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A fé do sertanejo
A foto que parece tirada do filme “O Pagador de Promessas”, do grande Anselmo Duarte, na realidade é a imagem de um sertanejo que se mudou para Paranavaí no início da década de 1950 em busca de um futuro melhor. Em meio ao vazio, percebe-se um todo que o migrante sonhava em preencher com a própria esperança.
Uma vida de riffs e solos
Fábio Pianucci: o autodidata que se tornou músico profissional
Em 1993, o garotinho paranavaiense Fábio Pianucci estava assistindo ao show da banda brasileira de hard rock Dr. Sin no festival Hollywood Rock. O fascínio pelos riffs e solos de guitarra de Eduardo Ardanuy foi tão grande que a partir daquele dia Fábio decidiu se tornar músico profissional.
“Eu tinha 13 anos e comecei a estudar guitarra sozinho, como autodidata mesmo”, relata. À época, o rock estava em ascensão, era o estilo mais tocado nas rádios.
Fábio, que hoje é produtor musical, professor de música e um dos guitarristas profissionais mais solicitados de Paranavaí, se introduziu no universo da música da mesma maneira que quase todos os garotos que gostam de rock: tocando Ramones, a banda estadunidense que se tornou o maior ícone do punk-rock mundial.
“Depois tirei Iron Maiden, Ozzy Osbourne, Metallica e por aí vai”, cita Pianucci, referindo-se a bandas que são emblemáticas quando o assunto é heavy metal e thrash metal. O guitarrista ainda cita a revista Guitar Player, criada em 1996, como grande fonte de conhecimento.
Em 1997, Fábio Pianucci ingressou na banda de rock “Netos da Vovó Mafalda”. “Era algo amador, mais pra se divertir mesmo”, frisa. Depois o guitarrista foi para a banda Callyra que tocava basicamente heavy metal e suas vertentes, como thrash metal e heavy metal melódico. Nesse período, Fábio já era conhecido como um guitarrista virtuoso, de grande habilidade técnica.
Com o fim da Callyra, Pianucci entrou para a banda Drenergia que tinha uma proposta mais profissional. “Foi aí que a gente decidiu tocar para ganhar dinheiro, seguindo uma linha mais acessível. Com a Drenergia, toquei em muitas cidades do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul e até Argentina”, declara. A banda que se apresentava mais em casas noturnas durou quase quatro anos e tocava rock nacional e internacional.
Fábio Pianucci, que já compôs para artistas locais e da região, cita como um grande mestre o guitarrista Eduardo Faria, de Maringá. “É importante nunca parar de estudar. Por isso, participo muito de workshops e palestras musicais. Também sempre tive o apoio da família, o que conta muito”, assinala. O guitarrista dá aulas há 12 anos para alunos de Paranavaí e região, e desde 2005 é proprietário do Jam Studio em parceria com o também músico Calil Souza.
Juntos, já produziram discos das bandas Okzião, Piratas de Aldebaran, que foi classificado para o Garagem do Faustão, e Marcela Martins. “Já gravamos sertanejo, pop, rock, todos os estilos”, assegura Fábio que desde 2008 é patrocinado pela Tagima, uma das maiores fabricantes de guitarras, violões e baixos do Brasil.
Pianucci ressalta que não recebe dinheiro, mas sim os instrumentos. “Meu trabalho é divulgar a marca tocando as guitarras do Seizi Tagima”, explica o músico que atualmente se dedica a banda Culinária Blue, de Maringá, que realiza shows didáticos de rock. Em 2011, Fábio Pianucci e Calil Souza pretendem lançar o disco independente de música instrumental “Sex, Love & Guitar”.
Contatos
Fábio Pianucci trabalha com aulas de guitarra e produção musical. Para mais informações, ligar para (44) 3446-1963 ou (44) 8439-5188.
Sites
www.youtube.com/user/fabiopianucci
O Garganta de Ouro de Terra Rica
Antes do estrelato, José Rico cantava em troca de doces em Terra Rica
Na infância, o pequeno José Alves dos Santos começou a se destacar em Terra Rica ao cantar em troca de doces. Quando cresceu, a necessidade o obrigou a exercer serviços braçais para sobreviver. Porém, como profetizara um padre, José ainda seria rico.
