Brasileira era o jipe Land Rover, de fabricação britânica, que se destacava pela capacidade de trafegar no solo arenoso e irregular da colônia. O veículo comercializado até por 20 mil réis perdeu espaço na década de 1950, quando a população do povoado começou a viajar com as jardineiras e os monomotores.
Povoado não tinha carro, mas tinha mecânico
O pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, lembrou que quando chegou a Fazenda Brasileira havia apenas um automóvel.
“Era um pé de bode, um ‘fordinho’ cabeça de cavalo do Lindolfo Alves que tinha uma oficina com aparelho de solda. Aqui não tinha carro, mas tinha mecânico”, garantiu Araújo. Sem automóveis para consertar, a oficina de Alves era mais requisitada para soldar ferramentas de trabalho e cortar madeiras para a construção de casas.
Curiosidades
Nos anos 1940, uma viagem de caminhão custava até 1,5 mil cruzeiros.
O primeiro posto de combustível da colônia foi fundado pelo pioneiro espanhol Thomaz Estrada.
Em 1929, a Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco) mantinha uma frota de 25 caminhões na Vila Montoya.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Capitão Telmo: herói ou vilão?
Telmo Ribeiro é um paradoxo na história de Paranavaí, o herói que se transformava em vilão
Capitão Telmo Ribeiro é um dos personagens mais controversos da história de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, onde viveu entre os anos de 1936 e 1964. Durante esse período, conquistou amigos, inimigos e apatia.
O tenente
Em 1932, o tenente gaúcho Telmo Ribeiro deixou o Rio Grande do Sul e foi para Porto Murtinho, no Mato Grosso (atual Mato Grosso do Sul), lutar na Revolução Constitucionalista. Com o fim dos conflitos, Ribeiro comandou o regimento de cavalaria de uma brigada militar em Ponta Porã. A missão era defender a fronteira brasileira. “Eu era tenente no esquadrão do Telmo. Naquele tempo, quem comandava a brigada era o coronel Mário Garcia”, relatou o pioneiro mato-grossense Alcides Loureiro de Almeida em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
Enquanto trabalhou em Ponta Porã, Telmo Ribeiro morou em Bela Vista, na Fazenda Casualidade, de João Loureiro de Almeida, pai de Alcides Loureiro. “Depois de um tempo, a brigada foi extinta e surgiu o convite para trabalhar na Fazenda Caaporã. Contratamos alguns homens e começamos o plantio e transporte de erva-mate para exportação”, lembrou Loureiro. Mais tarde, Telmo e Alcides retornaram a Ponta Porã. Loureiro continuou trabalhando na cidade e Ribeiro fechou um contrato com a Companhia Mate-Laranjeira para transportar erva-mate através do rio em um barco a vapor.
Em uma das viagens pelo estado, Telmo Ribeiro conheceu o engenheiro Francisco Natel de Camargo que atuava como boiadeiro, levando gado vacum do Mato Grosso para a Fazenda Brasileira, futura Paranavaí. A carne bovina alimentaria os migrantes que viviam no povoado. “O Natel levou o Telmo até Londrina para conversar com o representante do governo, o delegado Achilles Pimpão, intermediário do interventor Manoel Ribas”, revelou o pioneiro Alcides Loureiro.
Ao conquistar a simpatia do delegado e do interventor, Telmo Ribeiro foi contratado para abrir estradas ligando a Brasileira ao restante do Paraná. “Lembro quando ele foi encarregado por Natel de Camargo para abrir uma estrada para a movimentação de gado da Brasileira até a Gleba Roland [atual Rolândia]”, pontuou o pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles, ex-empregado e amigo do tenente Telmo.
Salles contou que Ribeiro fixou residência onde é atualmente o Jardim São Jorge. Lá, havia uma colônia abandonada, com casas boas e móveis coloniais de finíssima qualidade. “As árvores já tinham varado o teto das residências. Telmo aproveitou o que deu pra aproveitar”, assegurou o pernambucano.
