David Arioch – Jornalismo Cultural

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Pecuaristas estão trocando o leite pela cerveja nos Estados Unidos

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“Descobrimos a nossa paixão pela cerveja artesanal”

Situada em Massachussetts, a fazenda Carter & Stevens, que era totalmente dedicada à produção de laticínios agora está operando também como cervejaria (Foto: Reprodução)

O casal de pecuaristas Molly Stevens e Sean DuBois está trocando o leite pela cerveja nos Estados Unidos. Situada em Massachussetts, a fazenda Carter & Stevens, que era totalmente dedicada à criação de vacas e produção de laticínios, agora está operando também como cervejaria porque seus proprietários estão enfrentando a maior baixa histórica desde que a fazenda foi fundada, segundo informações do New York Times.

“Descobrimos a nossa paixão pela cerveja artesanal”, explica DuBois. Embora eles não tenham feito uma transição completa, o que significa que continuam operando parcialmente como uma fazenda de produção de laticínios, tudo indica que em breve as vacas leiteiras já não serão mais ordenhadas na propriedade, seja mecanicamente ou manualmente. E por um motivo bem simples, o casal vende cada litro de cerveja por sete dólares contra os 0,16 centavos por litro de leite.

Molly Stevens e Sean DuBois não têm dúvidas de que o mercado de leites vegetais deve ocupar cada vez mais espaço. Por isso, decidiram investir na cervejaria. Outras fazendas consideradas tradicionais no ramo de laticínios já fizeram uma transição completa. Dos exemplos mais emblemáticos está a Elmhurst Dairy que depois de 80 anos se transformou na marca vegana Elmhurst Milked, de leites vegetais.





Howard Lyman, a transformação de um pecuarista multimilionário em um ativista vegano

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“Se você realmente ama os animais, se você se importa com eles tanto quanto diz, por que os come?”

Lyman: “Nunca vi um animal pular e dizer que quer ser um hambúrguer” (Foto: Reprodução)

Howard Lyman talvez tenha uma das histórias mais famosas de transformação de um pecuarista multimilionário em um ativista vegano. Desde o início da década de 1990, ele tem promovido o veganismo nos Estados Unidos e publicado obras que revelam as mazelas da indústria agropecuária, e sob a perspectiva de quem fez parte desse meio por mais de 20 anos.

Da quarta geração de uma família de pecuaristas, Lyman frequentou a Universidade Estadual de Montana, onde se graduou em agricultura geral em 1961. Depois passou dois anos no Exército dos Estados Unidos antes de comprar a sua própria fazenda: “Eu acordava cedo, fazia a roçada, ouvia os pássaros cantando e me sentia como o guardião do Éden. Meu sonho era ser um fazendeiro. Então fui para a universidade. Comprei uma fazenda orgânica e com o passar dos anos, já possuía mais de 7 mil cabeças de gado e mais de 12 mil hectares.”

De 1963 a 1983, Lyman dedicou a maior parte do seu tempo à criação de animais e grãos, convertendo a sua fazenda orgânica em uma megaoperação de confinamento de animais visando a extração de leite e o abate. “Lembro como se fosse hoje quando trouxemos os animais e demos a eles entre 7 e 21 vacinas. Cortamos os chifres, castramos eles, injetamos hormônios e os alimentamos com resíduos e antibióticos. Na fazenda, eu via tantas moscas juntas que você podia pegá-las aos montes apenas abrindo e fechando as mãos”, narra.

Além de nove mil bovinos, incluindo bezerros enviados ao matadouro para atender ao mercado de carne de vitela, ele criava porcos e aves. Também produzia grãos, silagem e feno: “Levantávamos cedo, quando não havia nevoeiro, e pulverizávamos inseticidas por toda a propriedade. Havia sempre uma grande nuvem flutuando sobre o gado, sobre a água e sobre a comida, e o inseticida atingia tudo. Duas horas mais tarde, o gado se alimentava e bebia aquela água contaminada. Essas são as coisas que aprendi na Universidade Estadual de Montana.”

