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Montoya tinha a estrutura de uma cidade
População da colônia era de mais de seis mil habitantes
Em 1928, a Vila Montoya, atual Paranavaí, no Noroeste do Paraná, ganhou contornos de cidade. A colônia oferecia tudo que era necessário à sobrevivência dos mais de seis mil moradores. No entanto, o único acesso ao lugarejo era a estrada do Porto São José, na divisa com o atual Mato Grosso do Sul.
À época, todos que chegavam a Montoya usavam a mesma via que servia também para ligar a colônia ao Porto Ceará e a Presidente Prudente, no Oeste Paulista, de acordo com dados do livro “História de Paranavaí”, do escritor Paulo Marcelo Soares Silva. No passado, pela mesma estrada se chegava à Gleba-1 Ivaí, Piracema e Povoado de Cristo Rei.
Quem precisava viajar para outras cidades do Paraná era obrigado a atravessar a divisa com São Paulo, embarcar em um trem que percorria a antiga Estrada de Ferro Sorocabana até Ourinhos, e de lá partir para Tibagi, no Centro Oriental Paranaense, a quem Montoya pertencia. “Depois a pessoa ia pra onde quisesse, mas não tinha outro jeito. O peão tinha que dar toda essa volta”, afirmou o pioneiro catarinense José Matias Alencar.
Naquele tempo, a colônia tinha 1,2 milhão de cafeeiros, aproximadamente 60 mil ficavam em área onde se situa o Colégio Estadual de Paranavaí (CEP), Cemitério Municipal e Fazenda Experimental do Estado. A colônia ainda contava com uma frota de 25 caminhões, 60 mulas-cargueiras, máquinas de beneficiar arroz, farmácia, serraria com motor a vapor de 50 HP e uma caldeira, armazém, Cartório de Paz e Registro Civil, além de mil casas cobertas de zinco situadas no Jardim Ouro Branco, Fazenda Carneiro Ribas e outras localidades, conforme informações dos livros “História de Paranavaí”, do escritor Paulo Marcelo, e “Pequena História de Paranavaí”, do juiz de direito Sinval Reis.
A Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco), que tinha o direito de concessão da área, investia ao máximo no povoado para evitar que os trabalhadores deixassem o distrito, pois como as viagens eram longas o colono podia perder dias de serviço ou nem mesmo voltar, caso estivesse insatisfeito. Montoya fazia parte da Fazenda Brasileira, de propriedade do jornalista Geraldo Rocha que, além de proprietário de importantes veículos de comunicação situados no Rio de Janeiro – Rádio Nacional e jornais “A Noite” e “O Mundo”, era dono da Braviaco, responsável pela administração de uma área total de 317 mil alqueires no Sudoeste, Oeste e Norte do Paraná.
Quem cuidava dos negócios de Rocha na colônia e em toda a região era o vice-diretor da Braviaco, o engenheiro agrônomo Landulpho Alves de Almeida – que se tornaria senador e interventor federal da Bahia – cargo que equivalia ao de governador, Humberto Alves de Almeida e Joaquim da Rocha Medeiros. Humberto Alves, irmão de Landulpho Alves – sócio da Companhia Brasileira, era o responsável pelos serviços de transporte da fazenda e tinha como empregado de confiança o pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles, considerado o primeiro cidadão de Paranavaí.
Salles chefiava um grupo de peões, ajudava a ensacar o café e cuidava para que o produto fosse transportado de forma segura. A Vila Montoya tinha uma população de centenas de famílias que somavam mais de seis mil moradores. A maior parte prestava serviços a Braviaco e aos empreiteiros Gonzaga, João Gomes e Coronel João Antônio. Foram muitos os peões que se casaram em Montoya, alguns até registraram os filhos no distrito, segundo o juiz de direito Sinval Reis.
O responsável por impor a ordem na colônia era o Cabo Simão que trabalhava em parceria com dois soldados da Polícia Militar do Paraná. É importante destacar que Montoya se desenvolveu muito bem até a chegada da Revolução de 1930, quando o Governo Provisório rompeu todos os negócios com a Braviaco. Mais tarde, Getúlio Vargas repassou a concessão das terras da região ao político gaúcho Lindolfo Collor, avô do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
Joaquim Medeiros conheceu a região em 1923
A Vila Montoya fazia parte da Gleba Pirapó que somava 100 mil alqueires, cerca de 108 quilômetros de extensão. Começava no Rio Paranapanema e ia até a margem direita do Rio Ivaí. A Gleba fazia divisa ao leste com as propriedades da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP), de capital inglês, e a oeste com uma área destinada a Brazil Railway Company, de origem estadunidense.
