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Hoje é aniversário do Tio Lu
Hoje é aniversário do Tio Lu, da Oficina do Tio Lu. Fui até a Vila Alta dar um abraço nele e conversar um pouco. Ele está muito feliz de chegar aos 87 anos com pique para trabalhar e para ajudar a garotada do bairro. Tio Lu, que foi tema do meu documentário “Oficina do Tio Lú“, usa a arte como meio de afastar crianças e adolescentes das ruas, das drogas e do crime.
Um exemplo do nível da nossa política atual
Fui ontem na Vila Alta, bairro da periferia de Paranavaí, conversar com um amigo, o artista plástico Luiz Carlos Prates de Lima. Na ocasião, ele e outros moradores me relataram que nas últimas duas semanas apareceram vários candidatos a vereador, que até então nunca foram ao bairro, alegando serem os responsáveis pelo asfalto que existe naquele lugar desde o ano passado.
Na realidade, toda a malha viária da Vila Alta foi feita através de uma reivindicação dos próprios moradores, e com recursos do PAC. Ou seja, tais candidatos são basicamente mentirosos e picaretas querendo levar vantagem sobre os mais humildes.
Vão a bairros pobres para tentar enganar os moradores. Depois me perguntam porque é desanimador votar hoje em dia. É esse tipo de gente que mais briga para ocupar um cargo eletivo na atualidade.
Um almoço na casa do Tio Lú
Hoje, o artista plástico Tio Lú preparou um almoço para dezenas de crianças e adolescentes da Vila Alta, na periferia de Paranavaí. A garotada deveria chegar após às 12h, mas a fome falou mais alto e eles chegaram às 11h. Nesse ínterim, ficaram rindo e brincando, até o momento em que Tio Lú colocou uma panela de 60 litros de sopa de mandioca sobre uma mesinha improvisada. Enquanto ele dizia que a sopa não ficou tão boa quanto esperava, os convidados nem se importavam, comiam com alegria e satisfação.
Seguindo as diretrizes da casa, levaram colheres, copos e pratinhos ou vasilhas de plástico e alumínio. Presenciar um almoço na casa do Tio Lú significa ver crianças extremamente felizes comendo sopa de mandioca. E durante o encontro virei alvo das brincadeiras: “Ô tio, você vai ser Papai Noel agora? Quero meu presente de Natal!”, perguntou uma das crianças. William, de oito anos, o mais falante da turma, indagou como posso ter uma barba tão grande sem ser velho. “Ah, tio! Você comprou essa barba branca e pintou de preto. Pode falar!”, insistiu William. Depois começou a rir quando encostou a mão na minha barba e percebeu que não era de mentira.
Após às 13h, restavam poucos litros de sopa. E antes de partir, as crianças pediam para levar um pouco de sopa para casa, pensando em algum familiar. “Seu Luiz, posso levar um pouco pra minha avó?” “Seu Luiz, posso pegar um pouquinho pro meu pai?”, questionavam. E Tio Lú erguia uma concha gigantesca e enchia os pratinhos e as vasilhas. Os convidados saíam felizes, satisfeitos e repetiam a mesma frase de agradecimento: “O senhor é muito bom, Seu Luiz! Deus te abençoe!”
As transformações da Vila Alta
Era um abandono total e você pode não concordar, mas acredito que o nosso trabalho tem parte nisso
Fiquei feliz e emocionado hoje quando visitei o artista plástico Luiz Carlos Prates de Lima, o Tio Lú, idealizador da Oficina do Tio Lú, na periferia de Paranavaí. Durante um tranquilo bate-papo, ele me relatou que a Vila Alta não é mais o mesmo bairro de três anos atrás.