O ex-pecuarista admite que era preciso dissimular a realidade para seguir em frente. Sempre que via os pássaros mortos, as árvores morrendo, e o solo de sua fazenda mudando, ele se esforçava para não pensar em como estava gastando centenas de milhares de dólares em produtos químicos. “Eu era o responsável por tudo isso. Meu irmão faleceu aos 29 anos, e ainda hoje acho que ele morreu por causa desses produtos químicos que usamos na fazenda”, declara.

Em 1979, quando ainda criava animais para consumo, Lyman foi diagnosticado com um tumor na espinha. Diante da possibilidade de ficar paralítico, ele prometeu que se sobrevivesse ao câncer se afastaria dos meios de produção baseados em produtos químicos.

“Eu estava no auge da minha carreira quando fiquei paralisado da cintura para baixo. É preciso muita concentração para direcionar a sua atenção para outra coisa que não seja a sua situação. No hospital, os médicos disseram que eu tinha uma chance em um milhão de voltar a andar por causa de um tumor dentro da minha coluna vertebral. Fui levado para a sala de cirurgia e operado durante 12 horas. Eles removeram um tumor do tamanho do meu polegar. Saí do hospital depois de uma operação com uma chance de sucesso em um milhão. Me lembro de estar na fazenda após a operação.”

Em casa, o pecuarista viu o próprio reflexo no espelho e teve um momento de conflito existencial que, segundo ele, foi uma das primeiras situações em que foi honesto consigo mesmo. Lyman, que costumava dizer a si mesmo que amava os animais, se perguntou:

“Se você realmente ama os animais, se você se importa com eles tanto quanto diz, por que os come?” Foi tão traumático para mim que eu quase arranquei a pia da parede. Essa foi uma porta da minha alma que eu nunca tinha aberto antes. E uma vez que a abri, nunca mais consegui fechá-la porque eu sabia como esses animais pareciam quando eles caíam mortos no chão. Eu sabia o que havia em seus olhos, e eu era a pessoa que os colocava lá. Era como se tudo o que você acreditasse que é justo e sagrado de repente estivesse em risco.”

Naquele dia, Lyman se perguntou como falaria para a própria esposa que a sua operação multimilionária era um erro, e que ele percebeu que a sua fonte de renda foi construída “sobre a areia”; já que tudo em que Howard Lyman acreditava estava em risco porque, pela primeira vez se deu conta de que o seu lucro era baseado no assassinato de animais. “Como eu poderia dizer que talvez o que devêssemos fazer era sair desse negócio?”, lembra.

Lyman reconheceu que não poderia falar de seus conflitos com seus amigos, porque todos eles trabalhavam no mesmo ramo. Não teve nenhum apoio. Pensou também em falar com um padre, mas concluiu que provavelmente o próprio padre comia tanta carne quanto ele. “Foi o momento mais solitário e mais difícil da minha vida”, garante.

No entanto, a grande transformação de Howard Lyman só aconteceria alguns anos depois. Em 1990, quando atuava como lobista em Washington, ele estava muito acima do peso e enfrentando problemas de saúde como pressão alta e altos níveis de colesterol. Então decidiu definitivamente se tornar vegetariano. No ano seguinte, mais decidido e com uma opinião mais forte sobre os direitos animais, fez a transição para o veganismo e transformou a sua fazenda em um santuário para animais. Também começou a promover o veganismo em diversas regiões dos Estados Unidos, defendendo também a produção orgânica de vegetais:

“Nunca vi um animal pular e dizer que quer ser um hambúrguer. Estive em centenas de matadouros, vi milhares de animais morrerem, e sempre que eu os observava, eu notava que eles sabiam o que aconteceria com eles. Havia o cheiro de morte. Eu me questionava: ‘Existe alguma necessidade disso?’”

Em abril de 1996, o ex-pecuarista participou do programa The Oprah Winfrey Show, onde denunciou as mazelas da indústria de proteína animal. Suas revelações tiveram repercussão nacional e fizeram com que Oprah abdicasse do consumo de hambúrgueres. Lyman e a apresentadora tiveram de responder a dezenas de processos da Associação dos Produtores de Carne Bovina dos Estados Unidos, mas foram inocentados em 1998. “Tenho certeza de que se eu fosse novamente ao programa, hoje eu seria condenado, mesmo falando a verdade”, lamenta.

