David Arioch – Jornalismo Cultural

Jornalismo Cultural

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Treinando no escuro

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Subi a escadaria da academia, montei a barra para fazer rosca direta e comecei a treinar no escuro. Sim, não havia energia elétrica por causa do forte temporal. De repente, notei um cara me observando. Um olhar fixo e incivil. Sempre que eu me distraía, ele desaparecia.

Logo retornava. Continuava me assistindo. Movia os braços e fazia esgares ocasionais. Desconfortável, não nego. Estava bem escuro, e o sujeito continuava na mesma posição, movimentando os braços e contraindo os músculos. Um olhar grave, indômito. Movia a cabeça e sorria, não um sorriso comum. Um sorriso do tipo macarrônico.

“O que esse cara quer?” pensei. Deixa pra lá. Juntei 12 halteres ao redor do banco onde eu estava e continuei treinando. O sujeito também sentou e começou a me imitar. “Que isso?”, “O que está acontecendo aqui?” ‘O que tem de errado com esse cara?”, me questionei.

Ele só não me seguia quando eu ia até o bebedouro encher a minha garrafa de água. Mas continuava no mesmo lugar, me observando sem parar. Ele não se importava que eu soubesse. Sim, não fazia a menor diferença. Folgado.

No escuro, ocasionalmente a janela permitia que a pequena incidência de luz lançasse um brilho insólito sobre o espelho; um lume fortuito, intermitente. Era como se sua presença se desvanecesse com a luz. Dizem que o escuro é o refúgio dos casmurros. Deve ser.

Vez ou outra, eu caminhava até a janela, sentia o frescor, observava os galhos das árvores balouçando, desviava os olhos e retornava. Ok. Deitei no banco e comecei a fazer tríceps testa. Muito bom, assim não vejo ninguém, a não ser a barra e o movimento dos meus braços. Terminei, me levantei e ele continuava lá. “Po, ainda por aqui?”, pensei. Que seja!

Fiz rosca francesa com barra e caminhei até o outro lado da academia. “Aqui não tem ninguém. Claro que hoje não tem quase ninguém na academia, mas especialmente aqui estou só”, ponderei satisfeito. É isso aí! Olhei para o lado e o sujeito já tinha se antecipado. Ele sorriu; outro sorriso satírico, dicaz. Deve ter pensado: “Idiota, achou que fugiria de mim?”

“Que isso? Será que não posso treinar em paz?”, monologuei no escuro, desinteressado em abrir a boca. Fiz minhas séries de tríceps corda, fechando com drop-set. Antes de deixar a polia, a energia elétrica retornou por um instante. Observei o sujeito. Era o meu próprio reflexo no espelho.





Written by David Arioch

November 4th, 2017 at 12:06 am

Supino e o direito de ser marombeiro

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“Olha o naipe desse cara. Que otário! Muito músculo e pouco cérebro”, ocasionalmente dizia alguém

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“Na década passada, eu sempre encontrava um amigo no mesmo horário na academia” (Foto: Reprodução)

Na década passada, eu sempre encontrava um amigo no mesmo horário na academia. Era um sujeito bem animado, sorridente e que gostava de ser notado. Quando não percebiam sua presença, ele encontrava um jeito de chamar a atenção – dava um urro sorrateiro, falava alto ou causava algum atrito ruidoso entre as anilhas. Jamais o percebi conversando sem arquear os braços, chacoalhar a cabeça, espichar as veias do pescoço ou fazer movimentos curiosos com as mãos. Era um exibicionista de boa índole.

Ao sair da academia depois de um treino de peito ou braços, tirava a camiseta, aproveitando para mostrar o pump – aquele aspecto que faz todo cara parecer maior após os exercícios por causa do aumento do fluxo sanguíneo bombeado no músculo. “Agora vou ‘apavorar’ na rua”, comentou um dia. Nessas circunstâncias, eu apenas ria. Aquela era a sua alegria, e se ele tinha algum tipo de prazer nisso, era o que importava, não cabendo a mim nem a ninguém julgá-lo.