“Aqui antigamente você via briga direto nas ruas, nem que fosse bate-boca e confusão por bobagem. Assassinatos ou outros tipos graves de crimes não acontecem no bairro tem muito tempo. São raros. Nem sei te dizer quando foi a última vez. E notei que até moradores agressivos estão mais tranquilos, mais civilizados, mais tolerantes. Sempre fico sabendo de novos casos de criminosos que abandonaram a vida errada. Até as crianças estão mais conscientes de certo e errado, de suas obrigações. Parece que muita gente do bairro hoje se sente mais humana, menos insignificante. É como um renascimento. Aqui era um abandono total e você pode não concordar, mas acredito que o nosso trabalho tem parte nisso. Foi só depois que você começou a frequentar o bairro, ajudando, dedicando tempo, fazendo documentários e reportagens sobre a oficina e a vida dos moradores da Vila Alta, que surgiram melhorias, que a atenção se voltou um pouco para este lugar, melhorando até a autoestima da população. Você fez a Vila Alta existir para quem nem sabia que existia periferia em Paranavaí. Claro, não somos perfeitos, a oficina tem suas falhas, mas acredito que ela também tem feito a diferença no bairro, principalmente na vida dos mais jovens. E vejo os pais e avós também reconhecendo isso, o que é muito importante. Estou perto de completar 86 anos e às vezes tenho a impressão de que estou chegando no fim da linha, mas quero persistir e ver novas mudanças. Com a sua ajuda, quero continuar sonhando mais pelos outros do que por mim. Não tenho mais ambições pessoais na vida, a não ser ajudar essa molecada.”
A Oficina do Tio Lú é um dos trabalhos mais belos que conheci e tive o privilégio de acompanhar de perto. Durante a conversa, não pude deixar de dizer como é admirável ver alguém se doar tanto aos 85 anos, ainda mais levando em conta que nessa etapa da vida o ser humano tem grande facilidade em sofrer com crises existenciais. Também acho justo dizer que não consigo enxergar meu trabalho como tão importante, mas é muito gratificante ouvir algo assim do Tio Lú, de quem me tornei amigo no início de 2009.
O dia em que Tio Lú escapou da morte
O artista plástico Tio Lú, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, me contou hoje uma história que acho interessante compartilhar. Durante o relato, me recordei de “A Narrativa de Arthur Gordon Pym de Nantucket”, de Edgar Allan Poe, que anos depois deixou de ser apenas ficção para se tornar realidade, fazendo muitos de seus leitores refletirem sobre a quimera que envolve questões de probabilidade e impossibilidade.
Há cinco anos, Tio Lú estava pedalando pela Rua Pernambuco, perto do antigo depósito dos Correios, quando lhe chamou a atenção o fato de um homem passar diante dele vestindo roupas iguais e com as mesmas cores – sandálias amendoadas de couro, camisa azul e calça jeans escura. Assim como Tio Lú, o sujeito também era alto, negro e tinha cabeça raspada, além de composição corporal muito semelhante.
Por descuido, o homem quase esbarrou nele e seguiu guiando a bicicleta, também da mesma cor, com pressa, logo desaparecendo no horizonte. Intrigado, mas despreocupado, o artista plástico continuou pedalando, até que de repente ouviu um tiro que passou raspando à direita de sua camisa. O outro balaço coincidiu com o momento em que Tio Lú jogou a bicicleta sobre a calçada, se lançando sobre o pavimento de mosaico português e assim se livrando da morte.
Assustado, olhou para trás e viu um rapaz correndo e empunhando um revólver calibre 38. “O que é isso? Você tá louco?”, questionou Tio Lú, lívido e com o corpo trêmulo. O homem o observou rapidamente, o ignorou e prosseguiu acelerado. Desorientado, o artista plástico só conseguiu se levantar cinco minutos após o choque. No dia seguinte, ficou sabendo que ele foi confundido com o homem mais tarde assassinado na Rua Pernambuco, em Paranavaí.
Tio Lú e o reencontro com um ex-aluno
“O verdadeiro malandro sou eu que estou nesta vida com 85 anos e nunca fui preso, nunca usei drogas, nunca fumei. Tu acha que é malandragem estar na cadeia, sem liberdade pra fazer nada?”