Também em 1998, Howard Lyman, que se tornou uma referência em veganismo para a atriz vegana Linda Blair, publicou o livro “Mad Cowboy: Plain Truth from the Cattle Rancher Who Won’t Eat Meat”, em que narra a sua trajetória pessoal e profissional de pecuarista à ativista vegano. Também traz importantes informações sobre as mazelas da indústria agropecuária, o que inclui investigações do uso de nocivos produtos químicos nesse meio. Em 2005, ele lançou o livro “No More Bull! The Mad Cowboy Targets America’s Worst Enemy: Our Diet”, que é uma continuação da obra de 1998. A sua história é narrada no documentário “Mad Cowboy” e em “Peaceable Kingdom” – este segundo com boa repercussão internacional.

Lyman também aparece no famoso documentário “Cowspiracy”, de Kip Andersen e Keegan Kuhn, em que afirma que não faz sentido um ambientalista consumir produtos de origem animal. “Engane-se se quiser. Aliás, se quiser alimentar o seu vício, faça-o, mas não chame a si mesmo de ambientalista ou protetor dos animais”, critica.

Saiba Mais

Entre os anos de 1996 e 1999, Howard Lyman foi presidente da União Vegetariana Internacional.

 Referências

Lyman, Howard. Mad Cowboy: Plain Truth from the Cattle Rancher Who Won’t Eat Meat (1998).

Capps, Ashley. Former meat and dairy farmers who became vegan activists. Free From Harm (4 de novembro de 2014).

Stein, Jenny. Peaceable Kingdom (2004).

Andersen, Kip; Kuhn, Keegan. Cowspiracy (2014).





 

Segundo estudo da Universidade de Oxford, não consumir alimentos de origem animal é a forma mais eficaz de reduzir o impacto no planeta

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“Evitar o consumo desses produtos traz benefícios ambientais muito melhores do que comprar carnes e laticínios sustentáveis”

Poore: “Realmente são os produtos de origem animal que são responsáveis por muitos desses problema” (Acervo: Irish Times)

Um estudo intitulado “Reducing food’s environmental impacts through producers and consumers”, publicado na conceituada revista Science, conclui que não consumir alimentos de origem animal é a forma mais eficaz de reduzir o impacto no planeta.

Considerada pelo jornal britânico The Guardian como a maior análise já feita sobre os efeitos da produção agrícola, a pesquisa realizada pela Universidade de Oxford, que reuniu dados de quase 40 mil fazendas que produzem 40 produtos agrícolas em 119 países, informa que 80% das áreas agrícolas do mundo são destinadas à criação de animais para consumo.

A atividade, que segundo o trabalho têm grandes consequências se tratando de alocação de terras e uso de água doce, é responsável por 58% das emissões de gases do efeito estufa, 57% da poluição da água e 56% da poluição do ar. A pesquisa, disponibilizada no site da revista Science, enfatiza que o impacto pode variar em até 50 vezes entre os produtores de um mesmo produto, criando oportunidades substanciais de mitigação.

No entanto, mesmo que os produtores de alimentos de origem animal se esforcem para alcançar baixos impactos ao longo da cadeia de produção e fornecimento, a redução ainda é limitada, de acordo com os cientistas. Isto porque “o impacto dos produtos de origem animal de menor impacto normalmente excede os dos seus substitutos de origem vegetal, fornecendo novas evidências para a importância da mudança na dieta” — explica.

Em entrevista ao The Guardian, o coordenador da pesquisa, Joseph Poore, disse que “uma dieta vegana é provavelmente a melhor maneira de reduzir o impacto no planeta, não apenas por causa dos gases do efeito estufa, mas também por causa da acidificação global e eutrofização, além do uso de terra e água.”

