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Meu primeiro encontro com a morte
Tentei tocar o chão abaixo dos meus pés, mas estava fundo demais
Meu primeiro encontro com a morte foi em janeiro de 1993. Aconteceu de forma casual, inocente, incauta e avassaladora, assim como muitas das nossas experiências na infância. Meus pais tinham planejado no final de 1992 uma viagem para o litoral norte de Santa Catarina.
Saímos de casa numa madrugada, por volta das 4h, um horário que sempre agradou meus pais pela grande possibilidade de não encontrarmos muitos veículos na estrada, ao menos nas primeiras horas de viagem. Admito que o sono ficou bem leve ao saber que sairíamos cedo rumo a novos destinos. Acordei com a respiração ofegante e expansiva do Happy e do Chemmy ao pé da orelha. Eram dois cãezinhos da raça poodle parecidos com dois grandes flocos de neve.
O Happy vivia com a língua de fora, como se quisesse falar e não latir. Ostentava um semblante jubiloso, dando a impressão de passar o dia inteiro sorrindo. Já o Chemmy possuía olhos tão expressivos que me transmitiam uma cândida melancolia. Em síntese, era menos agitado e mais carinhoso. Em comum, apesar das diferenças de personalidade e fisionomia, os dois eram dotados de uma postura altiva e indefectível. Só sentavam ou deitavam no chão com as patas sobrepostas, formando um X de formas itálicas. No dia da partida, pedimos à minha avó Clara para cuidar da casa e dos animais.
Em parte, o percurso foi relativamente tranquilo, até porque meus pais gostavam de parar em locais que não conhecíamos, tornando a viagem mais proveitosa e divertida. Quando chegamos a Matinhos era quase meia-noite e me surpreendi ao ver uma movimentação de centenas de pessoas pelas ruas. Eu, acostumado a uma realidade em que 22h já era tarde, não sabia que existiam cidades noturnas.
Havia muitas luzes, o suficiente para me fazer crer que a escuridão não tinha vez naquele lugar. A experiência me lembrou a reação de uma criança estrangeira ao ver o fulgor do sol da meia-noite em Luossavaara, no extremo norte da Suécia. Os letreiros enormes e brilhantes no centro de Matinhos iluminavam as ruas, as calçadas e os passantes. Também serviam como juncos para corujas urbanas que assistiam skatistas adolescentes saltando bancos, pequenas rampas e executando rock slides enquanto sorriam e seguravam latinhas de Coca-Cola, Taí e Fanta.
Os arroubos da urbanidade confundiam os vaga-lumes que se misturavam aos remanescentes piscas-piscas de Natal, talvez pensando que fossem parentes. Alguns jovens miravam a lua, balançavam os braços, bebiam cerveja em saquinhos, gargalhavam e cantavam Under The bridge, do Red Hot Chilli Peppers. Outros continuavam hipnotizados no interior de uma casa de fliperamas com mais de 40 máquinas.
De longe, eu ouvia sons retumbantes de tiros, saltos, acelerações, derrapagens, socos, chutes e musiquinhas eletrônicas monofônicas e polifônicas. O local estava cheio de adolescentes e crianças acompanhadas dos pais. A empolgação no interior me lembrou a cena em que Marty McFly, interpretado por Michael James Fox, observa crianças jogando fliperama em De Volta Para o Futuro 2. Chips, refrigerante, chiclete em rolo, Freshen Up, Minichiclets, Mentex e Lollo abasteciam os jogadores alheios ao que acontecia nas ruas. Rodeados de testemunhas, os desinibidos e impetuosos falavam alto e apertavam os botões com força. Logo entendi que queriam deixar suas marcas nas máquinas.
Lá fora, o céu não estava muito escuro. Suspeitei que estivesse absorvendo as cores e as luzes dos lugares, das pessoas e dos animais que ajudaram a compor um cenário notívago tão complacente. Percorri centenas de metros dentro e fora do carro. Não vi discussões, trocas de ofensas, nem violência. Quando um rapaz pisou em falso na calçada e caiu em frente a um automóvel no asfalto, um senhor imediatamente desceu do carro e o ajudou a se levantar.
Mais adiante, um motociclista se descuidou ao admirar uma bela moça em traje de verão que andava rente ao meio-fio. Como consequência, bateu na carroceria de uma caminhonete. Ao ver o jovem caído, o motorista de aproximadamente 50 anos desceu e ignorou os arranhões na lataria. “Você tá bem? Quer que peça ajuda?”, indagou. Apesar do susto, o motociclista não se machucou e a moto sofreu apenas riscos superficiais. O dono da caminhonete considerou o prejuízo mínimo e se recusou a cobrar. Agradecido, o rapaz se despediu com um sorriso portentoso e um aperto de mão consistente.
Após alguns dias em Santa Catarina, acordamos cedo numa manhã ensolarada e fomos a uma praia entre Itajaí e Balneário Camboriú. Havia pouca gente em frente ao mar calmo e convidativo. Sentei um pouco na areia para observar tudo à minha volta. Notei que o céu estava especialmente azul, límpido e com um recorte amarelo amendoado que parecia a entrada de um portal para lugar algum. Também avistei suas nuvens envolvendo e afagando nove gaivotas.
Minutos depois, me levantei e avisei meus pais que eu entraria no mar. Como manda a tradição, me disseram para ter cuidado e ficar próximo da margem. Comecei a brincar na água, numa área tão rasa que me permitia ficar agachado ou sentado afundando as mãos na areia. Quando enjoei, caminhei mar adentro, sentindo o peso cada vez maior da água sobre o meu corpo. Estava tudo bem. Percebi pessoas perto de mim e o mar ainda não tinha tocado os meus ombros. De repente, enquanto eu sorria e via meus pés penetrando a areia, as águas se rebelaram. O impacto de uma grande onda me arrastou alguns metros mar adentro.
