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Capitán, o cão que dorme no túmulo do seu ex-tutor desde 2007
Cão dorme ao lado do túmulo do dono há mais de cinco anos
Em Villa Carlos Paz, na Argentina, o cão Capitán, um cão mestiço, parte pastor alemão, tem chamado a atenção há muito tempo. O animal descobriu sozinho em 2007 onde o seu companheiro humano foi enterrado, e desde então dorme ao lado do túmulo.
Capitán, encontrado por Miguel Guzmán em 2005, foi criado como um irmão de seu filho Damián. À época, a mãe Verónica Moreno não gostou muito da ideia porque já imaginava como seria trabalhoso cuidar futuramente de um animal de grande porte. Em 24 de março de 2006, Miguel faleceu, e não demorou para Capitán começar a vasculhar a casa, procurando pistas de Guzmán. Cheirou cada cômodo da residência e mais tarde desapareceu.
A família pensou que o cão tivesse sido morto ou adotado. Só descobriram o paradeiro de Capitán quando Damián foi visitar o pai no cemitério e encontrou o cachorro ao lado do túmulo. “Ele começou a ladrar de uma maneira que dava a impressão de que estava chorando”, conta Verónica que tentou levá-lo para casa, mas ele se recusou; preferiu continuar ao lado de Miguel.
De acordo com a vendedora de flores Marta, Capitán chegou ao Cemitério Municipal de Villas Carlos Paz em janeiro de 2007, quando encontraram o cão com uma pata da frente quebrada. “Percebemos que ele amava o seu tutor porque jamais deixou o cemitério”, testemunha. Até hoje, ninguém sabe explicar como Capitán achou o túmulo de Miguel. O homem faleceu no hospital e de lá foi levado para uma casa funerária bem longe de onde morava.
Não há um dia em que Verónica e Damián visitem Miguel e não encontrem Capitán junto ao túmulo. Algumas vezes o cão acompanha a família até em casa, mas sempre retorna ao cemitério. “Lá é a casa dele agora. Admito que antes eu não gostava tanto do Capitán. Isso mudou assim que percebi o amor que ele tem pelo meu marido. Desenvolvi um carinho muito grande. Sinto que o Capitán está com Miguel”, afirma Verónica Moreno.
Damián desistiu de levar o cão para casa quando percebeu que não adiantaria. Não importa para onde Capitán vá, ele sempre retorna ao cemitério. “Todos os dias, às seis horas em ponto, ele se deita na frente do túmulo. É uma lição de preservação das memórias daqueles que partem. Incrível como os animais nos ensinam isso de modo tão fiel”, comenta o administrador do cemitério, Héctor Baccega, que todos os dias conta com a companhia do cão em suas andanças. Em casa, Baccega cuida de um filho de Capitán e diz que o filhote provavelmente será tão leal quanto o pai.
Referência: La Voz, de Córdoba, Argentina.
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Museu preserva fragmentos da colonização de Paranavaí
Espaço reúne um acervo de mais de 600 peças doadas por pioneiros
O Museu Histórico, Antropológico e Etnográfico de Paranavaí, que funciona nas dependências da Casa da Cultura Carlos Drummond de Andrade, foi criado em 2007 e deste então se consolidou como importante referência para quem quer aprender um pouco sobre a colonização de Paranavaí, no Noroeste do Paraná
Mantido pela Fundação Cultural, o museu reúne um acervo de mais de 600 peças doadas por pioneiros. A coordenadora da Casa da Cultura, Rosi Sanga, explica que o espaço do museu conta com uma exposição permanente e uma temporária. “Há desde fotografias, objetos do cotidiano, instrumentos de trabalho, da história do café, itens numismáticos, documentos, obras de arte e coleções. É um acervo muito rico”, avalia Rosi, acrescentando que as fotos estão entre os maiores atrativos do museu e chamam a atenção de crianças e adultos.
Para muitos visitantes, principalmente aqueles que viveram o pioneirismo paranavaiense nos anos 1940 e 1950, estar em contato com tantas peças familiares evoca um tempo de muita saudade e nostalgia. “Enquanto as crianças se surpreendem, animadas com os instrumentos usados pelos avós, os mais velhos saem daqui chorando, muito emocionados”, revela a coordenadora, ressaltando que apenas de visitas aleatórias já receberam este ano milhares de pessoas, sem contar os estudantes que frequentam as oficinas da Casa da Cultura. Um dos destaques é a oficina Literarte que atende turmas de crianças e adolescentes no museu com o objetivo de reviver o passado a partir de brincadeiras, histórias e atividades artísticas.