Supino, como eu o chamava porque ele treinava mais peito do que qualquer outro grupo muscular, tinha o costume de atravessar o centro da cidade com a camiseta sobre o ombro, ignorando comentários e olhares desdenhosos, principalmente de quem menosprezava marombeiros. Se alguém fizesse careta ou criticasse e ele percebesse, não era raro Supino reagir de forma inesperada.

“Olha o naipe desse cara. Que otário! Muito músculo e pouco cérebro”, ocasionalmente dizia alguém. Sua reação instantânea era retribuir com um sinal de joia e uma contração muscular elevando a cabeça do bíceps. “Fica sossegado, irmão! É só entrar na academia, seguir dieta e treinar certinho por anos que você chega lá”, comentava sorrindo e finalizando a breve interação com uma piscadela provocativa e um tapinha no próprio deltoide.

Quando ele atravessava a movimentada Rua Getúlio Vargas, algumas mulheres também o depreciavam às vezes, incomodadas em vê-lo na sua caminhada fruitiva, com o torso à mostra enquanto o sol aquecia o asfalto, atravessava vitrines e exasperava os mais afoitos. “Nossa, o tipo! Se acha demais! Tem gente que faz de tudo pra aparecer! Pensa que é bonito ser vagabundo e andar seminu na rua!”, ouviu numa tarde.

Sem titubear, caminhou até a moça que fez o comentário com a amiga e a observou nos olhos por alguns segundos. “Com licença, senhorita. Tu paga as minhas contas? Lava minha roupa? Prepara minha comida? Acho que não, né? Então pode parar de admirar que aqui não tem nada de graça”, declarou sorrindo e dando dois tapas no próprio peito. Constrangida, a moça puxou a amiga pelo braço e caminhou apressada até o fundo de uma loja.

Supino agiu assim por muito tempo, na sua tenra espontaneidade. Um dia, logo que saiu da academia, quando já não treinávamos mais no mesmo horário, foi surpreendido e atropelado. Ele rolou sobre o capô do carro e caiu deitado com as costas contra o asfalto tórrido de uma manhã altaneira de verão. No chão, sentiu uma luz quente bloqueando sua visão.

O motorista fugiu e Supino continuou deitado no chão. Não gemia nem agonizava. Somente ria de si mesmo e do seu próprio azar, ignorando os ferimentos pelo corpo. Surpreendendo quem testemunhou a cena, ele se levantou e limpou os ferimentos com a própria camiseta branca transfigurada em vermelha.

Joelhos e cotovelos esfolados, muitas escoriações nas costas e no peito, um corte superficial na testa e outro no topo da cabeça, nada disso o impediu de soerguer-se para assistir o autor já distante, fugindo pela Rua Pernambuco. Na manhã seguinte, Supino estava na academia praticando musculação.

E mais, na mesma semana, tomou uma decisão. Foi até uma loja no centro de Paranavaí e pediu para uma vendedora mostrar-lhe algumas camisetas. Enquanto ele as observava, em dúvida sobre quais escolher, as mãos da moça tremiam e as frases saíam incompletas de sua boca. “Você precisa tomar um copo de água com açúcar ou maracugina, moça. Não parece nada bem!”, sugeriu.

De repente, ela começou a chorar e a pedir desculpas. Supino não disse nada. Complacente, assistiu a reação dela em silêncio. Comprou três camisetas e saiu da loja com a consciência tranquila. Lá fora, a observou pela última vez antes de partir. Ele sabia e ela sabia. Supino descobriu que a mesma jovem que antes se incomodou com sua presença, fazendo um comentário preconceituoso que ele retribuiu quando ela o viu sem camiseta, pediu ao namorado que o atropelasse, alegando que Supino deu em cima dela.

À época, o questionei sobre o porquê de não ter procurado a polícia. Ele deu uma de suas respostas minimalistas e filosóficas: “Sua consciência é o seu único e verdadeiro guia.” O episódio me traz lembranças de uma subjetiva frase escrita por Balzac no século 18: “Quando todo o mundo é corcunda, o belo porte torna-se a monstruosidade.”

