Archive for the ‘Noroeste do Paraná’ Category
“Você não pode, você é nortista”
Os nordestinos que chegaram no Noroeste do Paraná até a década de 1950, geralmente atuavam como colonos nas fazendas de café. E como não havia muito lazer na área urbana, e se houvesse também não havia dinheiro o suficiente pra gastar com isso, as festas eram improvisadas no campo. Quando um nordestino convidava uma moça para dançar nos bailes, alguém não raramente interferia e dizia: “Você não pode, você é nortista.”
Casal investe na produção de alimentos orgânicos em Paraíso do Norte
A empresa baseada na agricultura familiar tem se destacado pela oferta de alimentos livres de agrotóxicos
Em novembro de 2016, o tatuador Marcos Cordeiro, que mudou de São Paulo para Paraíso do Norte, no Noroeste do Paraná, decidiu investir em um novo ramo – horta orgânica.
Levando em conta que a região ainda conta com uma baixa produção de alimentos orgânicos, mesmo havendo uma grande demanda, ele e a esposa Tais Cristina Delin não pensaram duas vezes antes de começar um novo negócio.
A empresa baseada na agricultura familiar, e que recebeu o nome de Family Ranch, tem se destacado pela oferta de produtos de boa qualidade, o que inclui tomate-cereja, pimenta-biquinho, quiabo, rúcula, acelga, quatro variedades de alface, mandioca, milho e brócolis, entre outros alimentos distribuídos em uma propriedade de um alqueire.
“Logo que meu marido chegou aqui, ele ficou abismado em ver que só tinha cana-de-açúcar e soja. Quando descobriu que todos os produtores de hortaliças e leguminosas usavam muitos pesticidas, ele começou uma pequena produção orgânica no fundo do quintal”, conta.
A identificação de Marcos e Tais com a produção de alimentos saudáveis foi tão grande que eles decidiram migrar a produção para um rancho, fazendo da atividade uma fonte de renda e profissionalizando a produção.
“Nosso intuito sempre foi vender produtos de qualidade e com preço justo; e sem uso de agrotóxicos”, garante Tais. Em 2016, na primeira safra, o casal atingiu a produção de 60 mil pés de hortaliças e, felizmente, conseguiram vender tudo que foi produzido.
Marcos e Tais admitem que no início foi difícil, até pelo fato de até então não terem experiência no ramo. Hoje em dia, para evitar problemas, já que a produção de orgânicos requer mais cuidado, eles fazem rotação cultural.
“Chegamos a perder todo um plantio por causa de pragas. Além disso, como não tínhamos noção nenhuma desse sistema, cometemos muitos erros. Agora contamos com o engenheiro agrônomo Ricardo Shintani, que tem nos ajudado bastante”, garante o casal, acrescentando que a produção e a diversidade deve aumentar em breve, assim oferecendo ainda mais alimentos saudáveis e de boa qualidade.
Saiba Mais
A horta orgânica fica ao lado da Vila Rural de Paraíso do Norte.
Contato
(44) 99726-3739 (Whatsapp)
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Consequência da grilagem de terras durante a colonização
Uma curiosidade sobre a região Noroeste do Paraná é que há muitas propriedades em situação de irregularidade fundiária. De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), os imóveis estão localizados principalmente em Paranavaí, Querência do Norte, Santa Cruz do Monte Castelo, São Pedro do Paraná, Amaporã, Nova Londrina, Marilena, Terra Rica e Santo Antônio do Caiuá, além de outros municípios. Um fato que pode ter relação com a grilagem de terras iniciada nos anos 1930.
Livro narra causos fantásticos da região de Paranavaí
Em 2013, a professora Elmita Simonetti Pires lançou em Paranavaí, o livro “Memória e Oralidade: Narrativas da Microrregião do Extremo Noroeste do Paraná”. Além de ser um registro da identidade dos povos que vivem em 22 cidades da região de Paranavaí, a obra leva ao público a importância da valorização da cultura oral como fonte literária.
“É uma maneira de destacarmos a importância do nosso folclore. O livro reúne causos contados principalmente por gente simples”, explica a professora que é mestre em letras pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e docente da Universidade Estadual do Paraná (Unespar).
