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O sonho de Carlos Faber
Fundador da Casa Faber acreditou no progresso de Paranavaí
m 1944, o pioneiro catarinense Carlos Faber, aos 54 anos, cruzou a mata primitiva do Noroeste Paranaense para abrir uma das primeiras casas de comércio de Paranavaí. Embora viveu aqui inúmeras dificuldades, o fundador da Casa Faber resistiu a tudo por acreditar em um sonho, o progresso da cidade.
Antes de falecer, em 30 de junho de 1993, aos 103 anos, Faber ainda encheu os pulmões de ar e disse: “Paranavaí é uma cidade muito boa e bonita. Tenho certeza que vai crescer mais ainda.” Para entender o amor do catarinense pela cidade é preciso conhecer a história do pioneiro.
Carlos Faber nasceu em Tubarão, interior de Santa Catarina, em 30 de maio de 1890. Na juventude, empreendeu muitas viagens pelo sertão catarinense e interior do Rio Grande do Sul. Perdeu as contas de quantas vezes cruzou mares a bordo de uma canoa, obstinado em conhecer as novas cidades que se formavam.
O pioneiro se mudou para o Norte do Paraná ainda jovem e fixou residência na Gleba Roland, hoje Rolândia. Lá, abriu uma casa de comércio que ele mesmo abastecia. Saía à noite ou de madrugada a pé para buscar mercadorias em Londrina. Voltando para casa, atravessava a mata carregando mais de 40 quilos de produtos nas costas.
Aos 54 anos, em 1944, Carlos Faber ainda ostentava o mesmo espírito de aventureiro da mocidade. Foi colocado à prova em Londrina quando conheceu o jovem agrimensor Ulisses Faria Bandeira que lhe falou sobre a Fazenda Brasileira, atual Paranavaí. “Resolvi me aventurar pelo mato cortado por umas picadinhas.”
A viagem à Brasileira durou cinco dias, parte do trajeto foi percorrido a pé e o restante a bordo de uma velha jardineira da Viação Garcia que trazia mais duas pessoas. O ônibus fazia o trajeto uma vez por semana. “Em Maringá, dormi num rancho de palmito. Lembro que perto tinha duas casas velhas. Maringá era praticamente isso”, frisou o catarinense.
A surpresa veio depois com os estreitos picadões quase engolidos pela mata virgem. O motorista da jardineira tinha de desviar da vegetação que insistia em cobrir a estrada – galhos quase atravessavam as janelas do ônibus. “Lembro que a picadinha era tão fechada que para todos os lados se via onça, veado, cateto e passarinhos de todas as espécies”, afirmou Faber, que em Paranavaí se deparou com um universo de mato bruto, antigos cafezais e ranchos velhos. Um era de propriedade do pioneiro Sebastião Freitas.
Dias depois, o comerciante voltou para Rolândia e relatou a mulher, Hulda Faber, tudo que viu. “Ela concordou em experimentar o lugar, então viemos de mudança e deixamos os filhos lá”, revelou. A viagem, dessa vez de caminhão, durou dois dias e meio, pois o solo arenoso fazia o veículo atolar com facilidade, obrigando o catarinense a ajudar o motorista a empurrá-lo.
Em Paranavaí, o casal foi muito bem recebido pelo administrador da colônia, Hugo Doubek. “Quando cheguei percebi que não tinha lei, e só duas famílias de colonos viviam aqui, os outros moravam nas redondezas”, salientou o pioneiro que em 18 de junho de 1944 abriu uma casa de comércio.
A amizade com o Capitão Telmo Ribeiro
A Casa Catarinense, que mais tarde recebeu o nome de Casa Faber, se situava onde é hoje o Banco do Brasil. Era um comércio de Secos e Molhados, onde Carlos Faber comercializava tecidos, cereais, ferragens e muitos outros produtos. “Meus primeiros clientes foram Heitor Barreiro, Telmo Ribeiro e Vendolino Schueroff. Depois, vendi bastante pro pessoal do Governo do Estado que abria os picadões”, disse o homem que chegou à colônia com um capital de 300 mil réis.
