David Arioch – Jornalismo Cultural

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Anchor: “Ter estupro e assassinato como premissa para ter comida sobre a mesa é absolutamente desnecessário”

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“Fazemos tudo que podemos em nossos shows para chamar a atenção para o veganismo”

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Fundada em Gotemburgo, na Suécia, em 2007, a banda de hardcore punk Anchor (Âncora), é formada somente por músicos suecos e noruegueses que seguem duas filosofias de vida – veganismo e straight edge. Ao longo dos anos, o grupo que já tocou na América do Sul com o Ratos de Porão, realizou ações em parceria com inúmeras organizações em defesa dos direitos animais, como a sueca Förbundet Djurens Rätt (Federação dos Direitos Animais).

“Fazemos tudo que podemos em nossos shows para chamar a atenção para o veganismo. Estou feliz por fazer parte desse movimento. Cada pequena coisa que podemos fazer para aumentar a conscientização significará algo para alguém em longo prazo. Há sempre jovens que não foram expostos a essas questões tanto quanto podemos imaginar. É fácil pensar que todo mundo tem entendimento dos direitos animais, mas infelizmente não é assim, mesmo em uma comunidade de pensamento progressivo como a nossa”, disse o vocalista Claes em entrevista publicada no The Grumpy Sailor em 16 de outubro de 2014.

Entre os anos de 2008 e 2015, o Anchor lançou os álbuns “The Quiet Dance”, “First Year”, “Recovery” e “Distance & Devotion”. Este último conta com uma música intitulada “Hope Diest Last”, que fala sobre o estado atual do planeta e a luta por um lugar mais compassivo para todos viverem. “As primeiras linhas começaram como uma canção sobre a minha pequena Ebba. Mas depois de reescrevê-la inúmeras vezes, acabou ficando um pouco diferente”, informou.

Ebba é uma cachorrinha que Claes adotou em Málaga, na Espanha, quando estavam em turnê. A adoção foi feita por meio da organização SOS Animais, que costuma resgatar animais que vivem nas ruas. “Ela tinha uma história diferente. Veio de um criador que estava abusando de seus cães. Ela mal estava viva quando os voluntários a tiraram dele”, confidenciou ao Grumpy Sailor.

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Claes se recordou também que durante a Anchor South American Tour, eles viram um monte de cães abandonados. Em uma noite, em uma cidade do Sul do Chile, ele sentou-se diante de uma estrada com uma cadelinha em seu colo e notou em seus olhos que ela não queria que ele fosse embora. Como Claes não podia levá-la, ele chorou. “Tirei algumas fotos para me lembrar dela. Acho que foi quando decidi mudar minha vida e tomar conta de um cão”, revelou.

Com Ebba em casa, Claes viu sua rotina se transformar. Seus  dias se tornaram mais divertidos e a cadelinha levou tanta positividade para sua vida que ele se surpreendeu. “Trabalho em meu escritório e passo o tempo com ela ao meu lado. Saímos na natureza o máximo que podemos. Me sinto abençoado, não de forma religiosa, por tê-la em minha vida”, enfatizou.

Influenciado por bandas como Good Riddance, Entombed, Separation, 108 e Robyn, o Anchor pratica um som inovador e ao mesmo tempo fiel à velha escola do hardcore punk, inclusive ideologicamente. Questionado pelo DIY Conspiracy em publicação de 18 de janeiro de 2008 sobre a sua opinião em relação a jovens veganos e straight edge que compram produtos da Nike e da Coca-Cola, ele disse que isso não o agrada de modo algum, já que as duas, assim como outras multinacionais, representam o capitalismo global que contribui tanto para a exploração de vidas humanas quanto não humanas.

“Eu quero vê-las destruídas mais do que qualquer coisa. Mas eu também sei que o hardcore não é onde a revolução dará seus primeiros passos. Para muitas pessoas, é apenas música, é sobre assumir uma aparência em vez de ideias. Acho isso muito triste. Contudo, a única coisa que eu como indivíduo posso fazer é ser um exemplo positivo e inspirador, eu acho”, declarou.

Ao DIY Conspiracy, Claes explicou que o veganismo e os direitos animais são muito importantes, tanto para ele quanto para o Anchor, no entanto, eles preferem voltar seus esforços para que sejam reconhecidos sempre como uma força positiva. “Pode ser que nosso trabalho não seja nada se comparado ao que outras pessoas fazem pela libertação animal, mas eu sinto que é importante que a cena hardcore seja um lugar onde os jovens conheçam o veganismo e se envolvam com isso”, assinalou.

