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Por que enterra os seus?
Uma breve discussão entre dois amigos na França de 1930
“Olho para o chão e me pergunto, por que o homem que anseia por um paraíso etéreo e enxerga a vida como mera passagem terrena enterra os seus? Parece-me demasiado contraditório se levarmos em conta a fabulosa crença de Tártaro abaixo de nossos pés. Qual é a lógica de enterrar os seus quando a profundidade do espaço terreno é o símbolo burlesco do mundo inferior? O que busca o homem? Um eterno banho no Flegetonte?”, questionou o francês François Schieu ao deslizar a mão direita pelo queixo.
O ucraniano Nikolai Ludovitch, estático e atento às palavras do amigo, revelou jamais ter pensado a respeito. “É uma pergunta interessante, mas qual seria a solução mais plausível? Cemitérios edificados com cinquenta ou cem andares para resguardarem seus falecidos? É possível distender sentidos peculiares e simbólicos, já que estariam mais próximos da região superior, onde se movem os astros.”
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O cão que foi promovido a sargento
Stubby participou de 17 batalhas na Primeira Guerra Mundial
O estadunidense Stubby, nascido em 1916 e falecido em 16 de março de 1926, foi o cão de guerra mais condecorado na Primeira Guerra Mundial, inclusive o único promovido a sargento. Encontrado no campus da Universidade Yale em 1917 pelo soldado John Robert Conroy, Stubby era de raça desconhecida. Alguns diziam que era uma mistura de Boston Terrier e Pit Bull. Já outras fontes afirmavam que era um puro Olde Boston Bulldog.
Em seu obituário consta “Bull Dog”, o que nos EUA significava o mesmo que Bull Terrier Americano ou Pit Bull Terrier. Quando a unidade de Conroy foi enviada à França, Stubby foi junto a bordo do navio SS Minnesota. O cão serviu na Infantaria 102, Divisão Yankee 26, nas trincheiras francesas ao longo de 18 meses. Participou de quatro ofensivas e 17 batalhas. Entrou em combate pela primeira vez no dia 5 de fevereiro de 1918 em Chemin des Dames, ao norte de Soissons. Por mais de um mês, esteve sob fogo constante, dia e noite. Stubby foi atingido pela primeira vez em abril de 1918, quando estilhaços de uma granada arremessada pelos alemães lhe feriram o antebraço.
Assim que se recuperou, voltou às trincheiras. Stubby aprendeu a avisar as unidades de ataque sobre a presença de gás venenoso, além de localizar soldados feridos nas terras de ninguém. Ouvia o som de entrada de cada artilharia inimiga antes de qualquer soldado. Stubby foi o responsável pela captura de um espião alemão na Floresta de Argonne. Quando os estadunidenses retomaram a área de Château-Thierry, as mulheres da cidade o agradeceram confeccionando um casaco de camurça adornado por medalhas. Dizem que o cão chegou a evitar que um garoto fosse atropelado por um carro em Paris.
Ao final da guerra, quando retornaram para casa, Stubby se tornou uma celebridade e marchou em muitos desfiles por todo o país. Se reuniu com presidentes como Woodrow Wilson, Calvin Coolidge e Warren G. Harding. Em 1921, Conroy foi para a Georgetown University Law Center e Stubby se tornou o mascote do time de futebol Georgetown Hoyas. Divertiu muitos torcedores empurrando a bola ao redor do campo.
O cão faleceu nos braços de John Robert Conroy em 1926. Após 80 anos, em 11 de novembro de 2006, Stubby foi homenageado com um tijolo na Calçada da Honra do Liberty Memorial, em Kansas City, onde há o maior monumento em lembrança aos heróis da Primeira Guerra Mundial.
Fontes: History Wired. Stubby, World War I Canine Hero 1921. Smithsonian Institution.
The Price of Freedom: Americans at War – Stubby. Smithsonian Institution.
Stubby the Military Dog. Connecticut Military Department. July 16, 2003.
O Velho Barbanço
Português se passou por francês para acompanhar amigo na Primeira Guerra Mundial

Na guerra, Manuel da Silva Barbanço era Jean Marceau Bonnet, um soldado do 5º Exército Francês (Foto: Reprodução)
É raro encontrar alguém que já tenha ouvido falar no Velho Barbanço, um misterioso imigrante português que viveu muitos anos em uma recôndita fazenda entre Paranavaí e Alto Paraná, no Noroeste do Paraná. Barbanço se passou por francês para acompanhar um amigo na Primeira Guerra Mundial e anos depois partilhou a maior parte da herança com os mais humildes.
