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Lurdinha: “Meu sonho era trabalhar em uma biblioteca”

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Em Paranavaí, Maria de Lurdes dedicou 26 anos à Biblioteca Júlia Wanderley

Lurdinha: “Sempre gostei tanto daquele lugar que eu até falava com os livros”

Lurdinha: “Sempre gostei tanto daquele lugar que eu até falava com os livros” (Foto: David Arioch)

Em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, até o dia 29 de setembro, uma segunda-feira, a rotina da auxiliar de serviços gerais Maria de Lurdes Sousa Silva era acordar às 5h30, chegar à Biblioteca Municipal Júlia Wanderley às 6h40 e preparar o café e o chá às 8h. Tradicionalmente, antes ouvia as notícias da Rádio Cultura e da Rádio Caiuá. “Meu expediente começava às 8h, mas eu fazia questão de chegar bem mais cedo”, comenta Lurdinha, como sempre foi conhecida no trabalho.

Aos 61 anos, a auxiliar de serviços gerais nunca deixou nada passar despercebido. Mesmo no último ano de trabalho, Lurdinha ainda tinha fôlego para limpar a biblioteca, a Fundação Cultural de Paranavaí e o Teatro Municipal Dr. Altino Afonso Costa. “Uma vez fiquei um mês sozinha. Fazia o café da biblioteca e da Fundação Cultural e ainda limpava tudo. Na hora do almoço, para adiantar o serviço, eu cuidava da limpeza dos banheiros”, relata.

A tarde de Lurdinha era dedicada ao Teatro Municipal Dr. Altino Afonso Costa. “Não saía de lá se não estivesse limpo como a minha casa. “Fazia com muito amor e carinho”, garante sorrindo e diz que não se esquece das vezes em que levou água fervendo da biblioteca para a Fundação Cultural. A intenção era ganhar tempo, deixar o cafezinho pronto o mais rápido possível.

Pontual em tudo que faz, Maria de Lurdes almoçava às 11h30, acompanhada da edição do dia do Diário do Noroeste. “Não abria mão disso. Eu ficava doente se não lesse o Diário”, brinca Lurdinha que se tornou muito querida no serviço, onde conheceu bastante gente e fez grandes amizades.

Maria de Lurdes: “Ficava curiosa em ver tanta diversidade nas estantes"

Maria de Lurdes: “Ficava curiosa em ver tanta diversidade nas estantes” (Foto: David Arioch)

Cita como exemplo do bom relacionamento o trabalho colaborativo na limpeza dos camarins do Altino Costa. “Uma colega sempre ajudava a outra, até porque ficamos bem amigas”, comenta e se emociona ao falar que considera os funcionários da Biblioteca Municipal Júlia Wanderley e da Fundação Cultural como parte de sua família.

Só na biblioteca, Lurdinha trabalhou 26 anos. Tudo começou em 1984, quando a Júlia Wanderley funcionava onde é hoje a Câmara Municipal de Paranavaí. “Pedi para a ‘dona Miriam’, mulher do ex-prefeito Pinto Dias, me transferir pra lá porque meu sonho era trabalhar em uma biblioteca. Eu não sabia o que era”, confidencia.

O pedido foi atendido e Lurdinha dedicou 18 anos à Júlia Wanderley. “Mais tarde, me transferiram para o Colégio Municipal Santos Dumont. Depois de quatro anos, voltei para a biblioteca, onde fiquei até me aposentar na semana passada”, explica.

Em tom nostálgico, se recorda com alegria dos tempos em que a Biblioteca Municipal funcionava na Rua Souza Naves, próxima ao Banco Real. “A gente recebia de 150 a 200 alunos por dia. Lá, eu tinha medo de entrar no cofre porque naquele lugar funcionou um banco e um dia um gerente se matou lá dentro por enforcamento”, relata.

Lurdinha passou mais tempo na biblioteca do que em qualquer outro lugar (Foto: Amauri Martineli)

Lurdinha passou mais tempo na biblioteca do que em qualquer outro lugar (Foto: Amauri Martineli)

Ao longo de dez anos, Lurdinha trabalhou aos sábados até as 12h. “Também trabalhei muitos domingos. Isso foi quando não havia internet e os estudantes iam para a biblioteca fazer pesquisas”, justifica e acrescenta que durante a semana a Júlia Wanderley, que chegou a ter dez funcionários, ficava aberta até as 22h para atender a demanda dos estudantes.

O ambiente fez Maria de Lurdes se apaixonar pela leitura. Além de ler nos intervalos, fazia questão de levar revistas e livros para casa. “Ficava curiosa em ver tanta diversidade nas estantes. Comecei a gostar de ler ainda na época das revistas Cruzeiro e Manchete”, destaca e conta que recentemente se encantou lendo o livro “O Menino do Dedo Verde”, do francês Maurice Druon.

Em pouco tempo, aprendeu muito sobre o acervo da biblioteca. Na ausência de alguma funcionária, os frequentadores da Júlia Wanderley tiravam dúvidas com a Lurdinha. “Sempre gostei tanto daquele lugar que eu até falava com os livros. Era uma terapia pra mim ficar em contato com eles”, assegura.

Por muitos anos, Maria de Lurdes Sousa Silva passou mais tempo na Biblioteca Municipal do que em qualquer outro lugar. “Era minha segunda casa. Agora estou numa tristeza muito grande por ter me aposentado. Ainda não me acostumei”, revela.