Archive for February, 2012
Fique em paz, meu amigo Baton
Uma homenagem ao meu amigo e ex-presidente da torcida Caldeirão Atleticano
No dia 4 de fevereiro de 2012, sábado, um faleceu em Paranavaí, no Noroeste do Paraná, o ex-presidente da torcida organizada Caldeirão Atleticano, Anderson Souto, o Baton, vítima de um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico. O enterro realizado em um domingo reuniu muitas pessoas, entre amigos, familiares, colegas de trabalho e torcedores do Atlético Clube Paranavaí (ACP).
Em sua homenagem, decidi escrever algo que foge do padrão de uma matéria, se aproximando mais de um relato pessoal, das impressões e experiências que tive ao longo de 12 anos como amigo do Anderson, uma pessoa que ao longo da curta vida se tornou muito conhecido, embora poucos o conhecessem bem.
Fui apresentado ao Baton em 2000, quando ele já tinha amizade com o meu irmão mais velho, Douglas, com quem estudou no Ensino Médio. Frequentava a nossa casa regularmente; era muito brincalhão, em diversos momentos beirando a inocência, o que facilitava a conquista de novos amigos. Tinha uma vida pautada pela música, tanto é que muitas das camisetas usadas no dia a dia traziam estampas com logos e desenhos de bandas de rock e heavy metal. Gostava muito de cultivar um visual que exteriorizasse suas preferências culturais.
À época, tínhamos uma turma que se reunia com certa frequência para ouvir música e conversar sobre o assunto, além de outros temas. Eram momentos de descontração, mas que faziam a diferença na vida de todos. Saíamos para comprar discos e depois emprestávamos uns aos outros para fazer cópias em fitas cassete. A banda preferida do Baton, com certeza, era o Iron Maiden, inclusive foi o maior fã que já conheci. E acredito que um dos momentos mais inesquecíveis de sua vida foi assistir Bruce Dickinson e companhia no Rock in Rio de 2001. Tinha a discografia completa, e lembro como se fosse hoje quando peguei todos os seus discos emprestados para tirar cópias.
Sempre que vinha em casa e entrava no meu quarto, ele gostava de mexer na minha coleção de filmes. Ficava um bom tempo entretido, e não saía daqui sem levar algum título que depois devolvia com um pequeno sinal de X feito à caneta. Eu brincava dizendo ao Baton que estava estragando meu acervo. Respondia rindo: “É só pra eu saber depois quais filmes já assisti, e não pegar repetido.”
Também não foram poucas as vezes que o Anderson nos visitou para assistir o Fúria MTV transmitido aos domingos, dedicado aos clássicos e lançamentos do mundo do heavy metal. Quando ele e os outros perdiam o programa, eu e meu irmão emprestávamos as gravações feitas em VHS. Passávamos horas assistindo videoclipes – era um vício saudável. A música contagiava tanto que em um prédio comercial ao lado de casa nasceu a banda TomBaDo, formada pelo vocalista Baton, o guitarrista Douglas, o baixista Tom e o baterista Adriano que faziam releituras de muitos clássicos do rock, mas ganharam mais popularidade tocando covers da banda de rock cristão The Flanders.
De vez em quando o Anderson me chamava para ir até a casa dele formatar o disco rígido. Naquele período, eu e meu irmão éramos os “formatadores” voluntários oficiais da turma. Em paralelo, muita conversa, lanches e música – praticamente, a base da amizade. Não é difícil lembrar do Baton sorrindo, era quase como uma caricatura animada. Transmitia alegria até quando não se sentia muito bem – sua maneira peculiar de enfrentar os problemas. Brincava muito e gostava de fazer piadas. Só que também era muito sincero, tinha uma personalidade forte, não se privando de emitir opiniões, mesmo que contrárias aos demais. Chegou a ter alguns conflitos até com amigos. Entretanto, sempre era algo passageiro, predominando uma relação de respeito.
