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Palestra sobre o papel do negro no cinema

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Fui convidado pelo Sesc para dar uma palestra para professores hoje à tarde no Seminário Multidisciplinar – Diversidade Étnico Racial, Indígena e Cigana no Núcleo Regional de Educação de Paranavaí. Fazia mais de dois anos que eu não dava uma palestra sobre cinema, e hoje fui até lá para falar sobre o papel do negro no cinema brasileiro ao longo da história. Foi uma experiência muito rica e interessante. Me trouxe muitas lembranças dos cinco anos em que ajudei a coordenar o Projeto Mais Cinema. Uma vez por semana, após a exibição dos filmes, eu fazia uma análise e discutia a obra com o público.

Written by David Arioch

December 6th, 2016 at 12:53 am

Lembranças do Mais Cinema

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Projeto reuniu cinéfilos de Paranavaí uma vez por semana ao longo de cinco anos

Reportagem sobre o Projeto Mais Cinema que saiu no jornal "O Paraná", de Cascavel, em 2009 (Imagem: Reprodução)

Reportagem sobre o Projeto Mais Cinema que saiu no jornal “O Paraná”, de Cascavel, em 2009 (Imagem: Reprodução)

Em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, o Projeto Mais Cinema, realizado de 2008 a 2013, oferecia uma vez por semana sessões gratuitas de cinema na Casa da Cultura Carlos Drummond de Andrade, onde cinéfilos com faixa etária de 18 a 70 anos se reuniam para assistir filmes que não fazem parte do circuito comercial. Ao final das exibições, eu sentava na beira do palco, analisava o filme e abria espaço para perguntas e comentários.

Não vou mentir e dizer que muita gente participava do Mais Cinema. Não, isso não é verdade, mas, apesar do público modesto, fazia o nosso projeto valer a pena, já que quem frequentava a Casa da Cultura sabia o que estava buscando e o que encontraria. Além da oportunidade de assistir bons filmes, os cinéfilos ainda recebiam refrigerante e pipoca – tudo isso graças à Fundação Cultural de Paranavaí e ao nosso amigo Sobhi Abdallah, responsável pelo empréstimo de um projetor que substituiu o nosso já danificado.

Pelo seu idealismo minimalista, o Mais Cinema chamou tanta atenção que em poucos meses jornais de diversas cidades do Paraná publicaram reportagens sobre a iniciativa. Um exemplo foi o “O Paraná”, de Cascavel, na região Oeste, a quem concedi uma entrevista falando do nosso objetivo após seis meses de implantação do projeto que contava com o empenho voluntário de amigos e artistas como Amauri Martineli, Rosi Sanga, Elza Pavão, Sobhi Abdallah e Paulo Cesar de Oliveira.

“Valorizamos aqueles cineastas que tiram proveito da sensibilidade para estabelecer uma profunda construção de sentido, nada óbvio, mas com uma capacidade de humanização que faz o espectador ir embora refletindo sobre o mundo, a vida, suas experiências e seu comportamento”, declarei ao jornal “O Paraná” em 2009.

Logo no início, seguindo a proposta de exibir e discutir filmes “alternativos”, o projeto presenteou o público com um cosmopolitismo cinematográfico – cinema clássico, expressionismo alemão, neorrealismo italiano, cinema surrealista, realismo poético francês, nouvelle vague, cinema noir, novo cinema alemão e cinema novo brasileiro, entre outros movimentos artísticos.

Público também participava do debate ao final do filme (Foto: Amauri Martineli)

Público também participava do debate ao final do filme (Foto: Amauri Martineli)

Ao longo de cinco anos, exibimos muitos filmes, obras de mais de 40 países e de todos os continentes. Quem participou do projeto sabe que a prioridade era seguir na contramão da Indústria Cultural, fomentadora de uma fantasia distante do homem comum. O mais importante era levar o público à imersão, um convite à reflexão – imprescindível nas obras de cineastas aptos a captar o obscurantismo da complexidade humana – individual e coletiva.

