Archive for the ‘Roteirista’ tag
Quando William Faulkner trabalhou em Hollywood
O escritor só reapareceu depois de nove dias, confidenciando que vagou pelo Vale da Morte
Em 7 de maio de 1932, William Faulkner chegou a Hollywood para atuar como roteirista, um trabalho que entre idas e vindas durou 20 anos. Na época o escritor estadunidense estava com apenas 34 anos e já tinha publicado quatro de suas novelas baseadas no Condado de Yoknapatawpha, incluindo The Sound and the Fury (O Som e a Fúria) e As I Lay Dying (Enquanto Agonizo).
Embora ainda estivesse distante de se tornar popular, Faulkner foi considerado por seus pares como o mais talentoso dos jovens escritores dos Estados Unidos. Àquela altura, ele tinha vivido a maior parte de sua vida em Oxford, Mississippi, e recentemente havia se casado e comprado a velha mansão Rowan Oak, de inspiração neogrega e construída antes da Guerra de Secessão.
Faulkner não era um homem sociável, nem gostava de trabalhar em equipe. O que o fez aceitar o contrato de 500 dólares por semana oferecido pela MGM foi uma experiência que ele teve em uma loja de artigos esportivos, onde o balconista se recusou a receber um cheque dele no valor de três dólares.
Depois que o escritor alegou que sua assinatura ainda valeria mais do que isso, o dono da loja se aproximou e disse a toda a sua equipe para não permitir que o jovem Faulkner pagasse por nenhum artigo que o interessasse. De acordo com o biógrafo Joseph Blotner, os primeiros dias de Faulkner em Hollywood foram incríveis.
Em um sábado, ele se aproximou do seu chefe, Sam Marx, e o homem logo percebeu que o escritor cheirava a álcool e tinha um corte na cabeça. Então Faulkner explicou que ele foi atingido por um táxi quando estava trocando de trem em Nova Orleans. Apesar de tudo, justificou que se sentia bem e queria começar o seu trabalho corretamente.
“Nós vamos colocá-lo em uma foto com o Wallace Beery”, disse Marx. Confuso, Faulkner perguntou quem era o sujeito. “Eu tenho uma ideia de quem seja o Mickey Mouse”, comentou o escritor, recebendo a explicação de que os filmes do Mickey Mouse são feitos nos estúdios da Disney.
Em seguida, Sam Marx pediu que o seu office boy levasse Faulkner até a sala de projeção para ver Beery atuando como um pugilista em The Champ, de King Vidor, e no recente Flesh, de John Ford, em que Wallace interpreta um lutador alemão. Faulkner se recusou a assisti-los e preferiu bater um papo com o office boy.
Quando o escritor perguntou se o garoto tinha um cachorro, ele respondeu que não. Faulkner estranhou e enfatizou que todo garoto deveria ter um cão. “Você deveria se envergonhar por não ter um cão, assim como todos aqueles que não têm um”, insistiu. Sem muita demora, Faulkner saiu da sala de projeção justificando que sabia o final da história.
Quando Marx foi informado que o escritor já tinha saído do estúdio, ele iniciou uma busca sem sucesso. William Faulkner só reapareceu depois de nove dias, confidenciando que vagou pelo Vale da Morte. “Mas agora já estou pronto para o trabalho”, garantiu.
A atuação de Faulkner como roteirista incluiu também adaptações de To Have and Have Not (Uma Aventura na Martinica), de Ernest Hemingway, e The Big Sleep (À Beira do Abismo), de Raymond Chandler. Muitos aspectos de sua vida em Hollywood foram incorporados ao filme Barton Fink, dos Irmãos Coen, lançado em 1991.
No outono, o escritor retornou para sua casa em Oxford, Mississippi, onde corrigiu as provas tipográficas do seu novo romance gótico sulista – Light in August (Luz em Agosto) enquanto comia melancia e assistia a chuva caindo ao redor da varanda. Com o dinheiro que ganhou da MGM, fez importantes reparos na mansão Rowan Oak.
Referências
http://www.todayinliterature.com/
Blotner, Joseph. Faulkner: A Biography. New York: Random House, 1974.
Blotner, Joseph. Faulkner: A Biography. New York: Random House, 1984.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
A crise de Kaufman
Quando as dificuldades de um roteirista se tornam tema de um filme
Lançado em 2002, Adaptação, do cineasta Spike Jonze, é um filme de caráter metalinguístico que conta a história de um roteirista vivendo uma crise criativa ao adaptar um livro para o cinema.
Depois de Being John Malkovich, Spike Jonze e Charlie Kaufman conquistaram outra parceria de sucesso com o filme Adaptação que conta a história do próprio Kaufman quando teve dificuldades em adaptar o conteúdo de um livro para o cinema. Na obra, Charlie e Donald são dois irmãos interpretados por Nicolas Cage que enveredam pelo mercado cinematográfico.
Enquanto o antisocial Charlie, roteirista com alguma experiência, mais sensível e introspectivo, não consegue dar vida a história de um vendedor de orquídeas, Donald, o extrovertido roteirista iniciante, o faz. A partir das lições aprendidas em workshops sobre roteiro de cinema, o inexperiente Donald atende todas as expectativas da indústria cultural. Cria uma história baseada numa fórmula recheada dos clichês que costumam lotar as salas de cinema.
Donald, que existe apenas no filme, é uma representação das qualidades que faltavam ao verdadeiro Charlie Kaufman durante a crise criativa. Além de ser uma particular idealização de Charlie, Donald é também uma subjetiva figura antagônica do irmão. Do início ao fim, o filme mistura fatos e ficção, tornando mais difícil para o espectador desatento distinguir a realidade da ilusão, se tratando da verdadeira concepção da obra. O filme também traz no elenco algumas estrelas como Meryl Streep, Chris Cooper, Cara Seymour, Tilda Swinton e Brian Cox. A trilha sonora é de Carter Burwell.
There is a fifth dimension…
Em 1975, uma das pessoas mais criativas da TV partiu. Me refiro ao roteirista, produtor e novelista Rod Serling, criador de séries que até hoje figuram entre as melhores dos gêneros fantasia e ficção científica. Para mim, duas das maiores criações de Serling: Twilight Zone e Night Gallery que no Brasil ficaram conhecidas como Além da Imaginação e Galeria do Terror. Nem Steven Spielberg nega as influências do Grande Rod em Amazing Stories.
É impossível enumerar quantas séries se espelharam na criatividade do roteirista, mas posso citar duas bem conhecidas: The Outer Limits (Quinta Dimensão) e Night Visions. Uma curiosidade que poucos sabem sobre Serling é que ele foi o roteirista do filme Planet of the Apes (Planeta dos Macacos), de 1968.