David Arioch – Jornalismo Cultural

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O pioneirismo de um curitibano em Paranavaí

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Aldo Silva viabilizou a construção do Cemitério Municipal de Paranavaí

Aldo Silva (o segundo da esquerda para a direita) se mudou para Paranavaí em 1948 (Acervo: Casa da Cultura)

O advogado Aldo Silva que chegou a Paranavaí nos anos 1940, além de atuar na promotoria pública, se elegeu vereador por quatro mandatos consecutivos. Como presidente da Câmara Municipal foi o responsável pela viabilização da construção do Cemitério Municipal.

O curitibano Aldo Silva se mudou para Paranavaí em 20 de maio de 1948. Com 34 anos, terminava o mandato como deputado estadual. “Quando cheguei à colônia havia cerca de 300 moradores. Me hospedei na pensão de Artur de Melo, perto da hospedaria do “Seu Rodrigo” [Rodrigo Ayres de Oliveira]. Passei uma noite horrível porque estava muito frio e o vento entrava pelas frestas na parede de pau-a-pique”, relatou Silva.

Em Paranavaí, Silva logo conheceu diversos personagens que fazem parte do pioneirismo local, como Rodrigo Ayres de Oliveira, Família Palmiano, Zé Peão, José Cândido de Freitas, Manoel Paulino e Ulisses Faria Bandeira. “Este último veio pra cá ainda muito menino”, comentou o advogado que foi transferido a Paranavaí para exercer a função de promotor de justiça, cargo que lhe rendeu boa popularidade, além de estar sempre em contato com a política local.

Não são poucos os que apontam Aldo Silva como uma das pessoas mais influentes da história de Paranavaí. Ainda assim, o advogado jamais se considerou pioneiro. “Não fui um dos desbravadores, mas sim um dos primeiros que vieram para cá quando aqui passou realmente a existir como Paranavaí. Foi um tempo de afluxo muito grande de gente”, destacou, acrescentando que pessoas de vários países e de todos os estados do Brasil fixavam residência na colônia.

Em 1952, Aldo Silva foi eleito vereador e no ano seguinte assumiu como presidente da Câmara Municipal. No dia 16 de novembro de 1953, assinou um decreto que viabilizou a construção do Cemitério Municipal. O bom trabalho desempenhado pelo advogado lhe rendeu a reeleição. Em 1956, o candidato do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) se elegeu com 727 votos. E não parou por aí. Aldo Silva garantiu uma vaga na Câmara de Vereadores até 1968. Foram 16 anos dedicados à política municipal.

As curiosidades do passado

Entre os fatos mais curiosos lembrados pelo pioneiro Aldo Silva está um que envolve o primeiro prédio da administração pública. “O local onde funciona hoje a Prefeitura de Paranavaí já era usado com essa finalidade naquela época, a diferença é que era maior e abrigava todos os serviços públicos, inclusive estaduais”, frisou Aldo Silva, acrescentando que antes o espaço servia como hospedaria.

O vereador conheceu o primeiro advogado de Paranavaí, Dalio Zippin Grinspun, de origem polonesa, que anos depois se mudou para Curitiba. “Era um sujeito que dormia de dia e de noite, em pé, sentado, até conversando com a gente”, disse. Outra personalidade da história local com quem o vereador teve bastante contato foi Oscarlino Carvalho Duarte, apontado como o pioneiro que desbravou a região de Santa Isabel do Ivaí. “Ele foi o primeiro a ter geladeira, fogão, automóvel de luxo e também a construir um sobrado em Paranavaí”, revelou o advogado que em suas viagens pelo Noroeste do Paraná se deparou com fatos inimagináveis.

Nas imediações do Rio Paranapanema, Aldo Silva teve a oportunidade de conhecer o “Ranchão de Zinco”, um local que nos anos 1940 e 1950 ficou conhecido como “cemitério de veículos”. “Lá, havia muitos caminhões e automóveis deteriorados que foram abandonados. Os que vieram pra cá no início, sempre passavam pelo Paranapanema”, justificou. Segundo pioneiros, era comum os migrantes abandonarem veículos nas estradas e jamais retornarem para buscar, então surgiu a iniciativa de remanejá-los para uma área que depois recebeu o nome de “Ranchão de Zinco”. No local, o que surpreendia é que havia automóveis e jipes com a lataria em ótimo estado de conservação.

Saiba Mais

O curitibano Aldo Silva nasceu em 1914 e faleceu no dia 7 de junho de 1977 em Paranavaí.

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Três Morrinhos: dos índios aos esportistas

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Morro Três Irmãos foi cenário de importantes acontecimentos envolvendo a civilização indígena   

 Via lateral do Morro Três Irmãos nos anos 1950 (Acervo: Ordem do Carmo)

Via lateral do Morro Três Irmãos nos anos 1950 (Acervo: Ordem do Carmo)

Com uma geomorfologia que ultrapassa milhares de anos, o Morro Três Irmãos, em Terra Rica, é o ponto mais alto do extremo Norte do Paraná. Além do atrativo turístico, surpreende também pelos fatos, mitos e lendas relatados por quem, de forma abnegada, se dedica a perpetuar a história da própria terra.

Na microrregião de Paranavaí, é raro encontrar alguém que nunca tenha ouvido falar do Morro Três Irmãos, mais conhecido como “Três Morrinhos”. Com 190 metros de altura, o pico desponta como o ponto turístico mais importante de Terra Rica. Nem poderia ser diferente, já que desde 1985 sedia campeonatos de voo livre com participantes do Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro, Argentina, Paraguai e Bolívia.