“Em 1923, abri um picadão com dez metros de largura por sessenta quilômetros de extensão que começava na Fazenda Laranjeira e ia até o Rio Paranapanema. A estrada ficava a duzentos metros da propriedade de Adão Medeiros”, disse o engenheiro agrônomo Joaquim da Rocha Medeiros em entrevista à Prefeitura de Paranavaí em 5 de julho de 1975.
O som dos colonos capinando nas imediações era tão alto que se ouvia mesmo de longe, segundo Medeiros. Encerrada a etapa de abertura do picadão até a divisa com o Paraná, o engenheiro agrônomo embarcou em uma canoa e atravessou o Rio Paranapanema. Já no extremo Norte do Paraná, Medeiros coordenou a derrubada de um alqueire para a construção de um rancho que recebeu o nome de Porto Itaparica que ficava numa área de 20 mil alqueires da Companhia Alves de Almeida. A iniciativa visava facilitar o escoamento do café para o Mato Grosso e Argentina.
Curiosidades
Os migrantes trazidos à Vila Montoya pela Braviaco eram de Minas Gerais, Piauí, Ceará, Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Bahia. Porém, é bem provável que pessoas de outros estados e países também já viviam no povoado.
A intenção da Braviaco era explorar o café da Fazenda Brasileira por 20 anos e depois migrar para a pecuária.
Saiba Mais
Antônio Geraldo Rocha nasceu em Barra, Bahia, em 14 de julho de 1881 e faleceu aos 78 anos em 19 de junho de 1959. Em 1931, deixou de representar os interesses da empresa norte-americana Brazil Railway Company e foi obrigado a hipotecar parte dos bens. Rocha é autor do livro “O Rio São Francisco: fator precípuo da existência do Brasil” que contribuiu para a implantação da Comissão do Vale do São Francisco (CVSF).
Landulpho Alves de Almeida nasceu em Santo Antônio de Jesus, Bahia, em 4 de setembro de 1893 e faleceu no Rio de Janeiro, capital, em 15 de outubro de 1954. Como político, Landulpho Alves é sempre lembrado como defensor da estatização do petróleo e relator da lei N 2.004, de 1953, que deu origem a criação da Petrobrás.
Lindolfo Leopoldo Boeckel Collor nasceu em São Leopoldo, Rio Grande do Sul, em 4 de fevereiro de 1890 e faleceu em 21 de setembro de 1942, no Rio de Janeiro, capital. Apesar de ter sido correligionário de Getúlio Vargas durante o Governo Provisório que sucedeu a Revolução de 1930, Collor se tornou um combatente da política ditatorial do Governo Vargas, chegando a ir para o exílio. Tornou explícito o desprezo pela ditadura em muitos jornais do Brasil, inclusive no semanário “Diretrizes”, do jornalista Samuel Wainer.
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Os torneios de luta livre do Seu Ferreira
Seu Ferreira era o destaque de Paranavaí quando o assunto era entretenimento
No final dos anos 1940 e na década de 1950, um homem conhecido como Seu Ferreira era o destaque de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, quando o assunto era entretenimento. Numa época em que havia poucas opções de lazer, o pioneiro surpreendeu todo mundo ao realizar torneios de luta livre com alguns dos praticantes mais célebres do Paraná e do Brasil.
Até 1945, Paranavaí ainda era um povoado isolado. Em dias de sol, aparecia um ônibus por dia na Colônia. E quando chovia, não chegava ninguém. Naquele tempo, era difícil não se incomodar com a monotonia, pois diversão era algo que não fazia parte do cotidiano da população. “Isso mudou quando apareceu o Seu Ferreira, um homem de idade avançada. Era ele quem animava o lugar. Que divertia a gente”, contou o pioneiro paulista José Ferreira de Araújo, conhecido como Palhacinho, em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás.
O homem, chamado por todo mundo de Seu Ferreira, era o maior símbolo de alegria e diversão de Paranavaí. Logo que chegou ao povoado, percebeu que a vida da maioria se limitava ao trabalho. Então tomou a decisão de fazer a diferença. Ferreira viajou sozinho até Curitiba e de lá trouxe alguns dos mais célebres nomes da luta livre, como Cabeludo, Tarzan, Taturana e mais outros que lutaram também fora do Brasil.
As primeiras lutas foram realizadas na região central, onde mais tarde surgiu a Livraria Santa Helena, na Avenida Paraná. Lá, Ferreira estendia um tapete de 12 metros de comprimento por 12 metros de largura, mas o confronto ocorria em um espaço de sete metros.