O músico José Alves dos Santos, conhecido como José Rico, nasceu em São José do Belmonte, Pernambuco, em 1946, mas em 1948 se mudou com a família para Terra Rica, onde viveu até os 19 anos. De acordo com Wilson Alonso, amigo de infância do cantor, José Rico, o Garganta de Ouro do Brasil, é um grande personagem da cidade. “Ele não é como aqueles artistas que esquecem da própria origem. Não fica mais de seis meses sem aparecer aqui”, defende.
Ao se mudar para o Noroeste do Paraná, no início, o pai de José Rico conseguiu manter a família com o ofício de barbeiro. No entanto, logo surgiram dificuldades e, ainda criança, José Alves dos Santos teve de trocar a chupeta por uma enxada. “Ele trabalhou muito na lavoura. Também atuou como pintor, sorveteiro, engraxate e servente de pedreiro. Lembro como se fosse hoje”, informa Alonso que durante alguns segundos se cala, disperso em pensamentos.
Quando não estava trabalhando, o pequeno José gostava de cantar. A boa voz foi determinante para ser convidado a participar de eventos locais em troca de um cachê baseado em paçoquinha e sorvete. “Era uma figurinha carimbada nas quermesses e festas juninas. Quem tinha muito dinheiro na época, sempre o chamava para se apresentar”, conta Alonso, sem velar o sorriso nostálgico.
O interesse pela música sertaneja foi precoce, mas o desconhecido José dos Santos embalava mesmo o público com canções românticas e boêmias. “Eram composições de Altemar Dutra e Nelson Gonçalves. O pessoal gostava mais desses cantores que estavam no auge”, relembra Alonso. No fim da adolescência, José Alves dos Santos começou a participar de programas de rádio. Alonso rememora um episódio em que o cantor veio a Paranavaí participar de um programa de auditório. “Ele conseguiu chegar a tempo de se apresentar na Rádio Paranavaí graças ao sargento Vieira”, reitera.
Na época em que sequer cogitava a possibilidade de gravar um disco, o jovem José conheceu o pároco Eduardo Bassil que lhe deu incentivo no início da carreira. “O padre falou que ele seria um José Rico, ficaria realmente rico, e isso aconteceu. Foi merecido porque ele lutou muito por isso, não caiu do céu”, finaliza Wilson Alonso.
José Rico gostava de lutar
Na adolescência, as mãos do cantor sertanejo José Rico não se sentiam atraídas apenas pelas cordas do violão. “Briga era com ele. Lembro que antigamente tinha luta em circo, então normalmente no segundo dia ele já estava lá na arena lutando. O Zé gostava muito disso”, garante o amigo Wilson Alonso.
Emocionado, Alonso destaca a simplicidade como a principal característica do cantor. “O Zé chegava aqui em casa e dizia que queria comer arroz, feijão, ovo frito e quiabo. Além disso, adorava sair na rua de bermuda, camiseta e tênis”, relata o amigo.
Apesar de não tocar nenhum instrumento, Wilson Alonso guarda com esmero um violão cuidadosamente envernizado e sempre brilhante. O instrumento está sempre afinado, à espera de José Rico, que ao toque do primeiro acorde leva à tona a mesma nostalgia e graça da época em que usava o talento para ganhar um pedaço de doce.
Saiba Mais
Além da música sertaneja, José Rico apreciava música gaúcha, mexicana, paraguaia e cigana. Tais influências são perceptíveis nas composições do artista.
A música “Estrada da Vida”, de autoria de José Rico, rendeu a venda de mais de dois milhões de discos para a dupla.
A dupla Milionário e José Rico surgiu em 1973. Desde então, lançaram 28 discos e dois filmes: “Na Estrada da Vida” e “Sonhei com Você”.
O filme “Na Estrada da Vida” foi dirigido por Nelson Pereira dos Santos, expoente do cinema novo brasileiro.