O estudo também comparou o impacto da produção de carne bovina com a proteína baseada em vegetais e revelou que até mesmo a carne orgânica ou considerada sustentável pode requerer 36 vezes mais terra e gerar seis vezes mais emissões de gases do efeito estufa do que a produção de ervilhas.

Poore frisa que, para quem se preocupa com o meio ambiente, é muito melhor abdicar do consumo de alimentos de origem animal do que reduzir viagens de avião ou comprar um carro elétrico: “Realmente são os produtos de origem animal que são responsáveis por muitos desses problemas. Evitar o consumo desses produtos traz benefícios ambientais muito melhores do que comprar carnes e laticínios sustentáveis”.

Referências

Poore, J; Nemecek, T. Reducing food’s environmental impacts through producers and consumers. Science Magazine (1º de junho de 2018).

Carrington, Damian. Avoiding meat and dairy is ‘single biggest way’ to reduce your impact on Earth. The Guardian (31 de maio de 2018).




 

60% dos mamíferos do mundo são produtos da pecuária

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“Nossas escolhas alimentares têm um grande efeito sobre os habitats dos animais, plantas e outros organismos”

Milo: “Considero o impacto ambiental na minha tomada de decisão, então isso me ajuda a pensar se quero escolher bife ou frango ou usar tofu?” (Foto: Creative Commons)

Um estudo intitulado “A Distribuição de Biomassa na Terra”, publicado esta semana pela Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, revelou que 60% de todos os mamíferos do mundo são produtos da pecuária. Ou seja, existem para serem comercializados como alimentos ou fontes de alimentos.

Desses 60%, a maioria é formada por suínos e bovinos. Tratando-se de animais não mamíferos, 70% das aves do mundo todo são criadas para consumo, e apenas 30% são silvestres. Os seres humanos, que somam 7,6 bilhões na atualidade, não representam mais do que 0,01% de todos os seres vivos que habitam a Terra. Ainda assim, a humanidade conseguiu provocar o desaparecimento de 83% de todos os mamíferos selvagens desde o início da civilização, segundo a pesquisa.

Ron Milo, do Instituto de Ciência Weizmann, de Israel, que liderou o trabalho, declarou que ficou chocado ao descobrir que não havia uma estimativa abrangente de todos os diferentes componentes da biomassa. “Espero que isso dê às pessoas uma perspectiva sobre o papel dominante que a humanidade desempenha agora na Terra”, enfatizou.

Para o pesquisador, a maneira como nos alimentamos exige uma profunda reflexão. “Nossas escolhas alimentares têm um grande efeito sobre os habitats dos animais, plantas e outros organismos. Considero o impacto ambiental na minha tomada de decisão, então isso me ajuda a pensar se quero escolher bife ou frango ou usar tofu?”

Referência

The Biomass Distribution on Earth. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America (21 de maio de 2018)

 



Written by David Arioch

May 24th, 2018 at 3:28 pm

“Sob a Pata do Boi”, novo documentário mostra o impacto da pecuária no desmatamento da Amazônia

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Documentário mostra como a Amazônia tem virado pasto em decorrência da pecuária (Arte: Divulgação)

Dirigido por Marcio Isensee e Sá, “Sob a Pata do Boi” é um documentário brasileiro de média-metragem que mostra o impacto da pecuária no desmatamento da Amazônia. De acordo com informações do filme que já entrou na programação de festivais na França e na Eslováquia, a Amazônia tem hoje 85 milhões de cabeças de gado, três para cada habitante humano. Entre alguns temas abordados pelo documentário estão “o boi clandestino”, “invasão biológica”, “indústria da carne” e “bancada ruralista”.

O documentário informa que na década de 1970 a floresta estava intacta e a quantidade de gado equivalia a um décimo do rebanho da atualidade. Hoje, encontramos uma área que pode ser comparada à extensão territorial da França desmatada. Desse total, 66% transformada em pasto.

“Sob a Pata do Boi” revela que essa transformação no cenário amazônico foi incentivada pelo próprio governo que motivou a chegada de milhares de fazendeiros de outras partes do país. “A pecuária tornou-se bandeira econômica e cultural da Amazônia, no processo, elegendo poderosos políticos para defender a atividade”, denuncia.