Quem ultrapassasse o limite permitido para o duelo perdia pontos, e o acúmulo de punições podia resultar na vitória do adversário. Pioneiros lembram que sempre venciam as lutas quem dava os melhores golpes e conseguia segurar o adversário no chão por dez segundos. O ideal era imobilizar e manter o ombro do oponente contra a lona.
Golpes baixos faziam parte do show, embora fossem reprovados. Era uma forma de despertar mais a atenção do público. Joelhadas, cotoveladas, puxadas de cabelo e de orelha, golpes nas genitais, pescoço e pé estavam entre as ações que custavam pontos ao lutador. Os torneios eram tão divertidos que até mesmo quem não gostava de luta não hesitava em assistir. “De noite, todo mundo ia pra lá. Todo mundo mesmo. A gente saía mais cedo de casa e assistia tudo”, relatou o pioneiro José Araújo.
Outro costume da época era o de reunir bandos e ir a até a área onde surgiu o Sumaré, distrito de Paranavaí, para buscar jabuticaba. “A gente saía daqui com latas de querosene. Era o nosso passatempo quando aqui não existia piscina e nem clube”, salientou Palhacinho. Quem também ofereceu diversão a população foi o pioneiro João Carraro, um dos poucos que tinha rádio na colônia. Muita gente ia todas as noites até a casa do pioneiro para acompanhar a programação da Rádio Nacional. “Ali a gente passava a noite, conversava e ria muito”, revelou José Ferreira.
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O empacotador que virou ícone do rádio
Armando Trindade se apaixonou pelo rádio na mocidade, um casamento que durou 47 anos
No limiar da adolescência, Armando Trindade Fonseca descobriu o amor pelo rádio. Foi discotecário, sonoplasta, apresentador de programas de auditório e jornalista esportivo e investigativo – a grande paixão do homem que dedicou 47 anos ao rádio. Em 2005, apenas a morte conseguiu interromper a trajetória do radialista que parecia carregar o coração no topo do microfone.
A história de Armando Trindade Fonseca com o rádio começou há mais de 50 anos, quando sua mãe era faxineira da Rádio Paranavaí. “Era julho de 1957, e eu tinha perdido o emprego como empacotador. Minha sorte foi que me convidaram para ser discotecário. Pouco tempo depois, me tornei sonoplasta. Era um trabalho difícil. Eu tinha 14 anos e precisava ficar atento ao locutor o tempo todo”, relatou emocionado.
Em três meses, Armando Trindade se tornou referência em sonoplastia. A facilidade em aprender e o amor precoce pela profissão o estimulava a chegar às 5h30 na Rádio Paranavaí. “Saia de lá só meia-noite. Isso porque exigiam pouco de mim. Curioso como eu era, quis aprender tudo, principalmente a trabalhar com programa de auditório. Ainda assim, continuava na discoteca e na sonoplastia, meu forte”, afirmou.
A primeira oportunidade de entrar no ar surgiu pouco tempo depois, em uma segunda-feira. Encarregado da sonoplastia de uma peça teatral radiofônica do autor Jackson Frazzoni, Fonseca foi convocado a substituir um ator que na última hora desistiu de participar. “O rapaz ficou com medo porque o papel dele era de uma bichinha. Então me chamaram e eu aceitei. Depois que acabou a peça começaram a me chamar de bichinha”, lembrou, às gargalhadas.
Em 1962, Fonseca foi chamado para substituir o apresentador Neideval Oliveira Guimarães que comandava um programa infantil. “Fiz isso durante 12 anos, sempre me espelhando em outros programas, como do César Alencar, da Rádio Nacional. Na época, eu gostava mais de trabalhar com as crianças. Com o tempo, adquiri gosto pelas notícias, independente do tema ou do assunto”, justificou.
Armando, que acompanhava a transmissão das rádios de São Paulo e do Rio de Janeiro, sempre ouvia reportagens policiais, mas tinha receio de trilhar tal caminho. “Um dia, em 1963, decidi pegar o gravador e fui atrás da notícia. Gostei do negócio, tanto que de 10 minutos para reportagens locais, aumentamos para 15. Com o tempo, consegui 25 minutos em produção local, deixando só 15 para notícias estaduais e nacionais. Virou um radiojornal diário, de segunda a sábado”, explicou.
No auge da profissão, o radialista trabalhava em torno de 14 horas por dia. Não havia horário específico de entrada e saída na emissora. Sempre levantava às 5h e era questionado pela mãe. “Queria saber pra onde eu ia. Sempre respondia que quando quisesse me encontrar era só ligar na emissora. Comecei, aprendi e me estabeleci no rádio. É o que faço há 47 anos”, revelou com olhos marejados.