Confuso e sem enxergar direito, engoli a água salgada que invadiu minha garganta com tanta aspereza que quase engasguei. Tentei tocar o chão abaixo dos meus pés, mas estava fundo demais. Não havia ninguém nas imediações. Observei ao longe apenas fisionomias desfocadas. Me debati contra a água, tentando nadar. Não adiantou. Outra onda me arrastou e desta vez para o fundo do mar.
Bebi muita água a contragosto e comecei a ter rápidas alucinações. Imaginei alguém me puxando pelos pés. Meus olhos e garganta queimavam de forma vertiginosa. Tanto que minha visão enturveceu gradualmente, abalando minha crença na sobrevivência. Fui tomado por lembranças fugazes dos poucos parentes e amigos falecidos. “Não! Eu não quero encontrar vocês ainda. Quero ver minha família. Eles estão logo ali, bem mais perto de mim do que qualquer um de vocês. Sou criança ainda. Por favor!”, pensei. Ao mesmo tempo, senti o palato abrasado e as lágrimas caindo do meu rosto como chuva de verão.
Para minha surpresa, antes que fosse vencido pelas câimbras, o mar se acalmou. Eu continuava muito longe da margem, só que ganhei o direito de nadar. Então coloquei em prática o que aprendi nas aulas de natação com meu pai em 1992. Mesmo combalido, cheguei à beira-mar. O medo de morrer era tão grande que só parei de nadar quando a areia tocou meus joelhos. Saí da água rindo e chorando ao mesmo tempo, com as pernas cambaleando, o rosto pálido e os lábios arroxeados. Não consegui dar outro passo e caí deitado.
Minha família chorou comigo. Naquele dia o salva-vidas sumiu e quando meus pais me localizaram eu já estava nadando. Eles viram apenas meus braços curtos e meus cabelos negros e lisos se movendo na água. Antes de me levantar da areia para ir embora, observei novamente o céu. O recorte amarelo amendoado tinha se dissipado, mas não as nove gaivotas que recebiam as carícias das nuvens que cobriam o mar da Praia Brava.
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Um atleta motivado por um sonho
Leonardo Fellipe Mariani sonha em se tornar campeão mundial de powerlifting
Em um certo dia de 2010, Leonardo Fellipe Mariani, de Siderópolis, Santa Catarina, estava em casa assistindo alguns vídeos de campeonatos de powerlifting no YouTube. Ficou tão impressionado com a força, técnica e vigor físico dos competidores que decidiu se tornar um atleta da modalidade. Sem saber exatamente como proceder, Mariani buscou informações na internet e procurou pessoas envolvidas com o esporte para instruí-lo.
“Foi amor à primeira vista, mas infelizmente esbarrei nas limitações da minha antiga academia. Por causa disso, comecei a treinar pra valer em outubro de 2012. Só que desde então não parei mais e tenho dado tudo de mim”, afirma. O que levou o catarinense de 25 anos a procurar vídeos de powerlifting na internet foi o apreço pela musculação, atividade que pratica desde 2009, quando se matriculou em uma academia com o objetivo de perder peso.
Atualmente o atleta treina cinco vezes por semana e cada treino tem duração de duas horas. “Os meus exercícios preferidos são o agachamento livre e o levantamento terra”, conta. Incluído o supino, os três formam a base que consagrou o esporte. Embora motivado por uma paixão, hoje, Mariani vive o dilema de não ter patrocínio, o que dificulta a participação nos principais campeonatos.
“Preciso de apoio financeiro para competir no Campeonato Catarinense que será realizado em Blumenau [Santa Catarina] no dia 23 de março. Quem puder ajudar, me comprometo a divulgar a marca patrocinadora através de sites, fotos, vídeos e entrevistas”, declara. As dificuldades de Leonardo Fellipe refletem também o preconceito contra o esporte no Brasil, uma consequência do desinteresse da iniciativa pública e privada.
Tudo isso somado ao descaso da imprensa ofusca o brilho de um esporte que requer muita força de vontade, dedicação e disciplina. A situação preocupa porque inviabiliza uma maior aceitação do powerlifting em território nacional, modalidade já tradicional e que na versão moderna começou a se popularizar nos EUA e Reino Unido nos anos 1950.
O amor pelo levantamento de peso há muito tempo constrói irmandades por todo o Brasil. Mariani é um exemplo de atleta que fez muitas amizades por meio do powerlifting. A interação social é inevitável, inclusive estimulada, já que o apoio em cada competição assegura ao atleta uma dose a mais de motivação para vencer. “Espero um dia ter a chance de abrir um centro de treinamento para crianças e adolescentes carentes”, revela.
Sem investimentos e com recursos limitados, muitos powerlifters convocados para representar o Brasil no exterior são obrigados a recorrer ao crowdfunding (financiamento coletivo), uma alternativa que nem sempre tem um final feliz. Já houve inúmeros casos de esportistas que desistiram da competição porque receberam um número pífio de doações. Embora alguns tenham uma legião de seguidores, isso não garante sólidas contribuições. “É um esporte caro. É preciso investir muito em dieta, viagens e hospedagens. Um atleta não gasta menos de R$ 1,7 mil”, comenta Leonardo Fellipe que compete na categoria até 125kg e tem como principal inspiração o gigante russo Andrey Malanichev.
Além de evoluir como atleta de alta performance, Mariani quer construir um corpo mais forte e definido. E claro, sonha em se tornar um campeão mundial de powerlifting. O anseio de chegar ao topo já garantiu importantes premiações. “Espero me tornar uma das promessas do powerlifting brasileiro. Estou lutando para chegar lá”, avisa.