Com esse caráter, dentre filmes nacionais exibidos, vale destacar o clássico “Vidas Secas”, adaptado por Nelson Pereira dos Santos, inspirado no livro homônimo de Graciliano Ramos. Na obra, o cineasta conduz o espectador, por meio de recursos estéticos, a sentir o vazio existencial, ingente e avassalador dos personagens: flagelados do sertão. A própria ausência de diálogo, em muitos momentos do filme, é elementar em transmitir uma miséria que não agride apenas o organismo, mas a essência do homem.

Não menos marginal é o filme neorrealista “Ladrões de Bicicleta”, do mestre italiano Vittorio de Sica, em que o personagem principal é um desempregado de origem humilde – idiossincrasia de uma decadente classe operária subjugada a um sistema socioeconômico que os impele a trocar valores e ideologias por comida.

Continuando nessa dimensão variegada, o público conheceu o futurista “Fahrenheit 451”, exímio exemplar da Nouvelle Vague, e idealizado pelo singular francês François Truffaut. No filme, uma sociedade hipócrita e paradoxal – afugentada pela opressão ditatorial, renega a literatura, numa crítica mordaz ao cerceamento da liberdade intelectual.

Uma ode à fragilidade humana, a bela trilogia das cores – “A Liberdade é Azul”, “A Igualdade é Branca” e a “Fraternidade é Vermelha”, do surpreendente diretor polonês Krzysztof Kieślowski, foi exibida em três sessões – numa sequência ordenada, respeitando a característica de unidade indissolúvel dos três filmes.

Na trilogia, cada obra tem seu título justificado de várias formas, seja por meio da estética ou da dialética, e sempre a partir do momento que a individualidade de um personagem é confrontada com a de outro, no contexto de um relacionamento. Sendo assim, é possível interpretar a partir da obra-prima de Kieślowski que ideologias, crenças, valores, conceitos, são todos descartáveis perante a vida.

Muitos outros filmes foram celebrados na Casa da Cultura, mas esses em especial merecem ser citados porque marcaram o início de um projeto que trouxe a Paranavaí até cinéfilos de outras cidades da região. Boas e duradouras amizades foram construídas no auditório da Casa da Cultura, a sala oficial do projeto Mais Cinema que hoje ainda é lembrado em tom de nostalgia por tanta gente que por lá passou, mesmo que somente uma vez.

Benílio, um tipo de Verlaine travestido de Rimbaud

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Como se feito de ironias, Benílio era visto por mim como um sujeito vivendo um paradoxo existencial

Benílio, que não aparece na foto, frequentava o Projeto Mais Cinema na Casa da Cultura (Foto: Amauri Martineli)

Benílio, que não aparece na foto, participava das discussões do Projeto Mais Cinema na Casa da Cultura (Foto: Amauri Martineli)

Já passei por situações muito incomuns e estranhas na minha vida e hoje vou relatar uma delas. Em 2008, comecei a coordenar um projeto de cinema na Casa da Cultura Carlos Drummond de Andrade. O público era modesto, mas bastante participativo, tanto que com o tempo estreitei contato com os frequentadores mais assíduos. Afinal, tínhamos em comum o amor pelo cinema e o interesse em discutir sobre o tema. Os encontros ocorriam às quartas-feiras, quando exibíamos algum filme fora do circuito comercial. Ao final, eu fazia uma análise e em seguida abria espaço para o público fazer perguntas. Foi assim até 2013. Era gratificante ver que até pessoas de outras cidades gostavam do projeto.

Em 2010, um rapaz a quem chamo de Benílio, para preservar a sua identidade, compareceu ao Mais Cinema. Na primeira vez em que participou, se mostrou bastante atento ao filme, a discussão e tudo que o cercava. Basicamente, um sujeito tranquilo, questionador, com bons argumentos e um humor sardônico. Algum tempo depois, Benílio começou a sumir e ressurgir durante as sessões de cinema. Parecia agitado e incomodado, o que contrastava com tudo que notei anteriormente sobre seu comportamento. A expressão ponderada, o olhar quiescente, foram substituídos por uma agitação frequente que o fazia se levantar da poltrona como se o estofamento estivesse dominado por percevejos.