A infância
Manuel da Silva Barbanço nasceu na Freguesia de Barcelos, em Portugal, no ano de 1896. Aos 12 anos, fugiu de casa por causa dos maus tratos do pai que tinha a conivência da mãe subserviente. Em Lisboa, o então jovem Manuel, inebriado pelos cartazes que exaltavam as belezas de Paris, decidiu partir para a França. Na Estação de Trem de Santa Apolónia tentou convencer dezenas de passageiros a levá-lo junto, porém só um concordou. Era um caixeiro-viajante de menos de 30 anos que percorria a Europa comercializando cigarreiras e perfumes. “O sujeito estava com duas malas grandes. Uma cheia e a outra vazia. Com um forte sotaque francês, falou que o levaria, mas o garoto teria que se esconder dentro da mala vazia”, contou o aposentado Amácio da Costa que durante anos trabalhou como “faz-tudo” para Barbanço.
Franzino, Manuel entrou na mala e permitiu que o homem a fechasse. A viagem levou horas e mesmo assim o garoto se manteve calado, respirando por um pequeno vão. “O Velho Barbanço me contou que estava tão frio que conforme respirava pela boca o ar que saía da mala criava forma”, disse Costa. Quando chegou a Paris, Manuel agradeceu e os dois se despediram. Na Avenida Champs-Élysées, não muito distante do Arco do Triunfo, Barbanço conheceu um português que vivia num cubículo no Montmartre e explorava o trabalho infantil de dezenas de crianças, colocando-as para engraxar os sapatos dos turistas que visitavam a Torre Eiffel. “Eles trabalhavam em troca de comida e moradia”, relatou o aposentado.
A amizade com Bulle
Ingênuo, Manuel foi coagido e trabalhou para o homem por vários meses, até que um dia fugiu de madrugada. Por questão de sobrevivência, Barbanço aprendeu a falar francês. Naquele tempo, não fluentemente, mas o suficiente para se virar. Fez bicos para turistas até os 16 anos, quando conheceu Bulle, um órfão francês que trabalhava de auxiliar de limpeza num restaurante de culinária mediterrânea na região do Jardim de Luxemburgo. “Era um rapaz mais velho, de 21 anos, que se tornou o irmão que Barbanço nunca teve”, comentou Amácio da Costa.
Em 1914, Bulle e Manuel estavam trabalhando juntos como carregadores de malas de um hotel situado no Montparnasse quando souberam da convocação para a Primeira Guerra Mundial. Bulle, que se chamava Pierre Livereaux, foi obrigado a se apresentar ao serviço militar. Com receio de ficar sozinho novamente, Barbanço implorou para que Bulle o ajudasse a conseguir documentos falsos para acompanhá-lo. Livereaux resistiu, mas acabou cedendo e ajudou o amigo que à época tinha 17 anos. “Sei disso porque o Velho Barbanço tinha um diário em que anotava tudo. Era muito preciso e detalhista sempre que relatava algo”, afirmou o aposentado que viu os falsos documentos franceses do português.
Na guerra, Manuel da Silva Barbanço era Jean Marceau Bonnet, um soldado do 5º Exército Francês que participou da Batalha de Charleroi em 21 de agosto de 1914, quando os alemães invadiram a Bélgica. Questionado sobre a experiência na guerra, Barbanço disse o seguinte a Amácio da Costa no início dos anos 1960: “Nunca tinha segurado uma arma na vida e tudo que eu sentia era medo, tremia mais que vara verde. Quem passava por mim nem percebia, pois estávamos todos na mesma situação. Éramos crianças e o temor era tão absurdo que ao longe os alemães sentiram o cheiro do nosso pavor”, confidenciou Manuel da Silva Barbanço, referindo-se à derrota francesa na Batalha de Sambre.
O horror da Primeira Guerra Mundial
Algumas lembranças do episódio vivido pelo português foram reproduzidas em grandes folhas de papel já amarelecidas e deterioradas pelo tempo que Costa ganhou do ex-soldado em 1962. “Anos depois, pedi pra minha neta copiar o conteúdo, mas deu pra recuperar pouca coisa”, garantiu Costa, mostrando as informações registradas. No relato, Barbanço revelou que quando a ofensiva alemã, que estava em maior número, os atacou, só ouviu um companheiro gritar algo como: “soins, soins, sont mis à nous tirer dessus” que significa “cuidado, cuidado, começaram a atirar em nós”. O jovem soldado deitou rapidamente no chão. Quando se levantou, olhou para trás e viu o amigo Bulle caído no chão, morto, com o corpo cravejado de balas de aproximadamente oito milímetros.