Títulos
Campeão da 1° Copa Rafa Crestani de Powerlifting, da World Association of Benchers and Deadlifters (WABDL), em Veranópolis (RS) em 2012.
Segundo lugar no Campeonato Brasileiro de Levantamento Terra, da International Powerlifting Federation (IPF), em São Paulo (SP) em 2012.
Campeão do 11º Campeonato Catarinense de Powerlifting, da International Powerlifting Federation (IPF), em São Bento do Sul (SC) em 2013.
Terceiro lugar no Campeonato Brasileiro de Powerlifting, da World Powerlifting Congress (WPC), em São Paulo (SP) em 2013.
Segundo lugar no Campeonato Brasileiro de Powerlifting, da International Powerlifting League (IPL), em São Paulo (SP) em 2013.
Serviço
Para entrar em contato com Leonardo Fellipe Mariani, basta ligar para (48) 9925-5200 ou enviar um e-mail para leonardofellipemariani@hotmail.com.
Sobre matanças e os temidos quebra milho
Experiências e impressões sobre criminosos que viveram em Paranavaí nos tempos de colonização
Embora tenha falecido há muitos anos, o frei alemão Ulrico Goevert, um dos pioneiros religiosos de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, tinha o hábito de registrar muito do que via e ouvia na antiga Fazenda Brasileira. O primeiro diário de Goevert sobre os fatos aqui vividos data de 1951. Sete anos mais tarde, a convite do padre provincial Adalbert Deckert, de Bamberg, no estado alemão da Baviera, o frei começou a publicar suas experiências em Paranavaí na revista germânica Karmel-Stimmen, onde ganhou uma coluna periódica.
Entre os relatos que mais chamaram a atenção dos alemães está um sobre as matanças promovidas pelos quebra milho, como eram chamados os jagunços e grileiros violentos que viviam na região de Paranavaí entre os anos 1940 e 1950. “Muitos que aqui chegavam de outros estados e países buscavam construir uma nova vida. Tudo isso resultou em uma grande mistura internacional”, conta Ulrico Goevert, acrescentando que no meio de tanta gente havia famílias sonhadoras, oportunistas gananciosos e aventureiros preocupados apenas com o presente.
O frei alemão admitiu anos mais tarde que entre 1951 e 1958 foi procurado por quebra milho das mais diversas origens. “Não foram poucas as confidências de assassinatos e crimes hediondos. Me procuravam pedindo para ajudar a tirar as mortes da consciência”, lembra. O contato frequente com a comunidade fez Goevert se aprofundar um pouco mais sobre o passado duvidoso de uma significativa parcela da população local. “Eu era procurado até por aqueles que não queriam mais do que continuar a sua velha safadeza neste novo lugar”, declara. Boa parte pedia informações ao padre sobre como providenciar novos documentos para dar início a uma nova vida, se isentando dos crimes do passado.
Em Paranavaí, no final dos anos 1940 até a metade da década de 1950, muita gente conseguiu mudar de nome, enganando a polícia e os perseguidores que percorriam milhares de quilômetros para acertar as contas. “Aqueles que demonstravam verdadeira boa vontade, eu consegui ajudar, possivelmente os livrando da morte. O que mais podia fazer se não contribuir para torná-los membros úteis de uma comunidade?”, questiona o frei alemão na coluna mais lida da revista Karmel-Stimmen em 1958.
Perdulários, os quebra milho eram temidos e chamavam muita atenção em Paranavaí pelos gastos astronômicos com bebidas, comidas e orgias em locais como a Boate da Cigana. No entanto, algumas festas eram particulares e aconteciam em locais afastados da cidade. “Eles apenas ordenavam que buscassem as moças, escolhidas a dedo, que iriam servir para o lazer”, confidencia o pioneiro cearense João Mariano.
Tudo era custeado com pequenas fortunas conquistadas em um curto período de tempo explorando mão de obra barata na derrubada de mata e lavouras ou cobrando dívidas e desapropriando terras ilegalmente. “Eram promotores de um estilo de vida totalmente imoral e leviano. Não tinham interesse em mudar. Viviam em função da sequência roubo, homicídio e morte”, registra o alemão.
Apesar de não haver dados sobre a quantidade de quebra milho nos tempos da colonização, é possível inferir que era o suficiente para amedrontar a população. “Não se passava um mês sem eu ter de dar a unção a alguma vítima de assassinato, nem sempre o morto fazia parte desta leviana corja. Tivemos muitos homicídios por causa de direitos de posse”, frisa Ulrico Goevert.
Os crimes eram quase inevitáveis quando dois ou mais proprietários de um mesmo pedaço de terra se encontravam. Um apresentava ao outro o documento que dizia ser legal e reivindicava o direito da área. “Um não queria ceder e muito menos o outro. A discussão só acabava quando puxavam o revólver”, afirma o frei que presenciou algumas dessas situações. Com o tempo, o alemão começou a tentar entender como várias pessoas tinham diferentes escrituras de uma mesma terra. Depois de muito pesquisar, Goevert descobriu que a diferença entre um documento e outro ultrapassava décadas.
A verdade é que em outros tempos alguns oportunistas compraram terras em áreas não colonizadas de Paranavaí e desistiram de construir, levando em conta o investimento com derrubada de mata e povoamento. Então esperavam anos, até alguém iniciar a colonização da região. O tempo passava e o governo autorizava uma nova venda de uma área comercializada muito tempo antes. “Quando tudo ficava aberto, limpo e habitável aparecia gente até com documentos do Século XIX e a confusão se armava”, detalha o líder religioso.
Não é à toa que até hoje há pioneiros em Paranavaí que culpam o governo federal e o governo paranaense por diversos assassinatos provocados por conflitos de posse e comissão de terras. “A situação esquentava e ninguém fazia nada. Se o poder público entrasse no meio para tentar amenizar a situação, quem sabe até disponibilizando uma nova terra à parte lesada, teríamos evitado tantas mortes. Com o sangue quente, e ninguém para ajudar, o peão perdia o controle e matava”, pondera Mariano.