Mesmo com o Ministério Público “obrigando” os grandes frigoríficos da região a se tornarem responsáveis por monitorar as fazendas fornecedoras de gado, e não comprar daquelas que têm desmatamento ilegal, isso não significa que hoje a realidade seja auspiciosa.

O documentário é resultado de um trabalho de jornalismo investigado que completou dois anos, e que tem como eixo norteador as reportagens: “O procurador que laçou o desmatamento”, “Guerra e paz por trás de um bife”, “Os portões do desmatamento”, “Boi clandestino não morre de velho”, “O drible do gado: a parte invisível da cadeia da pecuária” e “Origem desconhecida”. “

Sob a Pata do Boi” tem 49 minutos e foi produzido pelo site ((o))eco, de jornalismo ambiental, e pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).





O que existe de errado com o chamado “bem-estarismo animal”

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Harold Brown, o pecuarista que se tornou um defensor dos direitos animais

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Brown: “Até que questionemos esse relacionamento que existe há cerca de 10 mil anos, teremos dificuldade em ver os animais com novos olho” (Acervo: Farm Kind)

Filho de pecuaristas, Harold Brown cresceu em uma fazenda repleta de animais – bois, vacas, porcos e cabras. Começou a acreditar desde cedo que os animais existiam simplesmente para servirem aos seres humanos. “Cresci imerso em uma doutrinação de como os animais estão classificados no ciclo da vida. Também fui um caçador”, relata. Além da sua família, o que ajudava a reforçar a ideia de que Brown estava no “caminho certo” ao tomar parte na exploração animal era a sua própria comunidade, a igreja e a TV.

“Cada intervalo [na TV] tem pelo menos um comercial vendendo produtos com carne, laticínios ou ovos, e eles são inventivos. Quando via isso, eu pensava que estava fazendo uma coisa boa”, afirma. Aos 18 anos, Brown teve um ataque cardíaco, e na época não entendeu o que aconteceu. Ele estava assistindo a um filme e tomando meio galão de sorvete, até que o lado esquerdo do seu pescoço começou a doer. A dor se estendeu para a mandíbula, ombros e se espalhou pelo braço esquerdo. “Eu estava no chão e não conseguia respirar. Parecia uma eternidade, mas durou apenas alguns minutos. Eu não conhecia os sintomas de um ataque cardíaco”, enfatiza.

Mais tarde, seu pai teve dois ataques cardíacos, um acidente vascular cerebral (AVC) que o privou da fala e um aneurisma que quase o matou. Então o médico informou que levando em conta o histórico familiar, Brown, assim como o pai, tinha uma predisposição a desenvolver graves problemas cardíacos. “Disse que se eu não mudasse o meu estilo de vida, teria que usar um marca-passo aos 35 anos. Falou que eu deveria cortar o sorvete, que era um vício para mim, e a carne vermelha. Não sugeriu ser vegetariano. Além disso, eu não saberia o que isso significava. Nunca ouvi falar disso até então”, revela.

Em casa, Harold conversou sobre a sugestão do médico com a esposa e os dois decidiram fazer uma transição para uma alimentação livre de alimentos baseados em calorias vazias e livre de carne vermelha. Em pouco tempo, ingressaram no Clube Vegetariano de Cleveland e se tornaram realmente vegetarianos. À época, Brown conheceu o trabalho dos médicos Caldwell Esselstyn e Michael Greger, defensores da alimentação livre de ingredientes de origem animal.

Alguns anos depois, Harold considerou insuficiente ser vegetariano, inclusive essa etapa de sua história foi registrada no documentário “Peaceable Kingdom – The Journey Home” ou “Reino Pacífico – A Jornada Rumo ao Lar”, lançado por Jenny Stein em 2009. Segundo Harold Brown, mesmo convivendo com animais desde muito cedo, ele não tinha percebido como desenvolveu um mecanismo que o impedia de ver os animais como sujeitos de uma vida.