O herói
Em 1936, nas palavras do pioneiro paulista Natal Francisco, o tenente e uma turma de paraguaios acabaram com a onda de assassinatos praticados por grileiros na Fazenda Brasileira. Nessa época, o tenente já se destacava entre a população humilde do povoado. Tinha boa postura e passo firme, mas o que mais chamava atenção era o carisma, o requinte e a elegância. Ribeiro usava paletó de alta qualidade combinando com botas feitas sob medida, além de um cinturão que tinha como fivela a letra T.
Fumava apenas charutos importados da Holanda e só usava perfume francês. “Ele tinha um anel madrepérola feito por um famoso joalheiro carioca. No pescoço, sempre trazia um lenço de cetim preso por um broche de ouro”, detalhou Alcides Loureiro, acrescentando que apesar da fama de violento, Telmo Ribeiro era um homem delicado.
O título de capitão, o tenente gaúcho recebeu por serviços prestados ao Estado do Paraná na Brasileira, segundo o pioneiro paulista Valdomiro Carvalho. Contudo, o pioneiro curitibano Aldo Silva deu outra versão sobre o assunto: “Ele foi promovido a capitão pelo próprio povo da região, então ficou conhecido assim.” Telmo Ribeiro se tornou uma figura tão influente na cidade que a jardineira da Viação Garcia que fazia a linha Paranavaí-Londrina adotou como ponto de parada a casa do capitão.
Ao longo da vida, o pioneiro paulista Salatiel Loureiro nunca se esqueceu de um favor feito por Telmo na década de 1940. “Uma vez, ele foi até Curitiba requerer meu título de terras. Fez isso e não cobrou nada.” Carlos Faber, José Alves de Oliveira, José Ferreira de Araújo (Palhacinho), Severino Colombelli, José Francisco Siqueira (Zé Peão) e Izabel Andreo Machado são alguns pioneiros que sempre tiveram bom relacionamento com o capitão Telmo Ribeiro.
“O meu amigo sempre foi um líder, homem com fibra de pioneiro, com o qual partilhei bons e maus momentos”, destacou Alcides Loureiro. Outro pioneiro que defendia a idoneidade e o caráter de Ribeiro era o paulista João da Silva Franco. “Muita gente falava que ele era ruim e ganancioso. Mas eu acredito que ele nunca matou ninguém. O problema era a cabroeira dele, usavam o nome do Telmo pra fazer coisas erradas aqui”, salientou.
O vilão
Se por um lado, o capitão Telmo Ribeiro foi admirado e fez valiosas amizades nos 28 anos dedicados a Fazenda Brasileira, depois Paranavaí, por outro, também conviveu com pessoas que não aprovavam suas atitudes, não gostavam dele ou lhe eram indiferentes. “Lembro que ele andava com dois revólveres, uns dez capangas e insultava muita gente na rua. Telmo achava que só ele tinha razão”, desabafou o pioneiro cearense Raimundo Leite.
Leite costumava relembrar o episódio em que entrou em conflito com o capitão. “Certo dia, o Raimundo Arruda e o Zé Andrade insultaram ele no Bar do Zé e depois foram pra minha casa. O Telmo apareceu lá e o pau quebrou. Teve gente que apanhou e correu. Eu não tinha nada com o peixe, mas quase sobrou pra mim. A minha sorte foi que chegou um pessoal e pediu pra ele não fazer nada comigo”, enfatizou.
Com o tempo, Ribeiro conquistou muitas inimizades em Paranavaí. “Aqui tinha os capa-preta e me recordo que eles queriam matar o capitão Telmo Ribeiro”, revelou o pioneiro espanhol Thomaz Estrada. Para a pioneira fluminense Palmira Gonçalves Egger, o capitão Telmo perseguiu muita gente e fez muitas coisas que não deveria ter feito.