Dentre algumas das histórias intrigantes contadas no livro estão: “E era mesmo o danado do Saci”, “Ler e escrever: vivência de Dona Arlinda”, “A Vaca da São Francisco”, “Causo de cemitério, chapeuzão e capa preta”; “A Casa Assombrada”, “O Pote de Ouro do Mourão da Mangueira”; “Dia do Pai da Mata”; “A Casa Assombrada”; “O causo do quebra-milho”; e “O Causo de Bainho: aconteceu na mata do Cristo Rei”. “São registros que revelam conhecimento, sabedoria, maneiras de fazer, pensar e ver as nossas relações sociais”, diz a professora.
A princípio, a meta era concluir a pesquisa em dois anos. No entanto, foram necessários quatro. Ainda assim, Elmita admite que havia mais histórias para contar. “Em material cultural, folclórico, a região é muito rica, então fui ingênua em achar que seria possível concluir esse trabalho em apenas dois anos. São muitos costumes, ideais e crenças”, comenta a professora. Acompanhada de uma equipe, Elmita Simonetti fez muitas viagens por cidades da região para ouvir histórias fantásticas narradas pela população.
O resultado do projeto “Memória e Oralidade”, então transformado em livro graças ao apoio do deputado federal Hermes Parcianello, Universidade Estadual do Paraná (Unespar), Fundação Araucária e Serviço Social do Comércio (Sesc), entra para a história do Extremo Noroeste do Paraná como mais uma importante referência de pesquisa e fruição para professores, estudantes e leitores interessados pela cultura regionalista. Distribuído em muitas instituições de ensino, o livro traz na contracapa um encarte com DVD. Para mais informações, ligue para (44) 3424-0100.
Deslizamento de terra na PR-444
Deslizamento que presenciei hoje à tarde, entre Arapongas e Mandaguari, no Norte do Paraná – ocasionando a interdição da PR-444. A chuva intensa no período da manhã e da tarde dificultou o tráfego em várias rodovias do Norte e Noroeste do Paraná. Também encontramos um veículo severamente avariado, mas sem vítimas, na BR-376, perto da entrada de Mandaguaçu. A foto é do meu irmão Guimarães Junior que estava comigo.
Morro Três Irmãos era usado por criminosos
Na década de 1950, o Morro Três Irmãos, em Terra Rica, mais conhecido como Três Morrinhos, era usado por criminosos como refúgio. No local, dizem que foram assassinadas muitas pessoas. Uma senhora que ainda mora na cidade me contou que nos tempos da colonização de Terra Rica, o tio dela torturou, matou e escondeu o cadáver de um homem em uma caverna de difícil acesso no terceiro morro. Outros pioneiros relataram que dependendo do dia, quando se passa perto do morro à noite, é possível ver uma “luzinha” seguindo os passantes. Por tal motivo, muitos moradores de Terra Rica se recusam a frequentar o local quando escurece.
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Um dia de foca
Visivelmente encolerizada, a mulher pensou que fomos lá para prejudicá-los, criar um factoide
Ser jornalista já me permitiu passar por muitas situações insólitas. Uma delas surgiu em Querência do Norte, no extremo Noroeste do Paraná, em 2006. Na manhã daquele dia, que pouco importa a data específica, o meu amigo e jornalista Cleber França saiu de Maringá, passou em Paranavaí e juntos fomos para Querência a bordo de um Renault Clio prata, acostumado a circular pelos terrenos mais inóspitos da região.
Sem dúvida, era um carro que surpreendia pelo viço, chegando a voar por metros em áreas de estradas ruins, onde muita gente só trafegaria de caminhão ou caminhonete. A verdade é que ele parecia acostumado a nos transportar pelos mais diferentes destinos da região, em busca de curiosidades, personagens e histórias pitorescas.
No caminho para Querência do Norte encontramos animais silvestres mortos na estrada, o que me parecia sempre trágico, principalmente quando os filhotes cercavam o pai ou a mãe que nunca mais veriam, emitindo gemidos vigorosos ou fragilizados. O som não transformava nada ao seu redor. Sequer parecia mover a tiririca que brotava no canto do asfalto tórrido. Ainda assim a iteração da cena não a tornava menos adventícia. Talvez fosse reles para tantos outros, não para mim que via cada morte animal como um exemplo da nossa displicência e efemeridade existencial.