No Museu de Paranavaí, as peças estão contextualizadas e organizadas por categorias. Há inclusive reproduções de espaços que remetem a um estilo de vida pautado pela luta. Exemplo é uma estrutura montada pela coordenadoria do museu para transmitir às novas gerações a sensação de viver em um rancho no período de colonização. Objetos pessoais e do cotidiano dispostos com esmero num ambiente rústico dão a tônica de uma peculiar fidelidade. Há instrumentos muito bem conservados usados por parteiras e pelos peões que trabalhavam na derrubata de mata.
O Museu Histórico, Antropológico e Etnográfico de Paranavaí funciona de segunda à sexta das 8h às 11h30 e das 13h30 às 17h. Entretanto, caso haja pedidos de abertura em outros dias e horários, Rosi Sanga deixa claro que basta agendar uma data. “A ideia do museu nasceu de uma parceria com a professora doutora Luciana Regina Pomari, do Departamento de História da Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí (Fafipa). Desde então, fomos reconhecidos por todos os órgãos representativos nacionais e estaduais”, enfatiza Rosi. O Museu de Paranavaí também está em todos os catálogos e guias de museus do Brasil. Em 2007 e 2008, tiveram o acompanhamento da Coordenação do Sistema Estadual de Museus (Cosem) que ministrou cursos e treinamentos em Paranavaí. Para mais informações, basta ligar para (44) 3902-1049.
Site do Museu de Paranavaí: http://museuparanavai.webnode.com.br/
A velha jardineira deixou saudades
Catita e Pavão foram os principais meios de transporte em Paranavaí nos anos 1940 e 1950
O antigo ônibus jardineira da Viação Garcia deixou muitas saudades para os pioneiros de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. São lembranças que começam em 1939, quando a empresa de transporte londrinense começou a investir na Fazenda Brasileira, atual Paranavaí.
Até 1938, todos os pioneiros que se aventuravam na Brasileira chegavam ao povoado de jipe, caminhão, carroça, cavalo ou a pé. A escassez de estradas, e também o fato da colônia se situar em uma área isolada, fazia com que somente os corajosos viessem para cá.
O pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles contou em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás que o povoado estava distante do resto do Paraná. “A gente tinha que viajar até Presidente Prudente [interior de São Paulo], daí lá pegava um trem até Ourinhos e depois a cavalo ou a pé ia pra Tibagi [no Centro Oriental Paranaense]. Dava toda essa volta pra chegar em outras cidades do Paraná”, contou.
Foi assim até 1936, quando o Capitão Telmo Ribeiro reabriu a Estrada Boiadeira ligando Paranavaí ao resto do Paraná. Três anos depois, a iniciativa despertou o interesse do empresário Celso Garcia Cid que viu grande viabilidade comercial no povoado. Em 16 de dezembro de 1939, o empreendedor que atuava no ramo de transportes há cinco anos inaugurou a linha Londrina-Fazenda Brasileira. Naquele dia, Celso Garcia conduziu a jardineira “Catita”, adaptação de um caminhão Ford TT de 1933, até o seu destino.
Segundo o ex-prefeito Ulisses Faria Bandeira, em entrevista à prefeitura há algumas décadas, a viagem teve início às 17h30. “Chegamos aqui por volta das 14h do dia seguinte”, afirmou. Além de Faria Bandeira, entre os passageiros da primeira viagem da Viação Garcia a Paranavaí, estavam o prefeito de Londrina, João Lopes, e o fazendeiro Humberto Alves de Almeida.
Os viajantes logo apelidaram a estrada Londrina-Fazenda Brasileira como “Túnel Verde” por causa da mata densa e virgem que predominava na região Noroeste do Paraná. De acordo com pioneiros, o cenário era tão bonito que chegava a ser inacreditável. Durante o percurso era comum muitos mosquitos e borboletas invadirem a jardineira nas imediações da Capelinha, atual Nova Esperança.