Às vezes mudava de poltrona, até que sem observar lado algum abandonava o local com pressa, coçando os olhos com tanto vigor que mesmo ao longe dava a impressão de que o objetivo era esmagar o globo ocular com pontadas de dedo. Apesar disso, Benílio continuou frequentando o projeto. Sorridente e trocista, aparentava ser mais jovem do que realmente era. Andava sempre à vontade; de camiseta, bermuda e tênis ou sandálias. Mas ostentava um olhar amaneirado para compartilhar com pessoas de quem desgostava. Como se feito de ironias e de uma acidez vocabular inconstante, Benílio era visto por mim como um sujeito vivendo um paradoxo existencial.

Assim como na Gioconda de Da Vinci, seus olhos eram como uma antítese do sorriso, o que relevava mais intransparência e ardil do que insegurança. Com naturalidade dúbia, despertava reticência, principalmente sobre suas intenções e elucubrações durante as conversas. Jupiteriano, pouco se importava em transmitir clareza quando não simpatizava com alguém. Na realidade, fazia até questão de minar a conversa para afastar o interlocutor. Afeiçoado à arte clássica, ele desprezava com poucas ressalvas a arte contemporânea.

Por volta dos 20 anos, Benílio abandonou o curso de medicina da Universidade Federal do Paraná, mais tarde sendo relegado à pária por colegas, amigos e até familiares. Não se importava com as convenções sociais e as postulações de um mundo em que se deve viver sob a égide cronológica dos deveres. Parecia-lhe um despautério a ideia de que o ser humano deveria se limitar a estudar o suficiente para conseguir um bom trabalho, se casar, ter filhos, netos e falecer; assim não fazendo mais do que uma formiga obreira que percorre o chão nu transportando alimentos em horários estratégicos.

Seu nível de inteligência e cultura estava muito acima da média, o que era endossado por décadas mergulhado em livros, música e outras formas de arte. Um dia, me relatou alguns de seus conflitos amorosos com uma jovem com quem rompeu relacionamento de longa data. “Eis uma perda de tempo, uma relação que minora a alma em vez de alongá-la”, dizia. Em complemento e observação, citei que todo o nosso saber se reduz a aprender a renunciar nossa existência para podermos existir, segundo um aforismo de Goethe.

Ocasionalmente, Benílio me pedia carona na saída da Casa da Cultura. O deixei algumas vezes no cruzamento da Rua Manoel Ribas com a Avenida Paraná, no centro de Paranavaí. À época, eu dirigia ouvindo uma banda romena de rock chamada Travka que curiosamente falava de conflitos de identidade, do recrudescimento humano e da minoração da sensibilidade. Enfim, existentialisme par l’existentialisme.

Notei mais tarde que o rapaz era emocionalmente inconstante e por isso consumia com frequência medicamentos controlados. Solitário, tinha um pai aventureiro que há muito tempo se mudou para Rondônia. A mãe, com quem também pouco convivia, recebia visitas esporádicas do filho no Jardim Santos Dumont. Benílio morava sozinho em uma velha pensão na Rua Amapá, onde dividia o espaço com os mais diferentes personagens marginalizados. A maioria, pessoas que percorriam sob os ditames da penúria um chão de paralelepípedos tão maciço quanto a dor da invisibilidade velada por um sorriso frugal.

Um dia, eu corria pela Avenida Lázaro Vieira, no Jardim Progresso, quando ouvi Benílio me chamando. Olhei para o lado, ele sorriu e se aproximou de mim. Relatou que estava estudando Programação Neurolinguística (PNL) porque acreditava que as ações humanas são motivadas pelas próprias experiências, não pela realidade em si. “A mente e o corpo formam um sistema que a PNL ajuda a harmonizar, estimulando novas formas de pensar, sentir e agir. É um meio de minimizar conflitos entre o corpo e a mente”, comentou.

Na semana seguinte, após mais uma sessão do projeto Mais Cinema, Benílio pediu que eu o deixasse na Praça dos Pioneiros. Eram quase 23h, ele desceu do carro e começou a caminhar sozinho em torno da praça, sem se enfastiar com a solitude e a frágil iluminação precária e açafroada dos postes que atraíam somente insetos. Andou alguns metros e desapareceu no meio da quadra na outonal escuridão enevoada. Ignorava lados e direções, despreocupado em ser expulso da própria introspecção por sacomanos, ladrões, delinquentes ou vadios.