Bom, continuando. Chegamos em Querência por volta das 9h30. Era um dia quente, dando a impressão de um Sol maior e mais baixo, e não havia muitas pessoas circulando pelas pacatas ruas da cidade, onde os cantos dos pássaros se misturavam aos sons de rodas, latidos e miados. No centro, fomos até uma lanchonete e pedi informações sobre onde poderíamos encontrar um líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) da cidade, considerado um dos mais antigos do Paraná.
Então um senhor simpático, usando sandálias, bermuda e camisa, parou de polir as garrafas de cachaça e sugeriu que deixássemos o assunto de lado, alegando que desconhecidos, principalmente jornalistas, poderiam ser hostilizados. “Procure outra história porque essa daí acho que não vai prestar. Vai por mim”, disse o homem sem piscar, mantendo um sorriso enviesado e um olhar fixo em nossa direção. Agradecemos e saímos da lanchonete.
A verdade é que nosso objetivo principal era coletar informações sobre a realidade dos produtores de arroz irrigado. No entanto, como éramos movido pela abelhudice dos focas, jornalistas recém-formados, queríamos fazer muito mais. Em poucas horas, fomos aos portos Natal, Felício e 18. Entrevistamos proprietários e funcionários de balsas, além de ribeirinhos e pescadores. À tarde, voltamos para a área urbana de Querência do Norte e conversamos com alguns produtores de arroz. Todos foram bem receptivos.
Antes de nossa partida, conhecemos um personagem aparentemente bonachão, um agricultor de meia-idade que no passado ocupou posição de destaque no MST da cidade. Ele nos convidou para ir até uma cooperativa fotografá-lo com um saco de arroz. Chegando lá, entramos em um enorme barracão de estocagem, onde havia centenas de sacos bem posicionados. Para ser fotografado, sugerimos que o homem sorrisse, mostrando o conteúdo do saco e também deixando o cereal escorrer entre seus dedos.
Depois de fotografá-lo várias vezes, quando estávamos saindo do barracão fomos interrompidos pela diretora da cooperativa. “O que vocês pensam que estão fazendo?”, questionou. Respondemos que fomos convidados por um senhor bigodudo que se apresentou como sócio da cooperativa. Assim que olhamos para o lado, o homem entrou em seu carro e partiu sem dar explicações.
Visivelmente encolerizada, a mulher pensou que fomos lá para prejudicá-los, criar um factoide. Chamou a atenção de seis ou sete homens que estavam mais próximos e, esbravejando, ordenou: “Tranquem todas as saídas! Eles não vão sair daqui tão cedo!” Na sequência, ouvi o som retumbante do denso portão de ferro se fechando, com a trava já acionada. Dei um sorriso amarelecido e, mesmo tentando velar a tensão, estremeci, sentindo uma perna mais leve que a outra.
Alguns caras à nossa volta nos observavam com desprezo e chalaça, inclusive pressionando as próprias mãos, num gesto de intimidação. Quando tentei explicar quem éramos e o que fazíamos ali, ela disse que não interessava. “Sei muito bem que trabalho vocês fazem. Já recebemos gente como vocês há poucos dias. Única coisa que quero é essa câmera fotográfica”, exigiu olhando diretamente para o Cleber que a segurava com as duas mãos, como se embalasse o próprio filho.
Ele se negou a entregar a câmera e a mulher caminhou em nossa direção. Balançou os braços no ar e ordenou que as fotos fossem apagadas. Com receio de perder todo o nosso trabalho, não deixamos ela tocar no equipamento. Contudo, concordamos em deletar as fotos da cooperativa diante dela. Embora ainda irritadiça, algum tempo depois ela concordou em abrir o portão.
“Olhe a placa do carro e o adesivo no vidro traseiro. Nunca estivemos aqui. A senhora nos confundiu com alguém,” justifiquei, tentando amenizar a situação pela última vez. Sem interesse em dialogar, a mulher apenas recomendou: “Só digo mais uma coisa. Se sair uma foto daqui em algum jornal, pode ter certeza que vou atrás de vocês. Ah, se vou!”, prometeu.