Os insetos circulavam livremente no interior do veículo. “Isso acontecia porque os ônibus eram abertos como bondes”, relatou o pioneiro Oscar Gerônimo Leite. Por um bom tempo, o Governo do Paraná bancou as despesas da Viação Garcia, pois a demanda era pequena e a realização de duas viagens por mês não cobria o investimento.
O “Pavão” da Brasileira
Durante a Segunda Guerra Mundial, o ônibus que mais fez a linha Londrina-Paranavaí era conhecido como “Pavão”. O ônibus movido a gasogênio era econômico, ideal para o período de guerra que ficou marcado pelo racionamento de combustível. Na década de 1940, o veículo chegava a Paranavaí em 16 horas.
Por vários anos, a Viação Garcia transportou passageiros que não tinham condições de comprar passagem. Cada um pagava conforme podia, até mesmo com galinhas. Quando chovia durante a viagem, o motorista encostava o ônibus e amarrava correntes nos pneus para evitar que atolasse. “Lembro que uma vez a gente levou oito dias de Londrina até aqui. Cheguei com os peitos doendo de ajudar a empurrar um carro velho da Garcia pelo picadão”, revelou o pioneiro José Francisco Siqueira, conhecido como Zé Peão.
O pioneiro paulista Paulo Tereziano de Barros disse que nunca se esqueceu das viagens com o “Pavão”. “A gente tinha que atravessar um barro preto lá perto de Mandaguari e depois o areião de Maringá pra cá”, assinalou. Muitos pioneiros chegaram a Paranavaí com a jardineira. Alguns exemplos são o catarinense Carlos Faber, o gaúcho Severino Colombelli e os mineiros Enéias Tirapeli e José Antonio Gonçalves.
Naquele tempo em que as viagens duravam de 17 a 18 horas, o “Pavão” nunca deixou de cumprir a linha, nem quando havia só dois ou três passageiros. Com o passar dos anos, a demanda aumentou e a Garcia quadruplicou o número de viagens. “Em vez de duas por mês, ampliou para duas por semana”, enfatizou a pioneira fluminense Palmira Gonçalves Egger.
Com as jardineiras não chegavam apenas pessoas, mas também informações, conforme palavras da pioneira Inês Colombelli. “Sempre às 11h e às 14h, mulheres e crianças corriam até os ônibus para saber das notícias”, explicou. Era o único jeito da população se informar sobre o que acontecia no Paraná, no país e no mundo.
Frases dos pioneiros sobre a época das jardineiras
Joao da Silva Franco
“A jardineira era velha, não era estofada, e se entrasse de um lado saía do outro.”
Cincinato Cassiano Silva
“O ônibus era todo aberto e só com as bancadas pregadas, e duro que nem pau.”
Salatiel Loureiro
“O fundador da primeira empresa de ônibus da Brasileira foi o Manezinho. Esse coitado acabou em nada e os ônibus dele não aguentavam nem fazer daqui até o Porto São José.”
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Nostalgia de uma ex-ribeirinha
Ex-ribeirinha se emociona ao relembrar época em que vivia distante da realidade urbana
A dona de casa Luciene Franco, 35, e mais dez irmãos foram criados em uma comunidade ribeirinha na Ilha Portal do Trigo, na divisa do Paraná com o Mato Grosso do Sul, onde garantiam a subsistência por meio da pesca e do cultivo de pequenas culturas. Sem contato frequente com o mundo moderno, conheceram a realidade urbana somente ao atingir a maioridade. Foram obrigados a se mudar para a área urbana de Querência do Norte em função de rigorosas leis ambientais e também grande oscilação do volume de água do Rio Paraná.
Quando nasceu, o primeiro contato de Luciene com o mundo não aconteceu em um hospital, muito menos diante da presença de um obstetra. Foi sob a supervisão da natureza e os olhares atentos de uma capivara doméstica. “Nasci ali no berço da natureza com a assistência de uma parteira. Quando minha mãe deu à luz, estava deitada em uma cama de bambu forrada com folhas de bananeira. Havia vários animais próximos dali”, relata a dona de casa, apontando o dedo para a Ilha Portal do Trigo.
Na infância, Luciene e os irmãos aprenderam a conviver pacificamente com animais que a maioria só vê em revistas, TV ou jaulas de zoológico. “A gente tinha acesso a muitos bichos. Todo dia encontrava sucuri, capivara, jacaré, veado campeiro, anta e onça”, destaca. O contato diário contribuía para que os ribeirinhos tivessem uma boa relação familiar ou pelo menos de respeito e tolerância com os membros da fauna local.
