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O tratamento que dispensamos aos não humanos
Para que as pessoas possam se alimentar de uma “carne de qualidade”, os animais, por padrão, são deixados em jejum prolongado. Isto, claro, para que suas reações fisiológicas associadas à última refeição não comprometam a qualidade da carne. Como isso pode parecer justo? Aceitável? Você já considerou o fato de que até mesmo serial killers, ou seja, assassinos que não raramente são considerados os piores seres humanos, recebem melhor tratamento?
Um exemplo? Sujeitos que estupraram e mataram dezenas de pessoas e que são condenados à morte nos Estados Unidos costumam ter o direito de escolher uma última refeição com tudo que lhes agrada. Já os animais não humanos, relegamos à fome antes do golpe mortal. Sendo assim, como alguém pode dizer que reprovar o consumo de animais e lutar pelo direito à vida não humana não é importante? Seres não humanos estão na pior escala de tratamento da história da humanidade. Muito abaixo daqueles que são considerados alguns dos piores criminosos da nossa história contemporânea.
Será que aos olhos dos animais não somos vistos como assassinos?
Vamos esquecer por um instante o conceito legal, tradicional e legitimado socialmente de certo e errado e suas implicações ulteriores. Será que o famigerado Assassino do Zodíaco poderia ser considerado um executor com uma proposta de morticínio que segue os princípios do “abate humanitário”? É inegável que ele era um psicopata que usurpava vidas, e por isso merecia ser responsabilizado por seus atos. Mas, por pior que fossem suas ações, me parece, valendo-me me de sua trajetória, que ele não deixava de ter um código de ética.
Afinal, ele matava suas vítimas com tiros cirúrgicos, com precisão letal. Suas ações, independente de motivação, não deixavam rastros de passionalidade. Como um criminoso organizado, era como se estivesse simplesmente cumprindo um trabalho; tanto que sequer tocava suas vítimas. Ele não as torturava; não tinha qualquer interesse ordinário ou especial pelo sofrimento, mas apenas pelas consequências daquilo que não existiria sem o sofrimento pessoal ou transferível em algum nível. Ou seja, a morte.
O contato direto, a fisicalidade, não o interessava. O seu ritual se resumia ao gatilho. O prazer, se existiu, estava no disparo, e o seu clímax no desvanecimento da existência. E foi isso que impediu que ele jamais fosse capturado. Não era previsível nem imprevisível. Ostensivo e privativo, eu diria. Usava sempre o mesmo uniforme e quase sempre a mesma arma. Seu modus operandi e sua assinatura eram unos e indefectíveis na sua expressão e categoria nos anos 1968 e 1969. Seu método empedernido, mesmo que não motivado economicamente, já que não lucrava para matar, me levou a uma associação, concordem ou não, entre a sua pistola e a captive bolt pistol (no Brasil, conhecida como pistola de atordoamento ou de abate), usada nos matadouros dos países de “Primeiro Mundo” desde as primeiras décadas do século 20.
Me refiro à pistola empunhada pelos magarefes para disparar com brutal naturalidade um dardo que penetra o crânio de um animal não humano e atinge seu cérebro na tentativa de insensibilizá-lo no processo de abate. Se fizéssemos isso com seres humanos, independente de motivação, mesmo que em um caso de reparação ou de “lei de talião”, não seríamos considerados vis, túrbidos, refeces, monstros? Jeffrey Dahmer lobotomizava suas vítimas humanas. Será que o que fazemos com os animais antes de matá-los nas linhas de execução é tão diferente da lobotomização? Já que o disparo da captive bolt pistol rouba-lhes a própria identidade, tornando-os inúteis na sua própria essência, assim como os lobotomizados.
Acredito que há funcionários de matadouros que realmente não sentem prazer em tirar a vida de um animal não humano, já que muitos cumprem esse trabalho por alegada necessidade. Porém, será que isso não impacta em suas vidas? Em seu estado emocional e psicológico? Imagine ter um cotidiano pautado em violentar e matar animais. É preciso crer que está diante de objetos, não de vidas. É imprescindível desligar a compaixão – permitir-se uma dissociação. Do contrário, não serve para o trabalho.
Não que trabalhar em um matadouro transforme essas pessoas em sujeitos terríveis, já que são seres humanos imersos em um universo de legitimação de mortes de outras espécies. Afinal, eles seguem o protocolo da indústria e não ousam questioná-la por diversos fatores – pessoais ou não. A atividade se resume a ser pago, em muitos casos mal pago, para matar sob o respaldo legal. Há uma “roupagem” de atividade comum, impedindo que aquele que dispara uma arma contra a cabeça de um animal reconheça isso como errado, cruel, e menos ainda como assassinato. Claro, porque a humanidade diz que está tudo bem em matar, desde que não seja um ser humano; e desde que aquela morte gere algum produto ou bem de consumo.