Diante de tanta intransigência, apenas nos calamos e deixamos aquele lugar. Lá fora, rimos pateticamente, como se o medo jamais tivesse nos alcançado. E não evitei de me recordar da profética recomendação do dono da lanchonete ao saber que a diretora da cooperativa também fazia parte do MST. Nem esqueci da expressão do agricultor falsamente bonachão que talvez estivesse rindo de nós e não para nós nas fotos, antevendo a confusão.
Zaguinha, o Rei das Embaixadinhas
Manoel da Silva renasceu aos 44 anos, quando trocou a picareta por uma bola de futebol
Em 1999, o esportista Manoel da Silva, conhecido como Zaguinha, ganhou o título de Rei das Embaixadinhas ao participar de um programa televisivo em que desafiava os telespectadores – venceu todos. Desde então o reconhecimento lhe garante sobreviver daquilo que melhor sabe fazer.
O carismático Zaguinha ganhou visibilidade pela primeira vez em 1999, quando foi protagonista do Programa Esporte Espetacular, da Rede Globo. “Eu estava fazendo embaixadas em Tupã, interior de São Paulo, e um repórter me ligou. Perguntou se eu tinha interesse em participar do programa. Aceitei na hora”, conta.
Convidado para desafiar praticantes de embaixadinhas de todo o Brasil, o atleta não precisou se esforçar demais para faturar o título de rei. “Venci os oito melhores, selecionados pelo programa. Tive que fazer embaixadinhas até na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Mas valeu a pena e muito. Foi depois dessa aparição que consegui patrocínio de uma grande empresa de artigos esportivos”, declara Zaguinha que participou do Esporte Espetacular por 14 domingos consecutivos.
O talento e a dedicação do atleta trouxeram oportunidades inesperadas, como conhecer mais de 20 estados brasileiros e, também, viajar de avião pela primeira vez. Zaguinha é reconhecido internacionalmente, tanto que foi tema de uma reportagem da rede de televisão estadunidense Cable News Network (CNN). “Isso foi em 2000. Me levaram para fazer um trabalho de oito dias em escolinhas de futebol. Até participei de uma feira de esportes em Nova York”, reitera o atleta que se apresentou na Argentina e no Paraguai durante a Copa América de 1999.
O maior orgulho de Zaguinha são as inúmeras façanhas, entre as quais embaixadinhas com bola de futebol americano e abacaxi. “Já fiz 550 com uma bolinha de dois milímetros. Faço com qualquer tipo de esfera, desde que o peso não ultrapasse dois quilos e meio”, enfatiza. Quando participou do Programa do Jô, lhe deram um sabonete molhado. O atleta admite que foi difícil manter o equilíbrio, contudo não passou vergonha; fez cinco embaixadinhas.
O esportista sempre fica feliz ao ser desafiado, mas a satisfação surge apenas no fim, quando o resultado é positivo. “Já fiz muitas embaixadas atravessando a Avenida Paulista, subindo as escadas de uma igreja em Aparecida e, também, sobre o parapeito de um prédio de 15 andares. Nesse desafio tive medo porque não gosto de lugares altos”, revela.
Zaguinha diz que se sente realizado por levar diversão e informação a tantas pessoas. “Minhas apresentações duram em média 30 minutos, só que sempre dedico algum tempo para falar sobre educação e drogas”, pondera.
Atleta teve vida difícil no Noroeste do Paraná
Manoel da Silva, conhecido como Zaguinha, nasceu em Murici, no interior de Alagoas, e se mudou para Loanda, no Noroeste do Paraná, quanto tinha nove anos. “Como saí do nordeste muito novo, me considero tanto nordestino quanto paranaense”, afirma o esportista que teve uma vida muito difícil.
Na década de 1960, o jovem Manoel começou a trabalhar na área rural derrubando árvores para o plantio de amendoim, algodão e mamona. “Sinto saudade das coisas boas, mas foi um tempo de muitas dificuldades”, frisa Zaguinha que se distrai mirando o horizonte. De repente, começa a lacrimejar ao se recordar da esposa falecida em 1981.