Barbanço conteve o desespero enquanto observou a multidão de cadáveres que se amontoaram diante de seus olhos, além de dezenas de jovens ainda vivos, mas caídos, implorando por ajuda. “A situação era horrível. Aqueles que estavam em estado muito grave foram deixados para trás. Quando me contou, também mostrou fotos da guerra e seus lábios tremeram até que levou a mão à boca para conter o choro. Disse que jamais na vida dormiu sequer uma noite sem pensar na guerra”, enfatizou o aposentado, lembrando que mais tarde Barbanço se retirou da zona de conflito, sem ter usado qualquer arma. Horas depois, se afastou da infantaria francesa e voltou para o local onde foi deixado o corpo do amigo.
Mesmo sabendo que a área estava dominada pelos germânicos, seguiu em frente. Quando viu um soldado alemão morto o despiu e trocou a farda francesa pela alemã. Logo que os alemães se dispersaram, o português carregou Bulle até as margens do Rio Sambre. Lá, Barbanço lavou o corpo do amigo, o abraçou e em seguida o enterrou. Da Bélgica, Manuel Barbanço retornou à França, onde morou até os 32 anos.
O reencontro com o avô
Mais tarde, imigrou para a Espanha e para a Itália, até que retornou a Portugal, onde soube que o avô, um aristocrata lusitano com quem perdeu contato no princípio da infância, o procurava há anos. Com a saúde debilitada, o homem convidou Manuel para morar numa propriedade em Funchal, na Ilha da Madeira. Barbanço viveu com o avô até 1945, quando o aristocrata faleceu, vítima de pneumonia. Com a morte do único familiar com quem teve uma profunda relação de afeto, Manuel da Silva Barbanço decidiu partir novamente. Antes, aguardou a execução do testamento do avô que lhe destinou uma herança que hoje equivaleria a pelo menos R$ 3 milhões.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, em outubro de 1945, Barbanço se juntou a centenas de imigrantes portugueses em um navio para o Brasil. Escolheu uma embarcação que reuniu somente pessoas de origem humilde que buscavam melhores condições de vida em terras tupiniquins. “Ele levou uma pequena mala com roupas e, como não sabia qual era a moeda brasileira, carregou uma enorme com mais da metade da herança em dólares”, salientou Costa. Numa madrugada, enquanto muitos estavam dormindo, Barbanço distribuiu boa parte do dinheiro entre as malas, bolsas, sacos e sacolas dos passageiros. No dia seguinte, ninguém entendeu o que tinha acontecido, mas as expressões nos rostos dos imigrantes eram tão cheias de esperança e alegria que o anônimo Manuel da Silva se sentiu parte de algo maior que a vida, segundo palavras de Amácio da Costa.
A partilha da herança com os mais humildes
Quando a embarcação atracou em Santos, Barbanço desceu pelas ruas do porto, onde foi abordado por um garoto de aproximadamente 12 anos que ofereceu-lhe ajuda em troca de algumas moedas. O português aceitou e pediu auxílio para pegar um trem com destino a São Paulo. Antes de embarcar, Manuel sugeriu que o garoto fechasse os olhos. “Barbanço colocou um saco de dinheiro na mão daquela criança e desapareceu dentro do trem”, assegurou. Da capital paulista, o português contratou os serviços de um motorista que o levou até Presidente Prudente, onde Barbanço quase comprou uma fazenda. Mudou de ideia quando conheceu um engenheiro agrônomo que falou-lhe sobre as terras virgens do Noroeste do Paraná.
Manuel adquiriu um jipe e se aventurou pelo Paraná. Depois de dias de viagem, chegou a Paranavaí, onde comprou uma fazenda a treze quilômetros do perímetro urbano. “Ele tinha um estilo de vida eremita, não ia pra cidade. Gostou muito daqui porque lembrava a calmaria e o sossego da terra do avô, na Ilha da Madeira”, ressaltou o homem que conheceu o português em 1955, quando deixou Londrina e se mudou para Paranavaí. O caminhão que trouxe os pertences do aposentado quebrou em frente à propriedade de Barbanço. Costa foi pedir ajuda e recebeu uma proposta de emprego.