Como já fazia parte da minha rotina percorrer a cidade a trabalho, vez ou outra eu o via vagando sozinho pelos mais distantes pontos da área urbana. Nunca perguntei o que fazia. De qualquer modo, não era difícil perceber que Benílio não se importava em ignorar pessoas e deixar claro que sentia ojeriza pela superficialidade. Demonstrava grande amor por muitas conquistas humanas. Em contraponto, nutria indiferença e desgosto por tanta gente. Julgava o mundo como tornado doente e usava isso como justificativa da pontual ausência de empatia.

Uma vez, há alguns anos, eu e meu amigo Sobhi Abdallah fomos até a casa da mãe de Benílio, onde ele estava hospedado enquanto ela viajava. O objetivo era conversar sobre o roteiro e a pré-produção de um documentário baseado na vida de um eremita conhecido como Negão do Surucuá. Entre tereré e palavras, a tarde até que rendeu bem. Dias depois, Benílio me ligou avisando que precisávamos discutir novamente sobre o roteiro. Segundo ele, a reunião também havia sido acertada com Abdallah e meu amigo Amauri Martineli.

Quando cheguei ao local, estacionei o carro e estranhei que não havia nenhuma movimentação na varanda. De repente, Benílio gritou, pedindo que eu entrasse. Lá dentro, perguntei sobre os outros convidados e ele mentiu afirmando que eles não puderam comparecer. Após minutos, o rapaz se aproximou e me convidou para tomar café. Assim que coloquei os pés na soleira, perguntei o que ele estava preparando. “Não estou preparando nada. O café somos nós dois!”, comentou com naturalidade enquanto penetrava a massa escura de um pão preto com uma longa faca de cozinha. Em seguida, me observou atentamente os olhos, revelando um sorriso narcísico e pela primeira vez naturalmente mórbido.

Me afastei de Benílio, que não reconheci naquela figura tétrica e medonha. Contrariando todas as minhas possibilidades de reação diante de situação tão imprevisível e espantosa, expliquei tranquilamente que iria até o carro buscar o pré-roteiro do documentário. “Já volto. É rapidinho!”, argumentei sem titubear. Ele assentiu com a cabeça e continuou na cozinha. Caminhei a passos curtos e pesados, enojado, sentindo meu olhos queimando e minhas mãos suando. O enorme portão parecia a quilômetros de distância e suspeitei até que Benílio poderia tê-lo trancado. Então me preparei para saltá-lo se necessário. Questionei até se ele não teria deixado ao alcance das mãos uma arma de fogo, caso eu fugisse. Por bem, consegui abri-lo e lá fora senti o sol em todo seu esplendor me revigorando, me banhando com sua energia imperecível.

Por segundos, meus sentidos ficaram mais aguçados do que nunca. Ouvi cães latindo, mãe empurrando carrinho de bebê, homem estacionando carreta e duas crianças brincando de pular corda. Assim que entrei no carro, virei a chave e ouvi o som do motor, meu coração desacelerou. Parti com a sensação de que apesar de tudo o mundo ainda era o mesmo e estava lá para lucilar diante de meus olhos escuros. Nunca mais vi Benílio. Fiquei sabendo apenas que, assim como um tipo peculiar de Verlaine travestido de Rimbaud, foi embora para Rondônia tornar-se desbravador de coisa alguma.

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Desinformação, incompreensão, desinteresse e paranoia

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Literatura, Marina Colasanti, Paulo Venturelli e cultura em geral

Marina Colasanti: "a literatura em si já vem embutida de formação."

Marina Colasanti: “A literatura em si já vem embutida de formação.” (Foto: Reprodução)

No sábado, a Folha de S. Paulo publicou uma entrevista interessante com a escritora Marina Colasanti defendendo que livros de histórias infantis não precisam ser educativos. Acho que quem conhece o trabalho dela entende que essa posição é defendida há muito tempo, não apenas agora. Ela inclusive viaja o Brasil discutindo sobre o assunto.