Parabéns, Campeão! – Acidentes e estripulias na academia

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“É agora que bato a cabeça na quina do banco e caio no chão com o crânio rachado e sem os dentes”

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Modelo do banco sobre o qual dei uma cambalhota no ar e caí sentado (Foto: Reprodução)

Nunca me machuquei seriamente praticando musculação, mas admito que ao longo dos anos passei por situações surpreendentes e inusitadas. Em um dia de treino de dorsais, a academia estava bem movimentada por volta das 18h. E por um milagre não havia ninguém usando a roldana.

Me aproximei, substituí a barra e coloquei o pino no último tijolinho da polia. “Que beleza! Hoje o treino vai render, já que não vou precisar esperar ou dividir a máquina com ninguém”, refleti com sorriso sardônico enquanto esfregava as mãos e observava outras pessoas que não tiveram a mesma sorte.

Fiz a primeira série de puxador frontal aberto assistindo a minha postura em um espelho à minha direita. Tudo ia bem até que no início da segunda série o cabo de aço se rompeu e voei para trás com a barra no colo, batendo as costas contra uma divisória branca que separa a sala de musculação da sala de aeróbicos.

O estrondo foi tão grande que ouvi duas pessoas gritando escandalizadas, pensando que o prédio estava ruindo. Até quem se exercitava do outro lado da academia veio xeretar. E eu sentado, com um sorriso enviesado, levantei rapidamente. Tentando não olhar ao meu redor, deixei a barra sobre o banco e caminhei até o outro lado da sala para fazer remada curvada.

O que mais causou estranhamento em quem presenciou o acidente foi o fato de eu continuar treinando. Apesar do susto, não senti nada e só deixei a academia quando terminei todos os exercícios. Na realidade, o único incômodo foi perceber tanta gente de olhos esgazeados, me observando e talvez me julgando como louco por não ter ido embora.

Em outra ocasião, eu estava na terceira série da cadeira abdutora quando o cabo arrebentou e violentamente veio em direção ao meu rosto. Faltando dois ou três centímetros para atingir meu olho esquerdo, ele chicoteou o ar e caiu complacente, repousando sobre a lataria do aparelho como se jamais tivesse saído dali. Senti gastura ao imaginá-lo penetrando meu olho e cutucando a íris como uma agulha aplicada com precisão cirúrgica.

Lá dentro, quem sabe a pontinha do cabo envergasse à direita e no momento do retorno – pop! Assim extraindo meu olho da órbita e deixando na cavidade a assinatura AB, de abdutora, como se fosse um tipo de zorro mecânico. Não sei, talvez ela quisesse apenas mostrar quem realmente mandava, que tudo estava ao seu alcance sempre que quisesse.

Vai saber, pode ser que os objetos não sejam completamente inanimados. Dizem que a barra olímpica usada no supino reto ganha vida de vez em quando. Não duvido. Um dia ela ficou teimosa no final do exercício e por pouco não me enforcou. Temendo o pior, senti a faringe se estreitando e o pescoço esquentando. Minha garganta parecia simular um canudo de plástico.

Àquela altura, minhas pupilas há muito dilataram, e mais do que nunca notei a barra lisa, escorregadia, traiçoeira e burlesca. Transparecia odiosa e retaliativa. A poucos centímetros do meu queixo, que se retraía com medo de ser esmagado, e prevendo que meus braços quase rendidos não suportariam mais a tensão, a amorteci levemente contra o peito. Estertorando e sentindo as fibras musculares dos meus ombros queimando, a deslizei em direção a minha barriga até o ponto de conseguir me levantar e tirá-la de cima de mim.