Palavras do artista plástico Luiz Carlos Prates de Lima, conhecido como Tio Lú, morador da Vila Alta, na periferia de Paranavaí, no reencontro com um ex-aluno de 18 anos que deixou a cadeia recentemente. O artista é bem conhecido pelo trabalho de recuperação de jovens em situação de vulnerabilidade social. Em mais de dez anos, já afastou muitos do mundo das drogas e do crime.
Visitando Billy
Hoje, no final da tarde, fui até a casa do artista plástico Luiz Carlos Prates de Lima, na Vila Alta, na periferia de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, visitar o Billy, cachorro do ex-morador de rua Jessé Piedade que está fazendo tratamento contra o alcoolismo na Casa da Misericórdia, de Apucarana, no Norte do Paraná. Quando cheguei lá, Billy fez a maior bagunça – começou a rodopiar e a saltar. Assim que se acalmou, aproveitei para registrar o momento. Billy, que hoje está sob a guarda do Tio Lú, tem uma história de vida muito bonita.
Quando filhote, foi abandonado na sarjeta do Terminal Rodoviário de Paranavaí num dia de chuva. E para piorar, um dos guardas do local o deixou cego de um olho ao usar uma arma de eletrochoque para expulsá-lo de lá. Jessé, revoltado, partiu pra cima do guarda e o impediu de machucá-lo mais ainda. Desde então, se passou dois anos, e hoje Billy é esse animal alegre e saudável que vocês podem ver na foto.
A sina de Nenê, um ex-peão de boiadeiro
Enquanto gesticula, coça a cabeça e sorri de forma acanhada, ele informa que é dia de música
Na Rua B da Vila Alta, enquanto eu converso com o artista plástico Tio Lú em frente a um terreno baldio, um homem se aproxima. Não entendo quase nada do que ele diz e suspeito que o sujeito esteja embriagado. Ele carrega um relógio muito bonito, que já não funciona mais. Tio Lú pede que eu aguarde um minuto, entra dentro de sua casa e traz um rádio pequeno. Nenê sorri efusivamente e pega o radinho com uma das mãos. Exibindo os poucos dentes que lhe restam na boca, parece uma criança quando ganha um doce.
Ele segura minha mão e diz algumas frases – entendo não mais do que meia dúzia de palavras e o observo se afastando. Então pergunto ao Tio Lú se ele pode chamar o Nenê novamente para responder uma ou duas perguntas. Em menos de 30 segundos, Nenê retorna e me diz com muita dificuldade que já foi peão de boiadeiro.
Conta que não sente falta dos tempos de boiadeiro, apenas da saúde. Anos atrás, antes de prometer a si mesmo que jamais montaria em um animal novamente, caiu de cima de um touro e bateu a cabeça com força no chão de terra, ficando em coma por vários dias. Quem o conhecia como boiadeiro, decidiu se afastar, julgando que o rapaz nada mais tinha a oferecer. A queda o deixou com graves sequelas, dificultando sua fala, dando a impressão de que está sempre embriagado.
Enquanto gesticula algumas vezes, coça a cabeça e sorri de forma acanhada, ele informa que hoje é dia de música. “Vô rum-a píi-a po radímm”, explica com dificuldade. Dias atrás, Nenê estava caminhando perto da estrada de terra da Farinheira Cassava quando alguns jovens começaram a importuná-lo. Como ele não gosta de briga, tentou se afastar, mas o jogaram no meio de uma roda, o empurraram e o estapearam até que as agressões se intensificaram.
Sem ter como fugir, Nenê derrubou quatro rapazes, distribuindo apenas quatro socos. “Ele é quieto, mas extremamente forte”, declara Tio Lú que toda semana separa algum objeto para entregar a Nenê que gosta de caminhar ladeado pelo Bosque Municipal, tratando cada presente como um motivo a mais para viver no seu universo de inocência e redescoberta tardia.
Oficina do Tio Lú no Encontro com Fátima Bernardes
Artista plástico de Paranavaí recebeu a equipe do programa ontem
Anteontem, eu estava retornando de Curitiba, quando parei em Califórnia por volta das 22h para atender uma ligação. Era o Tio Lú, artista plástico da Vila Alta, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, que faz um trabalho de recuperação de crianças em situação de vulnerabilidade social. Feliz, me contou que ontem de manhã receberia a equipe de jornalismo do programa Encontro Com Fátima Bernardes, da Rede Globo. Emocionado, me agradeceu várias vezes pela divulgação da sua oficina em texto e vídeo.