Em Loanda, depois de reunir um bom dinheiro, o atleta abriu um bar, onde impressionava os fregueses fazendo embaixadinhas com bolas de sinuca. Com o tempo o negócio deixou de ser lucrativo e Manoel decidiu participar de um concurso público municipal.
“Passei e ganhei uma picareta, uma chibanca [machadinho], uma enxada e uma pá. Meu trabalho era fazer valetas para esgoto. Ganhava um salário mínimo, ou seja, trabalhava demais e recebia pouco”, avalia Zaguinha. Logo que encerrava o expediente, Manoel da Silva ia pra casa treinar.
O apreço pelas embaixadinhas surgiu na infância, quando o esportista e seus cinco irmãos brincavam com bolinhas de meia. “Era comum também matarem porco e a gente tirar a bexiga do animal pra enchê-la com ar. Era a nossa bola, a maior alegria da minha infância”, relata Zaguinha que na década de 1990 decidiu transformar o sonho em realidade ao se mudar para São Paulo.
Estadunidense impulsionou a carreira do esportista
Em São Paulo, Zaguinha adotou o Viaduto do Chá como local de treino porque sabia que a área era bastante frequentada pela mídia. Com a intenção de atrair a atenção para si, sempre fazia embaixadinhas quando via uma máquina fotográfica ou filmadora. “Estava sempre próximo da imprensa, mas sem exageros”, assegura.
Zaguinha passou três anos fazendo shows na rua. Tudo mudou em 1999, aos 47 anos, quando um empresário estadunidense que assistiu a uma apresentação de Zaguinha pela TV a cabo acreditou no trabalho do esportista. “Gostou do que viu no Esporte Espetacular. Quando veio pra cá buscar produtos esportivos de uma grande empresa ele sugeriu que me contratassem. Naquele mesmo mês, comecei a receber para fazer embaixadas”, reitera sorrindo.
Na rua, o atleta sempre é reconhecido pelo traje – uma camisa da seleção brasileira e uma bola que ele carrega dentro de uma pequena rede pendurada no braço. “Onde me vê, o pessoal já sabe quem eu sou e pede pra fazer embaixadinhas”, comemora o atleta.
Saiba mais
Zaguinha já fez mais de 80 mil embaixadinhas em oito horas.
Zaguinha nasceu no dia 1º de março de 1952.
Uma premiada Estrela da Guia
Grupo de folia de reis mantém-se na ativa vencendo dezenas de concursos
Parte de uma tradição que une religião e folclore, o grupo de folia de reis Estrela da Guia, de Paraíso do Norte, surgiu há quase 30 anos. À época, foi criado para honrar uma promessa envolvendo doença. Mas desde o princípio houve tanta dedicação que além de cumprir compromissos religiosos o grupo venceu mais de 50 concursos no Paraná.
Tudo começou na década de 1980, quando o irmão de Hilda Maria da Silva descobriu um grave problema cardíaco. “Ele foi desenganado pelo médico e começou a viver como se esperasse pela morte. Então lembrei que quando nosso pai ficou paralítico, ele fez uma promessa para os três reis magos. Deu tudo certo, e meu irmão foi curado, assim como meu pai”, conta Hilda que em seguida assumiu o compromisso de fundar o primeiro grupo de folia de reis de Paraíso do Norte.
Após a convalescença, o irmão de Hilda cumpriu a promessa de sair com a companhia de reis durante sete anos consecutivos. Gostou tanto da experiência que continuou e se tornou embaixador do grupo. “Fiquei doente pouco tempo depois. Então todos os membros do grupo se ajoelharam e assumiram um novo compromisso”, relata Maria da Silva. No dia seguinte à promessa, Hilda recebeu alta médica e passou o Natal em casa com os familiares.
Ainda com dificuldades para caminhar, a coordenadora da companhia estimulou os confrades a continuarem a tradição. Porém, antes de deixarem a casa, os membros do grupo iniciaram uma cantoria, um ato que representou o desejo de que Hilda carregasse a bandeira da companhia. “Quando a segurei, consegui andar normalmente”, garante a coordenadora que participa todos os anos de concursos de folia de reis.