As colonizadoras também ignoravam as negociações anteriores e simplesmente continuavam a atrair mais colonos com a venda de lotes pagos em pequenas parcelas. “Também perdi as contas de quantas mulheres apareceram reclamando a paternidade do filho e mostrando a foto do pai que já tinha outra família em Paranavaí”, desabafa o frei.
Normalmente o homem fugia de madrugada, abandonando as duas mulheres. A vontade de escapar da responsabilidade era tão grande que o sujeito atravessava a densa mata fechada habitada por animais silvestres e ainda cortava o Rio Paraná com algum bote. “É quase certo que no Mato Grosso o fujão começava tudo de novo”, lamenta frei Ulrico.
O perfil e a conduta dos quebra milho
De acordo com o pioneiro cearense João Mariano, os quebra milho eram homens das mais diversas origens que podiam andar em grupos, duplas ou sozinhos. Chegavam a Paranavaí com um plano de ação definido. Eram contratados para comandar as mais diversas atividades, desde grupos de peões atuando na derrubada de mata até cobranças de dívidas e comissões de terras. “Um quebra milho não sentia remorso em tirar uma vida, mas também não fazia isso de graça ou por qualquer coisa. Eram como mercenários, mas com código de conduta”, explica Mariano.
A conduta era ditada pelo dinheiro, não por vingança ou punição. Quanto maior a recompensa, menor a preocupação com a exposição. Se o retorno financeiro fosse grande, não se importavam em invadir um bar cheio de gente para assassinar três ou quatro pessoas. “Ele ia, fazia o serviço e partia, sem olhar para ninguém a sua volta, a não ser as vítimas. Só que se fosse incumbido de cobrar alguma coisa sem matar ninguém, o sujeito também atendia a exigência”, esclarece o pioneiro que ao longo da vida conheceu muitos quebra milho, inclusive teve amizade com alguns.
Ao contrário do senso comum, dificilmente reagiam quando eram provocados por alguém sem envolvimento com seus negócios. Isso porque não traria retorno financeiro – a lógica da função. Metódicos, os quebra milho da Fazenda Brasileira dificilmente agiam por impulso. Além disso, não atuavam apenas em Paranavaí, mas em todo o Paraná, chegando a prestar serviços em São Paulo, Mato Grosso (incluindo o Mato Grosso do Sul), Santa Catarina e Rio Grande do Sul, principalmente a serviço de grandes empresários e latifundiários.
“Sei de alguns que encheram caminhões de cadáveres lá pelas bandas de Querência do Norte numa desapropriação ilegal e forçada. Tudo foi feito a mando de uma família tradicional da região de Maringá”, segreda Mariano que viu quando o caminhão estacionou em frente ao antigo Hospital João Cândido Ferreira (Hospital do Estado), onde é hoje a Praça da Xícara.
O veículo encostou e de longe os curiosos sentiram um forte odor de sangue que invadiu o centro da cidade. João Mariano diz que nunca tinha visto tanta gente morta em um mesmo local. “Havia dezenas. A maioria foi levada direto para um necrotério improvisado. Tinha tanto sangue que escorria até pelos pneus”, assegura.
Por medo, nos anos 1940 e 1950, quando se falava em quebra milho, a maior parte da população não se manifestava sobre o assunto. Habilidosos com armas de fogo e armas brancas, inúmeros foram identificados como ex-jagunços, ex-guerrilheiros, criminosos condenados ou procurados, antigos membros de brigadas e de grupos paramilitares, além de desertores do Exército Brasileiro.
À época, como Paranavaí era apenas uma colônia, podiam ser facilmente identificados, mas ninguém queria se meter em confusão. Personagens controversos, os quebra milho fazem parte da história de Paranavaí, onde já viviam no princípio da colonização da Fazenda Brasileira na década de 1930. “Policiavam” e impediam que os migrantes atuando nas lavouras de café abandonassem o trabalho. Quem tentasse era abatido em barrancos às margens de algum rio ou durante a travessia. Antes do descarte de cadáveres, os criminosos os abriam, os enchiam com pedras, costuravam e os lançavam na água para afundar rapidamente, impossibilitando a localização.
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“Tinha que desviar dos cipós pra não cair”
Gabriel Schiroff e as antigas histórias do distrito de Graciosa
Em 1951, quando o produtor rural Gabriel Schiroff se mudou com a família para Paranavaí, no Noroeste do Paraná, Graciosa ainda não era uma colônia. À época, ninguém chegava ao futuro distrito sem percorrer um precário e estreito carreador. “A gente tinha que se defender das perobas e desviar dos cipós pra não cair da carroceria do caminhão. Paranavaí era distrito de Mandaguari e lembro que sua área ia da beira do Rio Paranapanema até o Rio Ivaí”, relatou sorrindo o pioneiro que perdeu as contas de quantas vezes teve de descer do veículo para abrir caminho entre a mata virgem.
A viagem de Santa Catarina até Paranavaí foi difícil, mas Schiroff afirmou ter valido a pena porque as pessoas se divertiam e sabiam lidar da melhor forma possível com as adversidades. “Todo mundo vivia mais alegre e gostava mais de trabalhar. Se contar tudo que passamos nos anos 1950, muitos dos jovens de hoje em dia não acreditariam”, comentou. No mesmo período da chegada dos Schiroff, o distrito recebeu cerca de 50 famílias de outras regiões do Paraná e de Santa Catarina. A população era composta basicamente por sulistas de origem europeia, o que deu a colônia uma característica de comunidade germânica.
