Archive for the ‘amor’ tag
Amor como uma bola em movimento
Intriga-me quando as pessoas se referem ao amor como um elemento sólido imutável e estático na sua própria essência – romanesca ou não. Intriga porque se o amor assim fosse, não haveria razão de ser. Se ele não muda talvez seja porque suas raízes já tenham se mortificado ao longo do tempo, e o que tenha restado seja o conforto da platitude.
Há inclusive a tradicional crença de que relacionamentos longos, que aparentemente não chegam ao fim, sejam a maior representação do amor. Mas ninguém pode afirmar isso de forma generalizada, porque seres humanos são criaturas de hábitos e muitas vezes mesmo na ausência do amor, as pessoas podem continuar juntas ou pelo menos aparentemente juntas por fatores desconhecidos e alheios ao amor em si, mas quem sabe atrelados a outros sentimentos e emoções – que podem ser positivos ou negativos – ou ausentes.
Vejo o amor como uma bola em movimento que vai aglutinando e subtraindo, que aquece, que arrefece, que pode crescer tanto quanto pode se extinguir – um desaparecer no meandro do reaparecer, quem sabe. Se apenas um amor muda talvez a incerteza desnuda. O meu amor e o outro amor, acredito que dependem de uma estabilidade energética, de uma constância que pode e deve ser inconstante na proporção de nós mesmos, um emaranhado de sinergia que depende de mudanças. Creio que não seja errado dizer que o alimentamos a partir de uma evolução partilhada, alheia às estagnações típicas do conforto desinteressado, porque se nos enterramos nesse caso já não frutificamos.
Marlon Brando: “Sempre achei os animais fáceis de amar porque o amor deles é incondicional”
“Vacas têm um hálito muito doce por causa do feno que comem”
Um dos maiores nomes do cinema norte-americano, Marlon Brando nasceu em 3 de abril de 1924 em Omaha, Nebraska. Filho de um vendedor ambulante e de uma atriz amadora, ele teve uma infância e adolescência bastante conturbada. Seu pai e sua mãe eram alcoólatras. Ainda assim, isso não o impediu de desenvolver desde cedo uma relação de respeito com os animais e com a natureza.
Em 1938, seus pais compraram uma antiga casa de fazenda em Libertyville, Illinois, a 50 quilômetros de Chicago. No local, onde os poucos animais viviam soltos, havia um estábulo e um celeiro, embora pouco usado pela família. Naquele período, uma das criaturas mais queridas por Marlon Brando era uma vaca chamada Violet, com quem ele corria pelo campo, a abraçando e a beijando. Sobre essas experiências, Brando registraria mais tarde em sua biografia: “Vacas têm um hálito muito doce por causa do feno que comem.”
Há detalhes da vida de Marlon Brando que são pouco conhecidos, como o seu hábito de recolher animais abandonados e doentes, de acordo com a biógrafa Patricia Bosworth, autora do livro “Marlon Brando”, publicado em 2001. E não apenas não humanos. Uma vez, ele levou para casa uma moça esfarrapada e doente que encontrou na rua. Naquele dia, ele e o pai discutiram; até que o pai concordou em ajudá-la.
“Sempre achei os animais fáceis de amar porque o amor deles é incondicional. Eles confiam, são leais e pouco exigentes, exceto em querer amor em troca”, registrou em sua biografia “Brando: Songs My Mother Taught Me”, publicada em 1994. Na obra, Brando explica que a sua simpatia pelos animais e pela natureza foi semeada pela sua mãe, uma mulher que não raramente era violentada por seu pai. Além disso, relata também que sua mãe não foi tão presente em sua vida quanto ele desejava.
Apesar de tudo, as lembranças do que aprendeu com sua mãe ganharam força em 31 de março de 1954. Por volta das cinco horas da manhã, quando suas mãos estavam juntas às mãos de sua mãe, antes do suspiro final, ela disse: “Não tenho medo, e você também não precisa ter.” Na ocasião, Marlon Brando se desesperou e soluçou. Então se recuperou, cortou uma mecha do cabelo de sua mãe e saiu do hospital pensando em como ela tinha sido destemida.
“Parecia-lhe que tudo na natureza estava imbuído de seu espírito, os pássaros, as folhas das árvores, e especialmente o vento. Lembrou-se de como ela o ensinara a amar a natureza, os animais e a proximidade com a terra. Tudo isso o ajudou a lidar com a sua grande perda. Ela era o símbolo de muitas coisas importantes para Marlon – sua paixão pela pureza, sua atitude em relação aos animais, à terra e à música”, escreveu Patricia Bosworth na biografia “Marlon Brando”.