Sentado, me vi revigorado. Meu coração voltou a bater numa frequência mais aceitável, parei de suar frio e minha visão periférica se expandiu. Vislumbrei até o céu da academia se abrindo e uma revoada de dezenas de pássaros das mais diversas espécies circulando, circulando, até formarem a frase “Parabéns, Campeão!”. Quando levantei do banco, percebi que tinha duas anilhas a mais, e que não foram colocadas por mim. Realmente, a barra era inocente.

Ainda assim, acredito que icônico foi um episódio da época em que eu fazia paralelas em um banco de supino. Ele tinha um suporte de barras mais alto do que os mais tradicionais. Bom, em minha defesa, não existia nada específico para a realização das paralelas, então o jeito era improvisar. Como eu fazia esse exercício no dia do treino de peito, era preciso inclinar o corpo para a frente. Até aí tudo bem. Me apoiei sobre as laterais do banco e fiz a primeira série tranquilamente. Na segunda, por um deslize, inclinei demais o corpo e não consegui retornar à posição inicial.

Naquele instante, pensei o pior: “É agora que bato a cabeça na quina do banco e caio no chão com o crânio rachado e sem os dentes.” Contrariando previsões, inclusive de todo mundo que assistiu a cena – penso eu, dei uma cambalhota no ar e caí sentado no banco, sem sequer um arranhão. Nenhum espectador entendeu o que houve, muito menos eu. Mas fiquei orgulhoso pela façanha, assim como todos aqueles que escapam ileso de algum tipo de estripulia não planejada. Quando me levantei, agi como se tudo fosse proposital, sem saber que a calça não velava mais o quintal.

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Um homem moldado pelo ferro

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Com 20 anos de treino, Betão Marcatto se tornou uma importante referência da musculação no Brasil

A evolução de Betão Marcatto com a musculação (Foto: Arquivo Pessoal)

Na internet, o paulista Betão Marcatto se tornou uma das mais proeminentes referências da musculação, e não por acaso. Com uma relação de amor e ódio ao treinamento iniciada há 20 anos, o marombeiro graduado em eletrotécnica, mecânica, engenharia de produção e educação física se destaca por dividir o conhecimento com milhares de seguidores por meio do “Blog do Betão” e de uma página no Facebook. Outro diferencial é que Betão é o fundador da Academia Betoflex, de Guarulhos, São Paulo, uma das “mecas” do treino com pesos no Brasil.

Assim como muitas lendas do fisiculturismo, Betão Marcatto se sentia pequeno e muito magro na adolescência. “Um dia, meu pai trouxe uma fita de videocassete do filme ‘Comando para Matar’ com o Arnold Schwarzenegger, o que me impulsionou a procurar uma academia de musculação. Achei que se ficasse daquele tamanho seria mais respeitado na escola”, conta se referindo a um episódio em 1986, quando estava na sexta série do atual Ensino Fundamental.

Ao longo da trajetória com a musculação, Betão que tem 1,84m passou por uma fase em que se preocupava mais com volume do que qualidade muscular. “Só depois me dei conta que estava obeso, com 147 quilos. Foi a minha maior frustração. Então me empenhei e consegui reverter isso”, explica.

Marcatto: “O treino com pesos moldou meu caráter” (Foto: Arquivo Pessoal)

Apesar de ter vivido situações típicas entre marombeiros que estudam e trabalham, como dificuldade para conciliar horários, Marcatto jamais abandonou os treinos, nem quando era estagiário da Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec) e tinha apenas 30 minutos por dia para praticar musculação. Em vez de desistir, como faz a maioria, Betão encontrou uma academia no caminho para o trabalho.

Para entender a filosofia de vida do marombeiro é preciso ter em mente que a musculação vai muito além de atividade física que promove mudanças estéticas e de saúde. É uma prática com sentido metafísico que ensina a viver melhor, a ter disciplina e lidar com a frustração e a dor. “A musculação moldou meu caráter. Me deixou mais forte, menos emocional no sentido de sofrer por pouco. Você consegue transportar para fora da academia tudo aquilo que aprende treinando”, avalia.

