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Na essência, não existe nada de errado com o socialismo ou com o comunismo
Na essência, não existe nada de errado com o socialismo ou com o comunismo. O que existe de errado é com o ser humano mesmo, que não suporta a ideia de viver em uma sociedade igualitária, em que já não seria capaz de se destacar pelo que possui. Isso explica inclusive a apropriação ideológica maliciosa.
Até mesmo entre os que fazem caridade há muitos que o fazem porque gostam da ideia de que o outro depende dele, mas se esse outro ascende ao ponto de romper essa dependência, até mesmo o sentimento benevolente da caridade pode ser substituído pela inveja ou pelo desprezo se esse outro equivaler ao altruísta em termos econômicos. Agostinho de Hipona dizia que a caridade é a única verdade, e não duvido, porque desnuda muito sobre nós.
É difícil crer ou sonhar com a igualdade quando se vive em uma sociedade onde muitas pessoas não querem isso. Na realidade, muitas têm inclusive repulsa pela ideia da igualdade. Por isso que hoje eu vejo como padrão mais evoluído e possível politicamente a social-democracia porque sei que o ser humano não está preparado, e talvez nunca esteja, para ver o outro como um igual em tantos aspectos.
Um candidato que desconsidera valores humanos e sociais
Bolsonaro, um candidato que desconsidera valores humanos e sociais, que faz piadas sobre tortura, negros, gays e quilombolas; que acha normal desrespeitar mulheres; que não vê palestinos como cidadãos; que diz que “índio” não tem que viver no mato, mas sim aprender a se virar na cidade (não respeitando valores culturais); que fala em destruir o meio ambiente com a maior naturalidade possível, alegando que temos “áreas de proteção ambiental demais”; que chama caça de “esporte saudável”; que é o primeiro candidato à presidência do Brasil recente a ter apoio massivo das bancadas mais perigosas do congresso (BBB), que sempre colocaram os interesses pessoais e econômicos muito acima dos interesses humanos. Como isso pode ser aceitável?
Nada disso é ser sincero, verdadeiro ou do tipo que “fala o que tem pra falar”, mas sim apenas uma figura arbitrária que ao longo de sua vida não aprendeu a lidar com a pluralidade; alguém que não tem um arcabouço cultural sobre a premência de valores sociais porque esteve sempre imerso em vaidades, veleidades e em uma realidade unilateral. Estou falando de um candidato que foi despejado pelo Exército, que se exalta e fica nervoso diante de contrariedades, que em sua ficha militar consta: “Tinha permanentemente a intenção de liderar os oficiais subalternos, no que foi sempre repelido, tanto em razão do tratamento agressivo dispensado a seus camaradas, como pela falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de seus argumentos.”
Basicamente, uma pessoa que não tem perfil para ser o presidente do quinto maior país do mundo. Como um sujeito que desconsidera valores básicos como o respeito, as diferenças, tem condições de melhorar a realidade de um país? Se você não respeita as diferenças e as margens sociais de uma nação você está fadado a continuar sacrificando pessoas em benefício de interesses que você, na sua ignorância ou indiferença, considera mais urgentes.
Nas sociedades contemporâneas mais evoluídas, o tratamento dispensado às chamadas minorias é sempre um indicativo dos níveis de progresso de uma nação. Porque há um entendimento de que se você respeita “um diferente” você naturalmente respeita “um igual”. Não existe boa economia que beneficie toda uma população quando valores sociais são desconsiderados. Não existe boa economia se isso ofusca ou suprime outros valores. O Brasil precisa é de políticas econômicas que se voltem para modelos de referência como aqueles defendidos pelo sueco Olof Palme, modelos econômicos que consideram os valores humanos e sociais na formulação de um plano econômico, valores que combinam economia justa com bem-estar social.
O que vejo nos discursos e nas propostas do candidato, que me parecem vagas ou confusas, é apenas interesse em sacrificar todos ou quaisquer valores visando elevar a economia sem considerar de que forma isso pode efetivamente beneficiar quem mais precisa, não somente uma pequena parcela da população. Vamos considerar que o candidato consiga elevar a geração de renda. Se a apropriação dessa renda continuar, por exemplo, nas mãos dos 10% mais ricos, não há como alcançar mudanças substanciais, e pelo discurso de desconsiderações de outros valores, não tenho dúvida de que é isso que vai acontecer. O Brasil é um país que só vai ser capaz de melhorar quando a social-democracia for levada a sério.