Amácio da Costa trabalhou como “faz-tudo” para o português a quem considerava um pai até 1972, ano em que Manuel Barbanço transferiu-lhe a escritura de uma propriedade vizinha. “Num domingo chegou um homem na minha casa, me trouxe um título de terras acompanhado de uma carta de agradecimento pelos serviços que prestei ao longo de 16 anos. Não entendi direito e fui até a fazenda do português. Quando cheguei lá, o homem tinha sumido, ninguém nunca soube o que aconteceu. É possível que tenha partido para algum lugar onde outras pessoas precisavam de ajuda”, cogitou o aposentado com um sorriso e um olhar disperso no tempo.
Curiosidades
O apelido Velho Barbanço foi dado pelo próprio Amácio da Costa, pois o português tinha a barba, os cabelos e pelos das sobrancelhas brancos.
Para ser aceito pelo Exército Francês e justificar o sotaque, Manuel da Silva Barbanço falou que era francês, mas que foi criado pelo avô em Portugal.
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O dom de talhar a madeira
Olegário aperfeiçoou as habilidades como carpinteiro e se tornou um mestre em talhar madeira

Artesão é especialista em esculturas de madeira (Foto: David Arioch)
Há 28 anos, Olegário José dos Santos, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, aproveitou as habilidades como carpinteiro para reproduzir uma obra de arte. O resultado foi tão positivo que desde então se dedica a criar placas, quadros e esculturas, peças que já foram comercializadas em muitos estados do Brasil e em outros países.
Tudo começou em 1981, quando “Seu Olegário” trabalhava como mestre de obras e marceneiro. À época, a habilidade em talhar madeira despertou no artista o desejo de fazer algo mais do que criar apenas produtos funcionais. “Vi um trabalho e decidi produzir também. Comecei a fazer esculturas e não parei mais. Tem peças minhas nos Estados Unidos, Japão, França, Espanha, Argentina, Costa Rica e Portugal”, diz o artesão em tom de orgulho.
Houve um período em que Santos participava de feiras agropecuárias com o intuito de divulgar e também comercializar as peças que produzia. “Em exposições no Paraná e São Paulo, eu vendia pelo menos 10 placas para fazenda e ainda levava trabalho pra casa. A procura era grande”, explica o artista plástico que já participou de exposições agropecuárias em Paranavaí, Maringá, Umuarama, Londrina, Foz do Iguaçu, Santo Antônio da Platina, Wenceslau Braz, Maringá, Ourinhos, Votuporanga, Presidente Prudente e Assis. Santos também vendeu muitas peças no litoral de Santa Catarina, principalmente pequenos artigos.
Independente do tamanho da obra, seja um chaveirinho feito na hora e vendido por R$ 4 ou um altar de R$ 7 mil que levou 90 dias para ser produzido, a verdade é que depois do trabalho concluído sempre surge o momento de fruição. “Sinto prazer em criar qualquer coisa”, enfatiza Seu Olegário que preza pela riqueza de detalhes. O perfeccionismo está embutido em cada uma de suas esculturas; nas formas e nas curvas que tiram do anonimato pedaços de cedro e cerejeira que provavelmente seriam transformados em produtos em série, como móveis.

Olegário dos Santos: “Sinto prazer em criar qualquer coisa” (Foto: David Arioch)
“São ótimas madeiras para o trabalho que desenvolvo. Só uso outros tipos para fazer placas de fazenda”, informa e acrescenta que a cerejeira é trazida de Rondônia. Uma das especialidades de Seu Olegário é a criação de esculturas de imagens de santos, talento que combina com o sobrenome do artista. “Tenho algumas obras disponíveis para venda. São réplicas de São Expedito, São José, São Paulo e Nossa Senhora Aparecida”, destaca o escultor que está sempre aberto a encomendas e comercializa esculturas pelos mais diversos preços. Quem quiser conhecer de perto o trabalho do artista, pode vistar o seu atelier na Avenida Heitor Alencar Furtado, em frente ao trevo de acesso à Vila Operária.
Saiba mais
Cada escultura leva em média 30 dias para ficar pronta e um quadro é concluído em quatro dias.
O artista plástico Olegário José dos Santos também pode ser encontrado na Rua Augusto Fabretti, 877 – Jardim Alvorada do Sul, Paranavaí. Ou pelo telefone: (44) 3423-4633