“Eu tinha uma imagem imediata na minha cabeça de uma luz sobre o meu coração que eu poderia ligar ou desligar dependendo com quem eu estava lidando. Também percebi que a sugestão para esse mecanismo de desconsideração era a frase: ‘Não me importo’”, frisa. No seu entendimento, o ato de negar-se a se importar com os animais permitiu que ele vivesse desconectado emocionalmente, psicologicamente e espiritualmente em relação a eles.

Harold Brown chegou a um ponto em que não considerava mais correto continuar imerso nessa crença de desconsideração. “O que aprendi então foi que ao escolher não dizer que não me importo, então não haveria alternativa a não ser dizer: ‘Eu me importo’. Chamarei isso de cuidado condicional, mas pode ser melhor entendido como compaixão incondicional, que mudou profundamente a minha vida. Tive que trabalhar duro para aprender a praticar a honestidade emocional; algo que nossa cultura não ensina às pessoas, e particularmente aos homens”, avalia.

Um grande problema na perspectiva de Harold, e que dificulta o entendimento de que o respeito à vida animal deve estar muito além de “tratar bem” para explorá-los e matá-los, é que a honestidade emocional é substanciada como contraintuitiva para os homens em nossa cultura, sendo vista inclusive como sinal de fraqueza: “Mas no coração do meu coração eu sabia que era onde eu precisava estar. Se eu quisesse fazer qualquer tipo de diferença em prol de um mundo melhor, eu teria que viver essa verdade.”

Brown admite que não se tornou vegano apenas pela própria força de vontade. Ele teve muito apoio da esposa e de amigos da comunidade vegetariana de Cleveland: “Se eles não me proporcionassem um espaço seguro para explorar os traumas da minha vida, provavelmente eu não teria aprendido a entender verdades muito importantes. Uma dessas verdades é a ahimsa, a não violência.” O ex-pecuarista crê que não há ação sem reação no que diz respeito ao tratamento que dispensamos aos animais. Se os exploramos e os matamos em algum ponto isso também há de gerar consequências para nós.

Para Harold Brown, a forma como vivemos nossas vidas, e as coisas que fazemos ou não fazemos, têm tudo a ver com a realidade que criamos. Ele se recorda que na infância observou que os animais criados para consumo buscavam conforto, prazer, boa comida, abrigo e senso de comunidade. “Mas não permiti que essas observações atingissem a cultura dominante em que vivi. Quando me permiti incluir esses animais no meu universo moral, ficou claro que as observações mais simples que fazemos sobre os animais que chamamos de ‘animais de estimação’ não são diferentes das que poderíamos fazer sobre os ‘animais de fazenda’”, confidencia.

Brown, que antes de se tornar vegano trilhava os passos do pai, ou seja, já atuava na criação de animais para consumo, defende que os animais devem ser respeitados como seres sencientes que são. “Isso significa que eles estão na Terra por suas próprias razões, não pelas nossas. Eles têm seus próprios interesses, assim como os humanos, e devem ser respeitados. Por enquanto, são vistos como propriedade legal dos seres humanos, e essa dinâmica os coloca em grande desvantagem; particularmente em um sistema capitalista de livre mercado, onde os animais são comercializados nitidamente como commodities, unidades econômicas. Até que questionemos esse relacionamento que existe há cerca de 10 mil anos, teremos dificuldade em ver os animais com novos olhos”, acredita. Desde que se tornou vegano, Brown ministra palestras contando a sua própria história e motivando mais pessoas a seguirem o mesmo caminho contra a exploração de animais.

Saiba Mais

Harold Brown vive em Cleveland, em Ohio, nos Estados Unidos.

Referência

FarmKind.org

 

 





 

Valdir Colatto e Luiz Carlos Heinze querem “arrendar” terras indígenas

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Em 2016, o Estadão publicou a série de reportagens Terra Bruta, revelando que embora seja proibido criar gado em área indígena, fazendeiros já têm mais de 93 mil cabeças de gado na terra indígena dos javaé e carajás, na Ilha do Bananal (TO). Como se isso fosse pouco, atualmente, duas lideranças da Bancada Ruralista, Valdir Colatto (PMDB/SC) e Luiz Carlos Heinze (PP/RS) estão tentando viabilizar um projeto que permite o “arrendamento” de terras indígenas. Colatto também é o deputado federal responsável pelo projeto que tenta legalizar a caça de animais selvagens no Brasil.