Mesmo com graves problemas renais, no último ano de vida, Armando Trindade Fonseca travava uma luta diária consigo mesmo para não se distanciar do rádio. Fazia hemodiálise às 4h30, três vezes por semana e, com dedicação e esforço inigualáveis, procurava notícias, lia jornais e ia para a emissora às 12h, encerrando o expediente às 14h. O radialista faleceu no dia 12 de julho de 2005 e marcou para sempre a história do rádio em Paranavaí, com um exemplo de perseverança tão raro que hoje em dia é mais fácil ser encontrado no cinema do que na realidade.
Radialista era ameaçado
O radialista Armando Trindade Fonseca foi ameaçado muitas vezes. Em 1980, Fonseca estava em uma reunião da Câmara de Vereadores, trabalhando para a Rádio Cultura, quando lhe disseram que havia uma pessoa lá fora, com um fuzil, o esperando para matá-lo. “Um rapaz da rádio disse que eu estava na Câmara. O indivíduo achou que ele estava mentindo e chutou a porta que acabou quebrando. Aí o sujeito passou pela minha casa e não tinha ninguém. Minha mulher estava no hospital porque tinha ganhado bebê”, lembrou.
Mesmo ciente da situação, Armando Trindade continuou agindo com naturalidade. “Saí na rua de peito aberto. Cheguei ao trabalho e coloquei a reportagem esportiva no ar. Em seguida, o telefone tocou. Quando atendi, era o indivíduo falando que iria me matar. Falei pra ele que quem quer matar não fala. Vem quietinho, mata e depois vai embora”, declarou. O radialista desligou o telefone e nunca mais foi perturbado pelo homem. “Houve muitas outras ameaças, de políticos mesmo, só que ninguém me intimidava não”, garantiu.
Auge das reportagens esportivas
Sem pestanejar, o radialista Armando Trindade Fonseca afirmou que o auge das reportagens esportivas em Paranavaí foi na década de 1970, quando a cidade tinha um grande time de futebol e os melhores jogos. “O Estádio Natal Francisco lotava. Lembro das arquibancadas de madeira como se fosse hoje. Eu corria pra lá e pra cá naquele sol quente para fazer a cobertura”, frisou.
Quando os jogos ocorriam em outras cidades, Armando Trindade sempre se apressava. Ia para Curitiba, Cambará, Jacarezinho, Santo Antônio da Platina, Londrina, Paranaguá e muitos outros municípios. “As cidades do Oeste do Paraná ainda não tinham times. Os clubes de Toledo, Cascavel, Pato Branco e Clevelândia surgiram bem mais tarde. Eu sempre viajava aos domingos quando os jogos eram fora. Saía de madrugada e voltava no dia seguinte por volta das quatro, cinco horas da manhã”, exemplifica. As transmissões eram feitas ao vivo, um trabalho complicado porque ainda não existiam as micro-ondas. “Era tudo linha física, o que fazia a transmissão atrasar alguns segundos, atrapalhando o locutor”, revelou o radialista.
Frases do radialista Armando Trindade Fonseca
“Já fui ameaçado sim, mas quem ameaça não faz. Cão que ladra não morde.”
“Me recordo quando eu ficava atrás da casa brincando, pegava uma latinha e fazia de conta que era o microfone e que havia um auditório.”
“A gente sempre acha alguém que gosta de trabalhar com rádio. Na Rádio Cultura mesmo sempre teve uns três, quatro que trabalhavam porque gostavam. Mas é claro que tem aqueles que fazem porque querem aparecer.”
“Para alguns, o rádio é como se fosse uma obrigação. Para outros, o motivo são as meninas, principalmente porque no rádio dá mulher pra arrebentar. O cara começou a aparecer um pouquinho as mulheres invadem.”
“Programa de auditório era gostoso. Antigamente o público fazia muito barulho. O locutor pedia para fazer silêncio e gritavam mesmo assim. Daí havia essa briga, no bom sentido. Eu falava “silêncio” e o público gritava. Às vezes, vaiava. Era bem diferente do que eu queria, eles faziam exatamente o contrário, mas mesmo assim era muito agradável.”
“O jornalismo representa muito na minha vida. Tenho três filhas e nenhuma quis seguir o rádio, nem fazer jornalismo. Eu queria que pelo menos uma delas seguisse isso, mas nem a caçula quis. Ela escolheu fazer educação física, a do meio preferiu direito e a mais velha optou por biologia.”
Considerações
Em 2004, tive a oportunidade de entrevistar o radialista Armando Trindade Fonseca que, mesmo combalido por problemas de saúde, me relatou toda a sua trajetória em prol da cultura radiofônica local. A entrevista lapidada resultou no material acima que figura como uma homenagem póstuma.