Festivais
O grupo formado por 14 integrantes já conquistou mais de 50 prêmios em inúmeros municípios do Norte do Paraná. “Vencemos em Paranavaí, Maringá, Sarandi, Nova Esperança, Campo Mourão, São Tomé, Paraíso do Norte, Apucarana, entre muitas outras cidades. A gente sempre ganha algum prêmio. Significa que o nosso grupo é bem aceito”, declara Hilda. Cada concurso de folia de reis tem, em média, 30 companhias. Quando o Estrela da Guia participa de algum festival fora de Paraíso do Norte, a prefeitura se responsabiliza pelas despesas.
Qualquer pessoa pode participar do grupo que tem integrantes de 7 a 70 anos. A diversificação da faixa etária é importante para uma boa encenação que inclui saltos acrobáticos, danças, cantos e declamações. A coordenadora da companhia é a responsável pela confecção da bandeira e dos trajes de todos os membros do grupo: embaixador, contra-embaixador, bastiões e marungos (palhaços).
Doze dias de folia
O grupo de folia de reis Estrela da Guia, de Paraíso do Norte, inicia os festejos em 25 de dezembro e os encerra no dia 6 de janeiro. “Na primeira hora, eu corto um bolo, eles comem e seguem viagem”, conta a coordenadora Hilda Maria da Silva. Ao meio-dia do Natal, depois de passarem a noite em claro, cantando e batendo nas portas, os foliões param pela primeira vez. “Onde estiverem, eles deixam a bandeira e vão almoçar, retornando às 16h”, explica Hilda. Para a companhia, o mais importante não é o morador dar algo para os foliões, mas sim aceitar a bandeira dos três reis magos.
Durante a encenação que tem como trilha de fundo o som do cavaquinho, viola e caixa, o grupo Estrela da Guia já se deparou com outros grupos pelas ruas; momentos em que o duelo é inevitável. “Quando isso acontece, os palhaços se escondem. A gente canta pedindo a bandeira. Quem vencer no verso fica com ela. Enquanto isso os foliões fazem pedidos e os palhaços ficam chorando e enrolando. É uma bagunça”, frisa sorrindo Hilda Maria.
Saiba Mais
O respeito e carinho pelo grupo Estrela da Guia é tão grande que mais de mil pessoas participam das anuais festas realizadas por Hilda Maria.
Folia de reis é um festejo folclórico de tradições cristãs que celebra o encontro dos três Reis Magos com o menino Jesus.
Os reis Baltazar, Belchior e Gaspar, guiados pela estrela de Belém, são os personagens centrais da festa trazida pelos colonos portugueses. A comemoração brasileira foi semelhante a portuguesa até o século XVII, quando o folclore de cada região do Brasil se misturou, de modo peculiar, a folia de reis.
Irmãos Bonfadini, uma história de luta e união
Raridade entre as famílias de hoje em dia, os Bonfadini nunca se separaram
Assim como muitos migrantes, o que trouxe os sete irmãos Bonfadini a Paranavaí, no Noroeste do Paraná, foi a vida difícil. Em Encantado, cidade situada em uma região de morros no Rio Grande do Sul, a economia da família era baseada na criação de suínos. Então sonhavam em migrar para uma área plana, onde pudessem investir em outras atividades. “A vida no Rio Grande era dura. A gente queria ir pra um lugar sem pedras. Trabalhamos, lutamos e fizemos economia, crentes de que um dia sairíamos de lá”, explica o pecuarista Honório Bonfadini.
O sonho se concretizou em 1960, quando se mudaram para Paranavaí logo depois de conhecer um corretor que falou das terras boas da região. “Viemos em sete irmãos. Eram quatro homens e três mulheres. Cheguei e me senti no paraíso. A diferença para o lugar onde morávamos no Rio Grande era imensa”, explica Honório entre sorrisos e um tom de voz remansoso.
O trajeto até Paranavaí levou dias e foi percorrido de ônibus. A vontade de mudar de vida era tão grande que trouxeram pequenas malas com poucas peças de roupa, deixando todos os móveis e utensílios domésticos. “Paranavaí sempre foi bonita, né? Só que asfalto não tinha. Na Avenida Paraná só existia um pedacinho de malha viária”, lembra Honório.