Logo a Casa Faber se tornou referência comercial na Colônia Paranavaí. Pioneiros se recordam que toda a população do Distrito de Graciosa se deslocava até o comércio do catarinense para comprar tecidos. “Antes eu saía pouco da loja porque de 1944 a 1946 houve muitos tiroteios que acabaram em mortes”, disse Faber que em 1949 pensou em deixar Paranavaí quando soube do progresso de Maringá e Londrina.
De acordo com o pioneiro, o comércio estava falido, pois a população local parou de crescer. Além disso, os ônibus chegavam a Paranavaí no máximo três vezes por mês. “Isso aconteceu porque a estrada era muito ruim”, assinalou. Para piorar, naquele tempo a maleita foi a doença que mais atingiu a comunidade. Como não havia farmácia, os moradores buscavam remédios no escritório do administrador da colônia, Hugo Doubek.
Apesar do período de descrença, Carlos Faber resistiu às dificuldades motivado por um sonho. Acreditou no progresso local enquanto muitos, já desiludidos, partiram de Paranavaí. “Outros comerciantes também acreditaram, como João Machado, José de Oliveira, João de Barros e Severino Colombelli. Tudo isso quando as ruas eram abertas a mão, no machado”, ressaltou.
O pioneiro catarinense era amigo de um dos homens mais controversos da história local, o Capitão Telmo Ribeiro. Carlos Faber o considerava um bom homem, com o qual sempre podia contar. “Costumava me oferecer ajuda, mas nunca precisei”, justificou. Aos domingos, o comerciante e o filho Henrique iam até a residência de Telmo Ribeiro, onde passavam a tarde toda conversando. “Ele também aparecia em minha casa para tomar chimarrão”, complementou.
Saiba Mais
Em 1995, o vereador Nivaldo Mazzin criou o Projeto de Lei 59 que deu a uma via de Paranavaí o nome de Carlos Faber em homenagem ao pioneiro. Vale lembrar também que o catarinense recebeu o título de Cidadão Honorário de Paranavaí.
Carlos e Hulda Faber tiveram nove filhos: Henrique, Érico, Carlos Frederico, Frida, Guerta, Adélia, Erna, Hilda e Marta.
Curiosidade
Carlos Faber construiu a primeira casa de alvenaria de Paranavaí, em frente à Praça Dr. Sinval Reis, conhecida como Praça da Xícara.
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O agrimensor que se elegeu prefeito
Ulisses Faria Bandeira venceu a eleição municipal de 1956
O agrimensor Ulisses Faria Bandeira conheceu Paranavaí, no Noroeste do Paraná, em 1939, mas fixou residência alguns anos depois. Foi o primeiro morador a se casar na colônia. Em 1956, se elegeu prefeito e viveu em Paranavaí até os últimos dias de vida.
Ulisses Faria, que nasceu em São Mateus do Sul, no Sudeste Paranaense, se mudou para Londrina aos 17 anos, em 1938, após aceitar um convite do tio Francisco de Almeida Faria para trabalhar na 4ª Inspetoria de Terras do Estado do Paraná.
Bandeira se dedicou muito ao trabalho e logo se tornou o braço direito de Francisco de Almeida, diretor da inspetoria. O ofício, Ulisses aprendeu rápido, e em 1939 foi um dos ilustres convidados a participar da viagem de inauguração da linha Londrina-Fazenda Brasileira, da Viação Garcia.
Em 1942, aos 21 anos, Bandeira retornou à Brasileira, encarregado de demarcar algumas vias. Ao final do trabalho, o agrimensor voltou para Londrina. A oportunidade para fixar residência na futura Paranavaí surgiu em 1944, quando Ulisses Faria assumiu o cargo de diretor da Inspetoria de Terras do Estado, escritório regional de Paranavaí.