Baton era do tipo que não simplesmente ouvia música, também colecionava muitas revistas sobre o assunto. Gostava de adquirir conhecimento; isso o enchia de satisfação e representava consideração e respeito aos gêneros e bandas preferidos, algo de que se orgulhava. Também era aberto a outros estilos musicais, achava importante ter um constante aprendizado sobre a arte, indo além da obviedade. Adorava ir a shows e alguns assistimos juntos. Irradiava contentamento quando ficava em meio a tanta gente com afinidades semelhantes. Para ele, uma forte sensação de lar.
Com relação ao Atlético Clube Paranavaí (ACP), Anderson Souto foi um dos torcedores que injetou ânimo nos frequentadores do Estádio Waldemiro Wagner. Onde o time ia, lá estava o presidente da Caldeirão Atleticano que não se mantinha quieto por nenhum minuto, como se empurrar o clube e estimular a torcida fosse sua missão em cada partida. Não se importava em tirar dinheiro do bolso para investir na Caldeirão. Se destacava também por acompanhar o Atlético em todos os jogos, locais ou fora.
Me recordo de algumas partidas há alguns anos com o estádio relativamente vazio e o Baton na arquibancada, tendo a frente a faixa da torcida. Pulava e balançava uma bandeira já desgastada pelo tempo e por tantas lavagens. Desconheço alguém que amasse tanto o Vermelhinho quanto o Anderson. Ele saiu muitas vezes do estádio resfolegando e sem voz, de tanto gritar. Vivia cada momento do jogo na plenitude. Dava risadas, gargalhava, fazia caretas, se irritava, xingava, enfim, transmitia vida nas suas mais variadas formas.
Em 2007, quando eu trabalhava no jornal “O Diário do Norte do Paraná”, de Maringá, fiz uma matéria sobre a campanha do Paranavaí e a Torcida Caldeirão. Naquele dia, Anderson me disse que a campanha toda do Vermelhinho em 2003 não foi tão empolgante quanto a vitória de 2 x 1 sobre o Atlético Paranaense no dia 7 de fevereiro, referindo-se ao fato do ACP não vencer o Furacão desde os anos 1990. Reclamava muito do despreparo da arbitragem paranaense e também do afobamento dos jogadores do Paranavaí que em certas temporadas entravam em campo de forma muito agressiva, comprometendo a formação do time.
Quem imaginaria, meu amigo, que você morreria de forma tão precoce, aos 29 anos, deixando a esposa e um filho de três anos, o Derrick, a sua própria extensão que já nasceu homenageando o vocalista de uma banda de thrash metal que você tanto admirava – Sepultura. Devo dizer que eu, assim como outros, não tinha mais tanto contato com você. Surgiram mais responsabilidades e cada um teve de seguir um novo caminho. Entretanto, o carinho, respeito e admiração sobrevivem. O que marca as nossas vidas são justamente aquelas memórias inesquecíveis e indeléveis que carregamos para todos os lugares, sejam materiais e imateriais. Sua existência será eternizada através de todos aqueles que o amam, respeitam e admiram.
Vídeo de um dos primeiros ensaios da banda TonBaDo
Artista deixa de lucrar para ajudar jovens da Vila Alta
Luiz Carlos Prates: “Quero que façam trabalhos muito melhores do que os meus”
O artista plástico Luiz Carlos Prates, referência na arte de manipular madeira, está ensinando artesanato a 12 crianças e adolescentes na Vila Alta, em Paranavaí. As aulas realizadas em período integral às segundas, terças e quartas-feiras exigem muita dedicação, tanto que o artista produz menos para garantir que os alunos aprendam o máximo possível. “Continuo na ativa porque preciso vender minhas peças para comprar o material usado na instrução deles. Às vezes, conseguimos algumas doações”, comenta Prates.
Nos três primeiros dias da semana, o artista deixa de lucrar para dar toda atenção aos alunos. “Quero que façam trabalhos muito melhores do que os meus. Me envolvo de coração com eles, tanto que a minha principal preocupação sempre foi tirá-los das ruas. Como são crianças vulneráveis, faço de tudo para evitar que se entreguem ao mundo do crime e das drogas”, explica Luiz Carlos que é muito respeitado no bairro por pessoas de todas as faixas etárias. Como incentivo, os alunos levam para casa as peças produzidas, ou seja, podem doá-las ou vendê-las, se preferirem. “Quando querem vender, são melhores que eu”, afirma Prates enquanto sorri orgulhoso, ladeado pelos alunos que o consideram um avô.