No início a Família Schiroff começou a se dedicar à lavoura. Em seguida construíram uma farinheira e decidiram comercializar em Paranavaí tudo que produziam. “Todo dia a gente vendia dois caminhões carregados de farinha de mandioca para a Casa Estrela, em Paranavaí”, contou Gabriel. A família também se empenhava na cafeicultura e na serraria a vapor, chegando a cortar madeira para toda a população do Distrito de Graciosa.
Francisca Schiroff, esposa de Gabriel, começou a lecionar no povoado em 1952, meses antes do médico José Vaz de Carvalho ser eleito como o primeiro prefeito de Paranavaí. “Logo vieram muitos padres da Alemanha pra Paranavaí, então surgiu a ideia de construir um seminário em Graciosa”, explicou o pioneiro. Nos anos 1950 a modesta economia do povoado era baseada na agricultura, bovinocultura e suinocultura, pois o comércio se concentrava no centro de Paranavaí, onde havia grande demanda por produtos orgânicos e de origem animal.
A população de Graciosa demorou para começar a lucrar com as produções porque a colônia se situava em meio à mata nativa, numa região ainda isolada e pouco visitada. Além disso, nem todos tinham condições de ir até a cidade vender os próprios produtos. “O bom era que tinha bastante madeira, então a gente trabalhava até aos domingos. Duas pessoas levavam metade de um dia para derrubar uma árvore com quase dois metros de tronco. Era preciso derrubar com machado porque não existia motosserra”, destacou.
Em 1952, quando as residências do distrito ainda eram de tábuas e pau-a-pique, Gabriel presenciou um pouso forçado de um avião que perdeu a rota de Londrina até Nova Esperança. “Ele rodou várias vezes aqui por cima, até que acabou o combustível e aterrissou em uma rua. Paramos o trabalho na mata e fomos lá ver se estava tudo bem. Só havia duas pessoas e ninguém se feriu. À tarde, arrumamos gasolina pra eles em Paranavaí. Depois o pessoal empurrou o avião e eles seguiram viagem”, contou. Na década de 1950 era muito comum aparecerem aviões perdidos em Paranavaí, normalmente porque o piloto errava o percurso. Mas em todas as situações, por mais difíceis que fossem, a população sempre conseguia auxiliar os viajantes.
Naquele tempo, sem a conscientização ambiental da atualidade, os moradores de Graciosa encaravam as onças como grandes ameaças. Por isso aconteciam caçadas frequentes e o desfecho quase sempre culminava na morte do animal. Um dia o falecido pioneiro José Venturini Schiroff tinha montado uma armadilha para pegar paca e quando voltou viu alguns rastros de onça. Mais adiante, encontrou os restos do seu cachorro comido pelo animal. Revoltado, chamou um vizinho, reuniu alguns cães caçadores e adentrou a mata. Em poucos minutos foi surpreendido pelos cachorros voltando correndo, arrepiados e latindo.
Mesmo sem os cães por perto, se aprofundaram na floresta até verem uma árvore um pouco torta. “A onça estava lá em cima se preparando para dar o bote. Meu irmão e os dois vizinhos deram três tiros. A acertaram e ela caiu morta. Era uma onça pintada de mais de 80 quilos”, revelou Gabriel Schiroff.
Observação do Autor
Em 2006 e 2007, tive a oportunidade de conversar diversas vezes com o pioneiro e produtor rural Gabriel Schiroff, que sempre foi muito atencioso não apenas em me conceder longas entrevistas no Sítio Nossa Senhora Aparecida, como também me mostrando todo o acervo histórico preservado pela família desde os tempos da colonização (há inclusive arquivos que datam das décadas de 1900 e 1910). Gabriel e a esposa, a pioneira e professora Francisca Schiroff, são importantes personagens de Paranavaí e de Graciosa.
Pesquisando sobre história regional desde 2006, e entrevistando centenas de pessoas, posso acho justo afirmar que o acervo particular da Família Schiroff sobre a história de Paranavaí é um dos maiores já vistos. A relação cultivada com o passado, a partir dos mais diversos tipos de registros, demonstra não apenas um grande amor dos Schiroff pelas coisas desta terra, mas também um anseio de preservar e valorizar a identidade local. Infelizmente o pioneiro Gabriel Schiroff faleceu em 27 de julho de 2012 em decorrência de graves problemas de saúde. No entanto deixou um legado de muitas histórias que enaltecem a bravura daqueles que aqui chegaram nos tempos mais inóspitos.
O sonho de Carlos Faber
Fundador da Casa Faber acreditou no progresso de Paranavaí
m 1944, o pioneiro catarinense Carlos Faber, aos 54 anos, cruzou a mata primitiva do Noroeste Paranaense para abrir uma das primeiras casas de comércio de Paranavaí. Embora viveu aqui inúmeras dificuldades, o fundador da Casa Faber resistiu a tudo por acreditar em um sonho, o progresso da cidade.
Antes de falecer, em 30 de junho de 1993, aos 103 anos, Faber ainda encheu os pulmões de ar e disse: “Paranavaí é uma cidade muito boa e bonita. Tenho certeza que vai crescer mais ainda.” Para entender o amor do catarinense pela cidade é preciso conhecer a história do pioneiro.
Carlos Faber nasceu em Tubarão, interior de Santa Catarina, em 30 de maio de 1890. Na juventude, empreendeu muitas viagens pelo sertão catarinense e interior do Rio Grande do Sul. Perdeu as contas de quantas vezes cruzou mares a bordo de uma canoa, obstinado em conhecer as novas cidades que se formavam.
O pioneiro se mudou para o Norte do Paraná ainda jovem e fixou residência na Gleba Roland, hoje Rolândia. Lá, abriu uma casa de comércio que ele mesmo abastecia. Saía à noite ou de madrugada a pé para buscar mercadorias em Londrina. Voltando para casa, atravessava a mata carregando mais de 40 quilos de produtos nas costas.