Written by David Arioch

February 8th, 2018 at 7:36 pm

Estudo mostra que a pecuária é a atividade com maior apropriação de solo em áreas desmatadas da Amazônia

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Foto: Daniel Beltrá

O artigo “Pecuária e desmatamento: uma análise das principais causas diretas do desmatamento na Amazônia”, publicado pela revista Nova Ecnonomia, do Departamento de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), avalia a evolução das causas imediatas do desmatamento da Amazônia, utilizando-se de regressões lineares.

O estudo mostra que nos estados da Amazônia não há atividade com maior apropriação de solo do que a pecuária, e exatamente por desempenhar papel tão determinante na região está fortemente associada com o desmatamento, inclusive sendo apontada como principal causa. E a agricultura em larga escala em vez de reduzir o impacto da pecuária no desflorestamento tem ajudado a ampliá-lo, até porque as duas culturas estão intrinsecamente relacionadas na região, já que uma depende da outra.

O artigo aponta que o crescente investimento em pecuária na região não tem previsão de desaceleração, até porque a pecuária exige baixos níveis de capital, pouco preparo para o solo e poucas restrições associadas ao relevo e áreas livres de troncos em florestas onde o desmatamento é extremamente acentuado.

Na área, a criação de gado normalmente é extensiva, o que significa que há grandes latifúndios contando com até uma cabeça por hectare. O estudo sugere que é preciso agir sobre a lógica dessa expansão, reduzindo o seu avanço sobre novas áreas da Amazônia. Para isso, é preciso com urgência que sejam estabelecidas novas políticas ambientais.

“É necessário também reduzir a motivação da expansão da pecuária nas áreas onde a propriedade da terra é incerta ou se encontra sob o controle formal do governo (as chamadas áreas devolutas). Sem o aumento do grau de ordenamento sobre a propriedade da terra e do aumento da legalidade nas áreas ocupadas, a pecuária de baixa produtividade e baixo investimento de capital vai continuar fazendo parte da lógica de expansão da ocupação da terra na Amazônia”, informa o artigo “Pecuária e desmatamento: uma análise das principais causas diretas do desmatamento na Amazônia”.

 

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Written by David Arioch

August 21st, 2017 at 1:55 am

A pecuária como fator colaborativo do desmatamento na Amazônia

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Desmatamento é maior em áreas que pertencem ao Pará, Rondônia, Mato Grosso e Maranhão

De acordo com o artigo “O desmatamento na Amazônia e a importância das áreas protegidas”, que faz parte do Dossiê Amazônia Brasileira 1, publicado pela Universidade de São Paulo (USP), o modelo da ocupação demográfica da Amazônia legal nos últimos cinquenta anos tem levado a níveis significativos de desmatamento, resultante de múltiplos fatores, entre eles, a pecuária.

A área cumulativa desmatada na Amazônia legal brasileira chegou a cerca de 653.000 km² em 2003. O processo de desmatamento normalmente começa com a abertura oficial ou clandestina de estradas que permitem a expansão humana e a ocupação irregular de terras à exploração predatória de madeiras nobres.

[…] Existe uma relação direta entre a economia, o avanço da fronteira na Amazônia Legal e a taxa de desmatamento crescente desde 1990, influenciada pelo estado da economia nacional. Contudo, nos últimos anos, essa relação começou a modificar-se, pois a taxa de desmatamento foi crescente, apesar da falta de crescimento econômico .

[…] Os estados que mais desmataram a Amazônia brasileira entre 2001 e 2003 foram os do Pará, Rondônia, Mato Grosso e Maranhão, que, juntos, corresponderam por mais de 90% do desmatamento observado nesse período.

 

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Written by David Arioch

August 21st, 2017 at 1:50 am