De uma capivara e um tatu de estimação, Luciene guarda lembranças inesquecíveis. São até incompreensíveis para quem sempre viveu em um “paraíso de concreto”, como a dona de casa denomina o universo urbano. “Os dois sempre entravam em casa, mas quando a gente mandava sair, eles obedeciam. Era como um gato ou cachorro”, compara.
Porém, nem todos os animais despertavam alegria quando eram vistos cruzando a entrada da casa construída com recursos encontrados na própria ilha. “A gente não se acostumava com as onças. Mesmo assim, não fazíamos nenhum mal pra elas”, assegura a dona de casa.
Quando levava os filhos pequenos para pescar ou preparar a terra para o cultivo de arroz e feijão, o pai de Luciene sempre os mantinha por perto, já que tinham pouca ou nenhuma experiência com os perigos da natureza. “Era mais por cautela. Só que depois de um tempo, todo mundo ficava esperto e ia até pescar à noite, mesmo quando, não muito longe dali, tinha alguma onça bebendo água na beira do rio”, conta.
Há 17 anos, pelo menos 30 famílias ainda viviam na Ilha Portal do Trigo. O intenso aumento das cheias, agravado por proprietários de terras que depredavam a mata ciliar, e o surgimento de leis ambientais mais rigorosas, sob fiscalização do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), tornou inviável a vida na ilha. “Isso aqui deu muito orgulho pra gente. É uma pena que tudo tenha acabado dessa maneira”, lamenta Luciene, sem esconder os olhos marejados.
A dona de casa deixou a ilha há 13 anos, rompendo assim, uma corrente de gerações, iniciada com seus avós. Apesar disso, até hoje, acompanhada dos filhos, viaja de Santa Cruz do Monte Castelo até Querência do Norte, de onde observa, ao longe, um sentimento de nostalgia se materializando. “Independente de qualquer mudança, sei que ela sempre vai estar ali”, comenta.
“A gente não precisava de muito dinheiro”
O maior benefício de se viver em uma ilha, segundo a dona de casa Luciene Franco, é a economia. “Era muito bom porque a gente não precisava de muito dinheiro. Só tivemos de mandar trazer um gerador de energia da cidade. Isso foi bem depois”, lembra.
Antes de adquirir o gerador, a única luz que iluminava a pequena casa, onde viviam mais de dez pessoas, era a de um lampião. À época, Luciene e os irmãos, ainda pequenos, costumavam deitar no chão e olhar para o teto. A surpresa, que depois se tornou fato constante, era a presença de cobras. “Sempre tinha alguma pendurada. Como a gente era criança, levava tudo no divertimento”, declara sorrindo.
Até 1990, toda a família de Luciene estava envolvida na produção de arroz e feijão. Havia muita união, principalmente na hora de trabalhar. O respeito entre os membros da família era consequência do forte vínculo semeado no dia a dia, quando a força coletiva determinava a diferença. “Ninguém passava o dia desocupado. Meu pai e irmãos revezavam pra atravessar o rio com um bote de carga. Eles iam para Querência do Norte vender a maior parte do arroz para uma secadora”, reitera a dona-de-casa.
O desempenho da produção, em molde tão arcaico que beira o processo artesanal, dependia mais da natureza do que das técnicas de manejo. De acordo com Luciene, quando chovia, o jeito era aguardar o mau tempo passar. “A chuva estragava tudo e a gente tinha que esperar secar pra começar de novo”, revela.
Durante o dia, a família se dedicava a agricultura, e à noite, a pescaria. “O trabalho era puxado, mas sempre valeu a pena. A gente tinha muita fartura. Nunca faltava nada”, defende a dona de casa.
Curiosidade
Se pudesse, Luciene Franco voltaria a viver na ilha, onde o custo de vida é mais barato.
Carnavais do passado deixaram saudade
Época de carnaval é marcada pela lembrança dos grupos que fazem parte da história de Paranavaí
Em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, os carnavais da década de 1970 e 1980, marcados pelos grupos Escola do Biga, Clube da Binidita e Bloco dos Sujos, se caracterizaram como ícones da liberdade. A magia emblemática que deu origem aos ritos carnavalescos se desvaneceu no final dos anos 1990, mas ainda subsiste no ideário de quem viveu esse período. Hoje, prevalece um saudosismo rememorado nos balcões de bares.