Como a própria autora diz, a literatura em si já vem embutida de formação. Hoje de manhã, quando abri o Facebook, a primeira matéria que apareceu no meu feed de notícias foi essa. Então decidi olhar brevemente os comentários. Talvez por ingenuidade, achei que encontraria apenas opiniões interessantes e construtivas.

Em meio a tantos bons comentários, alguns extremamente negativos, erráticos e vazios em sentido me chamaram a atenção. Uma professora de Apucarana, no Paraná, funcionária da rede estadual de ensino, comentou o seguinte sobre a declaração de Marina Colasanti: “Da onde vem esses completos idiotas, querendo ferrar com uma nação toda!”

Outro sujeito disse que o vermelho ao fundo da foto revela a origem ideológica de Marina Colasanti (acredite, não foi uma piada). Sem dúvida, faz muito sentido, ainda mais se levarmos em conta o fato de que a escritora declarou apoio ao Aécio Neves durante as eleições. Na mesma postagem, um rapaz “vociferou” que com tal comentário Marina Colasanti está defendendo a desconstrução do Brasil.

Esses exemplos me lembraram dois episódios. O primeiro foi há poucos meses, quando o escritor Paulo Venturelli, radicado em Curitiba, ministrou uma palestra e ao final o questionaram sobre o que os professores poderiam fazer para estimular nos mais jovens o interesse pela leitura. Muita gente não gostou da resposta do autor, mas provavelmente ele se valeu de sua experiência de décadas trabalhando com literatura. “Comece lendo. Leia de verdade. Um professor não pode cobrar leitura de um aluno se ele mesmo não lê”, respondeu Venturelli que também é professor.

Paulo Venturelli: “Um professor não pode cobrar leitura de um aluno se ele mesmo não lê."

Paulo Venturelli: “Um professor não pode cobrar leitura de um aluno se ele mesmo não lê.” (Foto: Reprodução)

Com esse comentário, o escritor deixou subentendido que quanto mais você lê, mais ideias você tem de como estimular a leitura. Do contrário, há de se sentir sempre anuviado. O segundo episódio não tem relação direta com literatura, mas sim com a cultura em geral.

Em 2008 ou 2009, não tenho mais certeza do ano, um grupo de professores da rede estadual de ensino entrou em contato comigo pedindo para eu apresentar voluntariamente uma sessão especial do projeto Mais Cinema na Casa da Cultura Carlos Drummond de Andrade, em Paranavaí, no Noroeste do Paraná. Eles queriam que eu exibisse um filme sobre os mais diversos aspectos da exploração infantil. Gostei da ideia e me comprometi também em fazer a análise do filme e discutir o assunto com dezenas de alunos e alguns professores.

Pois bem, durante a exibição do excelente filme All The Invisible Children, de 2005, dividido em sete curtas realizados em várias partes do mundo, alunos e professores ficaram boa parte do tempo falando ao celular e enviando sms. Alguns saíam do ambiente para conversar e depois retornavam. Era como se estivessem em casa assistindo TV. Imitavam sons de animais, deitavam e pulavam sobre as poltronas com a conivência dos professores.

Naquele dia, curiosamente, havia sete ou oito professores na Casa da Cultura. Desse total, três ou quatro foram embora antes do filme terminar. Me recordo que uma professora que resistiu para ficar até o final manteve-se recostada contra a porta, ansiosa para ir embora. Quando acabou a sessão, acredito que não havia mais do que 40% do público inicial. No fim, não houve avaliação nem discussão alguma, claro, por desinteresse dos que ficaram.

Não estou dizendo que são casos que se aplicam a muitos professores, até porque não é minha intenção quantificar nada. Só acredito que se você não está disposto a desempenhar um bom trabalho, fazer alguma diferença, talvez seja mais viável trilhar outro caminho. Quem sabe, mudar de área. Há incongruências que atingem todas as profissões. Ainda assim, acredito que o relato vale a reflexão. Há uma relação curiosa entre as três situações e deixo a cada um a livre interpretação.