Um ano antes, Marlon Brando já havia revelado o seu desinteresse por coisas que ele julgava como ausentes de essência. Prova disso foi a sua recusa em protagonizar uma produção da Broadway para a qual receberia 10 mil dólares por semana. Ele preferiu aceitar o convite de Lee Falk para participar da adaptação de “Arms and the Man”, do dramaturgo vegetariano George Bernard Shaw, recebendo modestos 500 dólares por semana.
Na mesma época, Brando começou a se interessar cada vez mais por filosofia e espiritualidade. O seu biógrafo, ator e colega de quarto David Ge’lin escreveu que enquanto moraram juntos “ele estava particularmente interessado nos filósofos alemães, particularmente em Nietzsche e na religião hindu.” Marlon Brando era fascinado por religiões orientais e meditava duas vezes por dia. A sua admiração e reverência pela natureza também lançaram luz sobre uma inclinação panteísta. Filosoficamente, ele também não velava o seu respeito pelos índios americanos – mas principalmente pela reverência ao mundo natural como uma força mística e espiritual.
Acredito que o amor aos animais não é prioritário na consideração ao direito à vida não humana, mas sim o respeito
Minha linha de pensamento em relação aos animais é semelhante a do J.M. Coetzee. Acredito que o amor aos animais não é prioritário na consideração ao direito à vida não humana, mas sim o respeito. O respeito sim deve ser uma premissa básica. Acho um erro muito grande quando restringimos o discurso em favor dos animais ao amor, até por uma questão óbvia – nem todas as pessoas amam os animais.
E devo condená-las por isso? De modo algum. Muitas pessoas desgostam de outras, mas nem por isso fazem algo contra elas. E por que? Porque em primeiro lugar deve prevalecer o respeito. Outras formas de exploração não chegaram ao fim por causa de amor.
Essa é a realidade do mundo não romanesco em que vivemos. Veganos não precisam amar animais; não precisam tutelar animais, nem mesmo conviver com os animais. O primeiro e mais importante passo é entender que não temos o direito de interferir negativamente em suas vidas. Se uma pessoa cumpre esse papel, ela já está contribuindo.
Entendo também que o meu trabalho não é o trabalho do outro, assim como o dele não é o meu. Cada um cumpre o seu papel de acordo com suas características e potencialidades. Sempre fui a favor da diplomacia. Esse é o meu perfil, e não abro mão dele.
Não tenho interesse em ofender pessoas, xingá-las, independente da circunstância, porque pra mim é perda de tempo. E sei que à medida em que apelo as chances do outro me ouvir diminuem consideravelmente. Claro, você pode discordar, mas siga o seu caminho que eu sigo o meu.
Quando se fala em amor…
Diante do semáforo
De manhã, diante do semáforo, ao meu lado havia um fusquinha bege bem conservado. Ao volante, um senhorzinho já bem idoso. Enquanto o sinal não esverdeava, ele levantou a pequena mão da esposa e a beijou delicadamente. Ela sorriu e ajeitou a gola da blusa dele. Quando o sinal ficou verde, o fusquinha seguiu o seu caminho, sem pressa, ignorando as ultrapassagens. Naquele momento, pensei: “Realmente, nós que fazemos a velocidade da vida; nos entorpecemos ou nos sublimamos com ela.”
Para ser vegano, não é preciso amar os animais, basta respeitá-los
Um amigo — Cara, eu até acho legal quem é vegano, mas a verdade é que não amo animais. Para ser honesto, nem gosto muito de animais. O negócio é eles lá e eu aqui. Como isso poderia funcionar? Não vejo como.
Eu — Não há problema nenhum nisso. Você não precisa gostar de animais, tutelar animais, resgatar animais ou algo do tipo. Basicamente, você não precisa querer conviver com animais. Claro, muitos veganos fazem isso, mas não é uma regra ou algo do tipo. Para ser vegano, você precisa apenas ter a consciência de que os animais não humanos merecem viver, não morrer.
Para ser mais preciso, não merecem ser explorados. Então o seu papel como vegano seria esse, se empenhar em não contribuir com a exploração animal. A questão é você entender, reconhecer isso e colocar em prática. O amor pelos animais realmente é uma coisa nobre e bonita, mas a consciência sobre justiça nesse contexto é imprescindível, logo mais importante. Isto porque ela tem forte apelo junto ao discernimento moral e ético em uma sociedade construída sobre valores equivocados que levaram ao antropocentrismo e consequentemente ao especismo.