Célebre, o ex-jogador e ex-técnico do Atlético Clube Paranavaí (ACP), o falecido Chico Venâncio, conhecido como Biga, é o responsável pelo surgimento do carnaval de rua local. “Em 1975, ele trouxe para a nossa cidade uma realidade conhecida apenas por quem passou pelos grandes centros”, conta o comerciante e ex-integrante do extinto Clube da Binidita, Luís Carlos do Amaral, em referência ao surgimento da Escola do Biga.
Segundo o técnico em atividades do Serviço Social do Comércio (Sesc) e ex-coordenador do extinto Bloco dos Sujos, Dorival Torrente, Biga corria atrás de tudo sozinho, representando magistralmente o ideal de uma época. “Naqueles anos, o pessoal não simplesmente curtia o carnaval, mas vivia. Passavam 12 meses pensando nisso”, comenta Amaral, exemplo pródigo da realidade.
O comerciante foi um membro importante do Clube da Binidita, o segundo grupo carnavalesco da cidade, fundado em 1977, com origem no salão. Somente após dez anos de festividades no Clube Campestre e nas ruas é que houve uma queda no número de participantes da “Binidita”. “Nos primeiros anos, quase todo mundo era solteiro ou só namorava, então a presença era garantida. Já em 1987, muitos estavam casados e se tornaram pais de família”, lembra Luís Carlos.
O terceiro grupo a entrar para a história do carnaval de Paranavaí foi o irreverente Bloco dos Sujos, criado em 1981. Com cunho social e político, os participantes aproveitavam o período de folia para expressar as insatisfações da época. “Era tudo muito divertido. Tinha homem travestido de mulher e vice-versa. Não esqueço até hoje que fizeram um camelo em tamanho original e uma pessoa representando o Saddam Hussein, além de outros personagens políticos”, destaca Dorival Torrente.
O Bloco dos Sujos foi o último dos três a chegar ao fim, encerrando atividades em 1999, quando o Carnaval de rua local perdeu sua importância junto à população. “Desapareceu a magia de antigamente, pelo menos no interior do Paraná. Vai ser sempre uma época que deixa saudades porque as coisas não voltam”, desabafa Luís Carlos do Amaral.
Torrente concorda e atribui a desvalorização do carnaval a um processo de desvirtuação e individualismo gerado pela tecnologia. “A juventude não valoriza mais o congraçamento social. As pessoas preferem o isolamento diante da TV, aparelhos de DVD e computadores”, lamenta.
Hoje em dia, Torrente, Amaral e outros ex-integrantes dos três grupos ainda relembram o passado quando se reúnem diante de um balcão. “O bar é o local ideal para parir novas ideias e relembrar carnavais de antigamente”, avalia Dorival Torrente.
Auge do carnaval de rua foi na década de 1980
Na década de 1960, os clubes de Paranavaí estavam sempre lotados de foliões no mês de fevereiro. Os maiores exemplos eram o Paranavaí Tênis Clube, Harmonia Country Cub, Clube Campestre e Salão Paroquial da Igreja São Sebastião. “Nessa época, o pau comia”, diz, às gargalhadas, o técnico em atividades do Serviço Social do Comércio (Sesc) e ex-coordenador do extinto Bloco dos Sujos, Dorival Torrente.
O carnaval de rua local teve seu auge na década de 1980, quando a folia era baseada em canções como “Mamãe eu quero”, “Você pensa que cachaça é água?”, “Meu coração é corinthiano” e “Atirei o pau no gato”. As marchinhas compostas na década de 1950 eram determinantes e ditavam o carnaval paranavaiense. “Me recordo das canções do Moacyr Franco e do Sílvio Santos. Eram como símbolos. Bem diferente disso que tocam hoje em dia”, frisa Torrente. A opinião é partilhada pelo comerciante e ex-integrante do extinto Clube da Binidita, Luís Carlos do Amaral que considera inadequado celebrar o carnaval com outros gêneros musicais.
Até 1999, o tradicional carnaval de rua de Paranavaí tinha como ponto de partida a Avenida Distrito Federal, em frente ao Posto São José. “A gente descia até onde está localizado o atual Bar Toyokawa. O movimento nas ruas era imenso, havia muita gente”, explica Torrente. O evento começava às 20h30 e terminava por volta das 23h. Amaral revela que no Clube Campestre reuniam até 20 blocos carnavalescos.