Bandeira definitivamente adotou a Brasileira como lar, tanto que em 11 de maio de 1949 se casou com uma moradora local, Balbina Guilherme de Aguiar. Foi o primeiro casamento de Paranavaí. “Naquele tempo, uma das maiores colônias que havia na Brasileira era a Colônia Nº 2, onde é hoje o Jardim Ouro Branco”, relatou Ulisses Faria ao jornalista Saul Bogoni há algumas décadas.
Quando questionado sobre os primeiros pioneiros de Paranavaí, o agrimensor sempre citava a Família Fabrício, José Firmino, Frutuoso Joaquim de Salles, João Clariano e Telmo Ribeiro. “Todos esses eram da época da [Companhia Brasileira de Viação e Comércio] Braviaco”, garantiu o pioneiro.
O prestígio do inspetor de terras junto à população era tão grande que Bandeira foi estimulado a disputar as eleições municipais de 18 de novembro de 1956, concorrendo ao cargo de prefeito. Obteve 4071 votos contra 4029 de Herculano Rubim Toledo. “Foi uma campanha pesada e acirrada”, admitiu.
O agrimensor foi o segundo prefeito de Paranavaí, sucedendo o médico José Vaz de Carvalho. Naquele ano, assumiram como vereadores Aldo Silva, Francisco Rodrigues Ruiz, Gustavo Marques de Oliveira, José Vaz de Carvalho, José de Souza Leite, José Vendolino Schueroff, Minoru Imoto, Nelson Busato dos Santos, Osvaldo Madalozzo e Vivaldo Oliveira. Aldo, Gustavo, José de Souza e Vivaldo já ocupavam cargo na Câmara Municipal, pois foram eleitos em 1952.
Ulisses Faria Bandeira conquistou muita popularidade pelo hábito de interagir com os moradores, principalmente nos finais de semana quando participava de partidas de futebol no antigo Estádio Natal Francisco, localizado onde é hoje a Praça dos Pioneiros. “Joguei de ponta-direita no Atlético Clube Paranavaí (ACP). Eu não era um bom jogador, apenas razoável”, revelou Bandeira que viveu em Paranavaí até os últimos dias de vida.
Saiba Mais
Ulisses Faria Bandeira nasceu em 24 de março de 1921.
A velha jardineira deixou saudades
Catita e Pavão foram os principais meios de transporte em Paranavaí nos anos 1940 e 1950
O antigo ônibus jardineira da Viação Garcia deixou muitas saudades para os pioneiros de Paranavaí, no Noroeste do Paraná. São lembranças que começam em 1939, quando a empresa de transporte londrinense começou a investir na Fazenda Brasileira, atual Paranavaí.
Até 1938, todos os pioneiros que se aventuravam na Brasileira chegavam ao povoado de jipe, caminhão, carroça, cavalo ou a pé. A escassez de estradas, e também o fato da colônia se situar em uma área isolada, fazia com que somente os corajosos viessem para cá.
O pioneiro pernambucano Frutuoso Joaquim de Salles contou em entrevista à Prefeitura de Paranavaí décadas atrás que o povoado estava distante do resto do Paraná. “A gente tinha que viajar até Presidente Prudente [interior de São Paulo], daí lá pegava um trem até Ourinhos e depois a cavalo ou a pé ia pra Tibagi [no Centro Oriental Paranaense]. Dava toda essa volta pra chegar em outras cidades do Paraná”, contou.
Foi assim até 1936, quando o Capitão Telmo Ribeiro reabriu a Estrada Boiadeira ligando Paranavaí ao resto do Paraná. Três anos depois, a iniciativa despertou o interesse do empresário Celso Garcia Cid que viu grande viabilidade comercial no povoado. Em 16 de dezembro de 1939, o empreendedor que atuava no ramo de transportes há cinco anos inaugurou a linha Londrina-Fazenda Brasileira. Naquele dia, Celso Garcia conduziu a jardineira “Catita”, adaptação de um caminhão Ford TT de 1933, até o seu destino.