Betão tem como inspiração fisiculturistas conceituados como o inglês Dorian Yates, o alemão Markus Rühl e o estadunidense Lee Priest que se tornaram expoentes da chamada Freak Era, em que os atletas começaram a se preocupar com enorme volume muscular, além de simetria e definição extrema. “Também me inspiro no [estadunidense] Derek Poundstone, grande atleta de strongman da atualidade”, acrescenta.

Os melhores resultados ao longo de duas décadas, Marcatto conquistou se autoavaliando, conhecendo o próprio corpo, lendo muito e tornando-se “cobaia” das próprias experiências que ele define como “insanidades”. “Tenho mais de 80 livros de musculação e aprendi a colocar em prática tudo que sei”, relata o marombeiro. Com muita bagagem profissional, reclama que as faculdades de educação física não preparam adequadamente o estudante para a profissão. A sugestão para o egresso evitar o fracasso é a procura de cursos específicos.

Betão fundou uma das “mecas” do treino hardcore no Brasil (Foto: Arquivo Pessoal)

A Metroflex brasileira

Nos Estados Unidos, a Metroflex Gym, autora do slogan “A Hardcore Training Facility”, é um dos mais almejados ginásios de treino com pesos do mundo, onde treinam figuras emblemáticas como Ronnie Coleman e Branch Warren, fisiculturistas de elite do Mr. Olympia, a maior e mais tradicional competição de bodybuilding.

Com a referência da Metroflex, Betão Marcatto fundou a Betoflex em 13 de fevereiro de 2006, uma data que até hoje é lembrada com alegria e emoção. Betão deixou o emprego em outra academia um dia antes, levando para o novo ginásio um grupo de marombeiros que já se identificavam com o rigor de seus ensinamentos. “Sempre quis uma academia com professor que treina e incentiva os alunos, o que é raro hoje em dia”, diz.

Quem pratica musculação sem nenhuma meta específica pode se assustar logo na recepção, onde há cartazes com a frase “Pare! Se você não tem objetivo, não entre!” Outra raridade é que a Betoflex tem uma rigorosa política de trabalho aplicada aos alunos. “Já adianto o que espero de cada um e explico como será o tempo em que eles estarão aqui. Alguns desistem na mesma hora”, garante.

Betoflex oferece estímulos por meio de desafios (Foto: Arquivo Pessoal)

O marombeiro se orgulha dos 90% de alunos matriculados, de um total de 250, que treinam com seriedade. É um dado atípico se comparado a maior parte das academias, onde a minoria se empenha.

Cultura old school

Betão Marcatto faz o possível para contribuir com o sucesso dos alunos, seja incentivando, corrigindo a execução incompleta dos exercícios, um fato comum, ou impondo desafios. “Há alunos que chegam com vários vícios e um exemplo é o meio supino. A pessoa deve estar disposta a ouvir que treina errado e precisa mudar. É um grande impacto pra eles, tanto que muitos só ficam um mês”, lamenta. Embora a Betoflex seja conhecida como um ambiente masculino, a academia conta com uma sala feminina frequentada por um bom número de alunas.

Adepto dos princípios de treino old school, Betão deixa sempre um caderno na recepção, o que serve de baliza para estatísticas de melhorias. Quem chega deve escrever o próprio nome e o horário. “Além de custar uma fortuna, a catraca eletrônica deixa tudo muito formal e automatizado, o que não condiz com a Betoflex. Tanto é que sei o nome de todos os alunos. É uma questão de respeito”, ressalta.

No ginásio, também existe a preocupação com a trilha sonora, elaborada sob um esquema de progressão. Há mais de três mil músicas disponíveis. Pela manhã, os marombeiros “puxam ferro” curtindo hard rock, heavy rock ou rock clássico como Airbourne, Deep Purple e AC/DC. Betão treina um pouco mais tarde, quando prioriza bandas de thrash metal, groove metal e metal industrial como Sepultura, Pantera e Fear Factory.

Se o treino é pesado, a música também deve ser. “São gêneros que me inspiram. O resto do dia é recheado de Metallica, System of a Down e outros”, exemplifica. Outra curiosidade da Betoflex é que alguns aparelhos foram desenvolvidos dentro da própria academia.