O maior objetivo dos Bonfadini era investir na área urbana. Quando ficaram sabendo que o Líder Bar estava fechado por ordem judicial, em decorrência de badernas, brigas e trocas de tiros, não pensaram duas vezes. “O preço era bom. Por isso compramos e reabrimos. Só deu um pouco de trabalho pra reformar. Como não tínhamos dinheiro pra gastar, contratamos um pedreiro e ajudamos a reconstruir”, relata rindo e meneando a cabeça.
Além de Honório, o Líder Bar, situado na Avenida Paraná, perto do cruzamento com a Rua Getúlio Vargas, contou com a dedicação de Ida, Eva, Gema, Ricieri, Adão e Orestes. Praticamente a família inteira trabalhou no local de 1960 a 1965. “Era bar e restaurante. Tinha o prato do dia, salgados, sanduíches, bolos, chocolates e sorvetes. Os doces eram mais das crianças, né? Ah, o pessoal gostava muito de bauru! Mas a maioria vinha pelo café”, explica. A comida era vendida “por cabeça”. Pagava-se um preço fixo e comia à vontade no almoço ou no jantar.
Embora o ambiente fosse familiar, o Líder Bar se popularizou como ponto de encontro de homens. “A mulherada naquele tempo tinha medo de homem”, justifica Honório às gargalhadas. Apesar das limitações da época, o estabelecimento surpreendia pelo horário de funcionamento. Começava a atender às 6h30 e parava de madrugada, por volta da 1h. No verão, logo cedo a casa enchia. No inverno, à tarde o movimento crescia.
Além de proporcionar horas de descontração, o bar servia como escritório, tanto para profissionais quanto picaretas. Muita gente passava no estabelecimento antes do início do expediente, assim como muitos saíam do trabalho e iam direto pra lá bater papo e tomar um aperitivo.
A fama do bar atraía pessoas de toda a região de Paranavaí. E mais, até estrangeiros. Honório Bonfadini perdeu as contas de quantas vezes recebeu italianos, alemães, espanhóis e portugueses que chegaram ao balcão segurando um pedaço de papel em que estava escrito o endereço do Líder Bar acompanhado de alguns elogios. “Só que era um tempo difícil. Não tinha conforto e o nosso abastecimento de energia dependia de um motor”, garante.
Apesar das dificuldades, admite que ser proprietário do bar mais movimentado de Paranavaí era um privilégio. Vendiam muito e ganhavam bastante dinheiro. Honório sempre viu o Líder Bar como um ambiente modesto, de proporções medianas – com um longo balcão, algumas porções de cadeiras e mesas, sala e área reservada para comemorações.
Muita gente frequentava o local por causa do frango frito e do frango em molho, duas das especialidades dos Bonfadini. “Não tinha frango de granja, era só caipira. A gente fazia o possível pra nunca faltar”, enfatiza. Outro ponto alto era a limpeza. Independente do horário em que o bar fechasse, a família fazia questão de deixá-lo limpinho para a manhã do dia seguinte. Também se uniam para uma faxina geral uma vez por semana.
Os jovens engraxates aproveitavam a movimentação para encostarem caixas e banquinhos em frente ao bar, aguardando a entrada e a saída da freguesia. Na entrada os clientes se livravam do barro batendo as botas na soleira. No interior ouviam-se muitas vozes acompanhadas de sons de pratos, copos, cadeiras e mesas sendo arrastadas. A música no bar era o “barulho do movimento”, segundo Honório Bonfadini.
Em 1965, a crise da monocultura cafeeira motivou a família a se mudar para Planaltina do Paraná, a pouco mais de 50 quilômetros de Paranavaí. O Líder Bar precisava de reforma e o investimento seria desproporcional aos lucros. A melhor opção era desistir da atividade. “As geadas acabaram com o café. Muita gente foi embora. Como nosso bar ficou parado, decidimos partir. Os que moravam aqui nesta propriedade rural em Planaltina, onde conversamos agora, queriam ir pra cidade. Fizemos a troca pelo bar e viemos para o mato. Já estamos aqui tem 50 anos”, revela.
Seis dos irmãos Bonfadini nunca se casaram
Dos sete irmãos Bonfadini que se mudaram para o Paraná, seis jamais se casaram. “Tivemos de fazer economia pra conseguir alguma coisa na vida quando ainda tinha idade pra casar. A luta foi feia. Namorei pouco. Não deu tempo”, justifica o pecuarista Honório Bonfadini em tom singelo.