Segundo o ex-prefeito Ulisses Faria Bandeira, em entrevista à prefeitura há algumas décadas, a viagem teve início às 17h30. “Chegamos aqui por volta das 14h do dia seguinte”, afirmou. Além de Faria Bandeira, entre os passageiros da primeira viagem da Viação Garcia a Paranavaí, estavam o prefeito de Londrina, João Lopes, e o fazendeiro Humberto Alves de Almeida.
Os viajantes logo apelidaram a estrada Londrina-Fazenda Brasileira como “Túnel Verde” por causa da mata densa e virgem que predominava na região Noroeste do Paraná. De acordo com pioneiros, o cenário era tão bonito que chegava a ser inacreditável. Durante o percurso era comum muitos mosquitos e borboletas invadirem a jardineira nas imediações da Capelinha, atual Nova Esperança.
Os insetos circulavam livremente no interior do veículo. “Isso acontecia porque os ônibus eram abertos como bondes”, relatou o pioneiro Oscar Gerônimo Leite. Por um bom tempo, o Governo do Paraná bancou as despesas da Viação Garcia, pois a demanda era pequena e a realização de duas viagens por mês não cobria o investimento.
O “Pavão” da Brasileira
Durante a Segunda Guerra Mundial, o ônibus que mais fez a linha Londrina-Paranavaí era conhecido como “Pavão”. O ônibus movido a gasogênio era econômico, ideal para o período de guerra que ficou marcado pelo racionamento de combustível. Na década de 1940, o veículo chegava a Paranavaí em 16 horas.
Por vários anos, a Viação Garcia transportou passageiros que não tinham condições de comprar passagem. Cada um pagava conforme podia, até mesmo com galinhas. Quando chovia durante a viagem, o motorista encostava o ônibus e amarrava correntes nos pneus para evitar que atolasse. “Lembro que uma vez a gente levou oito dias de Londrina até aqui. Cheguei com os peitos doendo de ajudar a empurrar um carro velho da Garcia pelo picadão”, revelou o pioneiro José Francisco Siqueira, conhecido como Zé Peão.
O pioneiro paulista Paulo Tereziano de Barros disse que nunca se esqueceu das viagens com o “Pavão”. “A gente tinha que atravessar um barro preto lá perto de Mandaguari e depois o areião de Maringá pra cá”, assinalou. Muitos pioneiros chegaram a Paranavaí com a jardineira. Alguns exemplos são o catarinense Carlos Faber, o gaúcho Severino Colombelli e os mineiros Enéias Tirapeli e José Antonio Gonçalves.
Naquele tempo em que as viagens duravam de 17 a 18 horas, o “Pavão” nunca deixou de cumprir a linha, nem quando havia só dois ou três passageiros. Com o passar dos anos, a demanda aumentou e a Garcia quadruplicou o número de viagens. “Em vez de duas por mês, ampliou para duas por semana”, enfatizou a pioneira fluminense Palmira Gonçalves Egger.
Com as jardineiras não chegavam apenas pessoas, mas também informações, conforme palavras da pioneira Inês Colombelli. “Sempre às 11h e às 14h, mulheres e crianças corriam até os ônibus para saber das notícias”, explicou. Era o único jeito da população se informar sobre o que acontecia no Paraná, no país e no mundo.
Frases dos pioneiros sobre a época das jardineiras
Joao da Silva Franco
“A jardineira era velha, não era estofada, e se entrasse de um lado saía do outro.”
Cincinato Cassiano Silva
“O ônibus era todo aberto e só com as bancadas pregadas, e duro que nem pau.”
Salatiel Loureiro
“O fundador da primeira empresa de ônibus da Brasileira foi o Manezinho. Esse coitado acabou em nada e os ônibus dele não aguentavam nem fazer daqui até o Porto São José.”
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