Quando encontra uma criança à toa na rua, o artista logo pergunta se tem interesse em aprender artesanato e justifica os benefícios. Recentemente, conquistou a parceria da psicóloga Cristina Pontes que uma vez por semana atende os alunos como voluntária. “Pretendo construir um pequeno escritório ao lado do atelier para que ela possa falar com eles aqui mesmo e individualmente”, destaca Luiz Carlos, lembrando que o projeto se desenvolveria com mais facilidade se conseguissem patrocínio para custear os lanches dos alunos e também a aquisição de ferramentas.
Entre os aprendizes estão Gustavo de Jesus Souza, 13; William Viana Castro, 15; Alisson Ferreira França, 15; Danilo Medeiros França. 12; Welinton Silva, 13; Daniel Pereira Silva, 10; Luan Guilherme Moraes, 15; e Éderson França de Melo, 12. Gustavo é o primeiro aluno do projeto no qual ingressou há oito meses. Produziu mais de 20 peças. “Gosto muito daqui. Prefiro trabalhar com madeira, e já fiz copo, concha, cinzeiro, casa, cadeira e carrinho que foi o mais difícil”, revela. Quem quiser contribuir com o projeto pode ligar para (44) 3422-7635.
Artista plástico Antonio de Menezes cria réplica do 14-Bis
Antonio de Menezes levou dois meses para criar o avião híbrido
O artista plástico Antonio de Menezes Barbosa, conhecido por produzir muitas obras com materiais descartados, principalmente galhos e pedras, recentemente concluiu a criação de uma réplica do avião experimental 14-Bis, de Alberto Santos-Dumont.
Com mais de 30 anos de experiência como artista, Menezes conta que sempre teve vontade de confeccionar um avião que pudesse servir de referência para as crianças estudarem matemática, desenho mecânico e história, além de estimular a capacidade inventiva. “Foram dois meses dedicados ao 14-Bis, e 80% dos materiais usados comprei em ferro velho. Boa parte é reciclável”, explica o artista que aproveitou restos de bicicleta, cantoneiras e antenas parabólicas.
O avião de quase 28 metros chama atenção pelo tamanho, tanto que dá a impressão de ser pesado. Mas ao contrário do que parece, é bem leve, de fácil mobilidade e transporte, com estrutura semelhante a de um planador. Se tiver dúvidas, basta balançá-lo, segundo o autor. A hélice que se move até mesmo com uma brisa chega a girar por horas de forma ininterrupta. “O que me deu mais trabalho foi a traseira do 14-Bis e o trem de pouso”, admite o artista que esculpiu a hélice com uma madeira bem leve.
A roupagem do avião é baseada em banners de plástico grosso que dificilmente rasgam, mesmo com fortes correntes de ar. A obra ainda ganhou virabrequim, pistões e outras peças que tornaram o avião mais fiel ao original. “Por enquanto, ele só não voa”, brinca Menezes que já conquistou boa popularidade no Noroeste Paranaense, com excelente repercussão de suas obras no Museu da Bacia do Paraná, em Maringá, onde contou com a curadoria da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Algumas criações do artista que já foi elogiado e reconhecido até na Itália são mais objetivas, já outras mais complexas, com predominância para a arte autoral recheada de críticas sobre a conduta humana, sociedade e modernidade. Para mais informações sobre o trabalho de Antonio de Menezes, basta ligar para (44) 3045-7750.
Curiosidade
O avião 14-Bis foi criado em 1906, como um híbrido de aeroplano e balão.
Contribuição
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O homem de mais de 2,5 mil obras
José Mário: “O desenho é um desabafo mental”
Em 1984, o artista plástico paranavaiense José Mário Afonso Costa descobriu no desenho uma forma de materializar e canalizar emoções e sentimentos. Os traduziu com caneta em formas retas, mais tarde sinuosas, que se tornaram subjetivas e ganharam novas dimensões.