De acordo com o pioneiro gaúcho Otávio Marques de Siqueira, Telmo ajudou muito Paranavaí, mas nunca permitiu que alguém se lançasse contra ele na política. “No fundo, era boa pessoa, mas também sabia ser violento quando eram com ele”, avaliou. O pioneiro mineiro Enéias Tirapeli pertencia a um grupo que não simpatizava e nem desgostava de Telmo Ribeiro, apenas era indiferente ao capitão.
“Nunca me relacionei com ele, mas achei errado ele ter matado aquele rapaz na cadeia”, ressaltou, referindo-se ao assassinato do jovem Alcides de Sordi, de quem o capitão assumiu a autoria do crime. Fato sobre o qual houve divergências de opiniões. O pioneiro João Franco dizia que Telmo Ribeiro nunca atirou no rapaz. Para ele, o capitão tinha as “costas quentes” e chamou a responsabilidade para si na tentativa de livrar os amigos da prisão.
A decadência do capitão
Nas décadas de 1940 e 1950, Ribeiro conseguiu status e fortuna em Paranavaí. Entre as suas propriedades estava uma fazenda que compreende todo o Jardim São Jorge. Também tinha fama de perdulário. Ostentava um padrão de vida elevadíssimo, gastava muito dinheiro com a própria vaidade, amigos e mulheres em ambientes como a Boate da Cigana.
“Tal extravagância o levou a decadência. Depois de um tempo, começou a vender suas terras”, salientou Alcides Loureiro. Em 1964, às raias da falência, Telmo Ribeiro fixou residência em Maringá. Três anos mais tarde, viajou até Cornélio Procópio, no Norte Pioneiro, para cobrar um devedor e levou um tiro no peito.
O capitão influente e de muitos amigos, conhecido como rápido no gatilho, e que um dia participou da Guerra Paulista, enfrentou grileiros e jagunços, foi surpreendido e morreu no próprio local, longe de casa e sozinho, sem tempo de ao menos tirar a arma do coldre.
Curiosidade
Pioneiros contam que na época da colonização diziam que Telmo Ribeiro ameaçou roubar uma das filhas do pioneiro Arthur de Melo. Para evitar o pior foi enviado reforço policial de Arapongas.
Frases dos pioneiros sobre o capitão Telmo Ribeiro
Carlos Faber
“Nunca vi ele bravo, estava sempre alegre. Embora falassem certas coisas dele, nunca vi nada. O Telmo sempre me oferecia ajuda, mas nunca precisei.”
Raimundo Leite
“Ele me desacatou dentro da minha casa. E eu não morri porque não corri.”
Severino Colombelli
“O capitão Telmo era uma pessoa muito boa e de coração mole.”
Cincinato Cassiano Silva
“A parada era dura com o Capitão Telmo. Ele que expulsou os jagunços daqui. Para alguns ele era bom, mas pra outros não.”
Izabel Andreo Machado
“O capitão era pra nós uma pessoa muito boa.”
José Antonio Gonçalves
“Ele usava um chapéu grande e um lenço no pescoço. Era educadíssimo, mas a coisa com ele era meio brava.”
Valdomiro Carvalho
“Ele era realmente grande aqui. Eu ia com ele buscar boi no Mato Grosso, pra ganhar um dinheiro. Levava um mês. A gente ia pelo Porto São José, pegava um vaporzinho e atravessava a boiada de pouco em pouco.”
Paulo Tereziano de Barros
“O Capitão Telmo trouxe muita gente que ele achava que podia trabalhar no mato.”
José Francisco Siqueira (Zé Peão)
“Meu primeiro negócio com ele foi 30 sacas de arroz e 10 capados. Tudo fiado. Falavam que ele não pagava ninguém, tudo mentira. Depois de três dias, ele acertou comigo.”
Oscar Geronimo Leite
“Telmo Ribeiro era um dos mandões da época.”
José Ferreira de Araújo (Palhacinho)
“O telmo jogava snooker com a gente, andava com nós.”
José Alves de Oliveira
“Ele foi um dos grandes fregueses do meu bar. Nunca me deu um único prejuízo. Ia lá, comprava e pagava direitinho.”