O Blog do Betão

Betão Marcatto, que é chamado carinhosamente de “tio” ou “titio”, não tinha a mínima ideia da influência sobre milhares de marombeiros de Norte a Sul do Brasil. Ficou sabendo da repercussão do trabalho há pouco tempo, quando instalou um contador de visualizações no “Blog do Betão”. Mais tarde, encontrou muitos de seus artigos espalhados por dezenas de sites e blogs sobre musculação.

O marombeiro oferece assistência a todos os alunos (Foto: Arquivo Pessoal)

A ideia de criar uma página surgiu quando percebeu que muitas pessoas estavam com dúvidas sobre treinamento, mas não tinham a quem recorrer, seja por interesse em aprender um pouco mais ou não conhecer um profissional bem preparado. O blog se popularizou e todos os dias Betão recebe muitas perguntas que responde conforme a disponibilidade. “Às vezes, acontece de algumas mensagens sumirem em meio a tantas outras, parecendo que estou ignorando a pergunta, mas não estou [risos]. Além disso, gosto muito de escrever”, frisa.

Betão sabe que se não atualizar o blog diariamente a cobrança dos leitores aparece no mesmo dia. A justificativa é o conteúdo diferenciado que conta com metodologias de treinamento que foram criadas ou adaptadas por Marcatto. Um exemplo é a técnica 3D’s – Difícil, Dolorido e Doentio, destinada a praticantes intermediários e avançados de musculação. Em síntese, o “Blog do Betão” é recomendado para apaixonados por musculação, pessoas dispostas a treinar sob um novo patamar de intensidade.

Mister Freaky, personagem interpretado por Betão que ficou famoso na internet (Foto: Arquivo Pessoal)

Três perguntas para Betão Marcatto

Betão, o seu estilo de vida inspira muita gente, não apenas de Guarulhos [na Região Metropolitana de São Paulo], mas de todo o Brasil. Você acha que isso é um reflexo da insatisfação quanto a falta de uma política de seriedade na maior parte das academias do país?

Acho que quem treina sério percebe quando o objetivo de quem está por trás do estabelecimento é só dinheiro. O comportamento passivo da maioria dos donos de academia é o reflexo disso. Tenho academia porque amo musculação. Poderia estar trabalhando em outra área, mas isso não me traria felicidade. ‘Trabalhe no que você não gosta e só será feliz no dia do pagamento. Trabalhe com o que gosta e será feliz todos os dias’. Você tem que ganhar dinheiro, claro, mas isso tem que ser consequência de um trabalho bem feito. Por parte dos donos de academias, vejo muito “abandono” tanto de aparelhos quanto de alunos. São verdadeiros órfãos do ferro.

Como surgiu a ideia de criar a série Mister Freaky, com um fictício e controverso personagem que ganhou muita popularidade discutindo de forma bem humorada os clichês da musculação?

Publicidade feita com bom humor (Arte: Arquivo da Betoflex)

A ideia do Mister é satirizar dois públicos da musculação: o cara que se acha mau e forte e aquele que vai malhar e não treinar, o popular “franguinho”. Produzi diversos vídeos, mas os retirei da internet porque estavam vinculados a um projeto ao qual não pertenço mais. Fiz alguns remakes, mas a edição ainda não saiu. Estou estudando a possibilidade da volta do Mister Freaky.

Recursos ergogênicos são sempre úteis se usados corretamente, porém dentre os principiantes há uma exaltação dos suplementos em detrimento da alimentação. Como você avalia isso?

Alimentação é a chave. É por meio da alimentação que construímos nossos corpos, que chegamos ao objetivo. Se você negligenciar a alimentação, tudo estará perdido. Suplementos ajudam, mas não podem ser considerados essenciais. São importantes se você não tem tempo para preparar suas refeições.

Blog do Betão

http://blogdotitiobetao.blogspot.com.br