O mundo ao seu redor diz que o que ele faz é certo numa proporção muito maior do que a condenatória, já que o valor da vida animal não humana é proporcional ao peso da carcaça no contexto comercial. Porém, há um aspecto tétrico a se considerar. Essa realidade pode brutalizar o ser humano e transformá-lo, se assim o permitir. E se o executor desenvolve prazer pelo que faz, mesmo que isso signifique a morte de ser de outra espécie, ele corre o risco de definitivamente abrir mão de uma das qualidades mais importantes do ser humano, que é a empatia. Isso realmente não é impossível. Vídeos amadores pululam no YouTube mostrando que como os animais não partilham do mesmo código comunicativo que nós, há sempre aqueles que agem, de fato, como violentadores, psicopatas, serial killers, rampage killers ou mass murderers em relação aos animais de outras espécies.
O contato naturalizado com a violência pode asselvajar o ser humano, principalmente aqueles que já têm predisposição à ferocidade; ou a transferir frustrações aos vulneráveis com quem convive – com destaque para aqueles que não podem reclamar do próprio sofrimento por não terem uma voz que inspira respeito e consideração. Quem não se recorda do clássico do cinema de terror intitulado “Texas Chainsaw Massacre?” Nas partes mais pesadas do filme, estamos diante de um matadouro, e tudo que acontece lá dentro choca facilmente os seres humanos porque as vítimas são humanas. Por outro lado, ignoramos que aquela é a realidade ordinária não humana. Desconsidere a figura do serial killer e substitua os personagens humanos do filme por animais e você terá uma representação trivial do cotidiano.
Pessoas penduradas em grilhões, e sendo golpeadas violentamente, assim como fazemos com porcos; e, claro, tendo partes de seu corpo removidas. O código de comunicação do assassino também parece ser outro, e a sua ausência de empatia faz refletir sobre a empatia que negamos aos seres de outras espécies. É como se não ouvíssemos os animais, assim como os assassinos em série não ouvissem os seres humanos – como se enxergassem a si mesmos como uma espécie além – dotada do direito de nos exterminar. Analise alguns discursos de serial killers e você verá que não é difícil perceber que vários deles se referem às suas vítimas como se fossem bovinos e suínos.
Claro que a minha intenção não é chamar de assassino quem sobrevive matando animais, mas o ato em si é análogo a um assassinato quando subtraímos vidas que não nos pertencem, independente de finalidade. Mas o mundo e a nossa realidade social, cultural e econômica nos dizem diariamente que esse assassinato é justo, necessário e legal, porque tem o aval da maior parte da população e do Estado. E a morte de animais, além de cruel e evidentemente desnecessária, já que é possível viver muito bem sem matar outras espécies para consumo, pode preparar alguém para ações que, enfim, despertem a atenção da população, deixando-a em choque, como é o caso dos crimes cometidos pelo Zodiac Killer, citado no início do texto.
Além desse, recordo-me do caso de Jeremiah Burroughs, funcionário de um matadouro, que enfastiado de executar animais dóceis, acabou por matar mais de 70 pessoas. Há quem diga que o meio e a naturalização da violência contra não humanos o levou a matar pessoas. Não posso afirmar, mas não duvido, e creio que ele não seja o único. Ademais, há inúmeros assassinos e serial killers que adotaram em suas execuções métodos comuns em matadouros e na indústria da carne. Outros exemplos são Jeffrey Dahmer, Robert Pickton, os Bloody Benders, Ottis Toole, Albert Fish, Ed Gein, Béla Kiss, Richard Trenton Chase, Joachim Kroll, Armin Meiwes, Andrei Chikatilo, Arthur Shawcross, Issei Sagawa e Robert Maudsley, entre outros.
Será que aos olhos dos animais não humanos que seguem matadouro adentro não existe a possibilidade de que sejamos vistos como serial killers, mass murderers? A verdade que muitos se negam a ver é que assim como vítimas humanas de assassinatos não têm qualquer anseio em morrer, os animais não humanos nos matadouros partilham do mesmo interesse. Uma prova disso? Antes de executar um animal, dê a ele, ou peça que deem a ele, a oportunidade de fugir. Então você terá sua resposta.