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De acordo com Claes, os integrantes do Anchor reconhecem a vida dos animais como sendo somente deles, o que é um motivo mais do que justo para não consumirem produtos de origem animal. “Se é um produto pago ou não, não tem qualquer relevância para nós. Acho muito triste quando as pessoas viram as costas para elementos positivos em suas vidas, como o veganismo e o straight edge. Acho que há um milhão de razões para ser vegano, e é algo que não pode ser negado. Para aqueles que ainda não são veganos ou vegetarianos, por favor, façam um favor e eduquem-se. Você ficará chocado e horrorizado com o que está acontecendo”, recomendou.

Uma vez, enquanto conversava com seu irmão sobre veganismo, Claes ponderou o quão insana é a realidade de ter a morte como parte da realidade diária. “Ter estupro e assassinato como premissa para ter comida sobre a mesa é absolutamente desnecessário”, criticou.

Ele se referiu aos animais que têm suas vidas interrompidas precocemente em matadouros; e também àqueles que são explorados a vida toda, tendo sua intimidade invadida e sua sexualidade banalizada e violada exaustivamente, como ocorre com as vacas condicionadas a atenderem a demanda dos laticínios. Claes lembrou ao DIY Conspiracy que nos anos 1990 a Suécia teve um dos cenários de libertação animal mais ativos da Europa, o que abriu caminho para mudanças positivas.

Referências

https://thegrumpysailor.com/2014/10/16/anchor-interview/

http://diyconspiracy.net/anchor/

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Written by David Arioch

March 5th, 2017 at 11:08 pm

Consumo de carne pode se tornar insustentável até 2050

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São necessários 15 mil litros de água para produzir um quilo de carne (Foto: Reprodução)

De acordo com um relatório apresentado na Conferência Anual sobre Água, em Estocolmo, na Suécia, a escassez de alimentos será o motivo pelo qual o mundo terá que renunciar à carne até 2050.

Os especialistas afirmam que os produtos de origem animal consomem de 5 a 10 vezes mais água do que os vegetais e, por volta da metade deste século, não haverá água suficiente para alimentar nove bilhões de pessoas que habitarão o planeta.

Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), são necessários 1,5 mil litros de água para gerar um quilo de grãos, e dez vezes essa quantidade para produzir um quilo de carne.

Referência

FAO, World Agriculture Towards 2030/2050: The 2012 Revision.

A donzela de Bergman

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Jungfrukällan e o embate entre paganismo e cristianismo

A inocente Karin personifica a pureza (Foto: Reprodução)

Lançado no Brasil como A Fonte da Donzela, Jungfrukällan, de 1960, é um clássico do cineasta existencialista sueco Ingmar Bergman. A partir da trágica morte de uma virgem cristã, o filme apresenta uma perspectiva sobre o embate entre paganismo e cristianismo na Suécia do Século XIV.

Logo no início, a selvagem e expressiva Ingeri (Gunnel Lindblom) surge como uma representação do pecado ao tentar invocar o deus pagão Odin. Em outro cômodo da casa, a imagem de Jesus Cristo crucificado mostra que aquele é um lar cristão. Tais cenas evocam a ideia de uma recente civilização cristã, que ainda convive e até mesmo flerta com o paganismo.

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A selvagem Ingeri representa o pecado (Foto: Reprodução)

Enquanto a grávida Ingeri personifica o primitivismo e as falhas da natureza humana, o contraponto é a virgem cristã Karin (Birgitta Pettersson), a quem Bergman realça a beleza, transformando-a em um ícone de perfeição, pureza e inocência. Venerada pelos pais Töre (Max von Sydow) e Märeta (Birgitta Valberg), Karin consegue, inconscientemente, fazer com que a mãe odeie o pai. A justificativa é a identificação da filha com a figura paterna.

Os atos dos personagens parecem determinados por uma cortina de fé absoluta, às raias do fanatismo. Mas tudo começa a mudar quando Töre pede a Karin para levar velas para a missa. Ao longo da viagem, a frágil donzela é ludibriada por um grupo de pastores pagãos que a contagia com boa música campesina. Mais tarde, se revelam criminosos e a moça é estuprada e assassinada de forma impiedosa.

O crime acontece na primavera, que marca o fim de um período de trevas, segundo o folclore escandinavo. Conforme a estação do ano ilumina a natureza, transformando tudo em um paraíso multicolorido, o sacrifício de Karin joga luz sobre os maiores defeitos de uma família cristã. A antológica cena em que o pastor pagão esmaga as velas da jovem virgem é uma metáfora sobre a rejeição do cristianismo por uma parcela da população sueca.

Jungfrukällan é um filme que impressiona pela expressividade do elenco e por propor dúvidas de ordem metafísica. Bergman aborda fé, morte e redenção em um contexto onde há momentos em que os personagens mesmo calados e imóveis transmitem sentimentos. Em contrariedade, também os apresenta frios e protegidos por uma formalidade que visa manter as aparências e velar as imperfeições.