Aos 54 anos, em 1944, Carlos Faber ainda ostentava o mesmo espírito de aventureiro da mocidade. Foi colocado à prova em Londrina quando conheceu o jovem agrimensor Ulisses Faria Bandeira que lhe falou sobre a Fazenda Brasileira, atual Paranavaí. “Resolvi me aventurar pelo mato cortado por umas picadinhas.”
A viagem à Brasileira durou cinco dias, parte do trajeto foi percorrido a pé e o restante a bordo de uma velha jardineira da Viação Garcia que trazia mais duas pessoas. O ônibus fazia o trajeto uma vez por semana. “Em Maringá, dormi num rancho de palmito. Lembro que perto tinha duas casas velhas. Maringá era praticamente isso”, frisou o catarinense.
A surpresa veio depois com os estreitos picadões quase engolidos pela mata virgem. O motorista da jardineira tinha de desviar da vegetação que insistia em cobrir a estrada – galhos quase atravessavam as janelas do ônibus. “Lembro que a picadinha era tão fechada que para todos os lados se via onça, veado, cateto e passarinhos de todas as espécies”, afirmou Faber, que em Paranavaí se deparou com um universo de mato bruto, antigos cafezais e ranchos velhos. Um era de propriedade do pioneiro Sebastião Freitas.
Dias depois, o comerciante voltou para Rolândia e relatou a mulher, Hulda Faber, tudo que viu. “Ela concordou em experimentar o lugar, então viemos de mudança e deixamos os filhos lá”, revelou. A viagem, dessa vez de caminhão, durou dois dias e meio, pois o solo arenoso fazia o veículo atolar com facilidade, obrigando o catarinense a ajudar o motorista a empurrá-lo.
Em Paranavaí, o casal foi muito bem recebido pelo administrador da colônia, Hugo Doubek. “Quando cheguei percebi que não tinha lei, e só duas famílias de colonos viviam aqui, os outros moravam nas redondezas”, salientou o pioneiro que em 18 de junho de 1944 abriu uma casa de comércio.
A amizade com o Capitão Telmo Ribeiro
A Casa Catarinense, que mais tarde recebeu o nome de Casa Faber, se situava onde é hoje o Banco do Brasil. Era um comércio de Secos e Molhados, onde Carlos Faber comercializava tecidos, cereais, ferragens e muitos outros produtos. “Meus primeiros clientes foram Heitor Barreiro, Telmo Ribeiro e Vendolino Schueroff. Depois, vendi bastante pro pessoal do Governo do Estado que abria os picadões”, disse o homem que chegou à colônia com um capital de 300 mil réis.
Logo a Casa Faber se tornou referência comercial na Colônia Paranavaí. Pioneiros se recordam que toda a população do Distrito de Graciosa se deslocava até o comércio do catarinense para comprar tecidos. “Antes eu saía pouco da loja porque de 1944 a 1946 houve muitos tiroteios que acabaram em mortes”, disse Faber que em 1949 pensou em deixar Paranavaí quando soube do progresso de Maringá e Londrina.
De acordo com o pioneiro, o comércio estava falido, pois a população local parou de crescer. Além disso, os ônibus chegavam a Paranavaí no máximo três vezes por mês. “Isso aconteceu porque a estrada era muito ruim”, assinalou. Para piorar, naquele tempo a maleita foi a doença que mais atingiu a comunidade. Como não havia farmácia, os moradores buscavam remédios no escritório do administrador da colônia, Hugo Doubek.
Apesar do período de descrença, Carlos Faber resistiu às dificuldades motivado por um sonho. Acreditou no progresso local enquanto muitos, já desiludidos, partiram de Paranavaí. “Outros comerciantes também acreditaram, como João Machado, José de Oliveira, João de Barros e Severino Colombelli. Tudo isso quando as ruas eram abertas a mão, no machado”, ressaltou.
O pioneiro catarinense era amigo de um dos homens mais controversos da história local, o Capitão Telmo Ribeiro. Carlos Faber o considerava um bom homem, com o qual sempre podia contar. “Costumava me oferecer ajuda, mas nunca precisei”, justificou. Aos domingos, o comerciante e o filho Henrique iam até a residência de Telmo Ribeiro, onde passavam a tarde toda conversando. “Ele também aparecia em minha casa para tomar chimarrão”, complementou.
Saiba Mais
Em 1995, o vereador Nivaldo Mazzin criou o Projeto de Lei 59 que deu a uma via de Paranavaí o nome de Carlos Faber em homenagem ao pioneiro. Vale lembrar também que o catarinense recebeu o título de Cidadão Honorário de Paranavaí.
Carlos e Hulda Faber tiveram nove filhos: Henrique, Érico, Carlos Frederico, Frida, Guerta, Adélia, Erna, Hilda e Marta.
Curiosidade
Carlos Faber construiu a primeira casa de alvenaria de Paranavaí, em frente à Praça Dr. Sinval Reis, conhecida como Praça da Xícara.
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“É Nóis Cinco”: entreter para informar
Grupo de humor usa bonecos gigantes para oferecer entretenimento e ao mesmo tempo informação
Além de trabalhar com shows de humor, palestras, oficinas e publicidade, a trupe “É Nóis Cinco” está apostando também na criação e no uso de bonecos gigantes como meio de oferecer entretenimento e ao mesmo conscientização sobre assuntos importantes.
Em Paranavaí, é difícil encontrar alguém que nunca tenha ouvido falar do grupo “É Nóis Cinco”, conhecido por seus espetáculos paradoxais que misturam o humor das ruas, baseado na realidade, a elementos surreais, nascidos do improviso.