Independente de alguém se reconhecer ou não como superior a outras formas de vida, o que é preciso entender em relação a isso é que não interessa qual animal é mais inteligente, qual é mais amável ou qual é mais sensível. O entendimento que se deve ter é de que o direito à vida deve ser assegurado e que não cabe a nós decidirmos quais animais devem viver ou morrer levando em conta nossas pretensas necessidades ou preferências. Eles são conscientes, sencientes e merecem viver à sua maneira.
Nossa interferência deve ocorrer apenas quando eles precisam de nós, sem subjugação. Se esforçar para não impactar negativamente na vida dos animais é uma forma de aperfeiçoamento civilizatório, porque se você é capaz de respeitar honestamente a vida de um animal que não é capaz de falar, isso te conduz a respeitar mais a vida em geral. Gostar ou amar animais é uma questão de pessoalidade. Você pode desenvolver isso ou não, e sem que isso prejudique ninguém. Por outro lado, é a falta de entendimento de que os animais não existem para nos servir que tem perpetuado práticas desnecessárias que anualmente custam a vida de bilhões de animais.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Quando temos filhos…
Quando temos filhos, gostamos de contar-lhes histórias de amor e respeito aos animais; de amizade entre todas as espécies; de narrar historietas sobre a harmonia entre os seres vivos, o respeito a todas as formas de vida.
Porém, nossa própria realidade e nossos hábitos, mais cedo ou mais tarde deixam claro que tudo que foi dito ou lido era apenas ficção, um frágil e ilusório pseudo-alimento para a mente. Provamos com atitudes que não acreditamos naquilo.
E logo as crianças crescem e esquecem o que os pais disseram, e os pais esquecem o que disseram aos filhos. As histórias desaparecem, ou não. Talvez sejam lembradas como artifício jocoso, risível, alegórico ou mesmo insignificante e utópico.
E a vida segue diante de uma mesa em que celebramos os nossos, porque nós somos importantes, e os outros existem para nos servir; para figurar como coadjuvantes de suas próprias vidas.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
Uma lição de vida
Sempre me emociono quando vejo o vídeo abaixo. Baita lição de vida. E pensar que esses animais são tratados como se fossem isentos de qualquer razão e sensibilidade. Basta pensarmos no uso hediondo deles em laboratórios, em vivissecção. Triste realidade.
A lição de Dona Maria
Em março de 2014, comecei a produzir um documentário sobre a realidade da periferia. Durante as filmagens, conheci a Dona Maria, uma senhora que trabalhava recolhendo materiais recicláveis.
Em uma manhã, testemunhei o estado lastimável de sua casinha, atingida por uma forte enxurrada. Ela me contou que perdeu quase tudo. Apesar da situação extremamente difícil, a sua maior preocupação era com os animais com quem ela convivia.
No interior do casebre, sobre uma pequena cama, estava uma cadelinha, a quem ela tratava como se fosse uma filha. Dias antes, a cachorrinha tinha passado mal e ela percorreu quilômetros a pé, até encontrar um médico veterinário.
No casebre, moravam também outros dois cães que gostavam de ficar perto da única porta, como se fossem responsáveis pela segurança do lar. Em cima de um colchão, me deparei com o que mais me chamou a atenção – três pratinhos com ração.
Dona Maria não ganhava nem o suficiente para a subsistência, chegando até a passar fome, e dois dias antes quase perdeu a casinha construída com as próprias mãos. Apesar de tudo, ela afirmou que o mais importante era cuidar de seus três companheiros animais.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar:
O amor só sobrevive se houver plasticidade
Acredito que o amor só sobrevive se houver plasticidade. Ele deve ser genuíno, mas também deve ser mutável; mutável porque como seres humanos sofremos metamorfoses diárias, até mesmo quando vivemos uma rotina. Então se não houver plasticidade, o amor não sobrevive.
Creio que a singularidade do amor subsiste no vislumbre de querer estar junto de alguém mesmo imaginando a figura humana que materializa esse amor em muitos dos piores cenários possíveis.
Quando achar que ama alguém, imagine aquela pessoa nas mais terríveis das condições e pergunte a si mesmo se ainda assim você gostaria de estar junto dela. Se a resposta for sim, acredito que está aí um amor com chances não apenas de sobreviver, mas de frutificar.
Contribuição
Este é um blog independente, caso queira contribuir com o meu trabalho, você pode fazer uma doação clicando no botão doar: