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Tito o malabarista
“Antes ficava muito triste quando viravam o rosto, fingiam que não me viam”
Um dia, aguardando o sinal verde de um semáforo da Rua Manoel Ribas, no centro de Paranavaí, vi um rapaz agachado na esquina, ajeitando suas bolinhas de malabares dentro de uma mochila. Curioso, estacionei o carro e me aproximei. Sorrindo, ajeitou o boné e me cumprimentou cordialmente, mostrando, sem dizer mais nada, os pulcros desenhos que fez em quatro das seis bolinhas. Tive a impressão de que representavam fases de uma vida. E ele confirmou minha suspeita.
A bolinha número um reproduzia um momento marcante dos seus tempos de bebê, quando era assistido pelo pai enquanto a mãe o embalava nos braços. A bolinha número dois trazia uma imagem dele ainda criança sentado na areia de um parquinho brincando com um caminhãozinho e sendo observado pela mãe.
A bolinha número três o mostrava no início da adolescência, lendo sozinho, sentado no canto de um quarto. E a bolinha número quatro destacava sua partida com uma mochila nas costas, olhando para trás, onde não havia ninguém de quem se despedir. Intrigado, perguntei porque as outras duas bolinhas não tinham desenhos. “É que ainda me vejo na bolinha número quatro. Aquele sou eu hoje”, comentou com um sorriso vaporoso e contraposto ao olhar levemente melancólico.
Tito, sem nome composto ou sobrenome – prefere assim, tem como lar todo lugar e lugar nenhum. Deixou a terra natal no início da adolescência, quando sua mãe morreu de câncer. O pai partiu antes, vítima de um ataque cardíaco. Mora por aí, onde encontra um lugar para dormir. Artista de rua, perambula com a única missão de levar diversão. “É bom demais ver alguém admirando e elogiando seu trabalho. Triste é quando me perguntam se quero um emprego de verdade. Isso machuca. Não sou vagabundo!”, lamentou sensibilizado, acrescentando que tem graduação em artes cênicas.
Magrinho, com a pele bastante queimada pela exposição solar, e cabelos e olhos pretos como erva-moura, Tito nasceu prematuro, aos seis meses. Seus órgãos não se desenvolveram completamente e todo ano ele passa meses internado para fazer tratamento. “Meu coração é diferente do coração de uma pessoa normal. Posso morrer hoje ou amanhã. Por isso vivo cada dia como se fosse o último”, revelou com olhar ensimesmado.
De carona, Tito já viajou para mais de dez países e percorreu todas as regiões do brasil. A sua maior alegria em fazer malabarismo com os mais diferentes objetos é o prazer de ter os olhos voltados para si mesmo por poucos minutos. “É assim que sinto que estou vivo, que existo. Antes ficava muito triste quando viravam o rosto, mantinham os vidros do carro fechados, fingiam que não me viam. Hoje o reconhecimento de poucas pessoas em cada sinaleiro já faz o meu trabalho valer a pena”, declarou.
Por causa dos problemas de saúde, Tito não pensa em casar ou ter filhos. O rapaz demonstra que o medo de se envolver emocionalmente com alguém pode ser maior do que o seu temor perante a morte. “Tudo seria mais doloroso se eu tivesse uma companheira. Seria uma pessoa a mais para sofrer comigo. Juro que não queria morrer, mas isso não depende da minha vontade. Como tenho esses problemas, só me resta seguir na esperança de que eu não deixe de existir antes de desenhar novas fases da minha vida nas minhas últimas bolinhas brancas”, desabafou.
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