Depois pediu que eu fosse até a casa dele antes das 9h para dar uma força. Gostei muito da experiência. Fiquei emocionado em ver que após seis anos acompanhando a Oficina do Tio Lú, o trabalho do Seu Luiz vai ter uma repercussão muito maior. Outra felicidade foi encontrar o artista plástico Jesus Soares que teve importante participação nesse processo. Inclusive foi quem me apresentou ao Tio Lú há seis anos. Jesus fez questão de contribuir, tanto que dedicou a manhã toda e parte do início da tarde.
Admito que não tenho o hábito de assistir TV, mas fiquei grato em ver o carinho e a sensibilidade da equipe do programa com todo mundo que participou e testemunhou esse trabalho que findou só por volta das 14h. Tiveram uma grande preocupação em conhecer a fundo o projeto do Tio Lú. Recolheram fotos, vídeos produzidos de forma independente e checaram todos os outros materiais já publicados sobre o assunto.
É muito legal saber que o Seu Luiz, já com 84 anos, dois joelhos problemáticos e diagnosticado com uma hepatite C no final de dezembro, continua lutando pelos seus ideais, se esforçando para fazer a diferença em um mundo cada vez mais individualista e materialista. A garotada também merece só elogios. Deram um grande show de comprometimento e gratidão. A reportagem gravada em Paranavaí vai ao ar no programa Encontro com Fátima Bernardes na terça-feira.
Link do vídeo produzido pela equipe do Encontro Com Fátima Bernardes (atualizado no dia 21-04-2015):
http://globotv.globo.com/t/programa/v/gabriela-lian-mostra-trabalho-de-artesao-de-84-anos/4124935/
Conheça um pouco mais o trabalho do Tio Lú nos links abaixo:
//davidarioch.com/2014/02/22/oficina-do-tio-lu/
//davidarioch.com/2014/10/14/ajudando-jovens-em-situacao-de-risco/
Oficina do Tio Lú
Uma viagem por um universo de abnegação
Lançado no início da semana, Oficina do Tio Lú é o meu mais novo trabalho audiovisual. Parte da série “Realidade da Periferia”, o documentário conta a história do artista plástico Luiz Carlos Prates Lima, de Paranavaí, no Noroeste do Paraná, que se dedica a recuperar crianças e adolescentes em situação de risco.
Na Vila Alta, um dos bairros mais pobres da cidade, Luiz Carlos, que está sempre enfrentando dificuldades financeiras, deixa de lucrar para ensinar os mais jovens a criarem obras de arte a partir das mais diferentes fontes de matéria-prima.
A oficina do artista fica no fundo da própria casa, onde ele faz crianças e adolescentes se distanciarem do mundo das drogas, da fome e da miséria. Oficina do Tio Lú é uma viagem por um universo de abnegação. Na obra, Tio Lú mostra que não é preciso muito dinheiro para fazer a diferença em um mundo cada vez mais consumista e materialista.
Ficha Técnica
Roteiro e Direção: David Arioch
Colaboração: Jesus Soares
Trilha Sonora: Crash Nomada, Racionais MC’s, Ney Matogrosso e Cólera
Fotos: David Arioch, Gugu Ditzel e Arquivo Pessoal de Luiz Carlos Prates Lima
Personagens: Luiz Carlos Prates Lima, Jesus Soares, Paulo José Zanelato Silva, Lindinalva Silva Santos, Maria de Fátima Oliveira, Danilo Medeiros França, Lucas Antônio Souza Silva, Odair Correa Junior, Gustavo Jesus Souza, Vagner Souza Santos, Weder França Melo, Kelvin Santos Melo, Ariel Gonçalves Souza, Robson Silva, João Paulo Rodrigues Alves e Juvenal Ferreira Silva.
Duração: 46 Minutos