Para o artista, grande admirador de Pablo Picasso, a despreocupação com a objetividade na arte representa a complexidade da vida, a gradação do homem. Guiado pelo subconsciente, às vezes, José Mário intitula uma obra antes mesmo de criá-la. Não se prende aos rótulos, correntes artísticas, e preza pela liberdade intelectual como sendo a fórmula mais completa de se aproximar da essência humana.
Ao longo da entrevista, se mostra inquieto, embora detalhista, enquanto discorre sobre arte, cultura, família e formação artística e profissional. O artista se preocupa em agradar, mas tem opiniões próprias, questiona e fala abertamente sobre qualquer assunto. Algumas perguntas são respondidas com brevidade, já outras, “Zé Mário”, como é mais conhecido, não responde sem antes situar um contexto, levantar da cadeira e contar alguma história do presente ou passado.
Gosta de conversar sem pressa, é observador, e não se priva de manter o diálogo em um nível que mostre se o interlocutor entende algo de arte e também das suas obras. Passamos alguns minutos interpretando um dos desenhos do artista, um universo de curvas, onde o homem também é animal, vegetal, objeto material e imaterial. Confira abaixo os principais trechos da entrevista com o autor de mais de 2,5 mil obras.
DA – Como foi o primeiro contato com o desenho?
JM – Comecei em 1984, motivado pelas figuras que mais me chamavam atenção nos livros do meu pai. Tinha 14 anos e mudei para Curitiba pra fazer o Segundo Grau [Ensino Médio]. Me interessei pelo abstrato e depois pela arte figurativa. Mais tarde, fui para Presidente Prudente [interior de São Paulo]. Estudei medicina por dois anos e meio, mas abandonei o curso. Também passei pela Fafipa.
DA – São experiências que se refletem nas suas obras?
JM – Sim. Foi um período em que obtive muito conhecimento, estando em contato com a arte ou não, até porque passado algum tempo decidi trabalhar com meu irmão no nosso sítio em Santa Maria, perto de Alto Paraná.
DA – Todas essas transformações interferiram na dedicação à arte?
JM – Meus desenhos eram mais compactos, então fui ampliando, aumentando a dimensão, tendo um cuidado maior com as formas, só que sempre chegava o momento de me desligar disso tudo. Ficava dois meses por ano envolvido com desenho e o restante me dedicando a outras atividades bem diferentes.
DA – Nos seus trabalhos, as curvas parecem representar um novo ciclo, a ruptura com a linearidade. Você encara o rompimento com as linhas retas como resultado do seu amadurecimento?
JM – Sim. No começo meus desenhos eram mais infantis. Isso mudou só mais tarde, principalmente após o falecimento do meu pai que era uma inspiração pra mim. Sempre fui muito observador, e prefiro desenhar com naturalidade, sem planejamento. Quando começo algo, dificilmente sei como vai terminar porque minha principal referência é o que está no meu subconsciente.
DA – Quais as artes que mais o inspiram a desenhar?
JM – Já desenhei muito ouvindo música, chego a dar nome de canções aos meus desenhos. Também tem muito cinema no que faço, inclusive uma referência ao martelo do filme The Wall, do Pink Floyd. Nos tempos da faculdade, produzia muito enquanto os professores passavam filme em sala de aula.
DA – Já teve preferência por alguma corrente artística?
JM – Não. Já produzi muito, mas nunca me rendi a nada. Jamais tive preocupação em simplificar o que faço porque o desenho pra mim é um desabafo mental. O que crio à noite é diferente do que produzo durante o dia.
DA – Das 2,5 mil peças já produzidas, muitas estão fora de Paranavaí?
JM – Que me lembre, além de Paranavaí, tenho desenhos em Curitiba, Rondonópolis [no Mato Grosso], Campinas [São Paulo], Paraíso do Norte. Me lembro de quando ilustrei o livro do meu pai [o escritor Altino Afonso Costa que empresta nome ao Teatro Municipal de Paranavaí], Buquê de Estrelas. Nessa época, aprendi a ser mais detalhista.