O fato do morro existir em uma região totalmente plana desperta curiosidade em quem o visita pela primeira vez. “É um extra na paisagem. Desde criança isso já me chamava a atenção”, afirma o pesquisador Edson Paulo Calírio que na infância passava horas observando no horizonte, a uma altitude de 640 metros, a imponência hipnotizante da natureza.

Misterioso relevo em uma região de planícies (Foto: Cláudia Lanziani)

Misterioso relevo em uma região de planícies (Foto: Cláudia Lanziani)

Motivado em conhecer mais sobre a história de Terra Rica e das belezas naturais que a circundam, Calírio pesquisou sobre o assunto. Entre as surpresas, a descoberta de que o “Morro Três Irmãos”, antes de ser patrimônio do Paraná e até mesmo do Brasil, pertenceu ao Paraguai. Fazia parte de um dos mais valorizados pontos turísticos do Estado de Guairá.

À época, a região era habitada por índios guaranis catequizados pelos espanhóis. Segundo Calírio, a situação ficou tensa quando os portugueses chegaram ao local. Houve um grande confronto e, vitoriosos, os lusos expulsaram os espanhóis.

A justificativa para milhares de índios vivendo em torno dos Três Morrinhos era o fácil acesso aos recursos necessários à subsistência, além da privilegiada perspectiva do Pontal do Paranapanema. “Aqui servia como um ponto de referência para eles. O município de Terra Rica é rico em rios, então podemos perceber que eles quiseram desfrutar deste privilégio”, enfatiza o pesquisador apontando, de cima do primeiro morro, as correntes fluviais mais próximas.

Formação rochosa existe há milhares de anos (Foto: Prefeitura de Terra Rica)

Formação rochosa existe há milhares de anos (Foto: Prefeitura de Terra Rica)

Há algumas décadas, apesar da falta de bibliografia, e partindo de uma experiência empírica ou relativamente in loco, moradores de Terra Rica tiveram os primeiros contatos com materiais que confirmam a presença espanhola e indígena na área.

O pai de Edson Calírio, por exemplo, encontrou, às margens do Rio Paranapanema, uma espada que há centenas de anos pertenceu a um espanhol. A confirmação veio após o instrumento ser enviado para análise em São Paulo. “Ele não sabia do que se tratava na época. Pensou que fosse um facão ou algo do tipo. Curioso, decidi buscar mais informações”, explica o pesquisador.

Estrutura rochosa impede definhamento

Sobre o passado, uma prova que ratifica a existência de índios no Morro Três Irmãos, em Terra Rica, é uma machadinha encontrada pelo pesquisador Edson Paulo Calírio. A arma, feita a partir de uma rocha, é relativamente arredondada e possui um corte lateral. “É bem provável que tenha sido utilizada em batalhas. Aqui mesmo do alto deste morro”, avalia o pesquisador.

Caverna do Sol Nascente: contraste de lenda e realidade (Foto: Prefeitura de Terra Rica)

Caverna do Sol Nascente: contraste de lenda e realidade (Foto: Prefeitura de Terra Rica)

Naquele tempo, era uma prática indígena comum a de conceber armas a partir de rochas. A justificativa são os três morros que existem justamente em função desse mineral tão abundante. “Aqui temos apenas rocha matriz do arenito Caiuá, e todas têm aproximadamente cinco mil anos. É muito resistente. Você percebe que o relevo se desgastou, mas não os Três Morrinhos que são formados por esse material rochoso”, argumenta.

História X Lenda

Com o passar dos anos, moradores locais se interessaram em conhecer de perto os Três Morrinhos. A vontade foi impulsionada por uma vigorosa resistência física, já que era necessário pensar nas adversidades envolvendo a fauna e a flora local. “Antigamente tinha que subir isso aqui passando pela mata. O povo sofria muito porque não havia nenhum caminho delimitado”, conta o pesquisador Edson Paulo Calírio.

Com a oportunidade de conhecer o Morro Três Irmãos, vieram histórias que contrastam com lendas. De acordo com o pesquisador, houve uma época, há 50 anos, em que muitos capangas eram designados por grileiros a roubarem terras nas imediações. “Temos uma senhora de Terra Rica que quando era criança o tio dela lhe contou que matou um homem e colocou o corpo dele dentro de uma caverna no terceiro morro”, afirma Calírio.

Morro Três Irmãos está entre os melhores do Brasil para praticantes de voo livre (Foto: Carlos Sica)

Morro Três Irmãos está entre os melhores do Brasil para praticantes de voo livre (Foto: Carlos Sica)

Um dos melhores pontos do Paraná

 No início da década de 1980, a construção de um pequeno caminho cimentado, dando acesso aos Três Morrinhos, foi determinante para atrair centenas de praticantes de voo livre. Por se situar em uma região, a probabilidade de riscos durante o salto é menor.

Em 1985, quando o primeiro campeonato de voo livre foi realizado em Terra Rica, pouco tempo depois a cidade se tornou parada obrigatória para os amantes do esporte radical. Foram sete anos consecutivos como sede do Campeonato Brasileiro e Paranaense.

Todos esses eventos, aliados à condição topográfica, tiveram grande  importância para que o Morro Três Irmãos, de acordo com especialistas em voo livre, fosse visto como um dos melhores lugares do Paraná para a prática do esporte. “Terra Rica é a capital paranaense do voo livre”, diz orgulhoso o pesquisador Edson Paulo Calírio.

Outro motivo de orgulho para os 15 mil habitantes de Terra Rica é o fato de nunca ter acontecido nenhuma fatalidade durante um campeonato ou curso de voo livre. “Tivemos alguns acidentes, mas poucos de alta gravidade. Quem vem pra cá é profissional. Além disso, temos instrutores muito bem preparados”, assegura Calírio.