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Bukowski: “Não vou deixar muito, só algo para ler, quem sabe”
“Depois que eu partir, haverá mais dias para os outros, outros dias, outras noites, cães caminhando…”
Após publicar mais de 50 livros de poesia e prosa ao longo de meio século, Charles Bukowski se tornou o Grand Old Man da literatura marginal dos Estados Unidos. Abordando a rotina dos trabalhadores de colarinho azul e a realidade das áreas urbanas mais pobres de Los Angeles, habitadas por andarilhos, mendigos, usuários de drogas e outros tipos de rejeitados sociais, ele mergulhou em um universo onde homens de mau hálito e pés grandes parecem sapos e hienas. Eles caminham como se a melodia nunca tivesse sido inventada, e ao final ainda são execrados.
Depois de ser mandado ao inferno, Bukowski observava os braços gordos e suados do senhorio exigindo o pagamento do aluguel. “O mundo tinha falhado com nós dois”, escreveu. O jeito era abrir uma nova garrafa retirada da sacola enquanto ela se sentava na esquina fumando e tossindo como uma velha tia de Nova Jersey. Nos anos 1970, a vida de Charles Bukowski mudou.
Fez várias aparições com Allen Ginsberg e Lawrence Ferlinghetti. Deu entrevistas à Rolling Stone e todas as suas leituras pela Europa estavam com ingressos esgotados. Ele trocou as duas caixinhas de seis unidades de cerveja por quatro garrafas de bom vinho francês. Assim que sua história deu origem ao filme Barfly, de 1987, protagonizado por Mickey Rourke, com direção de Barbet Schroeder e roteiro do próprio Bukowski, ele se distanciou ainda mais da miserável realidade que o acompanhou por tanto tempo.
O seu deteriorado fusquinha 1967, com o qual viveu tantas aventuras, inclusive um dia sua namorada fez um furo no para-brisas com o salto, foi substituído por um novo BMW com teto solar. Em seus tempos de bebedeira, Bukowski deixava os atendentes baterem nele em troca de bebidas. Em 1992, com tuberculose, câncer e sentindo o peso da idade, foi convencido por sua esposa a experimentar uma das chamadas curas da nova era. Mesmo aceitando tudo, Bukowski não deixava de ser irônico.
Um dia, às 8h, enquanto estava sentado nu e sua esposa passava óleo de gergelim pelo seu corpo, o Grand Old Man comentou: “Jesus, como cheguei a esse ponto?” Mesmo na iminência da morte, sua mulher prosseguiu tentando purificá-lo. E pra isso contou com alguns monges budistas que conduziram o serviço. O seu bom humor o acompanhou até o fim.
“Depois que eu partir, haverá mais dias para os outros, outros dias, outras noites, cães caminhando, árvores balançando com o vento. Não vou deixar muito, só algo para ler, quem sabe. Uma cebola selvagem numa estrada eviscerada. Paris no escuro”, escreveu antes do último suspiro. Ele pediu que colocassem em seu túmulo a inscrição: ‘Don’t Try’ [Não tente]. Bom, a interpretação vai até onde a sua mente te conduz.
Saiba Mais
Charles Bukowski nasceu em Andernach, na Alemanha, em 16 de agosto de 1920 e faleceu em 9 de março de 1994 em San Pedro, Los Angeles.
Referências
http://www.todayinliterature.com/
http://bukowski.net/
Miles, Barry. Charles Bukowski. Random House (2009).