Apesar disso, Honório não se esquece que em Paranavaí tinha muitas mulheres bonitas. “Era uma alegria para os olhos. Só que eu não ia em festas porque precisava trabalhar”, argumenta. À noite, quando saía de vez em quando para passear, era impossível ficar sozinho com alguma moça. Sempre havia guardas noturnos nas esquinas e eles repreendiam quem tentasse namorar em locais escuros. Mesmo com a rotina atribulada, o comerciante teve a oportunidade de conhecer figuras lendárias da música brasileira, como Tonico e Tinoco, Cascatinha e Inhana e Roberto Carlos. “O comércio e as emissoras de rádio organizavam shows muito bons”, assinala.
Uma vez uma cantora espanhola se aproximou de Honório Bonfadini no balcão do Líder Bar e pediu uma dose de conhaque Dreher. Então os dois começaram a conversar. O comerciante entendia bem o espanhol, tanto que o papo se estendeu por horas. Antes de se despedir, a cantora o convidou para ir ao seu show que seria realizado em Paranavaí na mesma noite. Como o jovem Honório não poderia se ausentar do trabalho, ela se comprometeu em retornar ao final da apresentação.
Honório a esperou. Depois ficou sabendo que a moça encontrou um espanhol. Em vez de ir ao Líder Bar a cantora foi com o acompanhante para a Adega Espanhola na Rua Marechal Cândido Rondon. “Nunca mais a vi”, lamenta. Após se mudar para Planaltina do Paraná, não quis mais saber de se casar. “Aqui eu já estava fora de época. Não queria mais. Não tinha mais idade pra isso”, pontua.
Família sempre se manteve unida
Raridade entre as famílias de hoje em dia, os Bonfadini sempre se mantiveram unidos. De um total de 11 irmãos que viviam no Rio Grande do Sul, sete vieram ao Noroeste do Paraná e nunca perderam contato. Inclusive seis moraram juntos a vida toda.
“Só tivemos uma irmã que se casou e mudou para Presidente Epitácio, no interior de São Paulo. Nosso pai ensinou que devemos estar sempre perto uns dos outros, se respeitando e se ajudando. Se houver alguma falha, tudo bem, a gente tem que perdoar e seguir em frente”, ensina Honório Bonfadini que teve de lidar com a morte dos quatro irmãos mais velhos que viviam no Rio Grande do Sul. Em Planaltina do Paraná, perdeu também a irmã Ida em 2006 e os irmãos Ricieri e Orestes em 2004 e 2010.
Desde que se mudaram para Planaltina em 1965, não quiseram mais investir no comércio. Nos primeiros anos arriscaram plantar café. Depois priorizaram a pecuária. “Você levava uma manhã para chegar a Paranavaí quando chovia. E havia mato para todo lado. Era complicado chegar na cidade”, pondera e declara que Planaltina do Paraná tinha o mesmo tamanho de hoje.
Netos de imigrantes italianos, os irmãos Bonfadini tem raízes em Bento Gonçalves, onde os pais nasceram e viveram até migrarem para a região de Porto Alegre. “Temos sobrinhos lá no Rio Grande do Sul, mas não viajamos mais pra lá. Eles que costumam vir pra cá”, garante Honório.
Sentado em uma cadeira de varanda no sobrado que ajudou a construir em 1982, Honório diz com um sorriso impoluto e um olhar sereno que até hoje se sente bem vivendo no campo, onde a vegetação ajuda a reter umidade e preservar o frescor nos dias mais ensolarados. Mais à frente, aponta o dedo para uma área erma.
Lá, ele e os irmãos viveram anos em um casebre de madeira. Dos tempos de colonização resta ainda uma tulha acinzentada que pode ser vista logo na entrada da propriedade rural, às margens da PR-218, um marco das transformações culturais da região. O local que um dia armazenou grandes quantidades de café, há muito tempo serve de abrigo para o feno.
Curiosidades
Nos tempos da colonização, o revólver de calibre 44 era conhecido em Paranavaí como uma arma usada em execuções.
Honório Bonfadini nasceu em 8 de setembro de 1929.