Clube da Binidita teve quase 300 integrantes
De acordo com o comerciante Luís Carlos do Amaral, o Clube da Binidita chegou a ter aproximadamente 300 integrantes quando se tornou uma escola de samba. “Esse foi o número de componentes por volta de 1986, quando tínhamos até samba-enredo e resolvemos homenagear o radialista José de Matos, falecido em um acidente automobilístico”, conta.
À época, a conquista de recursos era feita junto ao comércio local que contribuía e muito com o Clube da Binidita. “Foi mais difícil quando resolvemos levar o carnaval do salão para as ruas. Tivemos de montar uma estrutura com instrumentos e roupas”, relata Amaral, mas admite que o esforço valeu a pena.
Com base nas escolas dos grandes centros, o Clube da Binidita tinha samba-enredo, puxador de samba (o próprio Amaral), abre-alas, 60 componentes na bateria, ala das baianas, das crianças e da velha guarda. “Seguimos os moldes do que vimos em São Paulo e Rio de Janeiro. Queríamos fazer bonito perto da Escola do Biga”, revela Luís Carlos, referindo-se ao primeiro grupo carnavalesco da cidade.
O técnico em atividades do Serviço Social do Comércio (Sesc) e ex-coordenador do extinto Bloco dos Sujos, Dorival Torrente, admite ter sido um fã incondicional do Clube da Binidita e afirma que a maior qualidade dos integrantes era o respeito mútuo. “Sempre chegavam a um denominador comum quando queriam decidir algo. Nunca havia briga. Era tudo extremamente organizado”, comenta.
Quando o Clube da Binidita chegou ao fim, Amaral e outros ex-integrantes resolveram fundar a Ala do Cachorro Louco. “Apenas os mais jovens da época participaram. Ficamos alguns anos, só que não era a mesma coisa. O pessoal mais antigo já tinha se desligado do carnaval”, garante o comerciante.
Saiba mais
Origem do Clube da Binidita – Em 1977, Jacaré e Mineiro estavam em um bar próximo à Praça da Xícara. Era sábado, e a pinga com limão era sagrada para os dois no final de semana. Então pediram a birita e em seguida verteram um pouquinho no chão. Quando questionados sobre o ato, disseram que era para São Benedito. Então alguém perguntou: “Por que não Binidita?” Em seguida, batizaram como Clube da Binidita o bloco formado principalmente por apreciadores da cachacinha.
Se estivesse na ativa, o Clube da Binidita completaria 32 anos.
Durante o carnaval de rua da década de 1980, comerciantes aproveitavam a oportunidade parar criar “camarotes” improvisados, com o objetivo de agregar mais renda. Normalmente reservavam espaços privilegiados.
No final da década de 1980, a bateria da Binidita fez uma parceria com o Bloco dos Sujos, dando sustentação musical para o desfile. Mas no final da década de 1990 alguns participantes do Bloco dos Sujos fizeram brincadeiras pejorativas, surgindo embate com a proposta inicial do grupo. Assim a coordenadoria do bloco optou por encerrar as atividades.
O Bloco dos Sujos era conhecido como uma fusão de Clube da Binidita com Escola do Biga. Na década de 1980, os três grupos atraíam pelo menos 12 mil pessoas para as ruas de Paranavaí, uma quantidade superior ao público que prestigiava o desfile de 7 de setembro.
Emblemáticos no carnaval de rua do Bloco dos Sujos eram o bumba-meu-boi e a boneca nega maluca de Dorival Torrente.
Em uma edição do Carnaval de Rua, Lourival Félix Carneiro, que posteriormente se tornaria prefeito de São João do Caiuá, provocou comoção popular ao participar do Bloco dos Sujos com um pênis de três metros usando uma camisinha. A proposta era educativa e alertava para os riscos do HIV.
O ritual do Clube da Binidita antes de se apresentar em público era se concentrar na residência de alguém para tomar caipirinha.
O Clube da Binidita ganhava todos os anos o prêmio disputado por todos os blocos que participavam do carnaval no Clube Campestre.
O folião Luís Carlos do Amaral não costumava entrar em férias. Aproveitava para folgar alguns dias no período do carnaval.
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