Desta vez, a trupe formada por Aleks Alves, Moacir Barini, Antônio Soares, Márcio Cândido e Amarildo Travain está investindo na criação de fantoches grandes. “Já fizemos cinco. Foi um trabalho que levou dois meses para ser concluído”, revela o artista Márcio Cândido. Os bonecos gigantes chamam a atenção não apenas pelos quatro metros de altura, mas também, e principalmente, pela riqueza de detalhes; é impossível não identificar as feições dos membros da trupe em cada um daqueles personagens caricatos.
Embora tenham usado basicamente isopor, madeira e ferragens na composição, o que se vê são figuras tão realistas e próximas da arte popular que a simpatia com os bonecos surge à primeira vista. Além disso, os fantoches da trupe também remetem aos clássicos bonecões do folclórico carnaval de Olinda, em Pernambuco.
“As ferragens foram trabalhadas de modo a termos todo o conforto necessário na hora de manipular os bonecos”, relata o artista Aleks Alves. Os fantoches gigantes podem ser interpretados como um grande apelo visual do grupo para assuntos sérios. “Criamos eles enormes pra realmente chamar atenção. Assim podemos usá-los para trabalhar com campanhas de conscientização, tratar de assuntos importantes de forma descontraída”, revela Márcio Cândido, referindo-se a especialidade do grupo.
A trupe acrescenta que os bonecos estarão disponíveis para trabalhos com publicidade. “Eles podem ser desmontados, o que facilita o transporte”, frisa o artista Moacir Barini. O grupo ainda agradece o apoio da Fundação Cultural pelo espaço cedido para a criação dos bonecos.
Trupe se apresenta para 15 mil estudantes
Até o final do mês de novembro, o grupo de humor “É Nóis Cinco” vai encerrar um ciclo de 42 apresentações que misturam humor, teatro e conta com a participação dos bonecos gigantes. São espetáculos destinados a estudantes da rede municipal de ensino. “É um trabalho de conscientização ambiental em parceria com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, inclusive até o cenário do espetáculo é feito de materiais recicláveis”, relata o artista Márcio Cândido.
A trupe tem muita experiência em trabalhos envolvendo temas como DST/Aids, alcoolismo, ergonomia, atendimento ao cliente, motivação, direção defensiva, qualidade de vida e relações familiares. O grupo também oferece oficinas de materiais recicláveis, pintura em azulejo e decoração.
“É Nóis Cinco” surgiu há três anos
O Grupo humorístico “É Nóis Cinco” surgiu em Paranavaí há três anos, e desde então já levou ao público cinco peças autorais: “É Nóis de Férias”, “É Nóis trabalhando”, “É Nóis de Férias, Trabalhando e Estudando”, “Nóis é Show” e “É Nóis Cinco Ponto Com”. Agora o grupo se prepara para estrear o espetáculo “Talentos” em que vão interpretar personagens famosos. “Vamos nos apresentar nos dias 20 e 21 de novembro no Teatro Municipal Dr. Altino Afonso Costa. Vai ser muito legal”, garante o artista Moacir Barini.
A marca registrada do grupo é a capacidade em transformar o improviso em arte. As apresentações da trupe são tão imprevisíveis que os próprios artistas surpreendem uns aos outros. Segundo o “É Nóis Cinco”, errar também faz parte do show porque aproxima mais o público do espetáculo. Em suma, a trupe é composta por artistas que trabalham por prazer e que valorizam a liberdade criativa de cada um.
Saiba mais
Os integrantes do grupo de humor “É Nóis Cinco” já excursionaram por muitas cidades do Paraná, além de Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
Serviço
Interessados podem entrar em contato com o grupo por meio da Educa Assessoria. O telefone é (44) 3045-4510. Para mais informações, basta acessar o site http://www.enois5.com
O dom de talhar a madeira
Olegário aperfeiçoou as habilidades como carpinteiro e se tornou um mestre em talhar madeira
Há 28 anos, Olegário José dos Santos, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, aproveitou as habilidades como carpinteiro para reproduzir uma obra de arte. O resultado foi tão positivo que desde então se dedica a criar placas, quadros e esculturas, peças que já foram comercializadas em muitos estados do Brasil e em outros países.
Tudo começou em 1981, quando “Seu Olegário” trabalhava como mestre de obras e marceneiro. À época, a habilidade em talhar madeira despertou no artista o desejo de fazer algo mais do que criar apenas produtos funcionais. “Vi um trabalho e decidi produzir também. Comecei a fazer esculturas e não parei mais. Tem peças minhas nos Estados Unidos, Japão, França, Espanha, Argentina, Costa Rica e Portugal”, diz o artesão em tom de orgulho.
Houve um período em que Santos participava de feiras agropecuárias com o intuito de divulgar e também comercializar as peças que produzia. “Em exposições no Paraná e São Paulo, eu vendia pelo menos 10 placas para fazenda e ainda levava trabalho pra casa. A procura era grande”, explica o artista plástico que já participou de exposições agropecuárias em Paranavaí, Maringá, Umuarama, Londrina, Foz do Iguaçu, Santo Antônio da Platina, Wenceslau Braz, Maringá, Ourinhos, Votuporanga, Presidente Prudente e Assis. Santos também vendeu muitas peças no litoral de Santa Catarina, principalmente pequenos artigos.
Independente do tamanho da obra, seja um chaveirinho feito na hora e vendido por R$ 4 ou um altar de R$ 7 mil que levou 90 dias para ser produzido, a verdade é que depois do trabalho concluído sempre surge o momento de fruição. “Sinto prazer em criar qualquer coisa”, enfatiza Seu Olegário que preza pela riqueza de detalhes. O perfeccionismo está embutido em cada uma de suas esculturas; nas formas e nas curvas que tiram do anonimato pedaços de cedro e cerejeira que provavelmente seriam transformados em produtos em série, como móveis.
