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A lição do malabarista
Num reflexo inimaginável, o malabarista segurou a pedra no ar
Em frente a um semáforo no centro de Paranavaí, um artista de rua fazia malabarismo quando um rapaz dentro de um carro arremessou uma pedra em sua direção. Num reflexo inimaginável, o malabarista segurou a pedra no ar. Sem mudar o semblante, continuou movimentando as bolinhas que, mesmo com a inesperada adição do calhau, formaram um arco aéreo multicolorido e extremamente vívido.
O responsável pela pedrada agiu como se nada tivesse acontecido. Desviou o olhar, simulou expressão serena e fingiu que estava guardando alguma coisa dentro do porta-luvas. Faltando uma bolinha para o sinal ficar verde, o sorridente artista de rua finalizou a apresentação e, acompanhado de um amigo, se ajoelhou no asfalto gelado e áspero.
No mesmo instante, abriu os braços e pediu que os motoristas aguardassem um momento. “Por favor, esperem! Agora o sinal que está vermelho não vem do alto!”, disse. Todos ou quase todos entenderam o recado. Então ele se levantou e exibiu as palmas das mãos. Eu estava na primeira fileira e vi que as duas tinham inúmeras cicatrizes, mas somente a mão direita sangrava. O sangue escorria pelo seu braço e respingava na rua.
“Por favor, você aí, meu jovem! Venha aqui!”, falou o malabarista para o seu agressor, a poucos metros de distância de mim. O rapaz fingiu que não entendeu e virou o rosto para a calçada à sua direita. O artista de rua caminhou até ele e acenou gentilmente para que saísse do carro. Diante de tantos olhares curiosos e inquiridores, o jovem acabou cedendo.
Fora do automóvel, o agressor ficou constrangido e rubro. Mais do que isso, temeu a reação do malabarista. “Não se preocupe! Só vou dar a você a única coisa que tenho a oferecer. E ela não vem de baixo, não vem de cima, não vem da frente nem dos lados. Ela vem de dentro! É tão poderosa que toca até o intocado”, declarou o artista.
De repente, o malabarista apertou a mão direita do rapaz, fazendo com que ele sentisse o ferimento e o sangue que começava a engrossar em sua mão. Sem dizer mais nada, o abraçou com ternura e devolveu-lhe o calhau tornado vermelho por causa do sangue. “Que nenhum moribundo se entregue ao terror profundo! Porque sem gentileza só resta a aspereza!”, gritou o artista de rua, tão jovem quanto o próprio agressor, antes de subir na calçada.
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