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A simplicidade como motivação existencial
A Cor do Paraíso inspira emoção sem decair para o melodrama
Em 1999, o cineasta iraniano Majid Majidi lançou o filme Rang-e Khodã que chegou ao Brasil com o título A Cor do Paraíso. A obra, que inspira emoção sem decair para o melodrama, conta a história de um garoto cego que encontra nas pequenas coisas do cotidiano uma razão para viver.
Mohammad (Mohsen Ramezani) contempla as belezas do mundo e se sensibiliza com aquilo que passa despercebido pela maioria. Um exemplo é a sua reação diante da queda de um passarinho. O cineasta Majid Majidi explora o belo por meio de uma esplêndida fotografia. Em muitos momentos a câmera simboliza os sentidos e a idealização existencial de Mohammad. E mais, vai além da beleza física do cenário natural ao amplificar os sons da natureza e transportar o espectador para uma afiguração particular de paraíso.
No mesmo contexto está Hashem (Hossein Mahjoub), um pai tornado infeliz e melancólico que desde a morte da mulher encara o ato de cuidar do filho como uma penitência. A figura paterna, presa a um universo lúgubre e estático – o que é muito bem representado nas tomadas com a câmera parada, é fria e individualista; uma crua metáfora da hipocrisia em uma sociedade arbitrária. Exemplo é a decisão do personagem em se casar com uma jovem mulher e entregar o filho a um carpinteiro cego de quem o garoto deve tornar-se ajudante. Mohammad e o pai vivem realidades distintas que aos poucos se afunilam, tornando-se ainda mais conflitantes.
A princípio, Hashem se limita a assistir a alegria do filho em admirar a natureza. Mais tarde, a satisfação de Mohammad em contemplar o que não vê faz o pai sentir-se perturbado. Na história, uma das cenas mais tocantes, embora com certo caráter teológico, surge quando em um monólogo o pai questiona porque merecera um filho cego. Mais tarde, Mohammad se pergunta por qual razão fora castigado pela cegueira. As duas questões existenciais revelam certa sintonia quando pai e filho estão distantes.
A genialidade do Cego Tom
Thomas Bethune compôs mais de sete mil músicas
Thomas Bethune, mais conhecido como Cego Tom, nasceu em 25 de maio de 1849, no auge da escravidão nos EUA. Filho de Domingo Wiggens e Charity Greens, um casal que sofria de deficiência visual e mental, Tom foi considerado inútil por seu mestre branco, o coronel James Bethune, de Columbus, na Georgia. Por isso lhe autorizaram a permanecer com a mãe, uma empregada doméstica que trabalhava na casa principal da fazenda.
Ainda pequeno, Thomas se sentiu atraído pelos sons de piano em um salão onde os sete filhos do coronel estudavam música e canto. Com cinco anos, o garoto que sofria de cegueira já reproduzia com facilidade as sequências de acordes que ouvia no piano. No ano seguinte, aprendeu a improvisar e compor. Reconhecido pela genialidade, era capaz de reproduzir qualquer composição, nota por nota, depois de ouvi-la apenas uma vez. À época, o professor de música dos filhos de Bethune disse que as habilidades do garoto estavam muito além da compreensão. Quando soube disso, o coronel decidiu explorar o jovem prodígio.
Em 1858, afastou o garoto da família e contratou um promotor de shows que o levou para realizar quatro concertos por dia em centenas de cidades. Thomas tocou até na Casa Branca para o presidente estadunidense James Buchanan que o definiu como “um grande pianista cujas habilidades superaram Mozart”. Em janeiro de 1861, Tom e o empresário retornaram à Georgia, onde todo o dinheiro arrecadado em cada um dos eventos que o garoto tocou foi usado para financiar a causa confederada durante a Guerra da Secessão. Uma das composições mais famosas do pianista é a “Batalha de Manassas”, baseada em relatos sobre a Guerra Civil. Por muito tempo, a música marcada por um enfático aumento gradual de volume foi uma das composições mais ouvidas no Sul dos EUA.
Ao final da guerra, James Bethune assinou um contrato com os pais de Tom, se comprometendo a repassar 500 dólares por ano, além de oferecer comida e abrigo ao garoto até os 21 anos. Enquanto isso, Bethune guardou para si a fortuna conquistada com a genialidade de Thomas. Através de manobras legais, conseguiu se tornar o tutor legal do rapaz, o que facilitou levá-lo para se apresentar por toda a Europa, além do Canadá e América do Sul.
Embora fosse enganado pelo coronel, o prestígio de Tom chegou a ponto do escritor Mark Twain cantar em sua homenagem. Thomas Bethune foi ainda mais longe e dominou instrumentos como corneta, trompa e flauta, chegando a um repertório autoral de mais de sete mil músicas. Tom, que recebeu pouco dinheiro pelas suas obras e concertos, passou os últimos dias de vida em reclusão, tocando piano em Hoboken, Nova Jersey, onde morreu em 3 de junho de 1908. Quem visitar o Brooklyn, em Nova York, pode localizar o seu túmulo no Cemitério de Evergreen.
Referência: Livro Crossroads of Conflict.