“São ótimas madeiras para o trabalho que desenvolvo. Só uso outros tipos para fazer placas de fazenda”, informa e acrescenta que a cerejeira é trazida de Rondônia. Uma das especialidades de Seu Olegário é a criação de esculturas de imagens de santos, talento que combina com o sobrenome do artista. “Tenho algumas obras disponíveis para venda. São réplicas de São Expedito, São José, São Paulo e Nossa Senhora Aparecida”, destaca o escultor que está sempre aberto a encomendas e comercializa esculturas pelos mais diversos preços. Quem quiser conhecer de perto o trabalho do artista, pode vistar o seu atelier na Avenida Heitor Alencar Furtado, em frente ao trevo de acesso à Vila Operária.
Saiba mais
Cada escultura leva em média 30 dias para ficar pronta e um quadro é concluído em quatro dias.
O artista plástico Olegário José dos Santos também pode ser encontrado na Rua Augusto Fabretti, 877 – Jardim Alvorada do Sul, Paranavaí. Ou pelo telefone: (44) 3423-4633
Médium por vocação
O dom de Maria Noêmia atrai pessoas do Paraná e de outros estados
Maria Noêmia dos Santos, de São João do Caiuá, ficou conhecida na região Noroeste do Paraná pelos trabalhos que desenvolve como médium da umbanda branca. Os resultados positivos com a atividade atraem pessoas do Mato Grosso do Sul, São Paulo e Santa Catarina, além do Paraná. Mas o fato mais curioso é que a benzedeira não exige remuneração; diz ter sido designada a cumprir uma missão.
De uma hospitalidade inigualável, Maria Noêmia, que vive com o marido em uma humilde residência, recepciona qualquer visitante com um largo sorriso. Em um primeiro contato, ela já avisa: “Não cobro nada. Apenas gosto de fazer a coisa certa. Caso a pessoa ache que mereço alguma gratificação, aí tudo bem.” Pelos serviços prestados, os visitantes dão de R$ 10 a R$ 30 para Maria Noêmia. Quem visa lucro com a umbanda branca, cobra de R$ 100 a R$ 200 por consulta.
Motivada por sentimento de abnegação, durante anos a benzedeira atendeu centenas de pessoas em um quarto tão pequeno que em dia de grande fluxo de visitantes, muitos tinham de esperar a vez na entrada da residência. “Minha vida mudou há 10 anos, quando o prefeito veio aqui e disse que me daria um presente; a construção de um local pra eu trabalhar. Agradeci, e até hoje esta tenda é o meu local de serviço”, relata a sorridente Noêmia dos Santos.
O reconhecimento do prefeito dá a dimensão da importância do trabalho da médium. “Já atendi a região toda de Paranavaí. Também benzi muita gente do Mato Grosso do Sul, São Paulo e até de Santa Catarina”, relembra. Maria Noêmia deixa claro que ela e o marido são aposentados, de onde provém o sustento familiar. “Não vivo da tenda, não tem como viver disso, porque não cobro. Se cobrasse, estaria rica”, frisa, às gargalhadas.
A médium é muito conhecida em São João do Caiuá, mas os moradores locais a procuram apenas em último caso. “Geralmente o pessoal vai atrás de outras benzedeiras, daí quando não dá resultado, eles vêm aqui”, declara. O trabalho de Maria Noêmia é baseado em um guia, espírito do caboclo Pena Branca que a benzedeira recebeu há mais de 30 anos. Desde então, segundo ela, adquiriu o poder de resolver problemas e curar enfermidades. “É uma missão que não escolhi. Mesmo assim, só faço o bem. Meu objetivo sempre foi ajudar as pessoas. Ninguém deve passar o pé diante da mão”, reitera a benzedeira.
No cotidiano, Noêmia dos Santos benze muitas crianças, contudo, também é procurada para resolver problemas sérios de saúde e quebrar mandingas. A médium cita o exemplo de um idoso que, incapaz de dirigir, foi levado até a tenda pelo genro. “Ele estava com os olhos bem vermelhos, pareciam duas bolas de fogo, e pediu para eu lhe benzer. No outro final de semana, retornou sozinho e me agradeceu. O velhinho já estava até dirigindo”, assegura a benzedeira.
A descoberta de um dom
Maria Noêmia dos Santos nasceu nas imediações de Nossa Senhora da Glória, no Sergipe. Em busca de melhores condições de vida, certo dia, subiu na carroceria de um caminhão pau de arara e partiu para São Paulo. No sudeste, aos 17 anos, começou a trabalhar na colheita de algodão.
Porém, com 25 anos, Maria Noêmia adoeceu. Os médicos foram incapazes de identificar a doença. Segundo a benzedeira, que à época já tinha três filhas, suas pernas e braços incharam muito e ao longo de meses pensou somente na morte. “Todo mundo já me imaginava morta. Mas a surpresa veio durante uma noite de sono. Foi quando senti algo diferente. Acordei recuperada e achei que não fosse eu mesma, até ouvi algumas vozes estranhas”, lembra.
Durante visita, um médium disse a Maria Noêmia que ela recebeu um guia (espírito mensageiro). O visitante alertou que a médium não sobreviveria se rejeitasse o espírito. Até então, Noêmia dos Santos nunca ouvira falar em umbanda branca. “Isso acontece sem que alguém peça. É algo inconsciente”, afirma.
Saiba mais
Umbanda Branca ou de Mesa – Não há presença de elementos africanos como Orixás, Exús ou pombas-giras, nem mesmo utilização de atabaques, fumo, imagens e bebidas. A linha doutrinária se restringe ao trabalho de caboclos, pretos-velhos e crianças.