Breivik & Ramirez
O terrorista de extrema direita Anders Behring Breivik, autor de um atentado que matou 77 pessoas em 22 de julho de 2011 na Noruega, recebe centenas de cartas de amor na prisão.
Algo semelhante aconteceu nos EUA com o Nightstalker, o serial killer Richard Ramirez, que até hoje detém o maior recorde de correspondências de amor recebidas por um condenado – foram milhares.
Desde 1989, Ramirez cumpria pena por 13 homicídios, 5 tentativas de assassinato, 11 estupros e 14 roubos, até que morreu de causas naturais em 7 de junho de 2013, aos 53 anos.
Pedro López, o serial killer que matou mais de 300 garotas
Psicopata atuou principalmente no Equador, Peru e Colômbia
Conhecido como o “Monstro dos Andes”, o colombiano Pedro Alonso López, é considerado o serial killer que praticou o maior número de homicídios da História. Ao psicopata, é atribuído o estupro e assassinato de mais de 300 garotas do Equador, Peru e Colômbia.
Filho de uma prostituta, López vivia com doze irmãos em Santa Isabel, no departamento colombiano de Tolima, até que em 1957, aos oito anos, foi expulso de casa pela mãe que o entregou a um homem que o sodomizava diariamente. Aos 12 anos, uma família estadunidense o levou e o matriculou em uma escola para órfãos. Novamente, Pedro Alonso foi vítima de abuso sexual. Dessa vez, por parte de um professor.
Aos 18, após ser preso por pequenos delitos, foi estuprado por dois homens que mais tarde assassinou na prisão.Quando foi libertado, iniciou sua jornada de crimes no Peru. Em 1978, López já havia matado pelo menos cem garotas, até que foi capturado por uma tribo nativa. Quando se preparavam para executá-lo, um missionário estadunidense interveio e os convenceu a entregá-lo à Polícia Estadual.
Por falta de provas dos crimes cometidos por López tiveram de liberá-lo. Entre Peru, Colômbia e Equador, Pedro Alonso manteve uma média de três mortes por semana. Em 1980, López foi detido em uma tentativa de sequestro malsucedida. À época, confessou a autoria de mais de 300 homicídios. Só começaram a crer no colombiano quando encontraram no Equador a primeira vala de corpos com 53 vítimas entre nove e doze anos. Anos depois, em 1994, o Governo Federal do Equador o libertou e o deportou para a Colômbia, onde viveu na ala psiquiátrica de um hospital de Bogotá.
Em 1998, foi declarado são e ganhou a liberdade após pagar uma fiança de 50 dólares. Em uma entrevista à BBC de Londres, Pedro Alonso López definiu a si mesmo como “O Homem do Século”. Em 2002, a Interpol encontrou uma nova vítima do colombiano que até hoje continua desaparecido.
Algumas frases do Serial Killer Pedro López:
“Eu gosto das meninas do Equador. Elas são mais gentis e inocentes. Elas não são tão desconfiadas com estranhos como as meninas da Colômbia”.
“Eu perdi minha inocência aos oito anos, então eu decidi que faria o mesmo com o maior número de meninas que eu pudesse seduzir”.
“Eu sou o homem do século. Ninguém nunca vai me esquecer”.
Referências
https://web.archive.org/web/20071021224003/http://users.erols.com/mwhite28/lopez_ap.htm
http://www.biography.com/people/pedro-alonso-lopez-12103226
https://web.archive.org/web/20150216093053/http://www.guinnessworldrecords.com/world-records/most-prolific-serial-killer
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M – Eine Stadt sucht einen Mörder
O expressionismo alemão como pioneiro em transpor para a tela o universo de um serial killer; nada mais intenso se tratando da figuração da distorção humana e dos aspectos sociais, políticos e econômicos da Alemanha de 1930. Depois de tanto tempo, M (que bem poderia ser de masterpiece) – Eine Stadt sucht einen Mörder ainda dialoga com o presente e instiga reflexões sobre a condição psicológica dos homens.
Poucos filmes sobre o tema conseguiram ser tão surpreendentes sem decair para o apelativo. É uma pena que ainda hoje muita gente não seja capaz de entender a profundidade dessa obra criada pelo gênio expressionista Fritz Lang, o homem que se recusou a trabalhar para Adolf Hitler. Embora à época o expressionismo alemão passasse por um momento difícil em função do crescimento do Nacional Socialismo, M, que foi relegado ao cinema cult, ultrapassou as barreiras do entretenimento para se consolidar como obra de arte.