Vivendo a viola
Há 17 anos, Jeferson Cley Bovarotti cultiva o talento de conceber violas de modo artesanal
Na adolescência, o primeiro contato de Jeferson Cley Bovarotti com a viola foi tão profundo que decidiu reproduzi-la. Desde então, se passaram 17 anos de produção, e hoje a arte de conceber o instrumento artesanalmente sintetiza o cotidiano do luthier de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. O trabalho de Bovarotti atrai clientes de várias regiões do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul.
Jeferson Cley é autodidata, mas não foi da noite para o dia que adquiriu conhecimento o suficiente para reproduzir violas. “Levei oito anos para me orgulhar dos instrumentos que faço. Eu dificilmente ficava satisfeito, sempre queria melhorar algum detalhe”, frisa Bovarotti. O perfeccionismo refere-se ao fato da viola ter muitos segredos que incluem o preparo da madeira, escolha da espessura e as medidas da escala. “O jeito é se aperfeiçoar sempre”, pondera.
Cautela é sempre imprescindível no momento de conceber um instrumento. A criatividade não pode se transformar em excesso de ousadia, já que a maior parte dos violeiros considera a tradicional viola caipira como a única verdadeira. “É preciso tomar cuidado principalmente na hora de escolher a madeira. Tem de conhecer o processo de envelhecimento da matéria-prima”, alerta o artista que criou o primeiro instrumento aos 17 anos, quando reproduziu a viola ganhada do pai Raulnilde Bovarotti.
Dentre as melhores madeiras para a produção de uma viola, o luthier que também é violeiro destaca o pinho sueco, jacarandá indiano, maple e ébano. “Para quem quer gastar um pouco menos, mas levar um produto de boa qualidade, tenho amapá e o cedro-rosa. As melhores do Brasil”, assinala. Uma viola com matéria-prima brasileira custa em torno de R$ 1,5 mil. Se o cliente preferir madeira importada, o preço final é de R$ 3 mil. “Também posso pré-cozinhar e fazer um tempero com duas madeiras”, informa Jeferson Cley. Todos os produtos da Di Cley Luthieria, de Bovarotti, são criados sob encomenda. Cada instrumento leva de 30 a 45 dias para ficar pronto.
O esmero do luthier para conceber uma viola se assemelha ao cuidado e requinte de detalhes com os quais um pintor se entrega a própria obra, tornando-a única. “Nunca fiz uma parecida com a outra”, garante.
Por tal peculiaridade, e amor incondicional pela viola, o trabalho do luthier é reconhecido pelos clientes, inclusive a boa fama da fábrica atrai violeiros de várias regiões do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul. “Geralmente quem se interessa mais é profissional. Já vendi instrumentos para várias duplas de moda de viola, além do famoso sertanejo Daniel e do vice-governador Orlando Pessuti”, conta Bovarotti.
Jeferson Cley revela que vender bem é importante, mas não supera o reconhecimento do trabalho. “Para quem vive a viola, a maior recompensa é ver alguém tocando seu instrumento”, comenta.
Luthier fabrica as próprias máquinas
Quando um violeiro pede que um luthier fabrique um instrumento, as variações mais comuns referem-se às escalas. “Uma escala maior é para afinação mais baixa, para tocar o estilo de Tião Carreiro e Pardinho. Só que tem gente que prefere menor ou normal. Depende muito da mão da pessoa”, explica o luthier Jeferson Cley Bovarotti. A escala padrão de uma viola é de 580 milímetros.
Bovarotti é proprietário da Di Cley Luthieria, uma fábrica de violas que preza pela originalidade, tanto que até as máquinas usadas na produção dos instrumentos foram criadas pelo luthier. “Aqui é tudo artesanal. Projetei ao meu gosto”, destaca o artista que luta para ganhar espaço oferecendo qualidade em vez de quantidade.
O aposentado Raulnilde Bovarotti, pai do luthier, conta que tem muito orgulho do filho. Mesmo com a concorrência desleal das indústrias que produzem instrumentos em série, Jeferson Cley sonha em ter o trabalho mais valorizado. “Já levei mais de dois meses pra finalizar uma viola. Não me importei com a demora porque o resultado foi um instrumento único”, enfatiza.
Mais informações
Quem quiser encomendar alguma viola do luthier, pode entrar em contato pelo telefone (44) 3446-7973